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TABELA DE VIDA DE FERTILIDADE DE BREVIPALPUS PHOENICIS (GEIJSKES, 1939) (ACARI: TENUIPALPIDAE) EM DIFERENTES CULTIVARES DE CAFÉ (COFFEA SPP.)

FERTILITY LIFE TABLE OF BREVIPALPUS PHOENICIS (GEIJSKES, 1939) (ACARI: TENUIPALPIDAE) ON DIFFERENT COFFEE CUTIVARS (COFFEA SPP.)

RESUMO

Este trabalho foi realizado visando elaborar a tabela de vida de fertilidade do ácaro da mancha-anular do cafeeiro, Brevipalpus phoenicis (Geijskes) (Acari: Tenuipalpidae), criado em folhas de quatro cultivares de café (‘Icatu Vermelho’, ‘Apoatã’, ‘Obatã’ e ‘Mundo Novo’), mantidas em câmara climatizada a 25º ± 1º C, UR 70 ± 10% e fotofase de 14 horas. Fêmeas de B. phoenicis foram colocadas sobre a superfície das folhas (arenas), por um período de 24 horas, para oviposição. Após este período, as fêmeas e os ovos excedentes foram retirados deixando-se apenas um ovo por arena. As arenas foram examinadas diariamente para se avaliar a sobrevivência e o número de ovos depositados. Preparou-se uma tabela de vida de fertilidade com os dados obtidos. Os ácaros B. phoenicis apresentaram diferenças de sobrevivência e taxas de crescimento populacional, quando criados nos diferentes cultivares de café. Os cultivares mais favoráveis para a multiplicação de B. phoenicis foram, nesta ordem: ‘Apoatã’, ‘Mundo Novo’ e ‘Obatã, baseando-se nas taxas finitas de incremento. ‘Icatu Vermelho’ mostrou-se o cultivar menos favorável à multiplicação de B. phoenicis.

PALAVRAS-CHAVE
Ácaro da mancha-anular; biologia; taxa de reprodução

ABSTRACT

This work was carried out aiming at constructing a fertility life table for the coffee ringspot mite, Brevipalpus phoenicis (Geijskes) (Acari: Tenuipalpidae), reared on the leaves of four coffee cultivars (Icatu Vermelho, Apoatã, Obatã and Mundo Novo), kept in climatic chambers at 25 ± 1º C, relative humidity of 70 ± 10% and photophase of 14 hours. Females of B. phoenicis were placed on the leaf surfaces (arenas), for a period of 24 hours for oviposition. After this period, the females and the excess eggs were removed, leaving only one egg of B. phoencis on each arena. The arenas were examined daily, evaluating the mite survival and the number of eggs laid. Fertility life table was prepared using the data obtained. B. phoenicis mites presented significant differences in survivorship and population growth rates, when reared on different coffee cultivars. The most favorable cultivars for the multiplication of B. phoenicis were, in this sequence: Apoatã, Mundo Novo and Obatã, based on the finite rates of increase. Icatu Vermelho proved to be the least favorable cultivar for the multiplication of B. phoenicis.

KEY WORDS
Coffee ringspot mite; biology; reproduction rate

INTRODUÇÃO

O ácaro Brevipalpus phoenicis (Geijskes, 1939) é uma espécie polífaga e cosmopolita encontrada em regiões tropicais e subtropicais. Reis (1974)REIS, P.R. Ácaros de algumas fruteiras de clima tropical e subtropical e seus hospedeiros. Lavras: ESAL, 1974. 32p. (Série Pesquisa, 3). relatou 37 plantas hospedeiras do ácaro, com ênfase para as espécies de importância econômica tais como café, citros, chá, pêssego, maçã, mamão, coco, goiaba, uva e pêra. Trindade; Chiavegato (1994)TRINDADE, M.L.B.; CHIAVEGATO, L.C. Caracterização biológica dos ácaros Brevipalpus obovatus D., B. californicus B. e B phoenicis G. (Acri: Tenuipalpidae). Anais da Sociedade Entomológica do Brasil, v.23, n.2, p.189-195, 1994. citaram 33 espécies hospedeiras, principalmente plantas invasoras e ornamentais.

Este ácaro é considerado importante para as culturas de citros e café por ser vetor, respectivamente, do vírus da leprose dos citros (Citrus leprosis virus – CiLV) e da mancha-anular do cafeeiro (Coffee ring spot virus – CoRSV) (Chiavegato et al., 1982CHIAVEGATO, L.G.; MISCHAN, M.M.; SILVA, M.A. Prejuízos e transmissibilidade de sintomas de leprose pelo ácaro Brevialpus phoenicis (Geijskes, 1939) Sayed, 1946 (Acari, Tenuipalpidae) em citros. Científica, v.10, n.2, p.265-271, 1982.; Chagas, 1973CHAGAS, C.M. A associação do ácaro Brevipalpus phoenicis (Geijskes) à mancha-anular do cafeeiro. . Biológico, São Paulo, v.39, p.229-232, 1973.; 1988CHAGAS, C.M. Viroses ou doenças semelhantes transmitidas por ácaros tenuipalpídeos: mancha-anular do cafeeiro e leprose dos citros. Fitopatologia Brasileira, v.13, n.2, p.92, 1988.).

A mancha anular do cafeeiro ainda não havia causado problema econômico até 1986 quando foi associada a uma intensa desfolha em cafeeiros durante o inverno com baixa precipitação pluviométrica, condição muito favorável ao ácaro (Chagas, 1988CHAGAS, C.M. Viroses ou doenças semelhantes transmitidas por ácaros tenuipalpídeos: mancha-anular do cafeeiro e leprose dos citros. Fitopatologia Brasileira, v.13, n.2, p.92, 1988.). Nos anos seguintes, com destaque para 1995, altas infestações de B. phoenicis e da mancha-anular foram associadas a grandes desfolhas em cafeeiro no Estado de Minas Gerais (Figueira, 1995FIGUEIRA, A.R. Vírus da mancha-anular do cafeeiro tem causado prejuízos relevantes aos cafeicultores da região do Alto Paraíba. Fitopatologia Brasileira, v.20, p.299, 1995. Suplemento.). A presença desse ácaro vem sendo constatada com frequência nas principais regiões cafeeiras do país, tanto em cafeeiros arábica (Coffea arabica L.) quanto em Conillon (Coffea canephora Pierre & Froehner) (Matiello, 1987MATIELLO, J.B. Novas condições de ocorrência de mancha-anular do cafeeiro. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISA CAFEEIRA, 14., 1987, Campinas, SP. Resumos. Rio de Janeiro: MIC/IBC, 1987. p.6.).

Os dados biológicos de B. phoenicis reportados para diferentes hospedeiros como mamão (Haramoto, 1969HARAMOTO, F.H. Biology and control of Brevipalpus phoenicis (Geijskes) (Acarina: Tenuipalpidae). Technical Bulletin, Hawaii Agricultural Experiment Station, n.68, 1969. 63p.), chá (Kennedy et al., 1996KENNEDY, J.S.; IMPE, G.; HANCE, TH.; LEBRUN, Ph. Demecology of the false spider mite, Brevipalpus phoenicis (Geijskes) (Acari: Tenuipalpidae). Journal of Applied Entomology, v.120, p.493-499, 1996.), Oroxylum indicum Vent. e Clerodendron sinphonantus R. Br. (Lal, 1978LAL, L. Biology of Brevipalpus phoenicis (Geijskes) (Tenuipalpidae: Acarina). Acarologia, v.20, n.1, p.97-101, 1978.), Citrus sinensis (L.) Osbeck (Chiavegato, 1986CHIAVEGATO, L.G. Biologia do ácaro Brevipalpus phoenicis em citros. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.21, n.8, p.813-816, 1986.; Alves, 1999ALVES, E.B. Manejo da resistência do ácaro da leprose Brevipalpus phoenicis (Geijskes. 1939) (Acari. Tenuipalpidae. ao acaricida Dicofol. 1999. 91f. Dissertação (Mestrado em Ciências Agrárias) – Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 1999.) e em frutos de citros e folhas de café arábica (Teodoro; Reis, 2006TEODORO, A.V.; REIS, P.R. Reproductive performance of the mite Brevipalpus phoenicis (Geijskes, 1939) on citrus and coffee, using life table parameters. Brazilian Journal of Biology, v.66, n.3, p.899-905, 2006.), indicam que a reprodução e o desenvolvimento do ácaro variam consideravelmente em relação à sua fonte alimentar.

Apesar de todos esses artigos, não há relatos comparando a capacidade reprodutiva de B. phoenicis em diferentes cultivares de cafeeiro, utilizando-se a tabela de vida de fertilidade. Assim, este trabalho teve por objetivo avaliar o desempenho reprodutivo de B. phoenicis em quatro cultivares de cafeeiro, utilizados pela cafeicultura paulista e nacional.

MATERIAL E MÉTODOS

O estudo sobre a tabela de vida de B. phoenicis foi realizado utilizando-se plantas de cafeeiros de 10 anos de idade, cultivadas no Centro Experimental (22o 52’ 25’’ S; 47o 04’ 43’’ W) do Instituto Agronômico, em Campinas, sem tratamento fitossanitário desde seu plantio. Os cultivares utilizadas foram: Coffea canephora ‘Apoatã’ – IAC-3597; C. arabica ‘Mundo Novo’ – IAC-515-20, ‘Icatu Vermelho’ – IAC-4045 e ‘Obatã’ – IAC-1669-20.

Os trabalhos laboratoriais foram conduzidos no Laboratório de Entomologia do Departamento de Parasitologia da Universidade Estadual de Campinas.

As criações estoques dos ácaros foram mantidas sobre as folhas das mesmas cultivares em que foram coletadas e estudadas. As folhas foram colocadas sobre espuma sintéticas de 2 cm de espessura umedecidas periodicamente com água destilada, acondicionadas em bandejas de polietileno sem cobertura.

Cada folha recebeu uma estreita faixa (2 cm) de algodão hidrófilo sobre toda sua borda, mantendo contato com a espuma umedecida, com o propósito de manter a turgescência das folhas e evitar a fuga dos ácaros (Reis et al., 1997REIS, P.R.; ALVES, E.B. Biologia do ácaro predador Euseis alatus DeLeon (Acari: Phytoseiidae). Anais da Sociedade Entomológica do Brasil, v.26, n.2, p.359-363, 1997.). Tanto as bandejas de criações estoques quanto as arenas dos experimentos foram mantidas em câmaras climatizadas a 25 ±1o C, 70 ± 10% de umidade relativa e 14 horas de fotofase.

Para o experimento, folhas dos diferentes cultivares, acondicionadas como descrito anteriormente, tiveram sua face adaxial divididas em 10 arenas (1,0 x 1,5 cm) delimitadas por uma estreita faixa de algodão hidrófilo umedecido. No interior de cada arena, foi colocado um pequeno filete de uma mistura de pó de gesso, areia fina e água para simular uma superfície rugosa, local de preferência e estímulo à postura do ácaro (Albuquerque et al., 1997ALBUQUERQUE, F.A.; OLIVEIRA, C.A.L.; BARRETO, M. Estudos da relação entre as incidências de verrugose da laranja-doce e leprose dos citros em frutos de laranja-pera. Científica, v.25, n.2, p.393-402, 1997.). Foram utilizadas apenas fêmeas de B. phoenicis por se reproduzirem, principalmente, por partenogênese deuterótoca, sendo rara a reprodução sexuada (Teodoro; Reis, 2006TEODORO, A.V.; REIS, P.R. Reproductive performance of the mite Brevipalpus phoenicis (Geijskes, 1939) on citrus and coffee, using life table parameters. Brazilian Journal of Biology, v.66, n.3, p.899-905, 2006.). Em cada arena foi colocada uma fêmea por um período de 24 horas para a obtenção de ovos. Após esse período, as fêmeas e os ovos excedentes foram eliminados deixando-se apenas um ovo por arena.

As avaliações foram realizadas diariamente a partir da individualização de 63, 98, 84 e 82 ovos para os cultivares ‘Icatu Vermelho’, ‘Apoatã’, ‘Obatã’ e ‘Mundo Novo’, respectivamente. Foram obtidos os períodos de ovo a adulto e as respectivas taxas de sobrevivência das fases de desenvolvimento do ácaro para cada cultivar. Para a fase adulta, foram observados o número de ácaros mortos e o número de ovos por fêmea por dia até a morte de todas elas. Como a presença de machos nas populações em estudo foi rara, a razão sexual foi considerada igual a um.

Esses dados foram utilizados para a confecção das tabelas de vida de fertilidade, baseando-se em Silveira Neto et al. (1976)SILVEIRA NETO, S. NAKANO, O.; BARBIN, D.; VILLA NOVA, N.A. Manual de ecologia dos insetos. Piracicaba: Agronômica Ceres, 1976. 419p. e Teodoro; Reis (2006)TEODORO, A.V.; REIS, P.R. Reproductive performance of the mite Brevipalpus phoenicis (Geijskes, 1939) on citrus and coffee, using life table parameters. Brazilian Journal of Biology, v.66, n.3, p.899-905, 2006., sendo que, através dos valores de intervalos de idade (x), fertilidade específica (mx), probabilidade de sobrevivência (lx), foram calculados: a taxa líquida de reprodução (Ro), razão intrínseca de crescimento (rm), tempo de desenvolvimento de uma geração (T), tempo necessário para a população dobrar de tamanho (TD) e a taxa finita de crescimento (λ), sendo que, Ro = Σ (mx.lx); rm = loge Ro / T = ln Ro / T; T = (Σ mx.lx.x) / (Σ mx.lx); TD = ln (2) / rm; λ = erm (Birch, 1948BIRCH, L.C. The intrinsic rate of natural increase of an insect population. Journal of Animal Ecology, v.17, p.15-26, 1948.; Reis; Alves, 1997REIS, P.R.; ALVES, E.B.; SOUZA, E.O. Biologia do ácaro-vermelho do cafeeiro Oligonychus ilicis (McGgregor, 1917). Ciência e Agrotecnologia, v.21, n.3, p.260-266. 1997.). Através dessa tabela, obtiveram-se, também, os valores de M 50% e M 100%, referentes aos tempos necessários para a obtenção de 50% de mortalidade [valor correspondente à idade (x) para a qual a sobrevivência (lx) apresentou o valor mais próximo de 0,50] e 100% de mortalidade da população, respectivamente (Silva et al., 1985SILVA, M.A.; PARRA, J.R.P.; CHIAVEGATTO, L.G. Biologia comparada de Tetranychus urticae em cultura de algodoeiro. II Tabela de vida de fertilidade. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.10, n.9, p.1015-1019, 1985.).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os diferentes cultivares influenciaram significativamente no período de desenvolvimento do ácaro B. phoenicis, assim como na longevidade dos adultos (Tabela 1). Verificou-se que as durações do período de ovo a adulto obtidas para os cultivares de C. arabica, ‘Icatu Vermelho’ (31,7 dias), ‘Obatã’ (31,2 dias) e ‘Mundo Novo’ (28,6 dias) diferiram entre si, sendo que esta última foi a única que diferiu de todas as outras, inclusive do cultivar ‘Apoatã’ de C. canephora. O período de desenvolvimento de B. phoenicis observado para ‘Apoatã’ foi de 31,2 dias, não diferindo estatisticamente de “Icatu Vermelho” e “Obatã” (Tabela 1).

Tabela 1
Número de ácaros observados (n) e duração média (±EP), em dias, do período de ovo-adulto e longevidade dos adultos de B. phoenicis criados em quatro cultivares de Coffea spp., em câmaras climatizadas a 25 ±1° C, 70 ± 10% de UR e 14 horas de fotofase.

Todos os valores observados para os períodos de desenvolvimento de B. phoenicis foram superiores aos 25,18 dias reportados por Teodoro; Reis (2006)TEODORO, A.V.; REIS, P.R. Reproductive performance of the mite Brevipalpus phoenicis (Geijskes, 1939) on citrus and coffee, using life table parameters. Brazilian Journal of Biology, v.66, n.3, p.899-905, 2006., para ácaros criados em folhas de cafeeiro do cultivar ‘Catuaí Vermelho’, a 25 ± 2º C. Os valores reportados por esses autores ficaram mais próximo aos obtidos neste trabalho para o cultivar ‘Mundo Novo’.

Para ácaros dessa espécie criados em frutos de citros do cultivar ‘Valência’, os autores observaram uma duração de apenas 17,27 dias para o período de ovo a adulto (Teodoro; Reis, 2006TEODORO, A.V.; REIS, P.R. Reproductive performance of the mite Brevipalpus phoenicis (Geijskes, 1939) on citrus and coffee, using life table parameters. Brazilian Journal of Biology, v.66, n.3, p.899-905, 2006.), ressaltando a influência do hospedeiro no desenvolvimento desse ácaro.

Chiavegato (1986)CHIAVEGATO, L.G. Biologia do ácaro Brevipalpus phoenicis em citros. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.21, n.8, p.813-816, 1986. verificou um período de desenvolvimento de 19,20 dias, quando utilizou frutos de citros da variedade ‘Pera Rio’. Para a temperatura de 20o C, o período se estendeu para 43,47 dias. Quando comparou folhas e frutos dessa última variedade, na temperatura de 30º C, obteve, respectivamente, os períodos de ovo a adulto de 17,62 e 14,37 dias. Esses resultados demonstram nítida influência da temperatura, assim como da espécie e parte da planta hospedeira no desenvolvimento do ácaro.

Períodos de desenvolvimento próximos aos obtidos neste trabalho foram observados por outros autores como Haramoto (1969)HARAMOTO, F.H. Biology and control of Brevipalpus phoenicis (Geijskes) (Acarina: Tenuipalpidae). Technical Bulletin, Hawaii Agricultural Experiment Station, n.68, 1969. 63p. para frutos de mamoeiro (29,3 dias) e Oomem (1982)OOMEN, P.A. Studies on population dynamics of the scarlet mite. Brevipalpus phoenicis. a pest of tea in Indonesia. 89p. 1982. Thesis (PhD) - Mededelingen Landbouwhogeschool, Wageningen, 1982. para folhas de chá da Índia (33,5 dias).

As longevidades observadas em ‘Icatu Vermelho’ (23,8 dias) e ‘Obatã’ (23,5 dias) diferiram das observadas em ‘Mundo Novo’ (21,2 dias) e Apoatã (20,1 dias), porém, sem grandes variações (Tabela 1).

Chiavegato (1986)CHIAVEGATO, L.G. Biologia do ácaro Brevipalpus phoenicis em citros. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.21, n.8, p.813-816, 1986., que obteve longevidades de B. phoenicis entre 18,61 a 22,22 dias, de acordo com a variação da temperatura e estrutura de plantas cítricas utilizadas como hospedeira, concluiu que não havia grandes interferências nas longevidades em decorrência das variações dessas condições. No entanto, Teodoro; Reis (2006)TEODORO, A.V.; REIS, P.R. Reproductive performance of the mite Brevipalpus phoenicis (Geijskes, 1939) on citrus and coffee, using life table parameters. Brazilian Journal of Biology, v.66, n.3, p.899-905, 2006., apesar de observarem valores de longevidade próximos aos obtidos neste trabalho, testando folhas de cafeeiro do cultivar ‘Catuaí Vermelho’ (27,46 dias), encontraram valores muito superiores para frutos de laranja ‘Valência’ (38,45 dias).

A fase reprodutiva de B. phoenicis iniciou-se no primeiro dia da fase adulta somente no cultivar ‘Obatã’, enquanto que nas demais se iniciou no segundo dia. O início da postura foi observado primeiro no cultivar ‘Mundo Novo’, aos 26 dias do início do ciclo de vida, seguido pela cultivar ‘Obatã’, aos 28 dias e pelos cultivares ‘Icatu Vermelho’ e ‘Apoatã’, aos 30 dias (Fig. 1)

Fig. 1
Porcentagem de sobrevivência (lx) e número médio de ninfas / fêmea (mx) de B. phoenicis criados em diferentes cultivares de Coffea sp. em câmaras climatizadas a 25 ±1o C, 70 ± 10% de UR e 14 horas de fotofase.

As taxas líquidas de reprodução (Ro) observadas para populações B. phoenicis mantidas em folhas de cafeeiro de diferentes cultivares variaram de 1,229 a 1,922 vezes a cada geração. O maior valor de Ro foi observado para o cultivar ‘Apoatã’ e o menor foi registrado para o cultivar ‘Icatu Vermelho’ (Tabela 2).

Tabela 2
Taxa líquida de reprodução (Ro), razão intrínseca de crescimento (rm), taxa finita de crescimento (λ), duração média de uma geração (T) em dias, tempo necessário para a população dobrar de tamanho (TD) em dias, mortalidade de 50 e 100 % das populações de Brevipalpus phoenicis criadas em diferentes cultivares de Coffea spp., a 25° ± 1° C, umidade relativa do ar de 70 ± 10% e fotofase de 14 horas.

Esses valores de Ro obtidos para folhas de cafeeiro são bem inferiores aos observados por Alves (1999)ALVES, E.B. Manejo da resistência do ácaro da leprose Brevipalpus phoenicis (Geijskes. 1939) (Acari. Tenuipalpidae. ao acaricida Dicofol. 1999. 91f. Dissertação (Mestrado em Ciências Agrárias) – Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 1999., que estudou a biologia de duas linhagens de B. phoenicis em frutos de laranja (variedade Valência). Os valores de Ro para os ácaros criados em citros variaram entre 12,8 e 26,8 vezes por geração, sendo aproximadamente dez vezes acima dos obtidos para os ácaros criados em folhas de café, na presente pesquisa. Em citros, os ácaros dessa espécie apresentam notável preferência por oviposição e desenvolvimento em frutos, em relação às folhas (Chiavegato, 1986CHIAVEGATO, L.G. Biologia do ácaro Brevipalpus phoenicis em citros. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.21, n.8, p.813-816, 1986.).

Medeiros (2002)MEDEIROS, M.B. de Ação de biofertilizantes líquidos sobre a bioecologia do ácaro Brevipalpus phoenicis. 110p. 2002. Tese (Doutorado) – Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 2002., trabalhando com folhas de Canavalia ensiformes (feijão de porco) nas mesmas condições de temperatura, obteve uma taxa líquida de reprodução (Ro) de 18,09 vezes por geração, indicando que este substrato também se mostra superior às folhas de café na multiplicação de B. phoenicis.

Os baixos valores de Ro observados no presente trabalho podem ser atribuídos principalmente ao baixo número de ovos depositados pelas fêmeas de B. phoenicis em folhas de cafeeiro. O número médio de ovos depositados por fêmea fértil foi de 3,6 ovos para o cultivar ‘Icatu Vermelho’ e de 4,6 ovos para o cultivar ‘Apoatã’.

Os índices de oviposição obtidos no presente estudo são baixos em relação aos observados para outros hospedeiros desse ácaro. Por exemplo, Haramoto (1969)HARAMOTO, F.H. Biology and control of Brevipalpus phoenicis (Geijskes) (Acarina: Tenuipalpidae). Technical Bulletin, Hawaii Agricultural Experiment Station, n.68, 1969. 63p. registrou uma fecundidade média 53,3 ovos por fêmea de B. phoenicis em mamão, a 25º C.

Com relação ao tempo para completar uma geração (T), o maior valor foi registrado para o cultivar ‘Apoatã’ (40,26 dias) e o menor para o cultivar ‘Mundo Novo’ (35,20 dias) (Tabela 2). Estes valores são próximos aos obtidos por Alves (1999)ALVES, E.B. Manejo da resistência do ácaro da leprose Brevipalpus phoenicis (Geijskes. 1939) (Acari. Tenuipalpidae. ao acaricida Dicofol. 1999. 91f. Dissertação (Mestrado em Ciências Agrárias) – Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 1999., para uma linhagem de B. phoenicis (susceptível a dicofol) (T = 33,6 dias) criada em frutos de laranja. Kennedy et al. (1996)KENNEDY, J.S.; IMPE, G.; HANCE, TH.; LEBRUN, Ph. Demecology of the false spider mite, Brevipalpus phoenicis (Geijskes) (Acari: Tenuipalpidae). Journal of Applied Entomology, v.120, p.493-499, 1996. observaram tempos menores para uma geração (27,6 dias), para ácaros desta espécie criados em folhas de Cammellia sinensis L.

Os maiores contrastes entre os valores das taxas finitas de incremento (λ) foram observados entre os cultivares ‘Icatu Vermelho’ (1,0053) e ‘Apoatã’ (1,01635). Valores mais próximos de l foram obtidos para ‘Apoatã’(1,01635), ‘Mundo Novo’ (1,01522) e ‘Obatã’ (1,0147) (Tabela 2).

Os contrastes no crescimento populacional de B. phoenicis, baseando-se exclusivamente na taxa finita de incremento (λ), em folhas de cafeeiro, podem ser observados na Figura 2.

Fig. 2
Simulação de crescimento populacional de Brevipalpus phoenicis em quatro cultivares de café, baseado na taxa finita de crescimento (λ) (por fêmea por dia): ‘Icatu Vermelho’ (λ = 1,0053); ‘Obatã (λ = 1,0147); ‘Mundo Novo’ (λ = 1,01522) e ‘Apoatã’ (λ = 1,01635).

Embora as diferenças nos valores das taxas finitas de incremento possam parecer pequenas, ao longo de vários meses, grandes contrastes populacionais podem ser observados na população de B. phoenicis originária de uma única fêmea desta espécie (Fig. 2). Por exemplo, após 12 meses, a população proveniente de uma única fêmea de B. phoenicis poderia alcançar apenas 6,71 ácaros em ‘Icatu Vermelho’, enquanto que em ‘Apoatã’, este valor seria de aproximadamente 343,2 ácaros. Valores intermediários seriam observados para ‘Obatã’ (191,2 ácaros) e ‘Mundo Novo’ (229,9 ácaros), nessa simulação (Fig. 2).

Provavelmente, esses contrastes não seriam tão evidentes em condições de campo, devido à influência de fatores meteorológicos, ataque de inimigos naturais, uso de agroquímicos etc. Além disso, os ácaros B. phoenicis podem permanecer e se multiplicar em outras partes das plantas de café (ex.: ramos e frutos) (Reis; Zacarias, 2007REIS, P.R.; ZACARIAS, M.S. Ácaros em cafeeiros. Belo Horizonte: EPAMIG. 2007. 76p. (Boletim Técnico, n.81)), onde as diferenças entre os cultivares podem ser menores.

Esses resultados corroboram parcialmente os dados de Mineiro (2006)MINEIRO, J.L.C. Ecologia do ácaro da mancha-anular (Brevipalpus phoenicis (Geijskes)) (Acari. Tenuipalpidae. em cafeeiros no Estado de São Paulo. 179p. 2006. Tese (Doutorado) – Centro de Energia Nuclear na Agricultura, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 2006. que observou maiores populações de B. phoenicis em plantas de café do cultivar ‘Apoatã’, em comparação com os cultivares ‘Icatu Vermelho’, ‘Icatu Amarelo’, ‘Mundo Novo’ e ‘Catuaí Amarelo’. O número de ácaros B. phoenicis por folha em ‘Apoatã’ foi aproximadamente 2,4 vezes maior que em ‘Icatu Vermelho’.

O cultivar ‘Icatu Vermelho’ pode ser uma boa opção para o agricultor, para o manejo do ácaro-praga em cafeeiro, considerando a baixa taxa de reprodução de B. phoenicis nas folhas destas plantas.

CONCLUSÕES

Ácaros da espécie B. phoenicis apresentam diferenças de sobrevivência e taxas de crescimento populacional, quando criados em diferentes cultivares de café.

Os cultivares mais favoráveis à multiplicação de B. phoenicis, baseando-se nas taxas finitas de incremento, são, nesta ordem: ‘Apoatã’, ‘Mundo Novo’ e ‘Obatã.

O cultivar ‘Icatu Vermelho’ mostra-se o menos favorável à multiplicação de B. phoenicis.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) pelo suporte financeiro desta pesquisa, e ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) pela bolsa de produtividade concedida ao último autor.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Set 2020
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2011

Histórico

  • Recebido
    26 Out 2009
  • Aceito
    19 Jun 2011
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