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ALTERAÇÕES DA COMPOSIÇÃO E DA PRODUÇÃO DE LEITE ORIUNDO DE QUARTOS MAMÁRIOS DE VACAS COM E SEM MASTITE SUBCLÍNICA DE ACORDO COM O ESTÁGIO E O NÚMERO DE LACTAÇÕES

CHANGES IN THE COMPOSITION AND MILK PRODUCTION OF MAMMARY QUARTERS FROM LACTATING COWS WITH AND WITHOUT SUBCLINICAL MASTITIS IN DIFFERENT PARITIES AND DAYS IN MILK

RESUMO

O presente trabalho teve por objetivo pesquisar diferenças na composição e na produção de leite ao serem estudadas as interações entre estágios de lactação, número de lactações e mastite subclínica. Quartos mamários foram distribuídos em 6 grupos: Grupo "A", animais com até 2 meses após o parto e até 5 lactações; Grupo "B", animais com até 2 meses após o parto e após a quinta lactação; Grupo "C", com vacas em meses intermediários do estágio de lactação e com até 5 lactações; Grupo "D", com animais em meses intermediários do estágio de lactação e após a quinta lactação; Grupo "E", com vacas nos 2 meses anteriores à secagem e até 5 lactações; e Grupo "F", composto por animais com até 2 meses antes da secagem e após a quinta lactação. Foram analisadas a produção láctea, a contagem de células somáticas (CCS), o teor de cloretos, a acidez titulável, a densidade, o extrato seco desengordurado (ESD) e a crioscopia. O estágio de lactação e o número de lactações influenciaram a produção láctea e o conteúdo de cloretos do leite de quartos sadios, devendo ser considerados quando estudada a influência da mastite subclínica sobre a composição e a produção de leite. Além disso, em conjunto com o período lactacional e o número de lactações, a etiologia infecciosa da mastite subclínica deve ser investigada pela possível variação do grau de acometimento da glândula mamária de acordo com os microrganismos envolvidos.

PALAVRAS-CHAVE
Leite; mastite subclínica; estágio de lactação; número de lactações

ABSTRACT

This study was carried out to investigate differences in milk composition and production when followed the stages of lactation, parities and subclinical mastitis. The mammary quarters of cows were arranged in agreement to days in milk and parities: Group "A" (lactating cows until 2 months after parturition and until the fifth lactation); Group "B" (lactating cows until 2 months after parturition and after fifth lactation); Group "C" (animals in intermediary months of lactation stage and until the fifth lactation); Group"D" (animals in intermediary months of lactation stage and after fifth lactation); Group "E" (cows in corresponding period of 2 months before the end of lactation and until the fifth lactation); Group "F" (lactating cows within 2 months before the end of lactation and after fifth lactation). The milk characteristics studied were the milk production, somatic cell count (SCC), chloride levels, titratable acidity, density, non-fat solids and cryoscopy. The lactation stage and the parities changed the milk production and chloride levels and these factors should be considered when the influence of subclinical mastitis upon the milk composition and milk production is analyzed. The days in milk and the parities of lactating cows should be investigated in addition to the infective etiology of subclinical mastitis because variations of the effects can occur in agreement to the microorganisms.

KEY WORDS
Milk; subclinical mastitis; stage of lactation; parity

INTRODUÇÃO

A mastite é considerada a principal doença dos rebanhos leiteiros. Quando presente, o leite apresenta qualidade inferior e diminui o rendimento dos seus subprodutos. A forma subclínica da enfermidade não promove sinais visuais de alteração do leite nem da glândula mamária, contudo, pode acarretar alterações no teor de gordura, extrato seco total, extrato seco desengordurado, conteúdo de caseína e em outras características físico-químicas. Além disso, pode influenciar negativamente no número de células somáticas, um dos principais parâmetros utilizados para o pagamento diferenciado do produto ao ser fixado um limite máximo de contagem celular pelos laticínios.

O leite é um ótimo meio para desenvolvimento de microrganismos e, entre os agentes etiológicos causadores de mastite, destacam-se os de origem contagiosa e os ambientais. Apesar da grande variedade de agentes infecciosos isolados a partir da glândula mamária, existem alguns que podem ser predominantes, como é o caso dos estafilococos e estreptococos (MENDONÇA et al., 1999MENDONÇA, C.L.; FIORAVANTI, M.C.S.; SILVA, J.A.B.A.; SOUZA, M.I.L.; EURIDES, D.; LANGONI, H. Etiologia da mastite bovina. Veterinária Notícias, v.5, n.1, p.107-118, 1999.; MAGALHÃES et al., 2005MAGALHÃES, H.; GONÇALVES, W.M.; LIBERAL, M.H.T.; SOUZA, R.M.; CARVALHO, L.S.; COUTINHO, C.E.R.; POMBO, C.R.; SILVA, S.C.; LOPES, L.L.S. Microrganismos isolados de mastites clínicas e subclínicas em rebanhos bovinos. Higiene Alimentar, v.19, n.130, 2005 (Encarte eletrônico).).

Para LESCOURRET & COULON (1994)LESCOURRET, F. & COULON, J.B. Modeling the impact of mastitis on milk production by dairy cows. Journal of Dairy Science, v.77, n.8, p.2289-2301, 1994., em casos de mastite clínica no início da fase de lactação ou entre as fases determinadas pelos mesmos como "média" e "final", a produção láctea no momento do surgimento da doença é um fator determinante da quantidade de leite produzido e do padrão de redução da produção de leite. Animais que se encontram com maior vida produtiva parecem responder com menor eficiência às infecções.

SOL et al. (1997)SOL, J.; SAMPIMON , O.C.; SNOEP, J.J.; SCHUKKEN, Y.H. Factors associated with bacteriological cure during lactation after therapy for subclinical mastitis caused by Staphylococcus aureus. Journal of Dairy Science, v.80, n.11, p.2803-2808, 1997. concluíram que quartos mamários de animais nos terços inicial e médio de lactação possuíam menores chances de serem curados após tratamento da mastite subclínica durante a lactação. Segundo MALLARD et al. (1998)MALLARD, B.A.; DEKKERS, J.C.; IRELAND, M.J.; LESLIE, K.E.; SHARIF, S.; VANKAMPEN, C.L.; WAGTER, L.; WILKIE, B.N. Alteration in immune responsiveness during the peripartum period and its ramification on dairy cow and calf health. Journal of Dairy Science, v.81, n.2, p.585-595, 1998., os mecanismos de defesa do animal têm baixa capacidade de resposta a infecções no período situado entre três semanas antes do parto até três semanas pós-parto.

Quanto mais elevado o número de lactações de um animal, aumentam as chances dele tornar-se uma fonte de infecção para o rebanho. Uma infecção crônica pode permanecer subclínica ou evoluir para um quadro clínico, quando, então, o tratamento não é apenas uma questão de custo-benefício e começam a vigorar aspectos legais, éticos e de bem-estar animal para tomadas de decisão sobre o mesmo (SWINKELS et al., 2005SWINKELS, J.M.; ROOIJENDIJK, J.G.A.; ZADOKS, R.N.; HOGEVEEN, H. Use of a parcial budgeting to determine the economic benefits of antibiotic treatment of chronic subclinical mastitis caused by Streptococcus uberis or Streptococcus dysgalactiae. Journal of Dairy Research, Cambridge, v.72, p.75-85, 2005.).

Buscou-se como propósito verificar a composição e a produção de leite de quartos mamários com mastite subclínica e de quartos sadios, em três diferentes estágios de lactação e agrupados de acordo com o número de lactações, com o intuito de pesquisar se existem diferenças ao serem estudadas as interações entre estágios de lactação, número de lactações e mastite subclínica.

MATERIAL E MÉTODOS

Animais pertencentes a uma fazenda experimental com vacas produtoras de leite tipo C foram investigados de maio de 2000 até maio de 2002. Durante este período eles foram submetidos ao mesmo tipo de alimentação e manejo e a ordenha era realizada, mecanicamente, uma vez ao dia, sendo utilizado o sistema de "balde ao pé". A população bovina era constituída por animais da raça Holandesa 7/8, variedade preta e branca, com 40 vacas em lactação.

As análises foram realizadas após prévia seleção das vacas cujo leite mostrava-se reagente ao CMT em um de seus quartos e não reagente no quarto homólogo correspondente, totalizando 152 quartos mamários. Os casos de mastite subclínica foram devidamente confirmados em laboratório, segundo procedimentos do National Mastitis Council (HARMON et al., 1990HARMON , R.J.; EBERHART, R.J.; JASPER, D.E.; LANGLOIS, B.E.; WILSON , R.A. Microbiological procedures for the diagnosis of bovine udder infection. Arlington: National Mastitis Council, 1990. 34p.).

Os quartos mamários foram distribuídos em seis grupos, de acordo com o número de lactações e o estágio de lactação dos animais: (1) Grupo "A", composto por animais nos primeiros 2 meses em lactação e com até 5 lactações; (2) Grupo "B", com animais nos primeiros 2 meses em lactação e com mais de 5 lactações; (3) Grupo "C", no qual faziam parte vacas em meses intermediários do estágio de lactação e com até 5 lactações; (4) Grupo "D", com animais em meses intermediários do estágio de lactação e com mais de 5 lactações; (5) Grupo "E", com vacas no período correspondente aos 2 meses anteriores à secagem e com até 5 lactações; e (6) Grupo "F", composto por animais com até 2 meses antes da secagem e com mais de 5 lactações (adaptado de CULLEN, 1968CULLEN, G.A. Cell count throughout lactation. Veterinary Record, v.83, p.125-128, 1968.; VAN HORN & WILCOX, 1992VAN HORN, H.H. & WILCOX, C.J. Monitoring milk quality and udder health. In: VAN HORN, H.H. & WILCOX, C.J. (Eds.). Large dairy herd management. Champaign, 1992. p.475-486.). Não foram colhidas amostras de leite de animais que se encontravam nos primeiros 10 dias de lactação.

As características do leite estudadas foram a contagem de células somáticas (CCS), o teor de cloretos, a acidez titulável, a densidade a 15º C, o extrato seco desengordurado (ESD) e a crioscopia (NATIONAL MASTITIS COUNCIL, 1968NATIONAL MASTITIS COUNCIL. Direct microscopic somatic cell count in milk. Journal of Milk Food Technology, v.31, n.1, p.350-354, 1968.; BRASIL, 1981BRASIL. Ministério da Agricultura.Métodos Analíticos Oficiais para Controle de Produtos de Origem Animal e seus Ingredientes. IIMétodos físico-químicos. Brasília, 1981. 174p.; AMARAL et al., 1988AMARAL, L.A.; NADER FILHO, A.; LEW, B.J. Estudo da variação do teor de cloretos no colostro e no leite de vacas sadias. Ars Veterinaria, v.4, n.1, p.105-112, 1988.), além da produção láctea (ZAFALON, 2003ZAFALON , L.F. Mastite subclínica bovina por Staphylococcus aureus: qualidade e quantidade de leite secretado por quartos tratados e não tratados e relação custo/ benefício do tratamento durante a lactação. 2003. 66p. Tese (Doutorado) Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Universidade Estadual Paulista, Campus de Jaboticabal, Jaboticabal, 2003.). As amostras para as análises laboratoriais foram colhidas antes do início da ordenha e os valores foram submetidos à análise de variância ou ao teste de Kruskal-Wallis, de acordo com os desvios-padrão encontrados, complementados pelos testes de Tukey-Kramer e de Dunn (SAMPAIO, 1998SAMPAIO, I.B.M. Estatística aplicada à experimentação animal. Belo Horizonte: Fundação de Ensino e Pesquisa em Medicina Veterinária e Zootecnia, 1998. 221p.).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Tabela 1 apresenta os microrganismos isolados no leite dos quartos mamários com mastite subclínica. Houve prevalência de estafilococos coagulase positiva dentre os microrganismos isolados (44,7%), seguidos por bactérias do gênero Corynebacterium (30,3%). Dentre os grupos analisados, apenas para o grupo A os estafilococos coagulase positiva não foram prevalentes.

Tabela 1
Isolamentos realizados em leite de quartos mamários com mastite subclínica de acordo com os diferentes estágios de lactação e número de lactações dos animais.

MAGALHÃES et al. (2005)MAGALHÃES, H.; GONÇALVES, W.M.; LIBERAL, M.H.T.; SOUZA, R.M.; CARVALHO, L.S.; COUTINHO, C.E.R.; POMBO, C.R.; SILVA, S.C.; LOPES, L.L.S. Microrganismos isolados de mastites clínicas e subclínicas em rebanhos bovinos. Higiene Alimentar, v.19, n.130, 2005 (Encarte eletrônico). analisaram amostras de leite de vacas pertencentes a rebanhos de várias regiões do Estado do Rio de Janeiro entre os anos de 2000 e 2004 e, de um total de 388 microrganismos identificados, o gênero Staphylococcus, incluindo o S. aureus e Staphylococcus coagulase negativo, foi o de maior freqüência no isolamento (30,7%), seguido pelo Bacillus sp. (15,0%) e Streptococcus, incluindo as espécies uberis, dysgalactiae e agalactiae (14,7%). Outros microrganismos freqüentemente isolados foram a Escherichia coli (12,6%), Corynebacterium spp. (8,2%) e Klebsiella spp. (5,9%).

Dentre os estafilococos coagulase positiva, o Staphylococcus aureus é considerado o principal microrganismo envolvido na etiologia infecciosa da mastite bovina (ZADOKS et al., 2002ZADOKS, R.N.; VAN LEEUWEN, W.B.; KREFT, D.; FOX, L.K.; BARKEMA, H.W.; SCHUKKEN, Y.H.; VAN BELKUM , A. Comparison of Staphylococcus aureus isolates from bovine and human skin, milking equipment, and bovine milk by phage typing, pulsed-field gel electrophoresis, and binary typing. Journal of Clinical Microbiology, v.40, n.11, p. 3894-3902, 2002.; SABOUR et al., 2004SABOUR, P.M., GILL, J.J., LEPP, D.; PACAN , J.C.; AHMED, R.; DINGWELL, R.; LESLIE , K. Molecular Typing and Distribution of Staphylococcus aureus Isolates in Eastern Canadian Dairy Herds. Journal of Clinical Microbiology, v.42, n.8, p.3449-3455, 2004.). Não se procurou identificar a espécie de Corynebacterium responsável pelos casos de mastite subclínica, porém o C. bovis tem a capacidade de colonizar o canal do teto e em rebanhos em que a anti-sepsia dos tetos depois da ordenha não é praticada, não é incomum este microrganismo ser isolado em mais de 60% de amostras de leite oriundas de quartos mamários. É considerado, basicamente, que microrganismos que exibem colônias pequenas em ágar sangue após 48h de incubação na área em que a gordura ficou depositada sobre a superfície do ágar é, presumivelmente, classificada como C. bovis (WATTS et al., 2000WATTS, J.L.; LOWERY, D.E.; TEEL, J.F.; ROSSBACH, S. Identification of Corynebacterium bovis and other coryneforms isolated from bovine mammary glands. Journal of Dairy Science, v.83, n.10, p.2373-2379, 2000.). Por acreditarmos que isto não diferencia estes microrganismos, optou-se pela não classificação destas bactérias em espécie.

Tabela 2
Valores médios de contagem de células somáticas (CCS) e produção de leite de quartos mamários com mastite subclínica e sadios, com respectivas variações dos quartos doentes em relação aos quartos sadios.
Tabela 3
Composição do leite de quartos mamários com mastite subclínica e sadios (valores médios), com respectivas variações.

Na Tabela 2 são apresentadas a contagem de células somáticas (CCS) e a produção de leite dos quartos mamários referentes aos diferentes grupos estudados.

Os resultados apontam que, quanto mais avançado o estágio de lactação dos animais, mais elevada foi a CCS do leite, como pode ser verificado pelos resultados dos quartos mamários sadios dos grupos "E" e "F". Ao serem comparados os resultados de CCS do leite dos quartos mamários doentes e sadios, verificou-se que a segunda menor diferença encontrada foi para os animais classificados dentro do Grupo A, talvez pela predominância de bactérias do gênero Corynebacterium dentre os microrganismos responsáveis pela mastite subclínica. A menor diferença encontrada foi para os quartos mamários pertencentes aos animais do Grupo "E". Apesar de, nestes quartos, ter sido encontrada predominância de estafilococos coagulase positiva, houve um número reduzido de quartos mamários estudados.

Após a realização do pós-teste de Dunn, foi verificada diferença para os quartos doentes entre os grupos "A" e "C" (Tabela 4). No grupo "C", os estafilococos coagulase positiva foram encontrados em oito (61,5%) quartos mamários, isoladamente ou em conjunto com Corynebacterium spp., enquanto no grupo "A" o isolamento destes microrganismos ocorreu em quatro (30,8%) quartos mamários. Talvez esta diferença deve-se ao fato da maior influência dos estafilococos coagulase positiva sobre o número de células somáticas do leite.

Tabela 4
Distribuição das diferenças encontradas para as características do leite oriundo de quartos mamários infectados e sadios, de acordo com os grupos estudados, quando confrontados pelos testes de Tukey-Kramer e pós-teste de Dunn para comparações múltiplas).

Quanto à produção de leite, observou-se que houve redução da mesma à medida que o estágio de lactação avançava, de acordo com os resultados para os quartos sadios contidos na Tabela 2. Notou-se, também, uma produção láctea inferior em animais com maior número de lactações (quartos sadios dos grupos "B" e "F" quando comparados com os quartos mamários sadios dos grupos "A" e "E"), com exceção daqueles em fase intermediária do estágio de lactação. Este fato pode ser decorrente de animais que se encontravam com mais de cinco lactações mas que estavam em pico de produção. Ao serem comparados os resultados de produção de leite dos quartos mamários doentes e sadios, verificou-se que a maior diferença entre os mesmos foi para os animais classificados dentro do Grupo "E". Neste grupo, havia predominância de estafilococos coagulase positiva.

Entre os quartos mamários sadios, houve diferença refletida pelo teste estatístico entre os grupos "A" e "F" (Tabela 4). Enquanto isso, nos quartos mamários com mastite subclínica, foram encontradas diferenças significativas entre os grupos "A" e "C", "A" e "E", além dos grupos "A" e "F". Verificou-se, dessa maneira, que tanto os quartos sadios como os quartos com mastite subclínica dos grupos "A" e "F" apresentaram valores distintos quando confrontados pelo teste estatístico utilizado, não se podendo afirmar que a diferença na produção de leite dos animais destes grupos e mostradas pelos quartos infectados tenham como causa a mastite subclínica. A diferença revelada pelo teste estatístico entre os grupos "A" e "C" também foi encontrada para a CCS referente aos quartos infectados, enquanto a diferença entre os grupos "A" e "F" pode estar relacionada com a etiologia da doença ou com casos de mastite mais graves para animais com mais de cinco lactações. No que se refere aos grupos "A" e "E", lembra-se que a quantidade de quartos pertencentes ao grupo "E" foi reduzida.

Na Tabela 3, por sua vez, estão presentes os resultados do conteúdo de cloretos, acidez titulável, densidade relativa a 15º C, extrato seco desengordurado (ESD) e crioscopia.

Houve uma variação superior para os quartos mamários pertencentes a animais com mais de cinco lactações e nos estágios inicial e intermediário de lactação, quando comparados os teores de cloretos de quartos sadios e doentes (Grupo "B" x grupo "A" / 63,5% x 26,6%; e grupo "D" x grupo "C" / 31,4% x 28,9%), excetuando-se os Grupos "E" e "F", cujos animais se encontravam em estágio final de lactação (até dois meses antes da secagem). A maior variação encontrada foi para quartos de animais do Grupo "B" (em fase inicial de lactação e com maior número de lactações), em que foram predominantes os estafilococos coagulase positiva.

Entre os quartos sadios, houve diferença entre os grupos "A" e "F", também encontrada para a produção de leite, quando os resultados foram confrontados estatisticamente. Houve um aumento do conteúdo de cloretos no leite conforme os animais foram avançando em seu estágio de lactação (médias de 0,136%, 0,136% e 0,157%, nos períodos inicial, intermediário e final de lactação, respectivamente, dados não tabelados). Talvez isso possa ter influenciado o fato de não ter sido encontrada uma variação maior entre quartos sadios e doentes para os animais com maior número de lactações em estágio final de lactação (Grupo "F"). O aumento progressivo do teor de cloretos do leite do início até o final do período de lactação pode ser atribuído a possíveis descamações das células secretoras da glândula mamária e que ocorrem, principalmente, no fim da lactação (VASCONCELOS et al., 1997VASCONCELOS, C.G.C.; NADER FILHO, A.; AMARAL, L.A.; PEREIRA, G.T. Influência da estação do ano, estádio da lactação e hora da ordenha sobre o teor de cloretos do leite bovino. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.49, n.6, p.753-760, 1997.).

O leite dos quartos mamários sadios de animais dos grupos "A", "B", "C" e "E" apresentou elevados valores de acidez titulável (18,5º D; 19,0º D; 20,2º D; e 18,6º D, respectivamente). Normalmente os valores considerados normais permanecem entre 14º D e 18º D (BRASIL, 2002BRASIL. Ministério da Agricultura. Instrução Normativa nº51. Brasília, DF, 2002. 48p.). Podem ter existido variações individuais em determinados animais, já que estes valores considerados como "normais" são para o leite de conjunto das propriedades, o que não foi o caso neste estudo.

Além do ácido lático, outros componentes interferem na acidez do leite, entre eles os citratos, fosfatos, proteínas e gás carbônico. Dessa forma, a análise de amostras individuais de leite pode apresentar resultados que variam de 10 a 30º D, mesmo sabendo-se que no leite fresco é improvável haver presença de ácido lático e que a carga microbiana é, normalmente, reduzida. Essa acidez deve-se aos demais componentes acídicos e não ao ácido lático (FONSECA & SANTOS, 2000FONSECA, L.F.L. & SANTOS, M.V. Qualidade do leite e controle da mastite. São Paulo: Lemos Editorial, 2000. 175p.). Além disso, deve ser considerada a grande variação no nível de acidez quando se analisa o leite de cada vaca. Estas variações individuais são diluídas no leite de conjunto, sendo que o valor obtido passa para níveis considerados normais.

A maior diferença encontrada entre os quartos sadios e doentes foi para os animais pertencentes ao grupo "B", em que os estafilococos coagulase positiva foram os agentes infecciosos mais isolados. Por outro lado, no Grupo "A" a diferença entre os quartos mamários foi de apenas 9,1%, grupo este em que o Corynebacterium spp. e os estafilococos coagulase negativa foram isolados em 70% dos quartos mamários.

NICOLAU (1994)NICOLAU, E.S. Influência da mastite subclínica bovina causada por Staphylococcus coagulase positiva e Staphylococcus coagulase negativa sobre a qualidade e a quantidade do leite secretado pelos quartos afetados. 1994. 101p. Dissertação (Mestrado) Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Universidade Estadual Paulista, Câmpus de Jaboticabal, Jaboticabal, 1994. observou que amostras de leite de quartos mamários sadios apresentavam valores médios mais elevados nas determinações de acidez titulável, densidade, E.S.T., E.S.D., ponto crioscópico e caseínas, quando comparados com amostras de leite oriundas de quartos com mastite subclínica. Amostras de leite de vacas sadias e de vacas com infecção clínica e subclínica foram submetidas ao exame de acidez titulável por Mohamed et al. (1999)MOHAMED, I.E.; ELOWNI, O.A.O.; MOHAMED, G.E.E. Effect of mastitis on milk quality of Friesian cows in a Khartoum state. Indian Journal of Animal Science, v.69, p.733-735, 1999. e a forma subclínica da mastite fez com que o coeficiente de variação para acidez titulável tenha sido significativo.

ZAFALON & NADER FILHO (2001)ZAFALON , L.F. & NADER FILHO, A. Influência de bactérias patogênicas sobre as características lácteas de quartos mamários bovinos com mastite subclínica. In: ENCONTRO CIENTÍFICO DE PÓS-GRADUANDOS DA FCAV, 3., 2001, Jaboticabal. Anais. Jaboticabal, 2001. 1 CD. apresentaram resultados nos quais a acidez titulável e o teor de cloretos foram as características do leite mais alteradas por microrganismos do gênero Staphylococcus e Corynebacterium quando verificadas as diferenças entre os quartos mamários sadios e com mastite subclínica (19,0% a 23,0% para acidez titulável e 26,7% a 46,7% para o conteúdo de cloretos).

A glândula com mastite subclínica apresenta alteração na composição do leite, com a tendência da mesma em aproximar-se à composição do sangue. O leite de vacas com mastite possui maior teor de sódio, menor concentração de potássio, cálcio e fósforo, um pH maior e também uma menor acidez titulável. Somente em poucos casos as infecções da glândula mamária podem provocar o aparecimento de leite com maior acidez titulável, quando os microrganismos envolvidos são produtores de ácidos (RODRIGUES et al., 1995RODRIGUES, R.; FONSECA, L.M.; SOUZA, M.R. Acidez do leite. Cadernos Técnicos da Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, n.13, p.63-72, 1995.).

Foi encontrada diferença significativa para os resultados de acidez titulável após a execução da análise de variância, porém, tal diferença, não foi encontrada quando os diversos grupos estudados foram comparados pelo pós-teste de Dunn.

Com relação ao extrato seco desengordurado, o leite oriundo de quartos mamários com mastite subclínica de animais incluídos no Grupo "B" apresentou valor médio abaixo daquele preconizado como normal. Novamente, vale lembrar que o valor contido na legislação é para leite de conjunto e não para o leite de quartos individuais como aqui analisado. O grupo "B" é de animais com maior número de lactações, assim como os animais do Grupo "D", em que o valor médio do ESD do leite dos quartos com mastite subclínica foi de 8,4%. Para o Grupo "F", que apresentou um valor superior para o ESD (8,76%) quando comparado com os grupos "B" e "D", também de animais com maior vida produtiva, nota-se que o ESD médio dos quartos mamários sadios foi superior ao ESD médio dos quartos mamários sadios dos outros grupos, podendo estes valores ser devidos a características exclusivas de animais deste grupo. Nenhuma diferença foi comprovada pelos testes estatísticos utilizados, seja para o leite dos quartos sadios como para os quartos com mastite subclínica.

O Grupo "A" foi o único em que os quartos mamários infectados apresentaram ESD superior àquele encontrado para os quartos sem mastite subclínica. Apenas neste grupo foi observada densidade relativa superior nos quartos infectados. Possíveis explicações podem ser a quantidade superior de soroproteínas no leite que é proveniente de quartos com mastite ou o fato de ter sido encontrada predominância de Corynebacterium spp. como responsável pela mastite subclínica, considerado um patógeno secundário na etiologia da doença.

Quando comparados os quartos com mastite subclínica e os quartos mamários sadios, no que se refere à densidade e à crioscopia, observa-se que não foram encontradas grandes variações. Ambas as características parecem sofrer pouca influência quando a mastite é subclínica.

A Tabela 4 apresenta os resultados referentes às comparações múltiplas para as diversas características do leite estudadas frente aos diferentes grupos.

CONCLUSÕES

A produção de leite e o teor de cloretos do leite apresentaram valores que se revelaram desiguais quando foram comparados animais em início de lactação e até no fim da quinta lactação com animais no final do estágio de lactação e com mais de 5 lactações, sendo necessários cuidados ao admitir diferenças causadas pela mastite subclínica quando são comparados quartos infectados com quartos sadios oriundos de animais neste período. Quando as características do leite aqui analisadas são investigadas em quartos com mastite subclínica, além do momento em que está ocorrendo a infecção, a etiologia infecciosa da doença deve ser levada em consideração pela possível variação do grau de acometimento da glândula mamária de acordo com os microrganismos envolvidos.

AGRADECIMENTOS

Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2005

Histórico

  • Recebido
    09 Nov 2005
  • Aceito
    28 Dez 2005
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