INTRODUÇÃO
Entende-se a má-oclusão como um desarranjo no equilíbrio dental e/ou esquelético em posição de repouso e durante a mastigação e/ou a fonação. Tem consequências funcionais, estéticas e psicológicas, e trata-se de um problema de saúde pública quando em grande magnitude ou gravidade, e frequentemente acomete crianças em idade pré-escolar1. Fatores genéticos, ambientais e sociais estão relacionados com a etiologia da mesma2.
A mordida aberta anterior é um dos tipos de má-oclusão mais frequentes em pré-escolares3. Ela consiste num valor negativo para o trespasse vertical entre as incisais dos dentes da arcada superior e da arcada inferior4, e é considerada um dos problemas oclusais mais difíceis de tratar, principalmente por sua etiologia multifatorial e sua íntima relação com hábitos bucais deletérios4,5.
Os resultados apresentados no SB Brasil 2010 trazem uma prevalência de mordida aberta aos 5 anos de 12,1%. Esse valor possui variações entre regiões do Brasil e, na literatura, esta prevalência varia de 8% a 21%1,3,6-9.
Os hábitos bucais de sucção não nutritiva, como o uso de chupetas e a sucção digital, são os fatores etiológicos mais comumente associados com a prevalência da mordida aberta anterior. Estes podem resultar em alterações neuromusculares e também interferir no desenvolvimento craniofacial3,10,11. Acredita-se que a criança que realiza sucção de chupeta de quatro a seis horas diariamente poderá ter movimentação dental significativa. O ato da sucção tem um papel psicológico muito significante para crianças, cujas demandas emocionais são supridas12. Ademais, existe a hipótese de que a mordida aberta pode favorecer o desenvolvimento de outros hábitos prejudiciais, como a superposição lingual13.
Achados em literatura sugerem que hábitos parafuncionais, como a onicofagia, podem se relacionar com o aparecimento de más-oclusões e complicações musculares e articulares14. Outros hábitos, como a respiração bucal, e a função ou o tamanho anormal da língua também podem atuar como fatores etiológicos e gerar a mordida aberta4.
Para além disso, fatores socioeconômicos podem exercer influência no desenvolvimento desse tipo de má-oclusão, com o favorecimento na adoção de hábitos de sucção deletérios3. Contudo, relatos controversos a respeito da influência dos fatores socioeconômicos coexistem em literatura.
Apesar de ser um hábito de sucção, nesse caso nutritiva, a amamentação viabiliza o correto desenvolvimento craniofacial, tanto dentário como neuromuscular, ao estimular corretamente os tecidos. Isso faz do hábito um potencial fator de proteção para o desenvolvimento da mordida aberta4.
Acredita-se na tendência à autocorreção da mordida aberta anterior após a transição da dentição decídua para a permanente1,5. Esta é favorecida a partir do momento em que o hábito que a causou é removido. Contudo, quanto mais tardio o abandono do hábito, mais complexa se torna a correção4,13. Salienta-se que a gravidade da má-oclusão se relaciona estreitamente com a tríade de Graber, em que duração, intensidade e frequência do hábito deletério interagem13.
Neste sentido, o objetivo deste estudo foi identificar a prevalência de mordida aberta anterior nos pré-escolares de Salvador-BA, bem como fatores potencialmente associados à mesma.
METODOLOGIA
Desenvolveu-se um estudo de corte transversal em 1.577 crianças na faixa etária pré-escolar (36 a 71 meses), que frequentavam creches públicas municipais de Salvador-BA. Analisou-se a presença de agravos bucais, entre os quais a má-oclusão. A coleta ocorreu com a participação de oito pessoas − professoras e estudantes de graduação da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal da Bahia (FOUFBA), devidamente treinados e calibrados, e foi realizada de setembro de 2018 a fevereiro de 2019, por meio de entrevista individual dos pais/ responsáveis a respeito de aspectos sociodemográficos e comportamentais da família e da criança, e de exame bucal das crianças, com o auxílio de espátula de madeira e luz natural, e os devidos equipamentos de proteção individual. Todos os responsáveis autorizaram a participação na pesquisa por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Do questionário e exame bucal, as variáveis utilizadas neste estudo foram (Quadro 1):
Quadro 1 Classificação das variáveis analisadas no questionário aplicado aos responsáveis e no exame bucal das crianças Salvador-BA, 2018-2019
VARIÁVEIS SOCIODEMOGRÁFICAS | CATEGORIZAÇÃO |
---|---|
Idade | Em meses |
Sexo | 0-Masculino 1-Feminino |
Cor da pele | 1-Amarelo 2-Branco 3-Negro 4-Pardo 5-Indígena 9-Sem registro |
Escolaridade | 0-Analfabeto 1-Alfabetizado 2-Fundamental incompleto 3-Fundamental Completo 4-Ensino Médio incompleto 5- Ensino Médio completo 6-Superior incompleto 7-Superior completo 8-Pós-graduação 9-Não Sabe |
Com quantas pessoas a criança mora | Quantidade |
Quantos cômodos tem a casa | Quantidade |
Como é a casa onde a criança mora | 1-Alvenaria 2-Barraco 3-Apartamento 9-Sem registro |
Gestação | 1-Planejada 2-Casual 9-Sem registro |
Pré-natal | 0-Não 1-Sim 9-Sem Registro |
Durante a gestação, a mãe teve alguma doença | 0-Não 1-Sim 9-Sem Registro (Se sim, especifica-se por extenso) |
Em que local a criança nasceu | 1-Casa 2-Hospital público 3-Hospital particular 9-Sem Registro |
Tipo de parto | 1-Normal 2-Cesáreo 3-Fórceps 9-Sem Registro |
Tempo de nascimento | 1-A termo 2-Prematura 3-Pós-termo 9-Sem Registro |
COMPORTAMENTAIS | CATEGORIZAÇÃO |
A criança chorou ao nascer | 0-Não 1-Sim 9-Sem registro |
A criança ficou roxa | 0-Não 1-Sim 9-Sem registro |
A criança precisou de internação | 0-Não 1-Sim 9-Sem registro (Se sim, especifica-se o motivo) |
Até que idade foi amamentada | Em meses |
A criança range os dentes enquanto dorme | 0-Não 1-Sim 9-Sem registro |
A criança chupa chupeta | 0-Não 1-Sim 9-Sem registro |
A criança chupa dedo | 0-Não 1-Sim 9-Sem registro |
A criança morde objetos | 0-Não 1-Sim 9-Sem registro |
Alimentação equilibrada | 0-Não 1-Sim 9-Sem registro |
A criança tem alguma doença | 0-Não 1-Sim 9-Sem registro (Se sim, especifica-se a doença) |
VARIÁVEIS EM EXAME BUCAL | CATEGORIZAÇÃO |
Má-oclusão | 0-Normal 1-Leve 2-Moderada 3-Severa 9-Sem informação |
Sobremordida | 0-Normal 1-Reduzida 2-Aberta 3-Profunda 9-Sem informação |
Elaboração própria.
A má-oclusão também foi analisada, além da mordida aberta anterior. Considerou-se, para este estudo, a variável dependente presença de mordida aberta anterior.
Procedeu-se à digitação das informações coletadas em um banco de dados no Excel e, para análise estatística, utilizou-se o programa MINITAB14. Realizaram-se análises descritivas das variáveis categóricas e contínuas, assim como uma análise exploratória em busca de potenciais fatores associados à mordida aberta.
Realizou-se o teste do qui-quadrado, com um nível de significância de 5%, com o propósito de identificar variáveis associadas à mordida aberta anterior. Após isso, realizou-se uma análise exploratória bi e multivariada com a finalidade de estabelecer as variáveis de risco ou proteção, e a razão de risco para a mordida-aberta em crianças na faixa etária de 36-71 meses. Consideraram-se relevantes as variáveis com nível de significância inferior a 0,20 no modelo bivariado.
A análise de regressão logística multivariada foi realizada através da técnica stepwise, segundo o modelo de regressão de Poison, com intervalo de confiança de 95%.
RESULTADO
Participaram do estudo 1.577 crianças em idade pré-escolar, com média de idade de aproximadamente 54 meses e desvio padrão de 10,8 meses. A maioria pertencia ao sexo masculino (50,29%). A população de estudo foi predominantemente composta por negros e pardos (92,02%). A maioria dos pais (52,77%) tinham até 35 anos e 54,70% das mães tinham até 32 anos. Com relação à escolaridade, a maior parte das mães (55,86%) e pais (50,08%) apresentou formação igual ou superior ao Primeiro Grau completo (Tabela 1).
Tratando-se da moradia, 79,60% das crianças morvaam em casa de alvenaria ou barraco, e 76,94% delas moravam em casas secas. Dentre os pré-escolares do estudo, 77,68% conviviam com até quatro pessoas e 75,87% habitavam em casas com até quatro cômodos; 62,40% dos pré-escolares nasceram de gestações não planejadas e apenas 3,73% do total de mães não realizou pré-natal. A maioria das mães (85%) não apresentou alguma doença durante a gestação, realizando o parto normal (57,3%) em tempo adequado de nascimento (80,34%). Ao nascer, 89,69% das crianças choraram, 12,3% ficaram roxas e 19,71% precisaram de internação (Tabela 1).
Tabela 1 Caracterização da população de estudo − pré-escolares de Salvador-BA, 2018 (n=1.577)
n | % | |
---|---|---|
Sexo | ||
Masculino | 793 | 50,29 |
Feminino | 784 | 49,71 |
Raça | ||
Branca, Amarela e Indígena | 115 | 7,98 |
Negra e Parda | 1326 | 92,02 |
Idade da criança | ||
Até 54 meses | 829 | 52,57 |
Acima de 54 meses | 748 | 47,43 |
Idade da mãe | ||
Até 32 anos | 792 | 54,70 |
Acima de 32 anos | 656 | 45,30 |
Idade do pai | ||
Até 35 anos | 772 | 52,77 |
Acima de 35 anos | 691 | 47,23 |
Escolaridade do pai | ||
Até Ensino Fundamental II incompleto | 633 | 49,92 |
A partir do Ensino Fundamental II completo | 635 | 50,08 |
Escolaridade da mãe | ||
Até Ensino Fundamental II incompleto | 637 | 44,14 |
A partir do Ensino Fundamental II completo | 806 | 55,86 |
Tipo de Casa | ||
Alvenaria/Barraco | 991 | 79,60 |
Apartamento | 254 | 20,40 |
Com quantas pessoas mora | ||
Até 4 pessoas | 1176 | 77,68 |
Mais de 4 pessoas | 338 | 22,32 |
Cômodos da casa | ||
Até 4 cômodos | 1116 | 75,87 |
Mais de 4 cômodos | 355 | 24,13 |
A casa é | ||
Úmida | 295 | 23,06 |
Seca | 984 | 76,94 |
Gestação | ||
Planejada | 540 | 37,60 |
Não Planejada | 896 | 62,40 |
Pré-natal | ||
Sim | 1419 | 96,27 |
Não | 55 | 3,73 |
Mãe teve doença na gestação | ||
Sim | 224 | 15,00 |
Não | 1269 | 85,00 |
Local de Nascimento | ||
Casa/Hospital particular | 271 | 17,69 |
Hospital público | 1261 | 82,31 |
Tipo de parto | ||
Normal/Fórceps | 867 | 57,80 |
Cesáreo | 633 | 42,20 |
Tempo de nascimento | ||
A termo/ Pós-termo | 1175 | 85,89 |
Prematura | 193 | 14,11 |
Criança chorou ao nascer | ||
Sim | 1314 | 89,69 |
Não | 151 | 10,31 |
Criança ficou roxa ao nascer | ||
Sim | 144 | 12,30 |
Não | 1027 | 87,70 |
Criança necessitou de internação | ||
Sim | 300 | 19,71 |
Não | 1222 | 80,29 |
Elaboração própria.
Na população de estudo, a prevalência de má-oclusão foi de 40,46% e, dentre estes, 14,02% possuíam mordida aberta.
No que concerne aos hábitos, a maioria das crianças foi amamentada até 12 meses de idade. A sucção digital era realizada por 6,73% dos pré-escolares e 10,39% faziam o uso de chupetas. A maioria das crianças (69,43%) não possuía o hábito de morder objetos e 26,14% rangiam os dentes (Tabela 2).
Tabela 2 Hábitos deletérios e condições bucais em pré-escolares de Salvador-BA, 2018 (n=1577)
n | % | |
---|---|---|
Idade de amamentação | ||
Até 12 meses | 810 | 56,60 |
Acima de 12 meses | 621 | 43,40 |
Sucção Digital | ||
Sim | 81 | 6,73 |
Não | 1123 | 93,27 |
Uso de Chupeta | ||
Sim | 154 | 10,39 |
Não | 1328 | 89,61 |
Range os Dentes | ||
Sim | 377 | 26,14 |
Não | 1065 | 73,86 |
Morde Objetos | ||
Sim | 372 | 30,57 |
Não | 845 | 69,43 |
Elaboração própria.
Na Tabela 3, foi feita a distribuição das variáveis de interesse segundo a presença e ausência de mordida aberta nos pré-escolares. As variáveis idade da criança, escolaridade do pai, escolaridade da mãe, cômodos da casa, gestação, local de nascimento, idade de amamentação, usa chupeta, sucção digital e rói unha mostraram-se relevantes com um p-valor inferior a 0,20 e foram exploratoriamente levadas ao modelo multivariado final.
Tabela 3 Distribuição das variáveis de interesse segundo a presença de Mordida Aberta em pré-escolares de Salvador-BA, 2018 (n=1577)
Mordida Aberta | |||||
---|---|---|---|---|---|
Ausente | Presente | P-valor | |||
n | % | n | % | ||
Sexo | |||||
Masculino | 687 | 50,93 | 105 | 47,73 | 0,379 |
Feminino | 662 | 49,07 | 115 | 52,27 | |
Raça | |||||
Branca, Amarela e Indígena | 99 | 7,98 | 16 | 8,29 | 0,882 |
Negra e Parda | 1142 | 92,02 | 177 | 91,71 | |
Idade da criança | |||||
Até 54 meses | 693 | 51,37 | 134 | 60,91 | 0,009 |
Acima de 54 meses | 656 | 48,63 | 86 | 39,09 | |
Idade do pai | |||||
Até 35 anos | 661 | 53,05 | 107 | 51,20 | 0,619 |
Acima de 35 anos | 585 | 46,95 | 102 | 48,80 | |
Idade da mãe | |||||
Até 32 anos | 671 | 54,38 | 120 | 58,25 | 0,301 |
Acima de 32 anos | 563 | 45,62 | 86 | 41,75 | |
Escolaridade do pai | |||||
Até o Ensino Fundamental II completo | 527 | 48,66 | 102 | 57,63 | 0,027 |
A partir do Ensino Fundamental II completo | 556 | 51,34 | 75 | 42,37 | |
Escolaridade da mãe | |||||
Até Ensino Fundamental II completo | 531 | 43,03 | 104 | 51,74 | 0,021 |
A partir do Ensino Fundamental II completo | 703 | 56,97 | 97 | 48,26 | |
Com quantas pessoas mora | |||||
Até 4 pessoas | 1007 | 77,76 | 161 | 76,30 | 0,638 |
Mais de 4 pessoas | 288 | 22,24 | 50 | 22,44 | |
Cômodos da casa | |||||
Até 4 cômodos | 943 | 75,02 | 168 | 81,55 | 0,042 |
Acima de 4 cômodos | 314 | 24,98 | 38 | 18,45 | |
Tipo de casa | |||||
Alvenaria/Barraco | 850 | 79,29 | 137 | 83,03 | 0,266 |
Apartamento | 222 | 20,71 | 28 | 16,97 | |
A casa é | |||||
Úmida | 249 | 22,76 | 44 | 24,31 | 0,646 |
Seca | 845 | 77,24 | 137 | 75,69 | |
Gestação | |||||
Planejada | 478 | 38,77 | 57 | 29,08 | 0,009 |
Não Planejada | 755 | 61,23 | 139 | 70,92 | |
Pré Natal | |||||
Sim | 1218 | 96,28 | 193 | 96,02 | 0,854 |
Não | 47 | 3,72 | 8 | 3,98 | |
Doença na gestação | |||||
Sim | 187 | 14,63 | 37 | 17,87 | 0,227 |
Não | 1091 | 85,37 | 170 | 82,13 | |
Local de Nascimento | |||||
Casa/Hospital particular | 237 | 18,13 | 31 | 14,29 | 0,168 |
Hospital público | 1070 | 81,87 | 186 | 85,71 | |
Tipo de Parto | |||||
Normal/Fórceps | 742 | 58,01 | 123 | 57,75 | 0,942 |
Cesáreo | 537 | 41,99 | 90 | 42,25 | |
Tempo de nascimento | |||||
Prematuro | 161 | 13,84 | 31 | 15,74 | 0,481 |
A termo/Pós-termo | 1002 | 86,16 | 166 | 84,26 | |
A criança chorou ao nascer | |||||
Sim | 1127 | 89,87 | 180 | 88,24 | 0,477 |
Não | 127 | 10,13 | 24 | 11,76 | |
A criança ficou roxa | |||||
Sim | 119 | 11,92 | 24 | 14,46 | 0,357 |
Não | 879 | 88,08 | 142 | 85,54 | |
A criança foi internada | |||||
Sim | 252 | 19,38 | 44 | 20,56 | |
Não | 1048 | 80,62 | 170 | 79,44 | 0,688 |
Idade de amamentação | |||||
Até 12 meses | 658 | 54,07 | 149 | 72,33 | |
Acima de 12 meses | 559 | 45,93 | 57 | 27,67 | 0,00 |
Range os dentes | |||||
Sim | 328 | 26,62 | 48 | 23,65 | 0,371 |
Não | 904 | 73,38 | 155 | 76,35 | |
Usa chupeta | |||||
Sim | 65 | 94,87 | 88 | 42,72 | 0,00 |
Não | 1203 | 5,13 | 118 | 57,28 | |
Sucção digital | |||||
Sim | 46 | 4,51 | 35 | 20,00 | 0,00 |
Não | 975 | 95,49 | 140 | 80,00 | |
Rói unha | |||||
Sim | 487 | 38,80 | 43 | 21,29 | 0,00 |
Não | 768 | 61,20 | 159 | 78,71 | |
Morde objetos | |||||
Sim | 315 | 30,67 | 54 | 29,67 | 0,787 |
Não | 712 | 69,33 | 128 | 70,33 |
Elaboração própria.
O resultado final das variáveis associadas à mordida aberta foi: escolaridade do pai ≤ Ensino Fundamental II completo, usa chupeta, sucção digital e rói unha. Houve associações positivas como potenciais fatores de proteção para a não ocorrência de mordida aberta: escolaridade do pai ≥ 1º Grau completo com chance para o desenvolvimento dessa má-oclusão, sendo 0,38 vez menor (IC 95% 0,41-0,95) e rói unha com chance 0,66 vez menor (IC 95% 0,21-0,56) (P-valor = 0,00). Ademais, usa chupeta apresenta risco 18 vezes maior (IC 95% 10,91-29,62) para mordida aberta e sucção digital com risco 11 vezes maior (IC 95% 6,0-20,32). Estas foram reconhecidas como variáveis potenciais de risco, com associação significativa com a mordida aberta (P-valor = 0,00).
DISCUSSÃO
No estudo, identificou-se a prevalência de 14,02% de mordida aberta. Foi observada a associação do uso de chupeta e da sucção digital com a maior ocorrência da má-oclusão estudada. Além disso, registrou-se a associação negativa com maior escolaridade do pai e a presença de onicofagia.
Tratando-se dos hábitos de sucção não nutritiva, no presente estudo, o uso de chupetas foi identificado como um dos maiores fatores de risco para o desenvolvimento da mordida aberta. A sucção de chupeta não só está associada com a mordida aberta como pode levar ao abandono precoce da amamentação, a qual poderia, por sua vez, atuar como proteção a não adoção dos hábitos de sucção não nutritiva2,3,15. Quando sustentado, o hábito possui maior potencial danoso e para aparecimento da má-oclusão16. O aumento no uso de chupetas pode ser relacionado com fatores socioculturais e o modo de vida moderno8.
Por sua vez, a sucção digital demonstrou ser outro fator de risco para a mordida aberta. Associadamente, esse mesmo achado é documentado pela literatura3. É entendida como o hábito mais difícil de ser abandonado se comparado com a sucção de chupeta11. Ademais, ela pode gerar anormalidades na erupção dentária e alterar o desenvolvimento esquelético, gerando também a mordida aberta2,15.
No atual estudo, o uso de chupeta demonstrou ser mais prejudicial que a sucção digital. De modo geral, independentemente do hábito, as crianças que possuem hábitos de sucção não nutritiva geralmente demonstram maior prevalência de mordida aberta15.
Ao tratar-se de potenciais fatores de proteção ao desenvolvimento da mordida aberta, a escolaridade do pai foi um fator identificado. Entende-se que a mordida aberta está associada com aspectos sociodemográficos e, mais fortemente, com aqueles que se encontram em um baixo nível econômico. Além disso, fatores sociodemográficos podem influenciar na adoção de hábitos deletérios de sucção3. Porém, alguns achados em literatura não identificaram associação significante entre a mordida aberta e o nível de educação dos pais ou o nível econômico familiar8,17. Assim, são necessários mais estudos que avaliem a associação da mordida aberta com aspectos sociodemográficos.
No que concerne à onicofagia, foi um hábito identificado como potencial fator de proteção à mordida aberta. Consiste em um dos hábitos parafuncionais mais prevalentes, sendo relacionado com o estado emocional14,15. Contudo, achados em literatura associam o hábito com o desenvolvimento de más-oclusões14. Sua proteção pode acontecer devido à necessidade de toque entre as incisais dos dentes anteriores com a borda da unha para o estabelecimento do hábito, inviabilizando assim a adoção de hábitos como a sucção digital e o uso da chupeta.
Para além dos achados do presente estudo, deve-se levar em consideração a influência de aspectos hereditários e genéticos no desenvolvimento da má-oclusão. A ausência de resposta no questionário aplicado pode levar à subestimação de variáveis, o que se constitui como uma limitação do estudo. Além disso, deve-se considerar que características culturais de cada região podem interferir nos hábitos da população.
Salienta-se que medidas preventivas e consultas regulares com o cirurgião-dentista podem auxiliar no tratamento e evitar agravos ou aparecimento da mordida aberta. Os dados identificados pelo estudo poderão servir de base para o estabelecimento de medidas de intervenção em controle e prevenção da mordida aberta na faixa etária pré-escolar no município de Salvador-BA e, consequentemente, atuarão em sentido de redução da prevalência da mordida aberta em crianças.
CONCLUSÃO
Em Salvador-BA, os pré-escolares apresentam prevalência de 14,02% de mordida aberta. Além disso, foram identificadas variáveis associadas à má-oclusão com significância estatística. Como fatores de risco, o hábito do uso de chupeta expõe o pré-escolar a um risco aproximadamente 18 vezes (IC 95% 10,91-29,62) maior de desenvolver a mordida aberta, seguido da sucção digital, que apresenta um risco 11 vezes (IC 95% 6,0-20,32) maior no desenvolvimento da má-oclusão estudada. Ao tratarmos dos fatores de proteção, possuir o hábito de onicofagia representa uma propensão 0,66 vez (IC 95% 0,21-0,56) menor de desenvolver a mordida aberta, seguida da escolaridade do pai a partir do Ensino Fundamental II completo, em que a propensão para o desenvolvimento dessa má-oclusão é 0,38 vez (IC 95% 0,41-0,95) menor. Dessa forma, medidas educativas direcionadas aos pais e responsáveis se fazem essenciais para a prevenção do desenvolvimento de hábitos deletérios nos pré-escolares. Ademais, outros estudos são necessários a fim de aprofundar o entendimento sobre os fatores de proteção identificados.