Acessibilidade / Reportar erro

EFEITOS DA COMPETIÇÃO LARVAL INTRA-ESPECÍFICA SOBRE CARACTERES BIOMÉTRICOS DE MUSCINA STABULANS (FALLÉN, 1817) (DIPTERA: MUSCIDAE) EM LABORATÓRIO

EFFECT OF LARVAL INTRAESPECIFIC COMPETITION ON THE BIOMETRIC CHARACTERS OF MUSCINA STABULANS (FALLÉN, 1817) (DIPTERA: MUSCIDAE) IN LABORATORY

RESUMO

O objetivo do trabalho foi investigar o efeito da competição intra-específica sobre características biométricas de Muscina stabulans (Fallén, 1817) (Diptera, Muscidae) em condições controladas de laboratório com a finalidade de aprimorar criações desta espécie. Dez densidades, a intervalos de 100, na faixa de 100 a 1.000 larvas foram colocadas em 50 g de substrato alimentar, e seu desenvolvimento foi acompanhado até a fase adulta. A alta densidade de larvas de M. stabulans reduz a viabilidade de larvas, peso das pupas e prolonga o período de desenvolvimento larval. Foi observado que a emergência decresceu em função da densidade larval, reduzindo também peso das fêmeas, fecundidade e investimento reprodutivo. Altos níveis de competição larval produzem adultos pequenos e de baixa fecundidade.

PALAVRAS-CHAVE
Substrato alimentar; Muscina stabulans ; densidade populacional; criação em laboratório

ABSTRACT

The objective of the work wasto investigate the effect of larval intraespecific competition on biometrics characteristics of Muscina stabulans (Fallén, 1817) (Diptera, Muscidae) under controlled laboratory conditions. Ten densities, ranging from 100 to 1,000 larvae per 50 g of food source were established, and their biological development observed until adult phase. The high density of larvae of M. stabulans reduced their viability, weight of pupae and extended the period of the larval development. It was observed that the emergency decreased in function of the larval density, also reducing weight of the females, fecundity and reproductive investment. High levels of larval competition produce small adults with low fecundity.

KEY WORDS
Alimentary substratum; Muscina stabulans ; population density; creation in laboratory

INTRODUÇÃO

Muscina stabulans (Fallén, 1817) (Diptera, Muscidae), conhecida como “falsa mosca dos estábulos”, é cosmopolita (SKIDMORE, 1985SKIDMORE, P. The biology of the Muscidae of the world. Dordecht: Kunk Publishers, 1985. 550 p.), sendo freqüente no sul do Brasil (RAFFI, 1997RAFFI, L.L. Exigências térmicas, longevidade e viabilidade dos estágios de desenvolvimento da Muscina stabulans Fallén, 1825 (Diptera: Muscidae), em condições de laboratório, em Pelotas, RS. 1997. 45f. Dissertação (Mestrado em Veterinária) – Departamento de Microbiologia e Parasitologia, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 1997.) e comumente encontrada em matéria orgânica animal em decomposição.

Suas larvas são saprófagas, tornando-se carnívoras facultativas no terceiro ínstar, podendo envolvendo no controle populacional de algumas espécies de Diptera por atacar as larvas que vivem no mesmo ambiente (LEGNER & DIETRICH, 1989LEGNER, E.F. & DIETRICH, E.J. Coexistence of predatory Muscina stabulans and Ophyra aenescens (Diptera: Muscidae) with dipterous prey in poultry manure. Entomophaga, v.34, p.453-461, 1989.), como Musca domestica Linnaeus, 1758 (Diptera, Muscidae) (SKIDMORE, 1985SKIDMORE, P. The biology of the Muscidae of the world. Dordecht: Kunk Publishers, 1985. 550 p.; CÁRCAMO et al., 2004CÁRCAMO, M.C.; WENDT, L. D.; RIBEIRO, P.B. Capacidade Predatória de larvas de Muscina stabulans F. (Diptera, Muscidae) sobre larvas de Musca domestica L. (Diptera, Muscidae). In: CONGRESSO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA, 13.; ENCONTRO DE PÓS-GRADUAÇÃO, 6., 2004, Pelotas, RS. Resumos. Pelotas: 2004.).

Os dípteros da família Muscidae são potenciais vetores de agentes etiológicos como: vírus, bactérias, cistos de protozoários e ovos de helmintos (GREENBERG, 1971GREENBERG, B (Ed.). Flies and disease – ecology, classification and biotic association. New Jersey: Princeton Univ. Press, 1971.). As moscas sinantrópicas também representam danos econômicos para criadores de animais através da redução de produtividade (LINHARES, 1989LINHARES, A.X. Perspectivas em controle de biológico de dípteros muscóides. In: SEMINÁRIO SOBRE INSETOS E ÁCAROS, 3., 1989, Campinas, SP. Resumos. Campinas: 1989. p.123-133.), visto que grandes populações têmse instalado nesses locais, onde a oferta de substrato para o desenvolvimento larval é grande (LOMÔNACO & PRADO, 1994LOMÔNACO, C. & PRADO, A. P. Estrutura comunitária e dinâmica populacional da fauna de dípteros e seus inimigos naturais em granjas avícolas. Anais da Sociedade Entomológica do Brasi, v.23, n.1, p.71-80. 1994.).

Dependendo das condições ambientais e disponibilidade de recursos poderá haver competição entre as larvas e por conseqüência quantidades variáveis de alimento disponível determinarão o tamanho do adulto, bem como a qualidade do alimento assimilado pelo inseto na fase larval (MUELLER, 1985MUELLER, L.D. The evolutionary ecology of Drosophila. Evolutionary Biology, v.19, p.37-98, 1985.; PROUT & MCCHESNEY, 1985PROUT, T. & MCCHESNEY, F. Competition among immatures affects their adult fertility: population dynamics. American Naturalist, v.126, p.521-558, 1985.). Esta relação interfere diretamente na dinâmica populacional dos adultos.

BAXTER & MORRISON (1983)BAXTER, J.A. & MORRISON , P.E. Dynamics of growth modified by larval population density in the flesh fly,Sarcophaga bullata. Canadian Journal of Zoology, v.61, p.512-517, 1983. incluem a densidade larval como um fator ambiental que pode delimitar o consumo dos recursos alimentares. Desta forma, a competição intra-específica está implícita na regulação do tamanho da população.

O conhecimento da capacidade de suporte da dieta, ou seja, a densidade larval tolerada por grama de substrato alimentar, também é de grande importância para otimização de uma criação em laboratório ou para a produção massal de insetos, visando o controle biológico. O presente trabalho teve como objetivo verificar os efeitos da competição intra-específica por alimento, em condições controladas, sobre as características biométricas de M. stabulans em meio artificial.

MATERIAL E MÉTODOS

Para a realização do experimento foi utilizada uma colônia de Muscina stabulans, já adaptada às condições de laboratório, com 24 gerações, mantida durante todo o período de experimentação em câmara climatizada com temperatura variando de 26º C ± 2º C, umidade relativa do ar acima de 75% e com fotofase de ± 12h, mantidas no Laboratório de Biologia de Insetos no Instituto de Biologia (IB) da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).

Os adultos foram mantidos em gaiolas teladas (30 x 30 x 30 cm) e alimentados com açúcar refinado e farinha de carne, em uma proporção de 2:1, respectivamente, sendo oferecida água em copos de becker com espuma de poliestireno cobrindo a superfície do líquido.

Para obtenção de larvas, foi exposto no interior das gaiolas, um recipiente contendo meio de cultura composto por farinha de carne e serragem, na proporção de 2:1 respectivamente, adicionando-se água em quantidade suficiente para torná-lo pastoso.

Dez densidades larvais foram estabelecidas por meio de contagem imediatamente após sua eclosão (a intervalos de 100, na faixa de 100 a 1.000 larvas) e transferidas para 50 g de substrato alimentar constituído por farinha de carne e farinha de trigo na proporção de 2,6:1, respectivamente. Para duas partes da mistura das farinhas, foi adicionada uma parte de serragem e água até tornar o meio pastoso.

Os recipientes contendo as larvas foram colocados no interior de potes contendo serragem umedecida, até uma altura de 5 cm aproximadamente. Estes foram fechados com tecido do tipo organza, sendo mantidos em estufa regulada à temperatura de 25ºC, umidade relativa de 80% e fotofase de 12h.

Foram montadas 3 réplicas para cada densidade, com observações diárias até a pupariação. Os dados relativos à viabilidade larval foram padronizados para cada densidade (VL = N/D.100), sendo N o número de larvas sobreviventes e D a densidade.

Após 48h da pupariação, trinta pupas de cada réplica foram escolhidas aleatoriamente e pesadas em balança analítica. Com a emergência, os adultos foram transferidos para gaiolas teladas onde receberam alimento e água. Foi oferecido meio para postura 48h após a emergência, que permaneceu durante 5 dias no interior das gaiolas. Após 15 dias de emergência, 90 fêmeas de cada densidade, coletadas aleatoriamente, foram anestesiadas com acetato de etila, pesadas e o abdome retirado para dissecação sob estereomicroscópio, verificando-se o número de ovos por fêmea. O investimento reprodutivo (COLLINS, 1980COLLINS, N.C. Developmental responses to food limitation as indicators of environmental conditions forEphydra cinerea Jones (Diptera). Ecology, v.61, p.650-661, 1980.) foi determinado pela divisão do número de ovos pelo peso fresco em gramas da fêmea.

Os resultados dos parâmetros: peso de pupas, período de desenvolvimento larval, peso das fêmeas, número de ovos e investimento reprodutivo, foram submetidos à análise de variância, sendo as médias comparadas pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade. Com relação às médias de número de ovos e investimento reprodutivo, os valores referentes à densidade de 1.000 larvas foram omitidos por apresentarem valores nulos e comprometerem as análises. Para a análise de correlação utilizou-se o Teste de Pearson, correlacionando a densidade larval com as variáveis: peso de pupas, número de ovos por fêmea e peso das fêmeas.

As comparações de freqüências das taxas de viabilidade larval, adultos emergidos e fêmeas fecundas foram realizadas pelo teste de regressão logística com intervalo de confiança de 95%.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A viabilidade larval de Muscina stabulans demonstrou uma tendência decrescente com o aumento da densidade larval, variando de 86,3% (100 larvas) a 62,9% (1.000 larvas) (Fig. 1). No modelo de regressão logística, utilizando-se a densidade de 100 larvas como referência, todos os outros tratamentos analisados apresentaram viabilidades inferiores à densidade padrão (P < 0,05 para todas as densidades). A viabilidade foi reduzida à medida que a densidade aumentou como conseqüência do aumento dos níveis de competição por limitação de recursos entre as larvas (MUELLER, 1988MUELLER, L.D. Density-dependent population growth and natural selection in food limited environments: the Drosophila model. American Naturalist, v.132, p.786-809, 1988.; VON ZUBEN, 1993VON ZUBEN, C.J. Competição larval em Chrysomya megacephala (Diptera: Calliphoridae): estimativas de perdas em biomassa e na fecundidade e cálculo da conversão de alimento em biomassa. Revista Brasileira de Entomologia, v.37, n.4, p.793-802, 1993.; SILVA et al., 2003SILVA, I.C.R.; MANCERA, P.F.; GODOY, W.A.C., Population dynamics ofLucilia eximia (Dipt., Calliphoridae).Journal of Applied Entomology, v.127, p.2-6, 2003.).

Fig. 1
Viabilidade de larvas de Muscina stabulans, em função da densidade larval, em condições de laboratório. Tº: 26º C ± 2º C, UR: acima de 75% e fotofase de ± 12h.
Fig. 2
Influência da densidade no período de desenvolvimento larval (Média ± Desvio Padrão) de Muscina stabulans, em condições de laboratório. Tº: 26º C ± 2º C, UR: acima de 75% e fotofase de ± 12h.
Fig. 3
Influência da densidade larval no peso de pupas (Média ± Desvio Padrão) de Muscina stabulans, em condições de laboratório. Tº: 26º C ± 2º C, UR: acima de 75% e fotofase de ± 12h.
Fig. 4
Emergência de Muscina stabulans, sob condições de laboratório, em função da densidade larval/recipiente. Tº: 26º C ± 2º C, UR: acima de 75% e fotofase de ± 12h.
Fig. 5
Influência da densidade larval no número de ovos por fêmea de Muscina stabulans, em condições de laboratório. Tº: 26º C ± 2º C, UR: acima de 75% e fotofase de ± 12h.
Fig. 6
Influência da densidade larval sobre a fecundidade e peso de fêmeas de Muscina stabulans, em condições de laboratório. Tº: 26º C ± 2º C, UR: acima de 75% e fotofase de ± 12 horas.

PROUT & MCCHESNEY (1985)PROUT, T. & MCCHESNEY, F. Competition among immatures affects their adult fertility: population dynamics. American Naturalist, v.126, p.521-558, 1985. destacaram a importância da viabilidade, uma vez que esta característica biométrica influencia a dinâmica populacional.

Para insetos, particularmente moscas, o principal período de limitação de recursos alimentares é o estágio larval, e seu modo de competição em substratos discretos e efêmeros é geralmente do tipo “por exploração”, em que as larvas competem por alimento e cada uma procura ingerir o máximo de alimento no menor intervalo de tempo possível, antes da completa exaustão dos recursos (ULLYETT, 1950ULLYETT, G.C. Competition for food and allied phenomena in sheep-blowfly populations. PhilosophicalTransactions of the Royal Society of London, v.234, p.77-174, 1950.; BAKKER, 1961BAKKER, K. An analysis of factors which determine the success in competition for food among larvae of Drosophila melanogaster. Archives Neerlandaises de Zoologie, v.14, p.200-281, 1961.; LEVOT et al., 1979LEVOT, G.W.; BROWN, K.R.; SHIPP, E. Larval growth of some calliphorid and sarcophagid Diptera. Bulletin of Entomological Research, v.69, p.469-475, 1979.).

O período de desenvolvimento larval de M. stabulans variou de 6,1 dias ± 0,8 a 10,6 dias ± 1,4. À medida que a densidade aumentou, ocorreu uma tendência ao aumento do período de desenvolvimento larval, observando-se diferenças significativas entre as diferentes densidades (P = 0,0000 e F = 1365,36).

O período de desenvolvimento larval foi inversamente proporcional ao peso das pupas, sugerindo que o aumento no tempo de desenvolvimento possa ter ocorrido por atraso dos indivíduos na obtenção do peso mínimo necessário para pupariação, permanecendo mais tempo no substrato alimentar para a aquisição de peso (ROPER et al., 1996ROPER, C.; PIGNATELLI, P.; PARTRIDGE, L. Evolutionary responses of Drosophila melanogaster life history to differences in larval density. Journal of Evolutionary Biology, v.9, p.609-622, 1996.) devido às dificuldades para a obtenção do recurso.

Analogamente, o custo adicional para obtenção de recursos nutritivos pode ter sido compensado pela redução do peso das pupas, que diminuiu em função da densidade larval, confirmado pelo teste de Pearson, cujo índice de correlação foi de – 0,51. Foi verificada diferença significativa entre as densidades (P = 0,0000; F = 117,65) e a comparação de médias mostrou que dentre as densidades, algumas não apresentaram diferenças entre si, como as de 100 e 200; 300 e 400; 500, 600 e 700; 600 e 1.000; 800, 900 e 1.000 larvas.

As médias de peso obtidas para as densidades menores foram de 31,7 mg ± 4,1 e 31,4 mg ± 3,7 (100 e 200 larvas respectivamente) diferindo das maiores concentrações larvais com pesos de 18,8 mg ± 3,6 e 19,9 mg ± 3,9 (900 e 1.000 larvas respectivamente).

Crescentes níveis de competição larval por alimento em insetos produzem um efeito significativo sobre o número de adultos emergidos, fato que está relacionado com o peso das pupas (BARKER & KREBS, 1995BARKER, J.S.F. & KREBS, R.A. Genetic variation and plasticity of thorax length and wing length in Drosophila aldrichi and D. buzzatii. Journal of Evolutionary Biology, v.8, p.689-709, 1995.; MOE et al., 2002MOE, S.J.; STENSETH, N.C.; SMITH, R.H. Density dependence in blowfly populations: experimental evaluation of non-parametric time-series modeling. Oikos, v.98, p.523–533, 2002.), ou seja, quanto menor o peso das pupas, menor será a viabilidade pupal e, conseqüentemente, menor a taxa de emergência dos adultos. Resultados semelhantes foram observados por TARDELLI et al. (2004)TARDELLI, C.A.; GODOY, W.A.C.; MANCERA, P.F.A. Population Dynamics of Musca domestica (Diptera: Muscidae): Experimental and Theoretical Studies at Different Temperatures. Brazilian Archives of Biology and Technology v.47, n.5, p. 775-783, 2004. para M. domestica e para espécies da família Calliphoridae por diversos autores (VON ZUBEN et al., 1993VON ZUBEN, C.J. Competição larval em Chrysomya megacephala (Diptera: Calliphoridae): estimativas de perdas em biomassa e na fecundidade e cálculo da conversão de alimento em biomassa. Revista Brasileira de Entomologia, v.37, n.4, p.793-802, 1993.; GODOY et al., 1993GODOY, W.A.C.; REIS, S.F.; VON ZUBEN, C.J.; RIBEIRO, O.B., Population dynamics of Chrysomya putoria (Diptera: Calliphoridae). Journal of Applied Entomology, v.116, p.163-169, 1993.; GODOY et al., 1997GODOY, W.A.C.; VON ZUBEN, C.J.; REIS, S.F.; VON ZUBEN, F.J. The spatial dynamics of native and introduced blowflies (Dipt. Calliphoridae). Journal of Applied Entomology, v.121, p.305-309, 1997.; GODOY et al., 2001GODOY, W.A.C.; VON ZUBEN, C.J.; REIS, S.F.; VON ZUBEN, F.J. Spatio-temporal dynamics and transition from asymptotic to bounded oscillations in Chrysomyaalbiceps (Diptera, Calliphoridae). Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, v.96, p.627-634, 2001.; REIS et al., 1996REIS, S.F.; TEIXEIRA, M.A.; VON ZUBEN, F.J.; GODOY, W.A.C.; VON ZUBEN, C.J. Theoretical dynamics of experimental populations of introduced and native blowflies.Journal of Medical Entomology, v.33, p.537-544, 1996.; MOE et al., 2002MOE, S.J.; STENSETH, N.C.; SMITH, R.H. Density dependence in blowfly populations: experimental evaluation of non-parametric time-series modeling. Oikos, v.98, p.523–533, 2002.; SILVA et al., 2003SILVA, I.C.R.; MANCERA, P.F.; GODOY, W.A.C., Population dynamics ofLucilia eximia (Dipt., Calliphoridae).Journal of Applied Entomology, v.127, p.2-6, 2003.).

No presente estudo, utilizando a densidade de 100 larvas como referência para o modelo de regressão logística, os demais tratamentos apresentaram valores de emergência inferiores (P < 0,05 para todas as densidades), indicando que esta taxa diminui em função da densidade larval. Os valores de emergência variaram de 93,44% a 65,68% (Fig. 4).

A redução no tamanho das fêmeas produz um importante efeito na dinâmica de população, já que as fêmeas pequenas têm a fecundidade diminuída (MUELLER, 1988MUELLER, L.D. Density-dependent population growth and natural selection in food limited environments: the Drosophila model. American Naturalist, v.132, p.786-809, 1988.; VON ZUBEN et al., 1993VON ZUBEN, C.J.V.; REIS, S.F.; VAL, J.B.R.; GODOY, W.A.C.; RIBEIRO, O.B., Dynamics of mathemathical model of Chrysomya megacephala (Diptera: Calliphoridae). Journal of Medical Entomology, v.30, p. 443–448, 1993.; GODOY et al., 1993GODOY, W.A.C.; REIS, S.F.; VON ZUBEN, C.J.; RIBEIRO, O.B., Population dynamics of Chrysomya putoria (Diptera: Calliphoridae). Journal of Applied Entomology, v.116, p.163-169, 1993.; REIS et al., 1996REIS, S.F.; TEIXEIRA, M.A.; VON ZUBEN, F.J.; GODOY, W.A.C.; VON ZUBEN, C.J. Theoretical dynamics of experimental populations of introduced and native blowflies.Journal of Medical Entomology, v.33, p.537-544, 1996.; GODOY et al., 1997GODOY, W.A.C.; VON ZUBEN, C.J.; REIS, S.F.; VON ZUBEN, F.J. The spatial dynamics of native and introduced blowflies (Dipt. Calliphoridae). Journal of Applied Entomology, v.121, p.305-309, 1997.; GODOY et al., 2001GODOY, W.A.C.; VON ZUBEN, C.J.; REIS, S.F.; VON ZUBEN, F.J. Spatio-temporal dynamics and transition from asymptotic to bounded oscillations in Chrysomyaalbiceps (Diptera, Calliphoridae). Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, v.96, p.627-634, 2001.; SILVA et al., 2003SILVA, I.C.R.; MANCERA, P.F.; GODOY, W.A.C., Population dynamics ofLucilia eximia (Dipt., Calliphoridae).Journal of Applied Entomology, v.127, p.2-6, 2003.; TARDELLI et al., 2004TARDELLI, C.A.; GODOY, W.A.C.; MANCERA, P.F.A. Population Dynamics of Musca domestica (Diptera: Muscidae): Experimental and Theoretical Studies at Different Temperatures. Brazilian Archives of Biology and Technology v.47, n.5, p. 775-783, 2004.).

Em relação ao número de ovos, verificou-se redução nos valores de fecundidade, em função da densidade larval. A correlação entre o número de ovos/ fêmea e a densidade mostrou-se inversamente proporcional e o índice de correlação foi de -0,51. Ocorreu uma variação média de 97,7 ovos (100 larvas) a 71,9 ovos (1.000 larvas), quando avaliadas somente as fêmeas que possuíam ovos e 93,9 ovos (100 larvas) a 10,4 ovos (1.000 larvas), quando todas as fêmeas foram avaliadas em conjunto.

Avaliando-se a densidade de 1.000 larvas, obtevese uma queda muito acentuada no número de ovos/fêmea (10,4 ovos). Este fato se deve ao grande número de indivíduos sem a presença de ovos, pois das 90 fêmeas analisadas somente 14,44% apresentavam ovos. Porém, quando consideradas apenas as fêmeas que apresentaram ovos, um alto valor (71,9 ovos) foi obtido (Fig. 5).

Analisando-se o peso das fêmeas e fecundidade (Fig. 6), observa-se que o peso das fêmeas fecundas e não fecundas, reduziram de forma inversamente proporcional a densidade larval, sendo o peso das fêmeas não fecundas inferior em todas as densidades, constatando-se que quando o peso das fêmeas é inferior ao peso médio de 15,68 mg, ocorre uma redução considerável na fecundidade.

Utilizando-se a densidade de 100 larvas como referência para regressão logística analisando-se as fêmeas fecundas, as diferentes densidades apresentaram-se inferiores em relação à densidade modelo (P < 0,05), com a exceção das densidades 200 (P = 0,87), 300 (P = 0,30) e 500 larvas (P = 0,07), que apresentaram similaridade com a densidade padrão. Observou-se queda no número de fêmeas fecundas em função da densidade larval, sendo que na faixa de 100 a 700 larvas, mais de 80% das fêmeas possuíam ovos, e nas três maiores densidades (800 a 1.000) a média de fêmeas fecundas variou de 70% a 14,44%.

Altos níveis de competição larval em populações naturais de moscas geralmente produzem um grande número de indivíduos de pequeno tamanho e baixa fecundidade (VON ZUBEN et al., 2000VON ZUBEN, C.J.; STANGENHAUS, G.; GODOY, W.A.C. Competição larval em Chrysomya megacephala (F.) (Diptera: Calliphoridae): efeitos de diferentes níveis de agregação larval sobre estimativas de peso, fecundidade e investimento reprodutivo. Revista Brasileira de Biologia, v.60, n.2, p.195-203, 2000.). Este decréscimo no número de ovos em função da densidade larval é citado para várias espécies, como Cochliomyia macellaria (Fabricius, 1775), Chrysomya putoria (Wiedemann,1830), Chrysomya megacephala (Fabricius, 1794), Chrysomya albiceps (Wiedmann, 1819) e Lucilia eximia (Wiedemann, 1819) (VON ZUBEN, 1993VON ZUBEN, C.J.V.; REIS, S.F.; VAL, J.B.R.; GODOY, W.A.C.; RIBEIRO, O.B., Dynamics of mathemathical model of Chrysomya megacephala (Diptera: Calliphoridae). Journal of Medical Entomology, v.30, p. 443–448, 1993.; RIBEIRO et al., 1993RIBEIRO, O.B.; PRADO, A.P.; GUIMARÃES, J.H. Competiçãointraespecífica em Chrysomya putoria (Wiedemann, 1983) (Diptera, Calliphoridae) em meio artificial. Revista Brasileira de Entomologia, v.37, p.641-652, 1993.; REIS et al., 1996REIS, S.F.; TEIXEIRA, M.A.; VON ZUBEN, F.J.; GODOY, W.A.C.; VON ZUBEN, C.J. Theoretical dynamics of experimental populations of introduced and native blowflies.Journal of Medical Entomology, v.33, p.537-544, 1996.; GODOY et al., 1997GODOY, W.A.C.; VON ZUBEN, C.J.; REIS, S.F.; VON ZUBEN, F.J. The spatial dynamics of native and introduced blowflies (Dipt. Calliphoridae). Journal of Applied Entomology, v.121, p.305-309, 1997.; GODOY et al., 2001GODOY, W.A.C.; VON ZUBEN, C.J.; REIS, S.F.; VON ZUBEN, F.J. Spatio-temporal dynamics and transition from asymptotic to bounded oscillations in Chrysomyaalbiceps (Diptera, Calliphoridae). Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, v.96, p.627-634, 2001.; VON ZUBEN et al., 2000VON ZUBEN, C.J.; STANGENHAUS, G.; GODOY, W.A.C. Competição larval em Chrysomya megacephala (F.) (Diptera: Calliphoridae): efeitos de diferentes níveis de agregação larval sobre estimativas de peso, fecundidade e investimento reprodutivo. Revista Brasileira de Biologia, v.60, n.2, p.195-203, 2000.; SILVA et al., 2003SILVA, I.C.R.; MANCERA, P.F.; GODOY, W.A.C., Population dynamics ofLucilia eximia (Dipt., Calliphoridae).Journal of Applied Entomology, v.127, p.2-6, 2003.).

Tabela 1
Influência da densidade larval sobre medidas biométricas de fêmeas de Muscina stabulans, em condições de laboratório.

As letras iguais ao lado das médias indicam subconjuntos de médias que não diferem significativamente entre si, ao nível de 0,05 de significância.

O peso das fêmeas foi inversamente proporcional à densidade larval, com índice de correlação de -0,66 (Tabela 1). A média de peso variou de 26,07 mg a 15,68 mg em função da densidade, demonstrando ser significativamente diferente (P = 0,0013; F = 80,30), o que também foi verificado para o número de ovos por fêmea nas diferentes densidades (P = 0,0006 e F = 36,19). Para o investimento reprodutivo, a análise de variância indicou uma variação significativa (P = 0,0001 e F = 4,09), embora a oscilação entre as médias tenha sido pouco acentuada (Tabela 1).

As larvas de dípteros ciclorrafos, além de sofrerem os efeitos da competição intraespecífica, estão também expostas às implicações dos próprios inimigos naturais; estes fatores irão repercutir na população adulta, com conseqüências na fecundidade (ULLYETT, 1950ULLYETT, G.C. Competition for food and allied phenomena in sheep-blowfly populations. PhilosophicalTransactions of the Royal Society of London, v.234, p.77-174, 1950.; LEVOT et al., 1979LEVOT, G.W.; BROWN, K.R.; SHIPP, E. Larval growth of some calliphorid and sarcophagid Diptera. Bulletin of Entomological Research, v.69, p.469-475, 1979.). Existe uma concordância geral de que a densidade constitui um fator de stress, por decorrência dos efeitos da competição por recursos, juntamente com as alterações químicas que ocorrem no substrato alimentar devido ao metabolismo larval (BUBLI et al., 1998BUBLI, O.A.; IMASHEVA, A.G.; LOESCHCKE, V. Selection for knockdown resistance to heat in Drosophilamelanogaster at high and low larval densities. Evolution, v.52, p.619-625, 1998.).

A competição intraespecífica por alimento de larvas de Muscina stabulans, indicou que a densidade populacional atua como um fator limitante à sobrevivência da espécie. Os efeitos deste comportamento atuam sobre a população, e sua disponibilidade determina o tamanho do adulto afetando a fecundidade e consequentemente a dinâmica da população. No presente estudo, todos os parâmetros analisados tiveram influência do aumento das densidades larvais verificando-se um desempenho superior dos insetos nas menores densidades.

CONCLUSÕES

Sob as condições deste experimento, pode-se concluir que:

  • ◊ A alta densidade de larvas de Muscina stabulans diminui a viabilidade larval, prolonga o período de larva e reduz o peso das pupas.

  • ◊ Quanto aos parâmetros relacionados aos adultos, há redução da emergência em função da densidade, influenciando também as características biométricas como: peso das fêmeas, fecundidade e investimento reprodutivo.

  • ◊ Altos níveis de competição larval produzem adultos pequenos e de baixa fecundidade.

REFERÊNCIAS

  • BAKKER, K. An analysis of factors which determine the success in competition for food among larvae of Drosophila melanogaster Archives Neerlandaises de Zoologie, v.14, p.200-281, 1961.
  • BARKER, J.S.F. & KREBS, R.A. Genetic variation and plasticity of thorax length and wing length in Drosophila aldrichi and D. buzzatii Journal of Evolutionary Biology, v.8, p.689-709, 1995.
  • BAXTER, J.A. & MORRISON , P.E. Dynamics of growth modified by larval population density in the flesh fly,Sarcophaga bullata Canadian Journal of Zoology, v.61, p.512-517, 1983.
  • BUBLI, O.A.; IMASHEVA, A.G.; LOESCHCKE, V. Selection for knockdown resistance to heat in Drosophilamelanogaster at high and low larval densities. Evolution, v.52, p.619-625, 1998.
  • CÁRCAMO, M.C.; WENDT, L. D.; RIBEIRO, P.B. Capacidade Predatória de larvas de Muscina stabulans F. (Diptera, Muscidae) sobre larvas de Musca domestica L. (Diptera, Muscidae). In: CONGRESSO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA, 13.; ENCONTRO DE PÓS-GRADUAÇÃO, 6., 2004, Pelotas, RS. Resumos Pelotas: 2004.
  • COLLINS, N.C. Developmental responses to food limitation as indicators of environmental conditions forEphydra cinerea Jones (Diptera). Ecology, v.61, p.650-661, 1980.
  • GODOY, W.A.C.; REIS, S.F.; VON ZUBEN, C.J.; RIBEIRO, O.B., Population dynamics of Chrysomya putoria (Diptera: Calliphoridae). Journal of Applied Entomology, v.116, p.163-169, 1993.
  • GODOY, W.A.C.; VON ZUBEN, C.J.; REIS, S.F.; VON ZUBEN, F.J. Spatio-temporal dynamics and transition from asymptotic to bounded oscillations in Chrysomyaalbiceps (Diptera, Calliphoridae). Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, v.96, p.627-634, 2001.
  • GODOY, W.A.C.; VON ZUBEN, C.J.; REIS, S.F.; VON ZUBEN, F.J. The spatial dynamics of native and introduced blowflies (Dipt. Calliphoridae). Journal of Applied Entomology, v.121, p.305-309, 1997.
  • GREENBERG, B (Ed.). Flies and disease – ecology, classification and biotic association New Jersey: Princeton Univ. Press, 1971.
  • LEGNER, E.F. & DIETRICH, E.J. Coexistence of predatory Muscina stabulans and Ophyra aenescens (Diptera: Muscidae) with dipterous prey in poultry manure. Entomophaga, v.34, p.453-461, 1989.
  • LEVOT, G.W.; BROWN, K.R.; SHIPP, E. Larval growth of some calliphorid and sarcophagid Diptera. Bulletin of Entomological Research, v.69, p.469-475, 1979.
  • LINHARES, A.X. Perspectivas em controle de biológico de dípteros muscóides. In: SEMINÁRIO SOBRE INSETOS E ÁCAROS, 3., 1989, Campinas, SP. Resumos Campinas: 1989. p.123-133.
  • LOMÔNACO, C. & PRADO, A. P. Estrutura comunitária e dinâmica populacional da fauna de dípteros e seus inimigos naturais em granjas avícolas. Anais da Sociedade Entomológica do Brasi, v.23, n.1, p.71-80. 1994.
  • MOE, S.J.; STENSETH, N.C.; SMITH, R.H. Density dependence in blowfly populations: experimental evaluation of non-parametric time-series modeling. Oikos, v.98, p.523–533, 2002.
  • MUELLER, L.D. Density-dependent population growth and natural selection in food limited environments: the Drosophila model. American Naturalist, v.132, p.786-809, 1988.
  • MUELLER, L.D. The evolutionary ecology of Drosophila Evolutionary Biology, v.19, p.37-98, 1985.
  • PROUT, T. & MCCHESNEY, F. Competition among immatures affects their adult fertility: population dynamics. American Naturalist, v.126, p.521-558, 1985.
  • RAFFI, L.L. Exigências térmicas, longevidade e viabilidade dos estágios de desenvolvimento da Muscina stabulans Fallén, 1825 (Diptera: Muscidae), em condições de laboratório, em Pelotas, RS. 1997. 45f. Dissertação (Mestrado em Veterinária) – Departamento de Microbiologia e Parasitologia, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 1997.
  • REIS, S.F.; TEIXEIRA, M.A.; VON ZUBEN, F.J.; GODOY, W.A.C.; VON ZUBEN, C.J. Theoretical dynamics of experimental populations of introduced and native blowflies.Journal of Medical Entomology, v.33, p.537-544, 1996.
  • RIBEIRO, O.B.; PRADO, A.P.; GUIMARÃES, J.H. Competiçãointraespecífica em Chrysomya putoria (Wiedemann, 1983) (Diptera, Calliphoridae) em meio artificial. Revista Brasileira de Entomologia, v.37, p.641-652, 1993.
  • ROPER, C.; PIGNATELLI, P.; PARTRIDGE, L. Evolutionary responses of Drosophila melanogaster life history to differences in larval density. Journal of Evolutionary Biology, v.9, p.609-622, 1996.
  • SILVA, I.C.R.; MANCERA, P.F.; GODOY, W.A.C., Population dynamics ofLucilia eximia (Dipt., Calliphoridae).Journal of Applied Entomology, v.127, p.2-6, 2003.
  • SKIDMORE, P. The biology of the Muscidae of the world Dordecht: Kunk Publishers, 1985. 550 p.
  • TARDELLI, C.A.; GODOY, W.A.C.; MANCERA, P.F.A. Population Dynamics of Musca domestica (Diptera: Muscidae): Experimental and Theoretical Studies at Different Temperatures. Brazilian Archives of Biology and Technology v.47, n.5, p. 775-783, 2004.
  • ULLYETT, G.C. Competition for food and allied phenomena in sheep-blowfly populations. PhilosophicalTransactions of the Royal Society of London, v.234, p.77-174, 1950.
  • VON ZUBEN, C.J. Competição larval em Chrysomya megacephala (Diptera: Calliphoridae): estimativas de perdas em biomassa e na fecundidade e cálculo da conversão de alimento em biomassa. Revista Brasileira de Entomologia, v.37, n.4, p.793-802, 1993.
  • VON ZUBEN, C.J.V.; REIS, S.F.; VAL, J.B.R.; GODOY, W.A.C.; RIBEIRO, O.B., Dynamics of mathemathical model of Chrysomya megacephala (Diptera: Calliphoridae). Journal of Medical Entomology, v.30, p. 443–448, 1993.
  • VON ZUBEN, C.J.; STANGENHAUS, G.; GODOY, W.A.C. Competição larval em Chrysomya megacephala (F.) (Diptera: Calliphoridae): efeitos de diferentes níveis de agregação larval sobre estimativas de peso, fecundidade e investimento reprodutivo. Revista Brasileira de Biologia, v.60, n.2, p.195-203, 2000.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2006

Histórico

  • Recebido
    03 Abr 2006
  • Aceito
    02 Jun 2006
Instituto Biológico Av. Conselheiro Rodrigues Alves, 1252 - Vila Mariana - São Paulo - SP, 04014-002 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: arquivos@biologico.sp.gov.br