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Seleção de inoculantes à base de turfa contendo bactérias diazotróficas em duas variedades de arroz

Selection of peats inoculants with diazotrophic bacteria in two rice varieties

Resumos

O estudo consistiu em avaliar a sobrevivência e a eficiência das bactérias diazotróficas Herbaspirillum seropedicae, Burkholderia sp. e Azospirillum brasilense, inoculadas em dois tipos de turfas. A sobrevivência das bactérias foi determinada pelo método do Número Mais Provável (NMP), durante o armazenamento de até seis meses. A eficiência foi avaliada pela contribuição destas bactérias nos parâmetros agronômicos de acúmulo de massa seca e N-total dos grãos nas variedades de arroz IR42 e IAC4440. O experimento foi conduzido em vasos com solo, em delineamento inteiramente casualizado com três repetições, em arranjo fatorial 2 x 4. Os dados obtidos mostraram que o inoculante contendo a estirpe de Burkholderia sp. manteve o número de células viáveis em torno de 10(8) cel. g -1 de turfa no período testado, enquanto nos demais inoculantes este número ficou em torno de 10(6). Os ensaios de inoculação não mostraram diferenças significativas quanto à origem das turfas usadas como veículo sobre os parâmetros agronômicos e sobrevivência das bactérias. O tratamento que continha H. seropedicae manteve o acúmulo de massa seca e N-total dos grãos estatisticamente igual ao tratamento que recebeu 40 kg N ha-1, embora tenham sido observados aumentos de 13 e 19,4% nestes parâmetros na variedade IAC4440. Os resultados mostraram-se promissores quanto à utilização da prática de inoculação na cultura do arroz.

fixação biológica nitrogênio; veículos de inoculação; Herbaspirillum seropedicae


The study consisted of a comparison of two-peat materials (Brazil and Canada) containing different C-total content. The peats were inoculated with strains of Herbaspirillum seropedicae ZAE 94, Burkholderia sp. M130, and Azospirillum brasilense Sp109, and monitored during a period of six months in relation to variation on humidity and survival of bacteria in the inoculant. The quantification of viable cells in the inoculant was measured by the Most Probable Number (MPN) method. The rice seeds were pelleted with the respective inoculants, grown in pots containing soil and maintained outside a greenhouse. The dry mass accumulation, N percent, N-total and yield were determined during the plant cycle. The humidity content varied with storage period. The survival measurement showed that only Burkholderia sp. M130 maintained the number of viable cells around 10(8) g-1 of peat, while there was a reduction in population of other strains. An increase of yield and total N of 13 and 19.4%, respectively in comparison to treatment fertilized with 40 kg N ha-1 was observed for variety IAC4440, inoculated with strain ZAE94. There was no difference in yield of the IR42 inoculated with either ZAE94 or M130, as compared to N control treatment. No significant difference in development of both rice varieties was observed for both peat used. The results suggest that peat can be used as a carrier for production of an inoculant based on diazotrophic bacteria, since it allowed maintenance of a bacterial population up to 10(8) cells g-1 peat during the storage period of up to 100 days. The results obtained encourage the practice of inoculation of non-leguminous plants.

nitrogen biological fixation; inoculant carriers; Herbaspirillum seropedicae


MICROBIOLOGIA AGRÍCOLA

Seleção de inoculantes à base de turfa contendo bactérias diazotróficas em duas variedades de arroz

Selection of peats inoculants with diazotrophic bacteria in two rice varieties

Joilson Silva Ferreira* * Autor para correspondência. E-mail joilsonsf@yahoo.com.br ; José Ivo Baldani; Vera Lúcia Divan Baldani

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, km 47, 23851-970, Seropédica, Rio de Janeiro, Brasil

RESUMO

O estudo consistiu em avaliar a sobrevivência e a eficiência das bactérias diazotróficas Herbaspirillum seropedicae, Burkholderia sp. e Azospirillum brasilense, inoculadas em dois tipos de turfas. A sobrevivência das bactérias foi determinada pelo método do Número Mais Provável (NMP), durante o armazenamento de até seis meses. A eficiência foi avaliada pela contribuição destas bactérias nos parâmetros agronômicos de acúmulo de massa seca e N-total dos grãos nas variedades de arroz IR42 e IAC4440. O experimento foi conduzido em vasos com solo, em delineamento inteiramente casualizado com três repetições, em arranjo fatorial 2 x 4. Os dados obtidos mostraram que o inoculante contendo a estirpe de Burkholderia sp. manteve o número de células viáveis em torno de 108 cel. g -1 de turfa no período testado, enquanto nos demais inoculantes este número ficou em torno de 106. Os ensaios de inoculação não mostraram diferenças significativas quanto à origem das turfas usadas como veículo sobre os parâmetros agronômicos e sobrevivência das bactérias. O tratamento que continha H. seropedicae manteve o acúmulo de massa seca e N-total dos grãos estatisticamente igual ao tratamento que recebeu 40 kg N ha-1, embora tenham sido observados aumentos de 13 e 19,4% nestes parâmetros na variedade IAC4440. Os resultados mostraram-se promissores quanto à utilização da prática de inoculação na cultura do arroz.

Palavras-chave: fixação biológica nitrogênio, veículos de inoculação, Herbaspirillum seropedicae.

ABSTRACT

The study consisted of a comparison of two-peat materials (Brazil and Canada) containing different C-total content. The peats were inoculated with strains of Herbaspirillum seropedicae ZAE 94, Burkholderia sp. M130, and Azospirillum brasilense Sp109, and monitored during a period of six months in relation to variation on humidity and survival of bacteria in the inoculant. The quantification of viable cells in the inoculant was measured by the Most Probable Number (MPN) method. The rice seeds were pelleted with the respective inoculants, grown in pots containing soil and maintained outside a greenhouse. The dry mass accumulation, N percent, N-total and yield were determined during the plant cycle. The humidity content varied with storage period. The survival measurement showed that only Burkholderia sp. M130 maintained the number of viable cells around 108 g-1 of peat, while there was a reduction in population of other strains. An increase of yield and total N of 13 and 19.4%, respectively in comparison to treatment fertilized with 40 kg N ha-1 was observed for variety IAC4440, inoculated with strain ZAE94. There was no difference in yield of the IR42 inoculated with either ZAE94 or M130, as compared to N control treatment. No significant difference in development of both rice varieties was observed for both peat used. The results suggest that peat can be used as a carrier for production of an inoculant based on diazotrophic bacteria, since it allowed maintenance of a bacterial population up to 108 cells g-1 peat during the storage period of up to 100 days. The results obtained encourage the practice of inoculation of non-leguminous plants.

Key words: nitrogen biological fixation, inoculant carriers, Herbaspirillum seropedicae.

Introdução

O arroz (Oryza sativa L.) é o cereal mais utilizado na dieta humana mundial e uma das principais fontes de proteína para populações de baixa renda. No Brasil, a produção de grãos é fortemente afetada pelo sistema de cultivo (terras altas e várzeas), práticas de manejo do solo e adubação nitrogenada.

Santos et al., (2008), trabalhando com a cultivar de terras altas BRS-Talento, observaram que o plantio direto acrescido de irrigação, na fase reprodutiva, proporcionou resultados satisfatórios em produtividade e características microbiológicas quando comparado a outros sistemas de preparo do solo.

Além do manejo do solo, em países de clima tropical como o Brasil, o nitrogênio é o elemento mineral mais importante para a produção das culturas. Embora presente em abundância na atmosfera (78%), na forma de N2, este elemento não está prontamente disponível para as plantas, uma vez que a ligação tripla e covalente de sua molécula não pode ser rompida pelas plantas. Entre os processos que podem romper esta molécula, tornando-a assimilável pelas plantas, o da Fixação Biológica de Nitrogênio (FBN) é o mais estudado em culturas de plantas leguminosas. A eficiência do processo da FBN em plantas de leguminosas é facilmente visualizada na cultura da soja, onde até 94% do N requerido pelas cultivares mais produtivas pode ser fornecido pela FBN (HUNGRIA et al., 2006), colocando o Brasil entre os maiores produtores mundiais desta leguminosa.

Já em plantas não-leguminosas, o processo da FBN não é tão eficiente quanto na cultura da soja, embora bactérias capazes de fixar nitrogênio atmosférico, como os gêneros Herbaspirillum, Burkholderia e Azospirillum, tenham sido isoladas de plantas como arroz, trigo, milho, sorgo, cana de açúcar e Brachiaria spp. (ELBELTAGY et al., 2001; PERIN et al., 2006; RODRIGUES et al., 2006; REIS JUNIOR et al., 2000; 2004) em vários experimentos. Os resultados de inoculação destes isolados não são muito consistentes, apesar de que efeitos significativos na produção de grãos e N-total da planta têm sido relatados (BALDANI; BALDANI, 2005; GUIMARÃES et al., 2007).

Estudos que usam a técnica de diluição isotópica com 15 N indicaram, em condições gnotobióticas, efeitos positivos da inoculação das estirpes diazotróficas endofíticas selecionadas de Herbaspirillum seropedicae e Burkholderia sp. Essas estirpes contribuíram com 54 a 27%, respectivamente, do N-total acumulado nas plantas de arroz da cultivar Guarani (BALDANI et al., 2000). Contudo, ainda não foi desenvolvido um inoculante para o arroz, e os estudos nesse sentido devem avançar para que se tenha um inoculante capaz de suprir grande parte das necessidades de nitrogênio deste cereal.

Por tais resultados positivos e pela falta de um inoculante comercial para a cultura do arroz no mercado brasileiro, como disponível para a cultura da soja, alguns trabalhos têm sido desenvolvidos, na Embrapa Agrobiologia, com o intuito de selecionar estirpes de Herbaspirillum spp. e Burkholderia spp. eficientes quanto à FBN, assim como o veículo de inoculação para a cultura do arroz (BALDANI et al., 2000; GUIMARÃES et al., 2003; FERREIRA et al., 2003; GUIMARÃES et al., 2007).

A eficiência da produção de inoculantes para gramíneas depende, dentre outros fatores, da manutenção do número mínimo de células viáveis da bactéria no inoculante, desde a sua fabricação até o uso pelo agricultor, conforme observado para as plantas leguminosas.

O desenvolvimento de um inoculante com bactérias diazotróficas endofíticas, capaz de suprir parte do nitrogênio requerido pela cultura de arroz, contribuirá para a produção sustentável de grãos, a redução dos custos de produção e a diminuição da poluição ambiental.

Um passo importante para a produção deste inoculante é a seleção e avaliação de um veículo eficiente para a inoculação das bactérias diazotróficas endofíticas, pois o veículo afeta diretamente a sobrevivência delas bactérias antes e após a inoculação (FENG et al., 2002).

O objetivo deste trabalho foi avaliar a sobrevivência e o efeito da inoculação de estirpes eficientes das bactérias diazotróficas H. seropedicae, Burkholderia sp. e A. brasilense em dois tipos de turfa utilizadas no preparo de inoculantes.

Material e métodos

Caracterização do material turfoso e ajuste do pH

A análise química dos elementos disponíveis mostrou para a turfa nacional e importada (Canadá), respectivamente: pH em H2O de 3,4 e 5,1, teores de Al 8,5 e 0,2 (cmolc dm-3), Ca 7,1 e 27,2 (cmolc dm-3), Mg 6,9 e 9,2 (cmolc dm-3), P 22 e 11 (mg dm-3), K 47 e 48 (mg dm-3) e teores de carbono 42 e 54 (g de C kg-1 Massa Seca).

A neutralização da turfa a pH 6,0 foi feita com CaCO3, necessário para o crescimento adequado das estirpes.

Condições de crescimento das bactérias diazotróficas

Estirpes de Herbaspirillum seropedicae ZAE94 (BR11417), Burkholderia sp. M130 (BR11340) e Azospirillum brasilense Sp109 (BR11023) foram crescidas em tubos de ensaio contendo meio Dygs, por 18h, a 30ºC, em agitação a 100 rpm. A pureza das estirpes foi verificada em placas contendo meios semiespecíficos: NFb 3x para as estirpes de H. seropedicae e A. brasilense e JMV para Burkholderia sp. (DÖBEREINER et al., 1995). Após a verificação da pureza, as estirpes foram crescidas em meio Dygs, e o número de células viáveis foi determinado pelo método do NMP. Os valores obtidos foram de aproximadamente 109 cel. mL-1.

Preparo dos inoculantes

As suspensões bacterianas que continham 109 cel. mL-1 foram inoculadas, na quantidade de 0,45 mL g-1 de turfa nacional e 1 mL g-1 de turfa do Canadá, para atingir a umidade inicial em torno de 38% para a turfa nacional e de 65% para a turfa importada, em sacos de polipropileno. A umidade inicial foi ajustada para facilitar a homogeneização da cultura bacteriana nos materiais turfosos, já que estes apresentam diferentes capacidades de retenção de umidade. Os inoculantes preparados foram mantidos por 24h a 30ºC, antes de serem usados. Foram utilizadas três repetições dos inoculantes preparados para cada tratamento.

Avaliação da sobrevivência das bactérias nas turfas

Avaliação da sobrevivência das bactérias foi feita quantitativamente pelo método do NMP, utilizando os meios semi-seletivos JNFb, para a estirpe ZAE94, e JMV, para a estirpe M130 (DOBEREINER et al., 1995). O delineamento utilizado foi o inteiramente casualizado com três repetições, em arranjo fatorial 2 x 3, com duas turfas e três bactérias (ZAE94, Sp109 e M130), totalizando seis tratamentos. O número de células viáveis foi determinado aos 2, 5, 10, 15 e 30 dias e, subsequentemente, a cada 30 dias até 180 dias. Para cada época de contagem, foram utilizadas 18 parcelas independentes, o que totaliza 180 parcelas para toda a contagem. Após a quantificação, os valores brutos foram transformados em log10 para realização da análise estatística. Os inoculantes foram mantidos a 4ºC em geladeira durante o período de análise. Na análise de variância, foi utilizado o teste F; para separação das médias o teste LSD a 5% de significância.

Avaliação dos teores de umidade dos inoculantes

As amostras dos inoculantes, preparados com diferentes turfas, foram pesadas para determinar a massa úmida da amostra (MAU) e colocadas para secar em estufa a 65ºC, por 72h. Após este prazo, foram pesadas novamente e se determinou a massa seca da amostra (MAS). Os teores de umidade (U) foram determinados pela fórmula: U (%) = (MAU-MAS)100/MAU. A determinação dos teores de umidade foi realizada aos 2, 30, 75, 90 e 180 dias de armazenamento do inoculante em geladeira, sendo utilizadas nove repetições para cada tipo de turfa, independentemente da bactéria usada. O delineamento utilizado foi o inteiramente ao acaso, em arranjo fatorial 2 x 5, em que os tratamentos foram os dois tipos de turfa e as cinco épocas diferentes. Para análise de variância, foi utilizado o teste F; para separação das médias, o teste LSD a 5% de significância.

Experimento de inoculação em vaso e caracterização do solo

Foram utilizados os primeiros 20 cm do horizonte A de um Planossolo Série Ecologia, oriundo do Campo Experimental da Embrapa Agrobiologia, com as seguintes características químicas: pH em H2O de 5,8 e teores de Al, Ca e Mg de 0,0; 1,3 e 0,7 cmolc dm-3; P e K de 6 e 27 mg dm-3. As correções da fertilidade do solo foram feitas segundo recomendações do Manual de Adubação e Calagem para o Rio de Janeiro para a cultura de arroz (ALMEIDA et al., 1988).

Plantio, tratamentos e delineamento experimental

O plantio foi feito com sementes peletizadas, em vasos com capacidade para 6 kg, contendo 4 kg de solo. Foram usadas seis sementes por vaso e as plantas desbastadas 20 dias após o plantio (DAP), deixando quatro plantas por vaso. Além da adubação de plantio, foi feita, aos 20 DAP, a aplicação de uma solução de sulfato de amônia, contendo 10 kg N ha-1, e outra aos 60 dias após o plantio, na mesma concentração. As testemunhas nitrogenadas foram adubadas com o equivalente a 40 kg N ha-1. Os vasos foram inundados quando as plântulas atingiram, em média, 15 cm de altura, sendo a lâmina d'água de 2 cm mantida durante todo o experimento.

O experimento foi conduzido ao ar livre, em delineamento inteiramente casualizado com três repetições, em arranjo fatorial 2 x 4, com duas turfas (nacional e importada), quatro inoculações (sem bactéria e com as estirpes ZAE94, M130 e Sp109) e um controle nitrogenado adicional (40 kg N ha-1), totalizando nove tratamentos por variedade. Para análise de variância foi utilizado o teste F; e para separação das médias o teste LSD a 5% de significância.

A coleta realizada ao final do ciclo da cultura. O parâmetro agronômico avaliado foi a massa seca dos grãos em estufa a 65ºC, por 96h. Após a secagem, as amostras foram moídas, e 100 mg de cada amostra foram submetidos à digestão com ácido sulfúrico, seguida de destilação e titulação para determinação do N%, segundo Tedesco (1983). O N-total dos grãos foi estimado multiplicando o N% pela massa seca dos grãos de cada amostra.

Resultados e discussão

Avaliação da sobrevivência das bactérias nas turfas

Os resultados demonstraram que as diferenças na sobrevivência das bactérias diazotróficas foram influenciadas pelas turfas e estirpes utilizadas nas contagens feitas aos dois e após os 70 dias de preparo do inoculante. Nas demais contagens, estas diferenças ocorreram devido às estirpes das bactérias diazotróficas, o que pode ser explicado pelas diferenças fisiológicas e bioquímicas destas bactérias, já que apresentam exigências nutricionais diferentes. Além disso, as diferenças nutricionais entre os dois substratos podem influenciar o estabelecimento das estirpes nas diferentes turfas, fato este observado pela diferença estatística aos dois dias e não observado aos seis dias após o preparo dos inoculantes (Figura 1).


Entretanto, o número de células viáveis aos 180 dias nos inoculantes preparados com as estirpes de H. seropedicae ZAE94 (BR11417), A. brasilense Sp109 (BR11023) e Burkholderia sp. M130(BR11430) inoculadas na turfa nacional apresentaram valores de NMP abaixo do mínimo estabelecido por lei para as três estirpes usadas no inoculante (Figura 1). Os resultados obtidos neste trabalho sugerem que o tempo de validade dos inoculantes seja diminuído para atender à Legislação Nacional nº 86.955, de 18 de fevereiro de 1982, que determina um mínimo de 108 cel. g-1 de inoculante, durante o período de armazenamento de 180 dias, para inoculantes comerciais.

Somente o inoculante produzido com a turfa importada para a estirpe M130 (BR11430) de Burkholderia sp. estava em consonância com a lei. De modo geral, os tratamentos que utilizaram a turfa importada apresentaram maior sobrevivência das estirpes de bactérias diazotróficas, quando comparados com os tratamentos inoculados na turfa nacional. Isto pode ter sido influenciado pelas diferenças existentes entre teores de nutrientes e a origem do material dos substratos turfosos. Ronchi e Baletti (1996), avaliando a sobrevivência de Bradyrhizobium japonicum estirpe E109 em dois tratamentos (um com 100% de turfa e o outro com uma mistura de 20% de solo mais 80% de turfa), observaram que os tratamentos utilizando 100% de turfa apresentaram melhor sobrevivência que os tratamentos com a mistura.

Após os 70 dias de armazenamento em geladeira, a influência dos substratos turfosos utilizados na sobrevivência das bactérias diazotróficas pode ser explicada pela maior retenção de umidade pela turfa importada, em comparação com a turfa nacional. Foram observadas reduções nos teores de umidade de 38 para 16% e de 65 para 62% nos tratamentos com a turfa nacional e importada, respectivamente (Tabela 1). Isto pode ser devido ao efeito direto do teor de matéria orgânica na retenção de umidade.

Outra variável que pode ter influenciado a perda de umidade é a permeabilidade dos sacos de polipropileno, conforme sugerido por Feng et al. (2002). Os autores observaram que a umidade da turfa decresceu de 52% na fase inicial para 49% após 85 dias a 30ºC, mesmo utilizando sacos com baixa permeabilidade às trocas gasosas. O efeito do tipo de turfa utilizada também foi observado por Lorda et al. (2007), ao verificarem que a adição de goma xantana a inoculantes preparados com turfa de alta capacidade de retenção de umidade não afetou a sobrevivência das estirpes de Bradyrhizohium japonicum e Sinorhizohium fredii; quando utilizada a turfa com baixa capacidade de retenção de umidade, porém, foram observadas diferenças.

Experimento de inoculação em condições de vasos

Não houve diferença estatística entre turfas utilizadas para a inoculação das bactérias, para as variedades de arroz usadas, em relação às variáveis de acúmulo de massa seca, N%, N-total dos grãos. As diferenças foram observadas em função das estirpes das bactérias diazotróficas utilizadas, por isso, foram apresentados os resultados do efeito geral dos tratamentos (Tabela 2).

Esses resultados sugerem que o maior teor de matéria orgânica da turfa importada não aumentou a eficiência da inoculação. Isto pode ser pelo fato de os inoculantes apresentarem número de células bacterianas nas sementes semelhante no momento do plantio, e as diferenças na sobrevivência destas bactérias só serem observadas em longo prazo, período superior à germinação, infecção e colonização das plantas de arroz.

Todavia, foram observadas diferenças no comportamento das duas variedades de arroz utilizadas, em relação ao acúmulo de N-total e acúmulo de massa seca dos grãos. Isto pode ser pela estirpe utilizada, já que Guimarães et al. (2003) observou efeitos positivos e negativos sobre a produção e acúmulo de matéria seca dos grãos devido à interação estirpe x cultivar.

Para a variável massa seca e N-total dos grãos, os tratamentos de inoculação com as estirpes ZAE94 nas turfas utilizadas e da estirpe M130 na turfa importada proporcionaram resultados estatisticamente iguais ao controle nitrogenado para a variedade IR42. Tal fato sugere que a inoculação destas estirpes pode suprir até 20 kg de N ha-1 para atingir o mesmo N-total e produtividade de grãos das plantas adubadas (Tabela 2). Resultado semelhante foi observado em trigo, em que tratamentos de inoculação com a estirpe JA04 de A. brasilense acrescidos de 15 kg N ha-1 acumularam quantidade idêntica de N-total e apresentaram produção de grãos estatisticamente igual ao tratamento com 60 kg N ha-1 (DIDONET et al., 1996).

Resultados semelhantes foram encontrados por Dalla Santa et al. (2004), em experimentos com milho em campo, por dois anos consecutivos, utilizando Azospirillum sp. estirpes RAM-7 e RAM-5. Os autores observaram que o uso destas estirpes foi capaz de reduzir em 40% a quantidade de fertilização nitrogenada recomendada em cada experimento. Já na cultura do milho, experimentos com o inoculante Graminante, à base de Azospirillum spp., mostraram que os tratamentos com inoculação e aplicação de adubação nitrogenada, tanto em cobertura quanto na base, obtiveram produção de 6.404 kg ha-1, não houve a inoculação e a produção foi de 5.500 kg ha-1. Assim, com melhor disponibilidade de nitrogênio, a inoculação das sementes com este inoculante aumentou a produção em 30% (CAVALLET et al., 2000).

Na variedade IR42, a massa seca e o N-total dos grãos dos tratamentos inoculados, embora estatisticamente igual, foram inferiores aos encontrados para a testemunha nitrogenada na variedade IR42. Entretanto, quando comparado com a testemunha não inoculada os tratamentos de inoculação aumentaram em até 13% as variáveis avaliadas (Tabela 2).

Os valores de massa seca e N-total dos grãos da variedade IAC4440 foram muito semelhantes para os tratamentos inoculados com ambas as turfas. Não foi observada resposta à inoculação das estirpes Sp109 e M130. Já a inoculação da estirpe ZAE94 aumentou a produção e o N-total dos grãos, embora estatisticamente iguais, em 13 e 19,41%, respectivamente, em relação ao controle nitrogenado.

Isto pode ser explicado por possíveis diferenças existentes entre a eficiência das estirpes em promover a FBN, ou por ser mais competitiva em relação a outras bactérias associativas. Também em experimentos conduzidos em condições de casa-devegetação, Nayak et al. (1986) observaram que a inoculação de estirpes de Azospirillum lipoferum promoveu aumentos na produção de arroz de 18%.

Efeito positivo da inoculação de bactérias diazotróficas também foi constatado por diferentes autores. Ferreira et al. (2003) observaram, na inoculação da estirpe ZAE94 de Herbaspirillum seropedicae, em campo, aumentos na produção de grãos de 38 e 18%, na variedade IR42 e IAC4440, respectivamente, em relação ao controle não-inoculado.

Os aumentos observados com a estirpe ZAE94 foram próximos, mesmo quando inoculado com os dois tipos de turfas para ambos os parâmetros (Tabela 2). O efeito positivo da inoculação da estirpe ZAE94 na variedade IAC4440 também foi observado por Guimarães et al. (2007), que verificaram aumentos de até 30% em relação ao tratamento nãoinoculado, dependendo da cultivar utilizada. Esses resultados indicam que a técnica de inoculação em plantas não-leguminosas é uma prática promissora e pode ser utilizada na agricultura.

Conclusão

A sobrevivência das bactérias diazotróficas utilizadas no inoculante turfoso foi mantida em 108 células g-1 de inoculante até 110 dias de armazenamento, independentemente do tipo de turfa utilizada. A inoculação da estirpe ZAE 94 de H. seropedicae aumentou em até 13 e 19% a produção e o N-total dos grãos, respectivamente, dependendo da variedade de arroz utilizada.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Capes pela bolsa concedida ao primeiro autor, ao Programa Pronex II/ Finep, nº 76.97.1051.00 e ao CNPq Edital Universal.

Received on July 26, 2007.

Accepted on January 23, 2008.

License information: This is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License, which permits unrestricted use, distribution, and reproduction in any medium, provided the original work is properly cited.

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    Autor para correspondência. E-mail
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Nov 2011
    • Data do Fascículo
      Mar 2010

    Histórico

    • Recebido
      26 Jul 2007
    • Aceito
      23 Jan 2008
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