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Intercorrência entre leucose enzoótica e tuberculose em bovinos abatidos em frigorífico

Intercurrence between enzootic leukosis and tuberculosis in slaughtered bovine in slaughterhouses

RESUMO:

Leucose e tuberculose são doenças que acometem o rebanho bovino e acarretam consideráveis prejuízos econômicos, em virtude do impacto na produtividade, porém há poucos relatos de que elas ocorram concomitantemente. Diante disso, objetivou-se avaliar a intercorrência entre essas doenças em bovinos abatidos no município de São Gotardo, MG, sendo que esses animais foram reagentes à tuberculinização e apresentaram lesões características da doença durante o abate sanitário. Cento e trinta e três amostras de soro sanguíneo, todas oriundas de bovinos positivos para tuberculose, foram analisadas pela técnica de imunodifusão em gel de ágar (IDGA), e a prevalência de bovinos que apresentaram positividade ao teste de IDGA foi de 55,64% (74/133). Os resultados obtidos nesta pesquisa permitiram concluir que a tuberculose e a leucose são doenças presentes nas regiões estudadas e encontram-se disseminadas na população avaliada, com níveis significativos, causando risco à saúde dos animais e das pessoas, dado o caráter zoonótico da tuberculose bovina.

PALAVRAS-CHAVE:
zoonose; tuberculinização; linfossarcoma; IDGA; bovina

ABSTRACT:

Leukosis and tuberculosis are diseases that affect cattle and entail considerable economic losses, due to theim pact on productivity, but there are few reports that they occur simultaneously. Therefore, aimed to evaluate the complications of these diseases in cattles laughtered in São Gotardo, MG, these animals were positive to the tuberculin and showed lesions characteristic of the disease during the stamping. One hundred and thirty three samples of blood serum, all from positive to bovine tuberculosis, were analyzed by immuno diffusion technique in agar gel (AGID), and the prevalence of cattle that were positive by AGID test was 55.64% (74/133). The results of this research showed that tuberculos is and leukosis are diseases present in the studied regions and are disseminated in this population, with significant levels, causing risk to the health of animals and people, as the zoonotic bovine tuberculosis.

KEYWORDS:
zoonosis; tuberculin; lymphosarcoma; AGID; bovine

A leucose enzoótica bovina (LEB) e a tuberculose bovina (TB) são doenças infectocontagiosas caracterizadas pela evolução crônica e pelos grandes prejuízos que determinam à pecuária bovina, estabelecendo sucessivas condenações de carcaças em matadouros e restringindo o comércio de animais, além de aumentar os custos com serviços veterinários (OIE, 2008OIE - OFFICE INTERNATIONAL DES ÉPIZOOTIES. Código Zoosanitário Internacional. 2008. Disponível em: <Disponível em: http://www.oie.int >. Acesso em: 08 nov. 2013.
http://www.oie.int...
).

No Brasil, a leucose foi descrita pela primeira vez por Rangel; Machado (1943RANGEL, N.M.; MACHADO, A.V. Contribuição à oncologia comparada em Minas Gerais. Arquivos Escola Superior de Medicina Veterinária do Estado de Minas Gerais , v.1, p.83-96, 1943.), que realizaram um levantamento sobre a frequência de neoplasias nos animais domésticos, no estado de Minas Gerais, e assinalaram a ocorrência de linfossarcomas em bovinos; entretanto, somente em 1959, no Rio Grande do Sul, Merckt et alMERCKT, H.; GIUDICE, J.C.O.; MULLER, J.A. Leucose bovina: concepção moderna e primeira verificação da doença no Rio Grande do Sul. Revista da Escola de Agricultura e Veterinária UFRGS , v.2, n.3, p.7-19, 1959.. registraram oficialmente o primeiro diagnóstico clínico da doença.

É uma enfermidade neoplásica, causada por um retrovírus que possui um longo período de incubação (dois a cinco anos); sua origem ocorre no tecido linfoide e é frequentemente diagnosticada nos animais domésticos (Jones et al., 2000JONES, T.C. Patologia veterinária . 6 ed. São Paulo: Manole, 2000. p.1415.), infectando, preferencialmente, linfócitos B (Goff, 2007GOFF, S.P. Retroviridae: the retroviruses and their replication. In: KNIPE, D.M.; HOWLEY, P.M.Fields virology 5 ed. Philadelphia: Lippincott Williams and Wilkins, 2007. v.2. p.1999-2069.). A infecção natural ocorre em bovinos, capivaras, bubalinos e ovinos (Camargos et al., 2004CAMARGOS, M.F.; REIS, J.K.P.; LEITE, R.C. Bovine leukemia virus. Virus: reviews and research. Journal of the Brazilian Society for Virology , v.9, n.1, p.44-59, 2004.); em bovinos, é conhecida também como linfossarcoma, linfoma maligno, linfomatose e leucemia bovina (Barros, 2007BARROS, C.S.L. Leucose Bovina, In: RIET-CORREA, F.; SCHILD A.L.; LEMOS, R.A.A.; BORGES, J.R.J. Doenças de ruminantes e equídeos . 3 ed. Santa Maria: Pallotti, 2007. p.159-169.).

Pode ocasionar linfocitose persistente (LP), linfossarcoma ou apresentar-se de forma inaparente, porém, o animal é portador e disseminador do vírus. É uma doença negligenciada devido à pequena quantidade de animais clinicamente afetados, e é comumente diagnosticada pela presença de anticorpos em amostras de soro ou leite, sendo que os anticorpos são detectados no soro de animais dentro de duas a oito semanas pós-infecção (Troiano, 2009TROIANO, L.D.C. Produção e caracterização de anticorpos monoclonais anti-gp51 do vírus Leucose Bovina (VLB) 2009. 101f. Dissertação (Mestrado em Processos Biotecnológicos, área de concentração: saúde animal e humana) - Setor de Tecnologia, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2009.).

Tal enfermidade causa imunossupressão, responsável pelas infecções secundárias, e os animais podem ser descartados precocemente, antes da ocorrência de sintomas (Troiano, 2009TROIANO, L.D.C. Produção e caracterização de anticorpos monoclonais anti-gp51 do vírus Leucose Bovina (VLB) 2009. 101f. Dissertação (Mestrado em Processos Biotecnológicos, área de concentração: saúde animal e humana) - Setor de Tecnologia, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2009.). A forma clínica manifesta-se, principalmente, em animais adultos destinados à produção leiteira, pois em rebanhos leiteiros existe maior quantidade de animais adultos do que em rebanhos de corte. Quanto mais intensivo o manejo, maior o risco de se transmitir a doença (Radostits et al., 2002RADOSTITS, O.M.; GAY, C.C.; BLOOD, D.C.; HINCHCLIFF, K.W. Clínica Veterinária: um tratado de doenças dos bovinos, ovinos, suínos, caprinos e equinos. 9 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. p.940-951.).

A LEB é registrada nos cinco continentes do mundo (Olson; Miller, 1987OLSON, C.; MILLER, I. History and terminology of enzootic bovine leukosis. In: BURNY, A.; MAMMERICKX, M. ed. Enzootic bovine leukosis and bovine leukemia virus Boston: Martinus Nijhoff , 1987, p.3-11.). No Brasil, a infecção pelo vírus da leucose bovina (VLB) ocorre em praticamente todas as regiões do país, e a última avaliação sobre a disseminação da doença revelou uma prevalência nacional de 27,6% (Birgel Júnior et al., 2006BIRGEL JÚNIOR, E.H.; DIAS, W.M.C.; SOUZA, R.M.; POGLIANI, F.C.; BIRGEL, E.H. Prevalência da infecção pelo vírus da Leucose dos bovinos em animais da raça Simental, criados no Estado de São Paulo. ARS Veterinária , v.22, n.2, p.122-129, 2006.).

O método atualmente utilizado para detecção de animais infectados no Brasil é a imunodifusão em gel de ágar (IDGA), um teste específico, mas não muito sensível, sendo utilizado para amostras individuais de soro ou plasma sanguíneo (OIE, 2004OIE - OFFICE INTERNATION DES ÉPIZOOTIES. Manual of Diagnostic Tests and Vaccines for Terrestrial Animals mammals, birds, bees 5 ed. Paris: OIE 2004. Cap. 2,3,4. Enzootic Bovine Leukosis.). Para a pesquisa de anticorpos em amostras de leite, utiliza-se a técnica de ELISA, visto que tem alta sensibilidade (Sardi et al., 2002SARDI, S.I.; CAMPOS, G.S.; BARROS, S.B.; EDELWEISS, G.L.; MARTINS, D.T. Revista de Ciências Médicas e Biológicas , v.1, n.1, p.61-65, nov. 2002.).

Atualmente não há nenhuma vacina efetiva que confira proteção contra o VLB bem como tratamento viável e efetivo (Birgel Júnior et al., 2006BIRGEL JÚNIOR, E.H.; DIAS, W.M.C.; SOUZA, R.M.; POGLIANI, F.C.; BIRGEL, E.H. Prevalência da infecção pelo vírus da Leucose dos bovinos em animais da raça Simental, criados no Estado de São Paulo. ARS Veterinária , v.22, n.2, p.122-129, 2006.). No Brasil, não existem programas específicos para a prevenção e o controle dessa enfermidade. O controle e a erradicação consistem na adoção de medidas tais como identificação, isolamento e eliminação dos animais reagentes (Silva et al., 2008SILVA, R.C.; FONTANA, I.; MEIRELLES, F.C.; RUGGIERO, A.P.M.; BENATO, N.; BORGES, J.R.J. Ocorrência de leucose enzoótica bovina na forma de linfomas no Distrito Federal: relato de caso. Arquivos do Instituto Biológico , v.75, n.4, p.507-512, 2008.). Os mesmos autores afirmaram, ainda, que a realização de testes sorológicos nos animais com idade superior a seis meses, com repetição semestral, permite identificar os animais positivos e auxiliar no controle da doença.

Em relação à TB, é uma doença infectocontagiosa que afeta seres humanos e outras diversas espécies animais. Segundo Roxo (1996ROXO, E. Tuberculose Bovina: Revisão. Arquivos do Instituto Biológico , v.63, n.2, p.91-97, 1996.), tal enfermidade tem evolução extremamente lenta e caquetizante, acarretando perdas na produtividade do rebanho, contaminação das crias e condenação dos animais ao abate, sendo necessárias melhorias nos aspectos de saúde pública veterinária.

A principal espécie infectante para os bovinos é o Mycobacterium bovis , que ocorre no mundo todo e, além de constituir um grave problema de saúde pública, seus prejuízos representam significativas barreiras econômicas (Brasil, 2006BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Departamento de Defesa Animal. Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e Tuberculose. Manual Técnico 2006. 184p.). É endêmica no Brasil e afeta a economia por reduzir a produtividade do rebanho, e pelas perdas de carcaça em frigorífico. O agente é transmitido para os humanos, principalmente por meio do consumo do leite e derivados crus (Murakami et al., 2009MURAKAMI, P.S.; FUVERKI, R.B.N.; NAKATANI, S.M.; BARROS FILHO, I.R. de;BIONDO, A.W. Tuberculose bovina: saúde animal e saúde pública. Arquivos de Ciências Veterinárias e Zoologia da Unipar , v.12, n.1, p.67-74, 2009.). A redução da incidência da doença é possível caso sejam utilizadas as medidas de controle e abate de animais positivos, segundo o Programa Nacional de Controle de Erradicação da Brucelose e Tuberculose Animal (PNCEBT) (Castro et al., 2009CASTRO, K.G.; LIEVORE J.P.M.; CARVALHO, G.D. Tuberculose bovina: diagnóstico, controle e profilaxia. PUBVET , v.3, n.30, ed. 91, art. 648, 2009.).

A hipótese da intercorrência entre essas duas enfermidades baseia-se na associação à etiopatogenia e em dois fatores que podem interferir de forma interdependente: o manejo sanitário a que são submetidos os rebanhos e as características imunológicas do VLB (Mendes et al., 2011MENDES, E.I.; MELO, L.E.H.; TENÓRIO, T.G.S.; SÁ, L.M.; SOUTO, R.J.C.; FERNANDES, A.C.C.; SANDES, H.M.M.; SILVA, T.I.B. Intercorrência entre Leucose Enzoótica Bovina e Tuberculose em bovinos leiteiros do Estado de Pernambuco. Arquivos do Instituto Biológico , v.78, n.1, p.1-8, jan./mar. 2011.).

Com o intuito de verificar a intercorrência entre duas doenças infectocontagiosas no Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, o objetivo deste estudo foi investigar a ocorrência de bovinos soropositivos para LEB, a partir de amostras de soro sanguíneo de animais reagentes à tuberculinização.

Esta pesquisa foi conduzida de acordo com normas e aprovação do Comitê de Ética no Uso de Animais (CEUA) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), sob o protocolo nº 113/12.

Cento e trinta e três bovinos foram abatidos, todos com tuberculose diagnosticada a partir do teste cervical comparativo, sendo 117 fêmeas e 16 machos, adultos, mestiços leiteiros, oriundos de 5 propriedades rurais do Alto Paranaíba e Triângulo Mineiro no Frigorífico Frisago - Frigorífico Ltda. (Serviço de Inspeção Estadual nº 3957), de São Gotardo, MG, de acordo com normatização do PNCEBT.

Não foi realizado nenhum teste laboratorial para confirmar a presença do Mycobacterium bovis .

No momento da sangria, foi colhida uma amostra de sangue de cada animal, em tubo siliconizado sem anticoagulante, com capacidade de 10 mL. Tais amostras foram identificadas e transportadas, sob refrigeração, até o Laboratório de Doenças Infectocontagiosas da Faculdade de Medicina Veterinária da UFU.

O soro, obtido após a centrifugação das amostras por 5 minutos a 3.000 x g, foi conservado em temperatura de -20°C até a realização dos testes diagnósticos.

O diagnóstico de LEB, por meio da detecção de anticorpos séricos anti-VLB, foi realizado pela prova de IDGA, teste de referência preconizado pela Office International des Épizooties (OIE) por ter alta especificidade, além de ser viável e acessível (Tostes, 2005TOSTES, R.A. Situação da Leucose Bovina no Brasil: uma revisão. Colloquium Agrarie ,n.1, p.42-50, set. 2005.). O antígeno utilizado para diagnóstico foi produzido pelo Instituto Tecnológico do Paraná (TECPAR(r)TECPAR(r). Instituto de tecnologia do Paraná. Antígeno para diagnóstico de Leucose Enzoótica Bovina (s.d.)), segundo metodologia preconizada pelo fabricante.

Foram confeccionadas lâminas de vidro 25 x 76 mm com 4,5 mL de solução de agarose (1 g de ágar Noble dissolvido em 100 mL de solução tampão) e, após seu resfriamento, perfuraram-se rosetas com 7 poços, com 4 mm de diâmetro cada, distanciadas, no máximo, 3 mm entre si.

O poço central foi preenchido com 25 µL do antígeno. Ao redor dele foram colocadas as amostras de soro testadas, na quantidade de 25 µL, e os demais poços, também alternados, foram preenchidos com 25 µL de soro controle positivo. Após esse procedimento, as lâminas foram incubadas em temperatura ambiente (20 a 25ºC) em câmara úmida.

Os bovinos foram classificados em positivos e negativos, conforme a interpretação do teste, que foi feita com o auxílio de um foco de luz forte, a fim de verificar o aparecimento das linhas de precipitação entre antígeno e soro, observadas após 24, 48 e 72h de incubação (Fig. 1). Os resultados foram expressos por meio do cálculo de percentual simples (Siegel, 1975SIEGEL, S. Estatística no paramétrica México: Trillos, 1975.).

Figura 1:
Teste de imunodifusão em gel de ágar, mostrando as reações negativa (seta 1) e positiva (seta 2) de amostras de soro de animais abatidos em São Gotardo, MG, 2012.

Neste estudo, evidenciou-se a intercorrência entre duas doenças: uma bacteriana e outra viral, TB e LEB, respectivamente.

A ocorrência da leucose foi de 55,64% (74/133), valor intermediário aos encontrados por outros autores. O percentual de animais soropositivos para leucose varia consideravelmente entre os Estados (Tabela 1). Leite et al. (1984LEITE, R.C.; MODENA, C.M.; MOREIRA, E.C.; ABREU, J.J. Evolução clínica da Leucose Enzoótica Bovina. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia , v.36, n.1, p.47-57, 1984.) encontraram uma prevalência de 70,9% em Minas Gerais.

Tabela 1:
Frequência da leucose enzoótica bovina em diversos estados brasileiros.

Vale salientar que foram utilizadas amostras de soro sanguíneo provenientes de bovinos de cinco propriedades rurais e, em uma delas, Aniceto (2007ANICETO, F.M. Pesquisa de linfocitose persistente e exame citológico para diagnóstico de Leucose Bovina na Fazenda Do Glória, em Uberlândia - MG. Brasil. 2007. 37f. Monografia (Graduação em Medicina Veterinária) - Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2007.) registrou 26% de bovinos positivos para leucose. A diferença é que esse resultado foi obtido pela contagem de linfócitos, e não pela técnica de IDGA, utilizada no estudo em questão.

Em relação à tuberculose, as notificações oficiais indicaram uma prevalência média nacional de 1,3% de animais infectados entre os testados, entre os anos de 1989 e 1998 (Brasil, 2006BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Departamento de Defesa Animal. Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e Tuberculose. Manual Técnico 2006. 184p.); entretanto, esses dados são referentes a animais sujeitos a testes regulares, não sendo representativos da população bovina nacional (Veloso, 2014VELOSO, F.P. Prevalência e fatores de risco da tuberculose bovina no Estado de Santa Catarina . 2014. 31p. Dissertação (Mestrado em Saúde Animal) - Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária, Universidade de Brasília, Brasília, 2014. ).

Com o objetivo de estimar a prevalência da tuberculose bovina na população, vários estudos foram realizados em diferentes Estados (Tabela 2).

Tabela 2:
Estimativa da prevalência da tuberculose bovina em alguns estados brasileiros.

A LEB e a TB são doenças comumente detectadas no animal vivo, com base nos testes da IDGA e da tuberculina (OIE, 2008OIE - OFFICE INTERNATIONAL DES ÉPIZOOTIES. Código Zoosanitário Internacional. 2008. Disponível em: <Disponível em: http://www.oie.int >. Acesso em: 08 nov. 2013.
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), sendo que o primeiro demonstra alta especificidade, adequada sensibilidade e grande praticidade, sendo pouco dispendioso (Mammerickx et al., 1987MAMMERICKX, M. The immunodiffusion test for the detection of Bovine Leukemia Virus infected animals. BURNY, A.; MAMMERICKX, M. (Eds.). Enzootic bovine leukosis and bovine leukemia virus . Boston: Martinus Nijhoff, 1987. p.195-200.). O teste da tuberculina é aferido como de significativa especificidade para bovinos (Roxo, 1996ROXO, E. Tuberculose Bovina: Revisão. Arquivos do Instituto Biológico , v.63, n.2, p.91-97, 1996.).

Ao comparar o número de bovinos positivos para a leucose, dentre os reagentes para a tuberculose, concluiu-se que ambas as doenças estão disseminadas nesse rebanho, e que a infecção simultânea de muitos animais sugere que o vírus da LEB pode desempenhar algum papel no desencadeamento da TB, resultados que corroboram os estudos de Mendes et al. (2011MENDES, E.I.; MELO, L.E.H.; TENÓRIO, T.G.S.; SÁ, L.M.; SOUTO, R.J.C.; FERNANDES, A.C.C.; SANDES, H.M.M.; SILVA, T.I.B. Intercorrência entre Leucose Enzoótica Bovina e Tuberculose em bovinos leiteiros do Estado de Pernambuco. Arquivos do Instituto Biológico , v.78, n.1, p.1-8, jan./mar. 2011.).

A intercorrência entre as duas doenças já foi registrada por Melo (1999MELO, L.E.H. Avaliação da Intercorrência entre LeucoseEnzoótica, Tuberculose e Leptospirose dos bovinos em rebanhos produtores de leite C do Estado de São Paulo Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 1999.), em rebanhos do estado de São Paulo, e por Melo et al. (2010MELO, L.E.H.; FERNANDES, A.C.C.; SILVA, T.I.B.; TENÓRIO, T.G.S.; MENDES, E.I; BAPTISTA FILHO, L.C.F. Estudo retrospectivo e prospectivo da intercorrência entre leucose enzoótica e tuberculose dos bovinos em rebanhos leiteiros do estado de Pernambuco. Seminário Nacional sobre Brucelose e Tuberculose Animal (SNBTA), 2010. Anais... Belo Horizonte, 2010.), Fernandes et al. (2011FERNANDES, A.C.C.; TENÓRIO, T.G.S.; MENDES, E.I.; SILVA, T.I.B.; MELO, L.E.H. de. Leucose enzoótica e tuberculose dos bovinos: estudo retrospectivo e prospectivo da ocorrência em rebanhos leiteiros do estado de Pernambuco. Veterinária e Zootecnia (UNESP) , v.18, n.4, p.728-732, 2011.), Mendes et al. (2011MENDES, E.I.; MELO, L.E.H.; TENÓRIO, T.G.S.; SÁ, L.M.; SOUTO, R.J.C.; FERNANDES, A.C.C.; SANDES, H.M.M.; SILVA, T.I.B. Intercorrência entre Leucose Enzoótica Bovina e Tuberculose em bovinos leiteiros do Estado de Pernambuco. Arquivos do Instituto Biológico , v.78, n.1, p.1-8, jan./mar. 2011.) e Batista Filho (2012BATISTA FILHO, L.C.F. Análise leucométrica em bovinos tuberculinizados e sua aplicação no monitoramento da LeucoseEnzoótica em rebanhos do estado de Pernambuco 2012. 62p. Dissertação (Mestrado em Ciência Veterinária) - Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, 2012.), em rebanhos do estado de Pernambuco, o que demanda atenção de pesquisadores e autoridades sanitárias.

Embora a maioria dos animais infectados não apresente sintomatologia, a leucose gera perdas econômicas consideráveis (Rajão, 2008RAJÃO, D.S. Efeito da infecção pelo vírus da leucose enzoótica bovina na produção de leite e reprodução de rebanhos leiteiros 2008. 26p. Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinária Preventiva) - Escola de Veterinária, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2008.), e tais animais atuam como fonte de infecção para indivíduos sadios, lembrando que infecção e doença representam um mesmo risco na cadeia epidemiológica (Mendes et al., 2011MENDES, E.I.; MELO, L.E.H.; TENÓRIO, T.G.S.; SÁ, L.M.; SOUTO, R.J.C.; FERNANDES, A.C.C.; SANDES, H.M.M.; SILVA, T.I.B. Intercorrência entre Leucose Enzoótica Bovina e Tuberculose em bovinos leiteiros do Estado de Pernambuco. Arquivos do Instituto Biológico , v.78, n.1, p.1-8, jan./mar. 2011.).

Muscoplat et al. (1974MUSCOPLAT, C.C.; ALHAJI, I.; JOHNSON, D.W.; POMEROY, .KA.; OLSON, J.M.; LARSON, V.L.; STEVENS, J.B.; SORENSEN, D.K. Characteristics of lymphocyte responses to phytomitogens: comparison of responses of lymphocytes from normal and lymphocytotic cows. American Journal of Veterinary Research , v.35, n.8, p.1053-1055, 1974.), Wyers (1975WYERS, M. Rappelsur lesoncorna virus des animaux. Recueil de Médecine Vétérinaire , v.151, n.3, p.153-163, 1975.) e Castro et al. (1988CASTRO, N.H.C.; WALTER. J.; SANTOS, R.C.S. dos; D'ANGELINO, J.L.; BENESI, F.; BIRGEL, E.H.; BEÇAK, W. Cytogenetics study of cattle affected by persistent lymphocytosis. Journal of Veterinary Medicine , v.35, p.380-384, 1988.) afirmaram que o papel do VLB no desencadeamento de bacterioses oportunistas de importância clínico-epidemiológica e em saúde pública, como a tuberculose, é desconhecido.

Assim, não é possível determinar qual doença aconteceu primeiro, porém deve-se refletir que o animal, uma vez acometido, torna-se imunodeprimido, ficando vulnerável a novas infecções, sem condições de combatê-las, principalmente se a doença em questão for a LEB, visto que desorganiza o sistema imunológico do animal e pode não desenvolver sintomas que indiquem a sua ocorrência (Nascimento, 2011NASCIMENTO, V.R. Intercorrência de quatro doenças infectocontagiosas que acometem bovinos 2011. 30f. (Graduação em Medicina Veterinária) - Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2011.).

Diante dos resultados obtidos, foi constatado que houve intercorrência entre leucose e tuberculose, e que essas doenças encontram-se nos rebanhos estudados, destacando-se a leucose, que apresentou níveis significativos (55,64%). Assim, torna-se essencial maior vigilância dos rebanhos, com a adoção e implantação de medidas sanitárias rigorosas, a fim de controlar a disseminação do vírus e, consequentemente, evitar perdas na cadeia produtiva da bovinocultura. Além disso, pessoas que lidam com bovinos merecem atenção, dado o caráter zoonótico da tuberculose.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    10 Fev 2014
  • Aceito
    05 Jan 2016
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