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AVALIAÇÃO DO POTENCIAL DA PLANTA ADIANTUM CAPILLUS-VENERIS (L.) NO CONTROLE DE FITOPATÓGENOS

EVALUATION OF THE POTENTIAL OF THE MEDICINAL PLANT ADIANTUM CAPILLUSVENERIS (L.) FOR THE CONTROL OF PHYTOPATHOGENS

RESUMO

O uso de compostos secundários de plantas medicinais, com propriedades antimicrobianas, pode ser uma alternativa para o controle de fitopatógenos. Diante disso, este trabalho teve como objetivo avaliar a atividade antimicrobiana de derivados obtidos da planta Adiantum capillus-veneris (avenca) contra fungos e bactérias fitopatogênicos. Os derivados, obtidos do pó de folhas de avenca secas ao ar, foram preparados por infusão, maceração e decocção, autoclavados ou não, nas concentrações de 0,1%, 0,25%, 0,5%, 1%, 1,25%, 2,5%, 5%, 10% e 20%. Foram avaliadas a germinação de esporos dos fungos Phakopsora euvitis e Pseudocercospora vitis, o crescimento micelial dos fungos Colletotrichum musae e Sclerotium rolfsii e a multiplicação das bactérias Erwinia sp. e Bacillus subtilis. O extrato obtido por maceração não autoclavado foi o que apresentou maior efeito sobre P. euvitis e P. vitis com reduções de 75% e 99% na germinação de esporos na concentração de 20%, respectivamente. O menor crescimento micelial de C. musae e S. rolfsii foi obtido pelo macerado autoclavado, com redução de 39% e 83%, respectivamente. Para Erwinia sp., o maior efeito inibitório foi obtido com o macerado autoclavado que, na concentração de 25%, inibiu 99% a multiplicação bacteriana. Para B. subtilis, não houve inibição significativa. Esses resultados indicam o potencial de derivados de avenca para o controle de fitopatógenos.

PALAVRAS-CHAVE
Controle alternativo; planta medicinal; decocção; maceração; infusão

ABSTRACT

The use of secondary compounds of medicinal plants, with antimicrobial properties, can be an alternative for the control of phytopathogens. The aim of the present study was to evaluate the antimicrobial activity of derivatives obtained from the medicinal plant Adiantum capillus-veneris (maidenhair fern) against phytopathogenic fungi and bacteria. The derivatives, obtained from the powder of shadow-dried maidenhair fern leaves, were prepared by infusion, maceration and decoction, autoclaved and non-autoclaved, in the concentration of 0.1%, 0.25%, 0.5%, 1%, 1.25%, 2.5%, 5%, 10%, and 20%. The germination of Phakopsora euvitis and Pseudocercospora vitis spores, the mycelial growth of Colletotrichum musae and Sclerotium rolfsii, and the multiplication of Erwinia sp. and Bacillus subtilis bacteria were evaluated. The extract obtained by non-autoclaved maceration presented the best effect against P. euvitis, with reduction of 75% on uredospores germination in the concentration of 20%. Against P. vitis, the derivative obtained by non-autoclaved maceration was more effective, presenting 99% of reduction on conidia germination in the concentration of 20%. The smallest mycelial growth of C. musae and S. rolfsii was obtained by autoclaved maceration with 39% and 83% reduction, respectively. For Erwinia sp., the greatest inhibitory effect was obtained with the 25% autoclaved maceration that inhibited the bacterial growth at 99%. For B. subtilis, there was no significant inhibition. These results indicate the potential of maidenhair fern derivatives for the control of phytopathogens.

KEY WORDS
Alternative control; medicinal plant; decoction; maceration; infusion

INTRODUÇÃO

Com o crescente desenvolvimento de tecnologias voltadas para a agricultura, são evidentes os incrementos na utilização de insumos, em especial de pesticidas. O uso de pesticidas vem contribuindo para o aumento da produtividade agrícola, mas também tem sido responsável por efeitos adversos sobre o meio ambiente e a saúde humana (Stangarlin et al., 1999STANGARLIN, J.R.; SCHWAN-ESTRADA, K.R.F.; CRUZ, M.E.S.; NOZAKI, M.H. Plantas medicinais e controle alternativo de fitopatógenos. Biotecnologia, Ciência e Desenvolvimento, v.11, p.16-21, 1999.). Isso se traduz pelo acúmulo de resíduos tóxicos ao longo da cadeia trófica, com impactos em longo prazo e danos a flora e a fauna, bem como às atividades produtivas diretamente dependentes de uso de recursos naturais, à vida selvagem, a piscicultura, aos insetos benéficos e mesmo ao homem (Borem, 2001BORÉM, A. Melhoramento de plantas. 3.ed. Viçosa: UFV, 2001. 500p.). Além disso, o alto custo, o aumento da resistência dos fitopatógenos a esses produtos químicos (Ghini; Kimati, 2000GHINI, R.; KIMATI, H. Resistência de fungos a fungicidas. Jaguariúna, SP: Embrapa Meio Ambiente, 2000. 78p.) e a conscientização do consumidor na procura de alimentos sem resíduos de pesticidas, têm levado à necessidade de se obter produtos alternativos para controle de doenças em plantas (Nakasone et al., 1999NAKASONE, A.K.; BETTIOL, W.; SOUZA, R.M. The effect of water extracts of organic matter on plants. Summa Phytopathologica, v.25, n.4, p.330-335, 1999.).

As plantas medicinais possuem compostos secundários que tanto podem ter ação fungitóxica (ação antimicrobiana direta) (Schwan-Estrada et al., 2003SCHWAN-ESTRADA, K.R.F.; STANGARLIN, J.R.; CRUZ, M.E.S. Uso de plantas medicinais no controle de doenças de plantas. Fitopatologia Brasileira, v.8, p.54-56, 2003.) como elicitora, ativando mecanismos de defesa nas plantas (ação indireta) (Schwan-Estrada; Stangarlin, 2005SCHWAN-ESTRADA, K.R.F.; STANGARLIN, J.R. Extratos e óleos essenciais de plantas medicinais na indução de resistência. In: CAVALCANTI, L.S.; DI PIERO, R.M.; CIA, P.; PASCHOLATI, S.F.; RESENDE, M.L.; ROMEIRO, R.S. (Ed.). Indução de resistência em plantas a patógenos e insetos. Piracicaba: FEALQ, 2005. p.125-138.). Na literatura é possível encontrar vários trabalhos que utilizam as propriedades antimicrobianas dos compostos secundários de plantas medicinais para o controle de agentes fitopatogênicos, como de Achillea millefolium. Cymbopogon citratus, Eucalyptus citriodora e Ageratum conyzoides contra Didymella bryoniae (Fiori et al., 2000FIORI, A.C.G.; SCHWAN-ESTRADA, K.R.F.; STANGARLIN, J.R.; VIDA, J.B., SCAPIM, C.A.; CRUZ, M.E.S.; PASCHOLATI, S.F. Antifungal activity of leaf extracts and essential oils of some medicinal plants against Didymella bryoniae. Journal of Phytopathology, v.148, p.483-487, 2000.), de Baccharis trimera contra Staphylococcus aureus e Streptococcus uberis (Avancini et al., 2000AVANCINI, C.A.M.; WIEST, J.M.; MUNDSTOCK, E. Atividade bacteriostática e bactericida do decocto de Baccharis trimera (Less.) D.C., Compositae, carqueja, como desinfetante ou anti-séptico. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.52, n.3, p.230-234, 2000.), de Artemisia camphorata contra Bipolaris sorokiniana (Franzener et al., 2003FRANZENER, G.; STANGARLIN, J.R.; SCHWAN-ESTRADA, K.R.F.; CRUZ, M.E.S. Atividade antifúngica e indução de resistência em trigo a Bipolaris sorokiniana por Artemisia camphorata. Acta Scientiarum, v.25, n.2, p.503-507, 2003.), de E. citriodora contra Colletotrichum lagenarium (Bonaldo et al., 2004BONALDO, S.M.; SCHWAN-ESTRADA, K.R.F.; STANGARLIN, J.R.; TESSMANN, D.J.; SCAPIM, C.A. Fungitoxicidade, atividade elicitora de fitoalexinas e proteção de pepino contra Colletotrichum lagenarium, pelo extrato aquoso de Eucalyptus citriodora. Fitopatologia Brasileira, v.29, n.2, p.128-134, 2004.), de Curcuma longa contra Alternaria solani (Balbi-Peña et al., 2006BALBI-PEÑA, M. I.; BECKER, A.; STANGARLIN, J.R.; FRANZENER, G.; LOPES, M.C.; SCHWAN-ESTRADA, K.R.F. Controle de Alternaria solani em tomateiro por extrato de Curcuma longa e curcumina- I. Avaliação in vitro. Fitopatologia Brasileira, v.31, n.3, p.310-314, 2006.) e contra Xanthomonas axonopodis pv manihotis (Kuhn et al., 2006KUHN, O.J.; PORTZ, R.L., STANGARLIN, J.R., DEL ÁGUILA, R.M., SCHWAN-ESTRADA, K.R.F.; FRANZENER, G. Efeito do extrato aquoso de cúrcuma (Curcuma longa) em Xanthomonas axonopodis pv. manihotis. Semina- Ciências Agrárias, v.27, n.1, p.13-20, 2006.) e de Zingiber officinalis contra Helminthosporium spp. (Rodrigues et al., 2006RODRIGUES, E.; SCHWAN-ESTRADA, K.R.F.; STANGARLIN, J.R.; CRUZ, M.E.S.; FIORI-TUTIDA, A.C.G. Avaliação da atividade antifúngica de extratos de gengibre e eucalipto in vitro e em fibras de bananeira infectadas com Helminthosporium spp. Acta Scientiarum Agronomy, v.28, n.1, p.123-127, 2006.).

A avenca (Adiantum capillus-veneris L.), também conhecida como cabelo de Vênus, é uma planta medicinal perene que cresce em lugares úmidos, em geral onde a luz é escassa. Originária da Inglaterra, Europa central e meridional, pertence à família Adiantaceae. Possui compostos fenólicos como o ácido gálico, mucilagens, taninos, carboidratos, diversos princípios amargos como a capilarina e pequena quantidade de óleo essencial (Teske; Trentini, 1997TESKE, M.; TRENTINI, A.M.M. Compêndio de fitoterapia. Curitiba: Herbarium, Laboratório Botânico, 1997. 317p.; Proença et al., 2003PROENÇA, A.C.; ROQUE, A.P.; RODRIGUES, O. Plantas e produtos vegetais em fitoterapia. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003. 701p.). É tradicionalmente usada como planta medicinal para uso expectorante, diurético, tônico capilar, infecções com catarro, doenças do tórax, tratamento de tumor no baço e possui propriedades anticancerígenas (Guha et al., 2005GUHA, G.P.; MUKHOPADHYAY, R.; GUPTA, K. Antifungal activity of the crude extracts and extracted phenols from gametophytes and sporophytes of two species of Adiantum. Taiwania, v.50, n.4, p.272-283, 2005.). Extratos utilizando partes aéreas desta planta foram testados apresentando efeito antifúngico (Guha et al., 2005GUHA, G.P.; MUKHOPADHYAY, R.; GUPTA, K. Antifungal activity of the crude extracts and extracted phenols from gametophytes and sporophytes of two species of Adiantum. Taiwania, v.50, n.4, p.272-283, 2005.), inclusive contra Candida albicanis (Ezzat, 2001EZZAT, S.M. In vitro inhibition of Candida albicans growth by plant extracts and essential oils. World Journal of Microbiology & Biotechnology, v.17, p.757-759, 2001.) e antibacteriano contra Bacillus subtilis. Escherichia coli. S. aureus. Proteus vulgaris e Pseudomonas aeruginosa (Raintree, 2006RAINTREE, N. Biological activity for extracts of avenca (Adiantum capillus-veneris). Disponível em: <http//:www.rain-tree.com/avenca-activity.pdf>. Acesso em: 11 set. 2006.
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).

O objetivo deste trabalho foi verificar a atividade antimicrobiana de derivados obtidos de avenca contra os fungos Phakopsora euvitis. Pseudocercospora vitis. Sclerotium rolfsii e Colletotrichum musae e as bactérias Erwinia sp. e Bacillus subtilis.

MATERIAL E MÉTODOS

Obtenção do extrato e preparo dos tratamentos

O extrato foi obtido a partir de folhas da planta medicinal Adiantum capillus-veneris (avenca), cultivada em latossolo eutroférrico em condições de sombreamento natural. As folhas, coletadas nos meses de outubro e novembro, foram secas por 10 dias em ambiente sombreado e arejado à temperatura de 25o C, trituradas em moinho para obtenção do pó vegetal e conservadas em local fresco ao abrigo da luz (Teske; Trentini, 1997TESKE, M.; TRENTINI, A.M.M. Compêndio de fitoterapia. Curitiba: Herbarium, Laboratório Botânico, 1997. 317p.). Os tratamentos foram obtidos por infusão, decocção e maceração. Para infusão, ferveu-se a água destilada previamente e logo após adicionou-se o pó da planta, deixando-se agir por 10 min em recipiente fechado. Na decocção colocou-se o pó em água destilada fria, aquecendo até a ebulição e deixando ferver por 1 min e, em seguida, reservou-se em recipiente fechado por 10 min. Para o preparo da maceração diluiu-se o pó com água fria destilada e reservou-se em recipiente fechado por 24h. Os tratamentos foram filtrados com gaze. Para os tratamentos autoclavados, os extratos foram incorporados aos meios de cultura usados nos ensaios e foram autoclavados por 20 min a 120o C e 1 atm, enquanto que para a condição não autoclavada, os tratamentos foram centrifugados por 15 min a 6.500 g, em seguida filtrados em papel Whatman no 40 e, posteriormente, esterilizados em membrana Millipore com 0,45 µm de diâmetro de poro.

Atividade antifúngica

Foi avaliada a atividade antifúngica sobre a germinação de esporos e o crescimento micelial de fungos fitopatogênicos. Avaliou-se a inibição da germinação de esporos microscopicamente sobre urediniósporos do fungo P. euvitis, agente causal da ferrugem da uva, e dos conídios do fungo P. vitis, agente causal da mancha das folhas da videira. Para o ensaio com P. euvitis, os urediniósporos foram removidos de folhas de videira com pincel e fez-se uma suspensão de esporos com água destilada (2 x 104 urediniósporos/mL). Uma alíquota de 50 µL da solução foi colocada em uma lâmina contendo uma camada delgada com 700 µL de meio ágar-água 1% autoclavado, que, conforme ensaios preliminares, foi o melhor substrato para germinação desses esporos. Cada lâmina foi reservada individualmente em placas de Petri contendo papel, para germinação, umedecido com água destilada esterilizada. Sobre a suspensão de esporos foram adicionados 50 µL de cada tratamento. As placas foram mantidas em escuro por 6 h, quando receberam 20 µL de azul algodão com lactofenol para paralisar a germinação (Naruzawa et al., 2006NARUZAWA, E.S.; CELOTO, M.I.B.; PAPA, M.F.S; TOMQUELSKI, G.V.; BOLANI, A.C. Estudos epidemiológicos e controle químico de Phakopsora euvitis. Fitopatologia Brasileira, v.31, n.1, p.41-45, 2006.). A avaliação dos urediniósporos germinados foi realizada em microscópio óptico. Para o ensaio com P. vitis os conídios foram retirados de folhas de videira a partir de lesões típicas e colocados em água destilada para obter suspensão com 2 x 104 conídios/mL. O ensaio foi realizado em placas de teste Elisa, devido à praticidade deste método e ao fato desses esporos germinarem nesta condição. Para tanto, foram adicionados 40 µL de tratamento e 40 µL da suspensão de esporos em cada orifício da placa. As placas foram mantidas no escuro à temperatura ambiente por 24h. Após isso, foram acrescidos 20 µL de azul algodão com lactofenol para paralisação da germinação. As concentrações dos tratamentos para ambos os ensaios foram de 0,25%, 0,5%, 1,25%, 2,5%, 5%, 10% e 20%. Foram utilizadas, para ambos os ensaios quatro repetições para cada concentração de cada tratamento, tendo como testemunhas água destilada e o fungicida Azoxystrobin (0,024 g/100 mL).

O crescimento micelial foi avaliado sobre C. musae e S. rolfsii, agentes causadores da antracnose em banana e da murcha de sclerotium da soja, respectivamente. Os tratamentos foram incorporados diretamente ao meio de cultura nas concentrações de 0,1%, 0,5%, 1%, 2,5%, 5%, 10% e 20% e autoclavados a 120o C e 1 atm por 20 min. Uma hora após o meio ter sido vertido em placas de Petri, um disco de 8 mm de diâmetro, contendo micélio de C. musae ou de S. rolfsii, com 7 dias de idade em BDA, foi repicado para o centro das placas, as quais foram vedadas com filme plástico e mantidas a 25o C. Foram utilizadas quatro repetições por tratamento. Os tratamentos controle continham apenas BDA ou o fungicida Azoxystrobin (0,024 g/100 mL). As avaliações foram realizadas por medições do diâmetro das colônias (média de duas medidas diametralmente opostas) após 5 dias para S. rolfsii e após 7 dias para C. musae. Após 16 dias foram contadas as estruturas de resistência (escleródios) de S. rolfsii.

Atividade antibacteriana

As bactérias B. subtilis (isolada de sementes de soja com sintomas de podridão) e Erwinia sp. (isolada de frutos de pimentão com podridão) foram cultivadas em meio ágar nutriente, à temperatura de +/- 25o C. A partir de colônias jovens (com 24h), foi preparada uma suspensão (1 x 108 bactérias/mL) com solução salina (0,85% de NaCl) estéril. Para os ensaios foram utilizados tubos de ensaio contendo caldo nutriente acrescido dos tratamentos (concentrações de 0,25%, 0,5%, 1,25%, 2,5%, 5%, 10% e 20%), totalizando 5 mL por tubo. A concentração dos nutrientes do meio foi a mesma para todos os tratamentos. Foram transferidos 50 µL de cada suspensão bacteriana em cada tubo de ensaio, com três repetições, utilizando-se um quarto tubo sem bactéria para leitura de absorbância (branco). Constituíram testemunhas o meio de cultura e meio de cultura acrescido de antibiótico (22,5 mg/L de oxitetraciclina e 225 mg/L de estreptomicina). Os tubos foram mantidos sob agitação por 42h, à temperatura +/- 25o C, com posterior leitura de absorbância a 580 nm (Motoyama et al., 2003MOTOYAMA, M.M.; SCHWAN-ESTRADA, K.R.F.; STANGARLIN, J.R.; FIORI, A.C.G.; SCAPIM, C.A. Efeito antimicrobiano de extrato cítrico sobre Ralstonia solanacearum e Xanthomonas axonopodis pv. Manihotis. Acta Scientiarum Agronomy, v.25, n.2, p.509-512, 2003.).

Os resultados foram avaliados no programa estatístico “Estat”, a partir do comportamento da curva de regressão, considerando os valores do coeficiente de determinação (R2) com 5% de significância.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Atividade antifúngica

No ensaio de germinação de esporos de P. euvitis (Fig. 1) não autoclavado, os tratamentos obtidos por infusão e maceração obtiveram equação linear com valores de R2 de 0,46 e 0,88, respectivamente, enquanto que por decocção foi significativa a função quadrática com valor de R2 de 0,76. Nesse caso, maior inibição da germinação ocorreu com a concentração de 13,5%, que reduziu em 59% a germinação em relação à testemunha água. Para os tratamentos não autoclavados de infusão e maceração, a inibição de esporos foi iniciada a 1,25%, sendo que na concentração de 20% houve redução de 63% e 75%, respectivamente, apresentando nestes dois casos possível efeito de dose dependência. No ensaio autoclavado, os tratamentos obtidos por infusão e decocção tiveram função quadrática com valores de R2 de 0,98 e 0,80, respectivamente. O macerado autoclavado não teve resultado significativo. Os tratamentos infusão e decocção autoclavados apresentaram pequeno incremento na porcentagem de germinação em baixas concentrações, mas reduziram a germinação a partir de 12% e 14%, respectivamente, podendo atingir a máxima inibição (100%), considerando a tendência da curva, nas concentrações de 39% e 34%, respectivamente. Quando comparados os derivados autoclavados com não autoclavados observa-se a tendência de menor atividade antifúngica para os três derivados autoclavados, indicando a possível presença de compostos termolábeis ou sensíveis ao tratamento térmico (Franzener et al., 2003FRANZENER, G.; STANGARLIN, J.R.; SCHWAN-ESTRADA, K.R.F.; CRUZ, M.E.S. Atividade antifúngica e indução de resistência em trigo a Bipolaris sorokiniana por Artemisia camphorata. Acta Scientiarum, v.25, n.2, p.503-507, 2003.).

Fig. 1
Germinação in vitro de urediniósporos de Phakopsora euvitis na presença de derivados de A. capillus-veneris obtidos por infusão (A e A’), maceração (B e B’) e decocção (C e C’).
Fig. 2
Germinação in vitro de conídios de Pseudocercospora vitis, na presença de derivados de A. capillus-veneris obtidos por infusão (A e A’), maceração (B e B’) e decocção (C e C’).
Fig. 3
Crescimento micelial in vitro de Colletotrichum musae, na presença de derivados de A. capillus-veneris obtidos por infusão (A e A’), maceração (B e B’) e decocção (C e C’).
Fig. 4
Crescimento micelial in vitro de Sclerotium rolfsii, na presença de derivados de A. capillus-veneris obtidos por infusão (A e A’), maceração (B e B’) e decocção (C e C’).

Para o fungo P. vitis (Fig. 2) os tratamentos autoclavados e não autoclavados tiveram valores de R2 ajustados variando de 0,86 a 0,99. Os tratamentos não autoclavados e o obtido por infusão autoclavado tiveram função linear iniciando a inibição da germinação de conídios na concentração de 5%. Decocção e o macerado autoclavados tiveram função quadrática. Considerando a concentração de 20%, a diminuição de conídios germinados foi de 21, 24 e 99% para infusão, decocção e maceração, respectivamente. A inibição de germinação de conídios iniciou-se com a concentração de 0,25% para maceração e decocção autoclavados, tendo maior inibição nas concentrações de 17%, com redução de 53% e 70%, para os respectivos tratamentos em relação a testemunha água. Para P. vitis, no entanto, não foi observada redução na atividade antifúngica em função do tratamento térmico por autoclavagem como ocorreu para P. euvitis, indicando ser tal atividade mais complexa e variável conforme o organismo em estudo.

No ensaio de crescimento micelial de C. musae (Fig. 3) os tratamentos autoclavados tiveram equações quadráticas ajustadas com valores de R2 variando de 0,90 a 0,97. Para maceração a redução em relação ao controle BDA foi iniciada a 0,1%, enquanto que para decocção e infusão foi a partir de 2,5%. Considerando-se as equações, o crescimento micelial foi menor nas concentrações de 16%, 20% e 20,5% para infusão, decocção e maceração, respectivamente. O derivado obtido por maceração teve redução de 39,3% em relação ao controle BDA, infusão teve redução de 26% e decocção 19%. Os tratamentos que não foram autoclavados também tiveram funções quadráticas com valor de R2 variando de 0,53 a 0,79. Nos tratamentos não autoclavados, para maceração a redução em relação ao controle foi a partir da concentração de 1%, para infusão foi a partir de 20% e para decocção foi a partir de 10%. Conforme as equações, os menores crescimentos foram obtidos para as concentrações de 14% e 13% para maceração e decocção, respectivamente e considerando a tendência do gráfico, para a concentração de 54% de infusão, com redução de crescimento de 29, 17 e 11%, respectivamente, em relação à testemunha água. Embora alguns derivados tenham apresentado função quadrática, não é possível afirmar que eles tenham sua atividade reduzida em elevadas concentrações situadas fora do intervalo em estudo, mas possivelmente ocorra estabilização da atividade em maiores concentrações.

O crescimento micelial de S. rolfsii (Fig. 4) foi inibido apenas na presença do derivado obtido por maceração, tanto autoclavado quanto não autoclavado, com função linear com valores de R2 de 0,94 a 0,84, respectivamente. O macerado autoclavado inibiu o crescimento micelial em 83% na concentração de 20% do derivado, enquanto que o não autoclavado inibiu 47% para a mesma concentração. A partir desses dados é possível destacar a atividade do derivado obtido por maceração e que, provavelmente, a autoclavagem seja capaz de liberar ou alterar moléculas, melhorando a sua atividade antimicrobiana. Adicionalmente, talvez o maior tempo de permanência do solvente água com o material vegetal tenha favorecido a extração de compostos antimicrobianos, embora não foram encontradas na literatura informações nesse sentido.

A quantidade de estruturas de resistência (escleródios) de S. rolfsii apresentou redução média de 21% para o macerado autoclavado e de 34% para a decocção Já para os tratamentos não autoclavados houve redução média na produção de escleródios de 51, 47 e 27% para infusão, maceração e decocção, respectivamente, sobretudo em maiores concentrações. Embora a autoclavagem tenha promovido variações, não foram observadas alterações drásticas como as observadas com outros extratos aquosos de plantas medicinais, estimulando (Bonaldo et al., 2004BONALDO, S.M.; SCHWAN-ESTRADA, K.R.F.; STANGARLIN, J.R.; TESSMANN, D.J.; SCAPIM, C.A. Fungitoxicidade, atividade elicitora de fitoalexinas e proteção de pepino contra Colletotrichum lagenarium, pelo extrato aquoso de Eucalyptus citriodora. Fitopatologia Brasileira, v.29, n.2, p.128-134, 2004.) ou inibindo (Franzener et al., 2003FRANZENER, G.; STANGARLIN, J.R.; SCHWAN-ESTRADA, K.R.F.; CRUZ, M.E.S. Atividade antifúngica e indução de resistência em trigo a Bipolaris sorokiniana por Artemisia camphorata. Acta Scientiarum, v.25, n.2, p.503-507, 2003.) a atividade antimicrobiana. Assim, para os derivados de avenca testados, a autoclavagem não comprometeu o seu potencial antimicrobiano.

Embora sejam escassas informações sobre a atividade antifúngica da avenca, Guha et al. (2005)GUHA, G.P.; MUKHOPADHYAY, R.; GUPTA, K. Antifungal activity of the crude extracts and extracted phenols from gametophytes and sporophytes of two species of Adiantum. Taiwania, v.50, n.4, p.272-283, 2005. relataram que extratos aquosos e fenólicos mostraram-se bioativos contra os fungos Aspergillus niger e Rhizopus stolonifer.

Atividade antibacteriana

Para Erwinia sp., os resultados não foram significativos, exceto para o macerado autoclavado, que teve função quadrática com valor de R2 de 0,78, tendo inibição a partir da concentração de 10% e atingindo 99% de redução do crescimento bacteriano para a concentração de 20% (como apenas este tratamento foi significativo, os gráficos não foram apresentados). Para B. subtilis, os tratamentos autoclavados e não autoclavados não tiveram resultados significativos ou de atividade inibitória.

Na literatura, no entanto, pode-se encontrar resultado diferente quando se utilizam outros tipos de solventes. Extratos obtidos com hidróxido de metanol, de partes aéreas da avenca, mostraram-se ativos contra B. subtilis, na dosagem de 0,5 mg/mL, E. coli, S. aureus a 1,0 mg/mL e para P. vulgaris e P. aeruginosa na dosagem 2,0 mg/mL (Raintree, 2006RAINTREE, N. Biological activity for extracts of avenca (Adiantum capillus-veneris). Disponível em: <http//:www.rain-tree.com/avenca-activity.pdf>. Acesso em: 11 set. 2006.
http//:www.rain-tree.com/avenca-activity...
).

Avancini et al. (2000)AVANCINI, C.A.M.; WIEST, J.M.; MUNDSTOCK, E. Atividade bacteriostática e bactericida do decocto de Baccharis trimera (Less.) D.C., Compositae, carqueja, como desinfetante ou anti-séptico. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.52, n.3, p.230-234, 2000., avaliando a atividade do decocto de B. trimera (carqueja) sobre bactérias de interesse veterinário, relataram que, diferentemente dos resultados obtidos neste trabalho, as bactérias Gram-positivas foram mais sensíveis ao derivado que as Gram-negativas. Os mesmos autores citam que a presença de atividade significativa de derivados aquosos mostra que suas substâncias antimicrobianas são também hidrossolúveis, indicando ser correta sua extração dessa forma simplificada.

CONCLUSÃO

Todos os derivados apresentaram atividade antifúngica, sugerindo ser correta esta forma de extração, porém maceração não autoclavado foi o mais eficiente contra os fungos P. euvitis e P. vitis. O macerado autoclavado foi o mais eficiente contra C. musae e S. rolfsii e para a bactéria Erwinia sp. Contra a bactéria B. subtilis, nenhum dos tratamentos testados foi eficiente. O tratamento térmico por autoclavagem promoveu alterações, mas não comprometeu o potencial antimicrobiano dos derivados. Os ensaios realizados indicam o potencial da planta A. capillus-veneris no controle de fitopatógenos fúngicos e bacterianos, sobretudo pelo derivado obtido por maceração, viabilizando a realização de ensaios in vivo com essa finalidade.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao professor Jerry Johann pela consultoria estatística e à Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI) – Fundo Paraná (CT 17/07) pelo auxílio financeiro.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2010

Histórico

  • Recebido
    20 Jan 2009
  • Aceito
    14 Jul 2010
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