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Avaliação das condições de saúde bucal de Portadores de Necessidades Especiais

Evaluation of oral health conditions of patients with Special Needs

Resumos

Objetivo:

O objetivo deste trabalho foi avaliar as condições de saúde bucal de Portadores de Necessidades Especiais (PNE) de uma Escola Especial da cidade de Patos-PB, bem como identificar as dificuldades apontadas por seus responsáveis para a manutenção da saúde bucal dos mesmos.

Metodologia:

A população-alvo deste estudo foi composta por 74 alunos, de ambos os sexos, regularmente matriculados, que preencheram os critérios de inclusão previamente estabelecidos e por seus responsáveis. O estudo foi conduzido em duas etapas: a primeira consistiu na aplicação de um formulário aos responsáveis pelos PNE, e a segunda, na realização de um exame clínico intrabucal, realizado por um examinador e anotador previamente calibrados, em que se avaliaram as condições de saúde bucal dos alunos por meio do Índice de Cárie Dentária (CPO-D), do Índice de Higiene Oral Simplificado (IHOS) e da presença de Trauma Dentário.

Resultado:

Observou-se que 75,4% dos alunos já haviam recebido algum tipo de tratamento odontológico; destes, 50,9% afirmaram ter sido na Unidade Básica de Saúde. O CPO-D médio foi de 12,6 (±8,4), 52% apresentaram higiene oral deficiente e o trauma dental foi observado em 19,3% dos alunos analisados. Com relação ao parto, 51% das mães relataram ter tido uma gestação normal e 54,4% nunca haviam sido orientadas com relação aos cuidados com a saúde bucal do filho. Entre as dificuldades relatadas pelos responsáveis para manter a saúde bucal do PNE, 33,3% afirmaram ser encontrar um Dentista que o atenda e 33,3% apontaram o custo do tratamento.

Conclusão:

Os altos índices revelados pelo CPO-D, bem como a higiene oral deficiente, somados às dificuldades relatadas em se realizar o acompanhamento odontológico desses indivíduos, mostram a necessidade da implementação de políticas públicas mais voltadas à atenção a esses pacientes.

Pessoas com deficiência; saúde bucal; Odontologia


Objective:

The aim of this study was to evaluate the oral health of patients with Special Needs (SN), and identify the difficulties pointed out by their parents for maintaining the oral health.

Methodology:

The population for this study was made up of 74 students, of both sexes, enrolled who met the inclusion criteria previously established and their parents. This study was conducted in two stages: the first was the application of a form to parents of the students with SN and the second, the achievement of an intraoral clinical examination, by an examiner and recorder calibrated, which evaluated the oral health status of students through the Caries index (CPO-D), Simplified Oral Hygiene Index (IHOS) and presence of dental trauma.

Result:

It's noted that 75.4% had received some form of dental treatment, of these, 50.9% said they had been in the Basic Health Unit. The caries index was 12.6 (±8,4), 52% had poor hygiene oral and the dental trauma was observed in 19.3% of analyzed students. With respect to delivery, 51% of mothers reported having had a normal pregnancy and 54.4% were never oriented in relation to the oral health care of the child. Among the difficulties reported by the parents for maintaining the oral health of the SN, 33.3% claimed to be finding a dentist that meets, and 33.3% pointed the cost of treatment.

Conclusion:

The high rates revealed by CPO-D, as well as poor oral higiene, added to the reported difficulty in performing the dental care of these individuals, show the need to implement more public policy that give more attention to these patients.

Disabled persons; oral health; dentistry


INTRODUÇÃO

Cerca de 10% da população mundial é constituída por Portadores de Necessidades Especiais (PNE)11. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política Nacional de Saúde da Pessoa Portadora de Deficiência. Brasília: Editora do Ministério da Saúde; 2008. (Série E. Legislação em Saúde)., que são indivíduos que apresentam perda ou anormalidade de uma estrutura do corpo ou função fisiológica, temporária ou permanente, progressiva, regressiva ou estável, requerendo atendimento diferenciado22. World Health Organization. International Classification of Functioning, Disability and Health. Geneva; 2004..

Os Portadores de Necessidades Especiais tendem a apresentar maiores riscos de desenvolver cárie e doença periodontal. O grau de limitação física e/ou mental, a dificuldade da realização da higiene bucal, a dieta alimentar, geralmente rica em carboidratos e alimentos pastosos, além do fato de muitas vezes terem sua higiene oral negligenciada pelos seus responsáveis, são fatores que favorecem o acúmulo de placa bacteriana e, consequentemente, o aparecimento dessas patologias33. Resende VLS, Castilho LS, Viegas CMS, Soares MA. Fatores de risco para a cárie em dentes decíduos portadores de necessidades especiais. Pesq Bras Odontoped Clin Integr. 2007; 7(2): 111-7. http://dx.doi.org/10.4034/1519.0501.2007.0072.0002.
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A população brasileira consiste em torno de 160 milhões de habitantes e estima-se que 23,9% têm algum tipo de deficiência – visual, auditiva, motora e mental ou intelectual44. Brasil. Secretaria de Direitos Humanos da Presidência Da República. Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Coordenação-Geral do Sistema de Informações sobre a Pessoa com Deficiência. Cartilha do Censo 2010: pessoas com deficiência. Brasília: SDH-PR/SNPD; 2012., requerendo estas pessoas um tratamento individualizado, com o estabelecimento de vínculos, motivação e educação em saúde bucal, que são elementos capazes de ajudar na superação dos obstáculos impostos pela dificuldade de comunicação.

No Brasil, a partir da Resolução 25/2002, publicada no Diário Oficial da União em 28/05/2002, pelo Conselho Federal de Odontologia, regulamentou-se a especialidade, com intenção de capacitar os Cirurgiões-Dentistas para o atendimento de pessoas que necessitam de cuidados odontológicos especiais durante toda a vida ou por um determinado período55. Mugayar LRF. Pacientes portadores de necessidades especiais: manual de odontologia e saúde oral. São Paulo: Pancast; 2000.. Mesmo diante dessa realidade, o tratamento odontológico para pacientes portadores de necessidades especiais ainda é um desafio para os Cirurgiões-Dentistas, sendo poucos os profissionais capacitados a atendê-los, tanto em rede pública quanto particular66. Marra PS, Miasato JM. A saúde bucal do paciente especial e sua relação com o nível sócio-econômico dos pais. Rev Bras Odontol. 2008; 65(1): 27-30..

Além da dificuldade em encontrar profissionais capacitados para o atendimento odontológico a pacientes Portadores de Necessidades Especiais, existe, muitas vezes, a falta de recursos financeiros de seus familiares no custeio do tratamento especializado, o que contribui para que sejam adotadas, na maioria dos casos, soluções radicais e tardias no tratamento odontológico desses pacientes, como, por exemplo, a realização de exodontias múltiplas77. Tanaca F, Maciel SM, Sonohara MK. Comportamento dos pais e condições de saúde bucal em crianças especiais - saúde bucal de crianças especiais. JBP Rev Ibero-Am Odontopediatr Odontol Bebê. 2005; 8(45): 342-8..

Diante de tais fatos, o presente trabalho objetivou avaliar as condições de saúde bucal de Portadores de Necessidades Especiais e identificar as dificuldades apontadas por seus responsáveis para a manutenção da saúde bucal dos mesmos.

METODOLOGIA

Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) HUAC/UFCG, nº 361.609. Trata-se de um estudo transversal descritivo, desenvolvido em duas etapas: a primeira etapa consistiu na aplicação de um formulário, que foi respondido pelos responsáveis pelos Portadores de Necessidades Especiais, e a segunda etapa, na realização de um exame clínico com o objetivo de avaliar as condições de saúde bucal dos alunos.

A população-alvo deste estudo foi composta por alunos Portadores de Necessidades Especiais, de ambos os sexos, regularmente matriculados em uma Escola Municipal Especial, que preencheram os critérios de inclusão previamente estabelecidos, e por seus responsáveis. Foram incluídos os alunos que tiveram os Termos de Consentimento Livre e Esclarecido e os questionários devidamente preenchidos e assinados pelos responsáveis, e que colaboraram para a realização do exame clínico, correspondendo a uma amostra final de 74 participantes.

Um estudo piloto foi realizado com a finalidade de avaliar os instrumentos da pesquisa e a dinâmica da coleta dos dados, possibilitando, assim, a realização dos devidos ajustes. O estudopiloto foi realizado com oito alunos, sorteados aleatoriamente, correspondendo a 10% da amostra do estudo.

Para aplicação dos questionários, o pesquisador foi pessoalmente a todos os responsáveis pelos alunos, os quais foram previamente comunicados sobre os propósitos da pesquisa e permitiram a realização da mesma. O formulário foi constituído por 26 questões fechadas, abordando itens relacionados às condições socioeconômicas das famílias, seguindo metodologia proposta por Graciano et al.88. Graciano MIG, Lehfeld NAS, Neves Filho A. Critérios de avaliação para classificação sócio-econômica: elementos de atualização. Serviço Social & Realidade. 1999; 8(1): 109-28., contendo perguntas sobre a história médica e odontológica dos indivíduos analisados, e as principais dificuldades relacionadas à manutenção da saúde bucal dos Portadores de Necessidades Especiais66. Marra PS, Miasato JM. A saúde bucal do paciente especial e sua relação com o nível sócio-econômico dos pais. Rev Bras Odontol. 2008; 65(1): 27-30..

As condições de saúde bucal dos Portadores de Necessidades Especiais foram avaliadas por meio do Índice de Cárie (CPO-D)99. World Health Organization. Oral health suveys: basic methods. 4th ed. Geneva; 1997. e do Índice de Higiene Oral Simplificado (IHOS)1010. Greene JC, Vermillion JR. The simplified oral hygiene index. J Am Dent Assoc. 1964; 68: 7-13. PMid:14076341., e pela presença visível de trauma dentário.

Os exames clínicos foram realizados por um único examinador e anotador, previamente calibrados. A verificação da concordância intraexaminador foi feita antes e durante a coleta dos dados, no sentido de aferir se a consistência obtida no treinamento foi mantida em campo. Durante o levantamento, a concordância foi feita a partir da prática do exame em duplicata, em que o examinador reexaminou em torno de 10% da amostra. Os alunos foram examinados nas dependências da escola, em local sob iluminação natural, ventilado e próximo de uma fonte de água, estando o examinador e o aluno sentados em cadeiras escolares.

Para a realização do exame clínico, foram utilizados espelhos bucais e sonda periodontal da OMS (sonda CPI), para levantamentos epidemiológicos99. World Health Organization. Oral health suveys: basic methods. 4th ed. Geneva; 1997.; após a realização do IHOS, foi realizada escovação supervisionada e secagem das superfícies dentárias com gaze, a fim de facilitar a execução do exame da cavidade oral.

Para realização do IHOS, foram atribuídos escores de 0 a 3, de acordo com a quantidade de placa bacteriana em cada elemento dentário avaliado, em que: 0 = superfície sem placa; 1 = um terço da superfície recoberta por placa; 2 = dois terços da superfície recoberta por placa; 3 = toda a superfície recoberta por placa. Posteriormente, foi feita uma média aritmética e, de acordo com o resultado, o nível da higiene oral do aluno foi avaliado. Os valores da média aritmética foram assim classificados: entre 0 e 1, higiene oral considerada boa; de 1 a 2, regular, e entre 2 e 3, deficiente1010. Greene JC, Vermillion JR. The simplified oral hygiene index. J Am Dent Assoc. 1964; 68: 7-13. PMid:14076341..

O índice de cárie dentária foi utilizado segundo os códigos e critérios recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS)99. World Health Organization. Oral health suveys: basic methods. 4th ed. Geneva; 1997. e adaptados pelo projeto SB Brasil 20031111. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Coordenação Nacional de Saúde Bucal. Projeto SB Brasil 2003: condições de saúde bucal da população brasileira 2002-2003: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2004. (Série C. Projetos, Programas e Relatórios).. Os dados obtidos foram anotados em fichas próprias para facilitar a tabulação. Depois de atribuídos os valores, foi feita uma média aritmética e, de acordo com o resultado, a história de cárie dentária dos alunos Portadores de Necessidades Especiais foi avaliada. Média de 0,1 a 1,1 foi considerada prevalência muito baixa; de 1,2 a 2,6 - prevalência baixa; de 2,7 a 4,4 - prevalência moderada; de 4,5 a 6,5 - prevalência alta, e ≥ 6,6 - prevalência muito alta99. World Health Organization. Oral health suveys: basic methods. 4th ed. Geneva; 1997..

Na avaliação do trauma dentário, foram considerados os dentes anteriores superiores e inferiores (12, 11, 21, 22, 31, 32, 41 e 42). Foi observado se houve presença de fratura coronária visível clinicamente, independentemente do terço atingido, em estruturas dentais hígidas.

Como mecanismo de controle, foi estabelecido um número de, no máximo, dez exames por período de atividade, evitando que a fadiga interferisse nos resultados obtidos. Todos os contatos com os Portadores de Necessidades Especiais foram realizados por meio de atividades educativas, com uso de materiais lúdicos, como forma de promover uma integração entre os alunos e o pesquisador.

A análise estatística foi realizada de modo descritivo por meio de frequências relativas e absolutas para as variáveis categóricas. Os testes foram calculados por meio do programa SPSS® (Statistical Package for the Social Sciences) versão 21.0 para Microsoft Windows. Os resultados foram expressos em percentuais e apresentados por meio de gráficos.

RESULTADO

Os 74 alunos avaliados estavam na faixa etária de 14 a 35 anos, sendo 35,1% do sexo feminino e 64,9% do sexo masculino. Destes, 64% eram portadores de deficiência intelectual, 14% possuíam mais de uma deficiência (múltiplos), 11% eram deficientes visuais, 8% deficientes auditivos e 4% possuíam Síndrome de Down.

Durante o exame clínico intrabucal, observou-se que 52% dos alunos apresentaram uma condição de higiene oral deficiente1010. Greene JC, Vermillion JR. The simplified oral hygiene index. J Am Dent Assoc. 1964; 68: 7-13. PMid:14076341. (Figura 1) e índice médio de cárie dentária (CPO-D) de 12,6 (±8,4), indicando este valor uma prevalência muito alta99. World Health Organization. Oral health suveys: basic methods. 4th ed. Geneva; 1997.. A prevalência de trauma dentário foi de 19,3%, sendo 73% em um único dente e 27% em dois ou mais dentes anteriores.

Figura 1.
Condição de higiene oral dos Portadores de Necessidades Especiais.

Com relação ao tipo de deficiência e a condição de saúde bucal, 87% dos alunos com deficiência intelectual e 100% dos deficientes visuais apresentaram CPOD alto; em contrapartida, 50% dos deficientes auditivos apresentaram CPOD baixo, 34% CPOD moderado e 16% CPOD alto.

No que diz respeito à escolaridade do chefe da família, observou-se que 49,1% nunca haviam frequentado a escola/Ensino Fundamental I incompleto; ao avaliar a renda média das famílias, pôde-se observar que 43,9% viviam com apenas um salário mínimo. Utilizando a classificação proposta por Graciano et al.88. Graciano MIG, Lehfeld NAS, Neves Filho A. Critérios de avaliação para classificação sócio-econômica: elementos de atualização. Serviço Social & Realidade. 1999; 8(1): 109-28. para avaliação socioeconômica, 100% das famílias estavam classificadas como Classe Baixa, sendo 54% destas consideradas como Classe Baixa Inferior e 46% como Classe Baixa Superior.

Correlacionando os pacientes com CPOD alto com a escolaridade do responsável, os resultados foram: dos responsáveis com Ensino Fundamental incompleto, 92% têm filhos que apresentaram CPOD alto; com o Ensino Médio incompleto, 66% dos filhos apresentaram CPOD alto, e com Ensino Médio completo, 50% dos filhos apresentaram CPOD alto.

Quando questionadas sobre a ocorrência de algum problema na gestação, 51% das mães relataram não ter tido nenhum problema e 47% se consideravam saudáveis; 5% apresentavam problemas neurológicos e 4% tiveram algum tipo de infecção durante a gestação; 57,9% afirmaram que o filho havia nascido de parto normal e 43,9% tinham realizado o pré-natal. Quanto ao uso de medicamentos na gestação, 54,4% não fizeram uso e as que fizeram (14%) não souberam relatar o tipo de medicação utilizada.

Com relação às perguntas específicas sobre saúde bucal, 54,4% dos responsáveis afirmaram que o médico que acompanha seu filho nunca os orientou sobre a necessidade de acompanhamento odontológico. Segundo relato dos pais, 75,4% dos PNE já receberam algum tipo de tratamento odontológico, dos quais 3,5% realizaram exame de rotina, 14% tratamento periodontal, 5,3% exodontia e 40,4% tratamento restaurador por cárie (Figura 2); 78,9% relataram que o filho ainda apresentava necessidade de tratamento.

Figura 2.
Principais causas de tratamento odontológico nos Portadores de Necessidades Especiais.

Com relação ao local de atendimento para tratamento odontológico, 73,7% procuraram as instituições públicas, sendo que 50,9% afirmaram ter sido a Unidade Básica de Saúde mais próxima de casa. Questionados sobre o comportamento dos PNE frente ao tratamento odontológico, 45,6% colaboraram durante o atendimento odontológico, 21,1% choraram durante as primeiras consultas e, com 7% dos PNE, foi necessário o uso de contenção física.

Entre as maiores dificuldades relatadas pelos responsáveis para manter a saúde bucal do PNE, pôde-se destacar: encontrar um Dentista que o atenda (33,3%), o custo do tratamento (33,3%) e seguir as orientações de higiene oral (8,8%) (Figura 3).

Figura 3.
Principais dificuldades para manter a saúde bucal dos Portadores de Necessidades Especiais.

Questionados sobre quem realizava a escovação dos PNE, 71,9% afirmaram ser o próprio Portador de Necessidade Especial e 61% dos responsáveis classificaram a saúde bucal do filho como regular (Figura 4). Quanto à alimentação diária do PNE, 86% afirmaram ser uma alimentação sólida, 7% alimentação pastosa e 7% não responderam.

Figura 4.
Quem realiza a escovação dos Portadores de Necessidades Especiais.

Quando perguntados sobre o que facilitaria a manutenção da saúde bucal dos PNE, pôde-se destacar: menor custo de tratamento (28,1%); maior número de profissionais e centros habilitados (12,3%); maior acesso a informações sobre higiene oral e prevenção (8,8%), e um trabalho em conjunto entre os Médicos e Cirurgiões-Dentistas (7%).

DISCUSSÃO

As condições de higiene oral deficiente têm sido consideradas um dos maiores problemas de saúde bucal em pacientes Portadores de Necessidades Especiais. Esse fato é agravado, entre outros fatores, pela baixa renda familiar, cujas famílias, muitas vezes, mal conseguem comprar alimentos e, menos ainda, escovas e cremes dentais1212. Abreu MHNG, Paixão HH, Resende VLS. Controle de placa bacteriana em portadores de deficiências físicas: avaliação de pais e responsáveis. Arq Odontol. 1999; 35(1/2): 27-37..

Esses dados foram confirmados no presente estudo, uma vez que a maioria dos alunos (52%) apresentou índices de higiene oral deficiente, baixo poder aquisitivo, em que 43,9% dos entrevistados relataram viver com menos de um salário mínimo, associado ao fato de quase 50% dos responsáveis não possuírem sequer o Ensino Fundamental I completo.

Aguiar et al.1313. Aguiar SMHCA, Barbieri CM, Louzada LPA, Saito TE. Eficiência de um programa para a educação e a motivação da higiene buco-dental direcionado a excepcionais com deficiência mental e disfunção motoras. Rev Fac Odontol Lins. 2000; 12(1/2): 16-23. afirmam que quanto menores os níveis de escolaridade e socio-econômico dos responsáveis, maiores as chances de seus filhos apresentarem maiores níveis de acúmulo de placa bacteriana. Esses fatores, associados ainda, à condição especial do paciente e ao fato de a maioria dos alunos (71,9%) ser responsável pela escovação dental, podem ter contribuído para os altos índices de cárie dentária observados nesse estudo, com CPO-D médio de 12,6, valor considerado muito alto99. World Health Organization. Oral health suveys: basic methods. 4th ed. Geneva; 1997..

Ao correlacionar os pacientes com CPOD alto com a escolaridade do responsável, pôde-se observar, neste estudo, que quanto menor o nível de instrução do responsável, maior a chance de a criança ter cárie dentária, afirmação que vai ao encontro dos estudos de Piovesan et al.1414. Piovesan C, Tomazoni F, Del Fabro J, Buzzati BCS, Mendes FM, Antunes JLF, et al. Inequality in dental caries distribution at noncavitated and cavitated thresholds in preschool children. J Public Health Dent. 2014; 74(2): 120-6. http://dx.doi.org/10.1111/jphd.12035. PMid:24020651
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, em que as crianças cujas mães não completaram o Ensino Fundamental I e aquelas com baixa renda familiar eram mais propensas a ter um aumento da cárie dentária.

A experiência de cárie dentária em pacientes portadores de deficiência tem sido relatada como maior do que a encontrada na população, havendo a necessidade de se estabelecerem programas específicos preventivos e curativos para os pacientes Portadores de Necessidades Especiais1515. Shyama M, Al-Mutawa SA, Morris RE, Sugathan T, Honkala E. Dental caries experience of disabled children and young adults in Kuwait. Community Dent Health. 2001; 18(3): 181-6. PMid:11580096.. Em seu estudo sobre a prevalência da cárie dentária, Santos et al.1616. Santos MT, Guare RO, Celiberti P, Siqueira WL. Caries experience in individuals with cerebral palsy in relation to oromotor dysfunction and dietary consistency. Spec Care Dentist. 2009; 29(5): 198-203. http://dx.doi.org/10.1111/j.1754-4505.2009.00092.x. PMid:19740150
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verificaram um maior CPO-D em crianças com necessidades especiais do que em crianças sem deficiência, devido, principalmente, à dificuldade de manutenção de uma higiene bucal satisfatória.

Em contrapartida, os dados de prevalência de cárie no Brasil para adolescentes entre 15 a 19 anos foram de 4,25 dentes com experiência de cárie e de 16,75 dentes para a faixa etária de 35 a 44 anos1717. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. SB Brasil 2010: Pesquisa Nacional de Saúde Bucal: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2012., valores não muito distantes do encontrado no presente estudo para pacientes com necessidades especiais. Campos et al.1818. Campos JADB, Giro EMA, Orrico SRP, Oliveira APC, Lorena SM. Correlação entre a prevalência de cárie e a utilização de medicamentos em pacientes com necessidades especiais institucionalizados e não institucionalizados. Salusvita. 2006; 25(1): 35-42.encontraram um CPOD médio de 8,39 para os pacientes especiais institucionalizados e de 5,96 para os não institucionalizados.

Com relação às dificuldades relatadas para manter a saúde bucal dos portadores de necessidades especiais, os responsáveis destacaram o alto custo do tratamento (33,3%) e a falta/escassez de profissionais capacitados para a realização do atendimento (33,3%) como os principais fatores, achados semelhantes aos de Marra, Miasato66. Marra PS, Miasato JM. A saúde bucal do paciente especial e sua relação com o nível sócio-econômico dos pais. Rev Bras Odontol. 2008; 65(1): 27-30., que enfatizaram a necessidade de capacitação de profissionais para a assistência odontológica a esses pacientes e a construção de centros públicos habilitados.

Segundo Marega, Aiello1919. Marega T, Aiello ALR. Autismo e tratamento odontológico: algumas considerações. JBP Rev Ibero-Am Odontopediatr Odontol Bebê. 2005; 8(42): 150-7., há a necessidade de criação de um programa de educação em saúde bucal que ensine e treine os pacientes portadores de necessidades especiais a escovarem seus próprios dentes, os tornando mais independentes, diminuindo a aversão à escovação e prevenindo a ocorrência de intervenções mais invasivas.

A falta de interação médico-odontológica resulta, muitas vezes, em tratamentos individualizados em cada área, não havendo um atendimento multidisciplinar e integrado ao paciente portador de necessidades especiais2020. Pomarico L, Mendes PCA, Primo LG, Heil FC. Cárie de estabelecimento precoce em pacientes portador de nanismo hipofisário: relato de caso. JBP Rev Ibero Am Odontopediatr Odontol Bebê. 2003; 6(33): 366-70.. Esse fato se confirma no presente estudo, uma vez que 54,4% dos responsáveis afirmaram que o médico que acompanha seu filho nunca os orientou sobre a necessidade de acompanhamento odontológico. Fatores como este podem ter contribuído para a alta necessidade de tratamento odontológico observada nesse estudo (78,9%), com destaque para tratamentos invasivos, como exodontias, tratamento restaurador e periodontal.

Segundo Firoozmand, Vargas2121. Firoozmand LM, Vargas RPS, Rocha JC. Prevalência de fratura dentária em pacientes portadores de necessidades especiais. Pesq Bras Odontoped Clin Integr. 2007; 7(2): 149-53., fraturas coronárias em incisivos permanentes constituem um problema de saúde pública, sendo necessário o estabelecimento de medidas para a prevenção da ocorrência destes eventos, relatando uma prevalência de trauma dental em pacientes portadores de necessidades especiais em torno de 38,5%.

No presente estudo, observou-se que 19,3% dos alunos apresentaram trauma dentário no grupo dos incisivos. Holan et al.2222. Holan G, Peretz B, Efrat J, Shapira Y. Traumatic injuries to the teeth in young individuals with cerebral palsy. Dent Traumatol. 2005; 21(2): 65-9. http://dx.doi.org/10.1111/j.1600-9657.2004.00274.x. PMid:15773884
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observaram que a prevalência de injúrias dentárias em pacientes com paralisia cerebral foi muito maior do que na população de pacientes sem qualquer deficiência. Em contrapartida, os dados deste estudo se assemelham aos achados do levantamento SB Brasil 20101717. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. SB Brasil 2010: Pesquisa Nacional de Saúde Bucal: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. para crianças sem deficiência, em que a prevalência de traumatismo dentário foi de 20,5%.

O tipo de parto mais comum, relatado neste estudo, foi o normal, com 57,9%, sendo 68,4% dos nascimentos aos nove meses de vida intrauterina; das mães entrevistadas, 50,9% relataram um período gestacional dentro da normalidade, sem intercorrências ou problemas. Tanaca et al.77. Tanaca F, Maciel SM, Sonohara MK. Comportamento dos pais e condições de saúde bucal em crianças especiais - saúde bucal de crianças especiais. JBP Rev Ibero-Am Odontopediatr Odontol Bebê. 2005; 8(45): 342-8. consideraram que dificuldades no trabalho de parto, prematuridade, demora para chorar e para respirar ao nascer, além de convulsões e coma nas primeiras horas de vida, constituem causas das possíveis complicações que acometem os Portadores de Necessidades Especiais, fatores estes não identificados neste estudo.

Observou-se que apenas 14% das mães dos PNEs fizeram uso de medicamento durante o período gestacional, sendo difícil, nesse caso, afirmar que haja correlação entre a ingestão de medicamentos e a ocorrência de problemas no feto.

Sabendo-se que o Portador de Necessidade Especial requer atenção, observou-se neste estudo que a higiene oral é colocada em segundo plano. As péssimas condições de saúde bucal, somadas à dificuldade relatada em realizar o acompanhamento odontológico desses indivíduos, mostram uma situação lamentável, necessitando da implementação de mais políticas públicas preventivas e curativas voltadas para essa classe. Estas políticas devem ser contínuas e simultâneas, para que desenvolvam – nos pais, professores e nos próprios PNE – o ato da prevenção e do cuidar.

CONCLUSÃO

Os altos índices revelados pelo CPO-D, bem como a higiene oral deficiente, somados às dificuldades relatadas em se realizar o acompanhamento odontológico desses indivíduos, mostram a necessidade da implementação de políticas públicas mais voltadas à atenção a esses pacientes.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    28 Nov 2013
  • Aceito
    22 Jul 2014
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