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INFESTAÇÃO POR MEGNINIA SPP. EM CRIAÇÃO INDUSTRIAL DE AVES PRODUTORAS DE OVOS PARA CONSUMO

INFESTATION BY MEGNINIA SPP. ON CHICKEN EGG LAYING FARMS

RESUMO

O presente estudo relata pela primeira vez, no Brasil, infestação maciça por Megninia causando prejuízos em granjas de postura comercial. Esta ocorrência é preocupante representando novo problema para a avicultura industrial. A identificação das amostras demonstrou a ocorrência de 2 espécies de ácaros: Megninia ginglymura e M. cubitalis. Foram encontradas galinhas parasitadas concomitantemente pelas duas espécies de ácaros. As aves apresentavam-se debilitadas, irritadas, com penas danificadas e dermatite com secreção. Os prejuízos causados na propriedade foram de 20% de queda na produção de ovos.

PALAVRAS-CHAVE
Galinhas poederias; ácaros de pena; Menoponidae; Analgidae

ABSTRACT

The present study reports for the first time in Brazil a massive infestation by Megninia causing damages on commercial poultry farms. This occurrence is of great concern, posing a new problem for the industrial poultry keeping. The identification of the samples demonstrated the occurrence of 2 species of mites: Megninia cubitalis and M. ginglymura. Both species of mites were found concomitantly on hens. The birds were weak and irritated, with damaged feathers and dermatitis with secretion. The damages caused on the property resulted in a 20% drop in egg production.

KEY WORDS
Laying hens; feather mite; Menoponidae; Analgidae

Megninias, conhecidas como ácaros das pena, são ectoparasitas de aves, tendo sido descritas na literatura parasitando galinhas, pombos, patos perus e periquitos. Os adultos e as formas jovens vivem nas penas, das quais se alimentam. As bárbulas ficam cortadas ou rarefeitas, os folículos inchados e vermelhos e o canhão recoberto de detritos (REIS, 1939REIS, J. Alguns parasitas de Gallus gallus (L.) verificados em São Paulo. Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.10, p.147-153, 1939.).

A lesão causada pela saliva dos ácaros acarreta uma reação alérgia com prurido. A serosidade que forma as crostas propicia uma contaminação bacteriana secundária podendo levar à piodermite. A contaminação por fungos também é bastante freqüente. Alguns autores comentam o decréscimo de até 20% na produção de ovos, causado pelo parasitismo desta espécie (MONTEIRO, 2005MONTEIRO, S.G. Parasitologia veterinária. Disponível em: <http://w3.ufsm.br/parasitologia/arquivospagina/parasitologia2.htm>. Acesso em: 19 jan. 2005.
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)

Ácaros desta espécie têm sido descritos na literatura parasitando aves silvestres e de criação de fundo de quintal, sendo escassos trabalhos associados à exploração industrial de galinhas.

No Brasil, a partir de 1950, foram implantados os sistemas de criação intensiva, o qual proporcionou uma maior produção de ovos em menor espaço físico e melhor racionalização do trabalho da granja (YOSHIDA, 1987YOSHIDA, C.K. Avicultura: A modernização, a especialização e a agroindústria em Bastos SP. Londrina: 1987. 98p. [Monografia (Bacharelado) Departamento de Geociências, Fund. Univ. Estadual. Londrina]).

Apesar de vantajoso em termos produtivos e econômicos, o confinamento em gaiolas favoreceu a instalação e o desenvolvimento de uma série de artrópodes como moscas, piolhos e ácaros (AXTEL & ARENDS, 1990AXTELL, R.C. & ARENDS, J.J. Ecology and management of arthropod pests of poultry. Annu. Rev. Entomol., v.35, p.101-126, 1990.).

Na Índia, D'SOUZA et al. (2001)D'SOUZA, P.E.; MURTHY, K.S.; JAGANNATH, M.S. Feather mite infestation in a broiler breeder farm. Vet. Rec., v.149, n.25, p.777, 2001. descreveram infestação por Megninia ginglymura determinando problemas em matrizes corte. Os autores constataram que as aves estavam constantemente coçando-se com presença de petéquias hemorrágicas na pele e ocorrência de vesículas.

No Brasil foram registradas duas espécies de ácaros de penas parasitando galinhas: Megniniaginglymura e Megninia cubitalis (REIS, 1939REIS, J. Alguns parasitas de Gallus gallus (L.) verificados em São Paulo. Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.10, p.147-153, 1939.; BASTOS & COELHO, 1962BASTOS, W.D.A. & COELHO, M.P. Primeira constatação no Brasil de Megninia cubitalis parasitando Galus domesticus de Salvador, Bahia. Bol. Inst. Biol. Bahia, v.6, p.26-31, 1962.). No Estado de São Paulo, estas espécies foram assinaladas em galinhas por REIS (1939)REIS, J. Alguns parasitas de Gallus gallus (L.) verificados em São Paulo. Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.10, p.147-153, 1939. e AMARAL et al. (1974)AMARAL, V. do.; SANTOS, S.M.; REBOUÇAS, M.M. & CHIARELLI, W. Nota sobre a ocorrência de Megninia cubitalis (Mégnin, 1877)(Acarina Analgidae) em Gallus gallus domesticus (L) no Estado de São Paulo – Brasil. Biológico, São Paulo, v.10, p.296-300, 1974.. Atualmente, não existem dados referentes à ocorrência e distribuição de Megninia em aves de postura de criação industrial. TUCCI et al, (1997)TUCCI, E.C.; GUIMARÃES, J.H.; BRUNO, T.V.; GAMA, N.M.S.Q.; SANTOS, A.M.M. Ocorrência de ácaros hematófagos em aviários de postura no Estado de São Paulo, Brasil. Rev. Bras. Parasitol. Vet., v.5, n.2, p.95-102, 1997. em levantamento realizado em 43 granjas de postura comercial, no Estado de São Paulo, não encontraram ácaros desta espécie.

Visando contribuir para o conhecimento das espécies de ácaros de importância econômica em avicultura, o presente trabalho teve por objetivo identificar os problemas causados pelo parasitismo por Megninia spp. em galinhas de granjas de exploração comercial.

O material foi coletado em junho de 2004, em granja de galinhas poedeiras comerciais, no Município de Ourinhos, SP. Foram obtidas informações sobre o manejo das aves, dados de produção e produtos utilizados no controle de ácaros, através de entrevista com o proprietário da granja. As galinhas eram alojadas em gaiolas de arame suspensas, em galpões tipo Californiano, contendo 4 fileiras de gaiola, com capacidade para 3.000 aves, na proporção de 2 aves por gaiola. O plantel em produção era composto de 60.000 galinhas, em idade múltipla, sendo 15% vermelhas e 85% brancas.

A coleta de material foi direcionada e dos 10 lotes em produção, 6 foram selecionados por estarem parasitados. Os lotes foram examinadas quanto aos sinais clínicos e 18 aves (3 de cada lote) foram encaminhadas ao laboratório para coleta do material e identificação dos parasitas.

As penas mais danificadas foram destacadas e observadas sob microscópio estereoscópico para coleta dos parasitas. Os ácaros coletados foram montados lâmina e lamínula com meio de Hoyer para identificação das espécies.

Verificou-se que todas as aves selecionadas para exame clínico e coleta de material apresentaram-se intensamente parasitadas por ácaros. A identificação das amostras demonstrou a ocorrência de 2 espécies de ácaros: Megninia ginglymura e M. cubitalis. Foram encontradas aves parasitadas concomitantemente pelas duas espécies de ácaros. A diferenciação morfológica deu-se com base na observação do epímero I e cerdas adanais. M. cubitalis apresenta epímero I fundido sob a forma de "Y", enquanto que M. ginglymura apresenta o epímero não fundido. As cerdas adanais de cubitalis são aculeiformes e de M. ginglymura infladas e relativamente maiores (AMARAL et al., 1974AMARAL, V. do.; SANTOS, S.M.; FURTADO, M.S.F.; REBOUÇAS, M.M. Ocorrência das espécies Megninia cubitalis (Mégnin, 1877) e Megninia cubitalis (Mégnin, 1877) (Acarina Analgidae) em Gallus gallus domesticus (L) no Estado do Ceará, Brasil. Biológico, São Paulo, v.10, p.296-300, 1974; AMARAL et al., 1975AMARAL, V. do.; SANTOS, S.M.; REBOUÇAS, M.M. & CHIARELLI, W. Nota sobre a ocorrência de Megninia cubitalis (Mégnin, 1877)(Acarina Analgidae) em Gallus gallus domesticus (L) no Estado de São Paulo – Brasil. Biológico, São Paulo, v.10, p.296-300, 1974.)

Verificou-se pela observação geral das aves alojadas, em todos os galpões de produção observados, que 30% delas apresentavam sinais clínicos de ectoparasitismo. Ao exame clínico todas as aves mostraram-se bastante debilitadas, irritadas, mal cheirosas, com penas danificadas, apresentando dermatite com secreção. Essas alterações foram encontradas na pele e penas de todo corpo, sendo mais acentuada na região interna das asas. As penas tinham perdido a plumagem e, em algumas regiões, notou-se a ausência de penas, como por exemplo na cabeça (Fig. 1). Nas áreas com dermatite, a pele apresentava-se espessada, com crostas e exudato purulento. Este fato sugere um parasitismo avançado por Megninia, seguido de infecção secundária (MONTEIRO, 2005MONTEIRO, S.G. Parasitologia veterinária. Disponível em: <http://w3.ufsm.br/parasitologia/arquivospagina/parasitologia2.htm>. Acesso em: 19 jan. 2005.
http://w3.ufsm.br/parasitologia/arquivos...
).

Fig. 1
A - penas danificadas e área sem penas sob a asa; B – crostas sobre a pele; C – penas sem plumagem; D – área sem pena.

De acordo com os dados obtidos no questionário, a propriedade enfrentava o problema por período superior a 2 anos, com queda na produção de ovos da ordem de 20%. Para o controle, foram utilizados diversos tipos de substâncias químicas como: acaricidas, inseticidas e desinfetantes, sem resultados satisfatórios com retorno do problema 3 meses após os tratamentos.

No Brasil não existem trabalhos sobre a eficácia de substâncias químicas empregadas no controle de megninias, tampouco orientações específicas como métodos e intervalos entre aplicações. Na Índia, D'SOUZA et al. (2001)D'SOUZA, P.E.; MURTHY, K.S.; JAGANNATH, M.S. Feather mite infestation in a broiler breeder farm. Vet. Rec., v.149, n.25, p.777, 2001. obtiveram sucesso controle da infestação por Megninia, em um lote de 10.000 matrizes imergindo as aves em solução de deltametrina 0,4%, pulverizando as instalações com malation e aplicando paratiom pó na cama das aves. Os autores relatam que o ácaro foi erradicado e não houve reinfestação por um período de 6 meses.

Em Cuba, LARRAMENDY et al. (2003)LARRAMENDY,R.;S ZCZYPEL, B.; HERNÁNDEZ, M.; VALDÉS, L.; LLANES, Y. El Nim: sus productos naturales para el control de parásitos de las aves, coleópteros y larvas de la mosca doméstica. Rev. Cubana Cienc. Avíc., v.27, p.1-6, 2003. estudando o controle alternativo de Megninia ginglymura, obtiveram 100% de eficácia após 30 dias do tratamento com óleo de nim nas concentrações de 2 a 3%, após 3 aplicações com intervalos de 15 e 30 dias. Os autores avaliaram, ainda, a ação da cipermetrina 1,2% obtendo-se eficácia de 100% após a terceira aplicação. No mesmo país, SZCYPEL et al. (2003)SZCZYPEL, B.; LARRAMENDY, R.; HERNÁNDEZ, Y.M. Evaluación de distintos insecticidas frente a ectoparásitos de la gallina doméstica. Rev. Cubana Cienc. Avíc., v.26, p.121-124, 2002. avaliaram a ação de diferentes substâncias químicas, no controle de M. ginglymura, obtendo resultados satisfatórios com cipermetrina e malation.

O prejuízo causado pelas megninias às aves ainda não é bem definido. Na literatura, não existem trabalhos referentes aos prejuízos causados pelo parasitismo por Megninia em aves de produção industrial. Os resultados obtidos no presente estudo demonstraram que a saúde das aves foi afetada pelo parasitismo, causando perdas na produção de ovos.

Na exploração industrial, o ambiente artificial faz com que a ave fique sem defesas contra os ectoparasitas. Em seu ambiente natural, ficam expostas ao sol e, quando parasitadas, passam grande parte do seu tempo se limpando, removendo os ectoparasitas de suas penas com o bico. Além disso, possuem o hábito de procurarem no ambiente, um local com terra seca para revolverem, com a intenção de eliminar os ectoparasitas de suas penas. No confinamento, a debicagem e a falta de contato com o solo impedem que a ave defenda-se, favorecendo desta maneira, a multiplicação e dispersão dos ectoparasitas nos galpões de criação e o aumento dos efeitos negativos do parasitismo às aves (BROWN, 1972BROWN, N.S. The effect of host beak condition on the size of Menacanthus stramineus populations of domestic chichens. Poult. Sci., v.51, p.162-164. 1972.). Aves criadas em gaiolas são muito sensíveis ao ataque dos ectoparasitas e estão constantemente submetidas a condições de estresse. CRAIG et al. (1986)CRAIG, J.V.; CRAIG J.A.; VARGAS, J.V. Corticosteroids and other indication of hen’s well-being in four laying house enviroments. Poult. Sci., v.65, p.856-863, 1986. observaram que a resposta ao estresse nas aves é a elevação da taxa de corticosteróides, resultando na redução do consumo de alimentos, baixas reações imunológicas e aumento na suscetibilidade a doenças.

O presente estudo relata pela primeira vez, no Brasil, infestação maciça por M. ginglymura e M. cubitalis causando prejuízos em granjas de postura comercial. Esta ocorrência é preocupante representando novo problema para a avicultura industrial.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • AMARAL, V. do.; SANTOS, S.M.; REBOUÇAS, M.M. & CHIARELLI, W. Nota sobre a ocorrência de Megninia cubitalis (Mégnin, 1877)(Acarina Analgidae) em Gallus gallus domesticus (L) no Estado de São Paulo – Brasil. Biológico, São Paulo, v.10, p.296-300, 1974.
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    » http://w3.ufsm.br/parasitologia/arquivospagina/parasitologia2.htm
  • REIS, J. Alguns parasitas de Gallus gallus (L.) verificados em São Paulo. Arq. Inst. Biol, São Paulo, v.10, p.147-153, 1939.
  • SZCZYPEL, B.; LARRAMENDY, R.; HERNÁNDEZ, Y.M. Evaluación de distintos insecticidas frente a ectoparásitos de la gallina doméstica. Rev. Cubana Cienc. Avíc, v.26, p.121-124, 2002.
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  • YOSHIDA, C.K. Avicultura: A modernização, a especialização e a agroindústria em Bastos SP Londrina: 1987. 98p. [Monografia (Bacharelado) Departamento de Geociências, Fund. Univ. Estadual. Londrina]

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Abr 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2005

Histórico

  • Recebido
    28 Fev 2005
  • Aceito
    31 Mar 2005
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