A lagarta-do-cartucho (Spodoptera frugiperda J. E. Smith, 1797) é uma espécie que, em fase imatura, pode causar grandes danos a várias culturas, levando a perdas econômicas (CRUZ, 1995; ALMEIDA, 2001). Em 2009, o custo econômico estimado visando o controle deste inseto foi de US$ 602,1, sendo o Paraná responsável por mais de 24% deste montante (FERREIRA FILHO et al., 2009).
Para controle de insetos como este, normalmente faz-se uso de inseticidas sintéticos que, além de ter um custo elevado, geram riscos ambientais e de toxicidade para invertebrados benéficos e vertebrados, como o homem (VIANNA et al., 2009). Desta forma, alternativas de controle vêm sendo buscadas, e o interesse por produtos botânicos para esse fim tem aumentado, dada a maior segurança de grande parte desses compostos para a saúde humana e para o meio ambiente (GALLO et al., 2002; ISMAN, 2006; CORRÊA; SALGADO, 2011).
A ação inseticida esperada de vários grupos botânicos se deve aos metabólitos secundários produzidos pela planta, e fazem parte da sua própria defesa contra herbívoros (ISMAN, 2006). Essas substâncias podem atuar de várias formas, como inibidores da alimentação ou dificultadores de crescimento, desenvolvimento, reprodução ou repelentes, especialmente quando a ação é resultante de uma complexa mistura de substâncias (MENEZES, 2005). Vários compostos secundários possuem atividade inseticida conhecida, como piretrinas, rotenona, nicotina, cevadina, veratridina, rianodina, quassinoides, azadiractina e compostos voláteis provenientes de plantas aromáticas (ISMAN, 2000), encontrados em diversas famílias botânicas, como Asteraceae, Solanaceae, Rutaceae, Piperaceae, Poaceae e Myrtaceae, dentre outras (ISMAN, 2006; BANERJEE et al., 2011; COITINHO, 2011; CORRÊA; SALGADO, 2011). Muitas vezes, esses compostos são encontrados em plantas amplamente distribuídas no território brasileiro e de fácil acesso para pequenos produtores, e poderiam ser utilizados na agricultura orgânica. DIETRICH et al. (2011)relataram, por exemplo, que o cultivo de plantas com ação inseticida é comumente realizado por produtores orgânicos do Rio Grande do Sul para o controle de diversos insetos.
Dada a necessidade de buscar novas medidas de controle para S. frugiperda e a existência de compostos botânicos com potencial inseticida em plantas comumente encontradas na região Sul, o objetivo desta pesquisa foi avaliar o efeito dos extratos de folhas de Mikania lalvigata (Asteraceae), Eucalyptus robusta (Myrtaceae) e folhas e frutos de Capsicum baccatum (Solanaceae) incorporados em dieta artificial sobre as lagartas de S. frugiperda.
As lagartas de 2o ínstar foram cedidas pela Cooperativa Central de Pesquisa Agrícola (COODETEC), onde eram mantidas a 26oC e 14 horas de fotofase e alimentadas com dieta artificial (PARRA, 2000).
Para o preparo dos extratos, foram coletadas folhas de M. laevigata, E. robusta e folhas e frutos de C. baccatum em Cascavel (PR). As plantas foram devidamente identificadas e depositadas no Herbário Educacional da Universidade Paranaense (UNIPAR), campus Cascavel, sob os registros HEUP-2320 (E. Robusta), HEUP-2319 (M. Laevigata) e HEUP-2318 (C. baccatum) Posteriormente, foram secas à sombra e depositadas em estufa para finalizar a secagem a 60oC por 48 horas. Os extratos foram feitos a partir da trituração das partes das plantas. Foram misturados 10 g da planta com 90 mL de água destilada. Após 24 horas de repouso, a mistura foi coada em tecido do tipo voile para a obtenção do extrato hidrossolúvel a 10% de cada uma das plantas, sendo, posteriormente, incorporado à superfície da dieta artificial, cuja composição e preparo são descritos por Parra (2000).
Os tratamentos foram: extratos aquosos a 10% de folhas de M. laevigata, folhas de E. robusta, folhas de C. baccatum, frutos de C. baccatum e testemunha, em cuja dieta foi acrescida água destilada. Cada tratamento constou de quatro repetições, sendo 15 lagartas por repetição. As lagartas de S. frugiperda foram mantidas individualmente em copos plásticos de 50 mL e alimentadas com dieta artificial, na proporção de aproximadamente um cubo de 1 cm de lado para cada lagarta, no qual foram aplicados 0,1 mL do extrato com uma micropipeta na superfície da dieta. A cada três dias, a dieta de cada lagarta foi substituída por uma porção de dieta fresca, acrescida do extrato. As variáveis avaliadas foram: duração da fase larval, mortalidade diária das lagartas, peso das lagartas aos 10 dias e de pupas com 24 horas e razão de machos e fêmeas. O delineamento foi inteiramente casualisado e os dados obtidos foram submetidos ao teste de Tukey a 5% de significância. Os dados referentes à porcentagem de mortalidade larval foram transformados em arcsen.
Os extratos que levaram à maior redução de peso das lagartas ao 10o dia de experimento foram folhas de E. robusta (18,6 ± 4,89) e folhas de C. baccatum (19,6 ± 2,11), possivelmente devido à deterrência alimentar causada pelos extratos. Com relação à mortalidade de S. frugiperda, todos os extratos diferiram estatisticamente da testemunha, mas nenhum interferiu na duração da fase larval (Tabela 1). SANTIAGO et al. (2008) encontraram resultados semelhantes utilizando extratos de Ruta graveolens, Momordica charantia e Lippia sidoides. MARTINEZ; EMDEN (2001) relataram que a inibição de crescimento é devido à reduzida ingestão de alimentos e da pouca habilidade da conversão de nutrientes em crescimento. Com relação à duração do período pupal, no tratamento com folha de E. robusta as pupas apresentaram menor período pupal, mesmo não diferindo dos tratamentos com folhas e frutos de C. baccatum (3,9 ± 1,58; 6,0 ± 0,57; e 6,3 ± 0,67, respectivamente). Não houve diferença na razão sexual dos insetos (Tabela 1).
Tabela 1 Peso, mortalidade e duração do ciclo larval de Spodoptera frugiperda em função de extratos aquosos em dieta artificial (T (°C) = 26 ± 2°C; fotofase = 16 horas).
Tratamento | Peso (mg) | Mortalidade (%) | Duração do ciclo (dias) |
---|---|---|---|
E.robusta | 18,6 ± 4,89 b | 76,7 ± 0,00 a | 16,9 ± 1,66 a |
Folha de C. baccatum | 19,6 ± 2,11 b | 83,3 ± 9,59 a | 16,1 ± 0,68 a |
Fruto de C. baccatum | 28,0 ± 2,61 ab | 61,7 ± 8,08 a | 14,7 ± 0,58 a |
M. laevigata | 37,6 ± 0,54 a | 70,0 ± 4,33 a | 14,5 ± 0,07 a |
Testemunha | 40,8 ± 2,06 a | 25,0 ± 4,33 b | 15,3 ± 0,17 a |
CV (%) | 22,32 | 15,40 | 7,04 |
Dados originais apresentados. Para análise estatística os dados foram transformados em arcsen. Médias (± erro padrão) seguidas pela mesma letra na coluna não diferem entre si, pelo teste de Tukey (p < 0,05).
Tabela 2 Razão sexual de Spodoptera frugiperda, peso médio das pupas e duração do ciclo pupal em função de extratos aquosos em dieta artificial. (T (°C) = 26 ± 2°C; fotofase = 16 horas).
Tratamentos | Razão sexual | Peso médio ± erro padrão (mg) | Duração da fase pupal (dias) | |
---|---|---|---|---|
Machos | Fêmeas | |||
E. robusta | 0,20 ns | 18,5 ± 0,00 b | 17,8 ± 0,01 ab | 3,9 ± 1,58 a |
Folha de C. baccatum | 0,22 | 13,8 ± 0,00 a | 15,1 ± 0,02 a | 6,0 ± 0,57 a b |
Fruto de C. baccatum | 0,30 | 17,7 ± 0,00 ab | 20,6 ± 0,01 ab | 6,3 ± 0,67 a b |
M. laevigata | 0,28 | 18,2 ± 0,00 b | 22,8 ± 0,00 b | 7,0 ± 0,00 b |
Testemunha | 0,30 | 18,4 ± 0,01 b | 21,0 ± 0,00 ab | 7,0 ± 0,00 b |
CV (%) | 34,86 | 6,68 | 10,17 | 16,96 |
Médias (± erro padrão) seguidas pela mesma letra na coluna não diferem entre si, pelo teste de Tukey (p < 0,05).
De acordo com MORDUE (LUNTZ); NISBET (2000), certas substâncias, especialmente as originadas do metabolismo secundário de plantas inseticidas, como a azadiractina, podem atuar sobre esses quimiorreceptores, estimulando as "células deterrentes específicas" ou bloqueando os fagoestimuladores, inibindo a alimentação. Assim, a falta de nutrientes pode ocasionar um atraso no desenvolvimento ou deformações. SCRIBER; SLANSKI-JR. (1981) complementaram que a quantidade e a qualidade do alimento ingerido durante a fase larval afetam a taxa de crescimento, tempo de desenvolvimento, peso corporal e sobrevivência.
Todas as plantas estudadas resultaram em aumento da mortalidade de S. frugiperda. Além disso, E. robusta e C. baccatumtambém foram responsáveis pela redução do peso das lagartas. Dessa forma, os extratos vegetais dessas plantas mostraram-se promissores para serem testados em concentrações menores e em condições de campo para o manejo de S. frugiperda, contribuindo para a redução dos danos ocasionados por esse inseto. Porém, testes adicionais devem ser realizados, especialmente com extratos feitos com solventes menos polares ou até mesmo óleo essencial. Assim, maior número de moléculas com possível atividade inseticida seriam exploradas, otimizando sua possível utilização no controle de pragas.