Acessibilidade / Reportar erro

Perfil funcional de locomoção em um grupo de pacientes com lesão medular atendidos em um centro de reabilitação

Perfil funcional de locomoción en un grupo de pacientes con lesión medular atendidos en un centro de rehabilitación

Functional ambulation profile in a group of spinal cord injured patients attended at a rehabilitation center

Resumos

OBJETIVO: descrever o perfil de locomoção de um grupo de pacientes com lesão medular (LM), correlacionando-o com as características da amostra. MÉTODOS: setenta pacientes (50 com LM traumática e 20 com LM não-traumática). Instrumentos: Classificação Funcional da Marcha Modificada (CFMM), WISCI-II, Escala de Ashworth Modificada (EAM), Classificação AIS, Lower Extremities Muscle Score (AIS-LEMS). Estatística: descritiva, comparação entre grupos, testes de correlação considerando p<0,05. RESULTADOS: a média da idade dos pacientes foi de 36 anos; 72,9% dos pacientes eram homens; tempo médio de lesão: 4,7 anos; AIS: 38,6% A, 10% B, 22,8% C, 28,6% D; Nível de lesão: 32,8% cervical, 52,9% torácico, 14,3% lombossacro. Causas mais frequentes: PAF 30%; acidente automobilístico 18,6%; CFMM: CR 34,3%; marcha terapêutica 20%; domiciliar 12,8%; comunitária 32,9%. WISCI-II: 7,5. AIS-LEMS: 13,4. Houve diferença entre os grupos LM traumática e não-traumática quanto à idade, sexo, AIS, AIS-LEMS, CFMM e WISCI-II. Correlações significativas: AIS correlacionou-se positivamente com CFMM, WISCI-II, AIS-LEMS. Nível de lesão correlacionado negativamente com EAM. AIS-LEMS positivamente com a AIS, CFMM, WISCI-II e negativamente com apoio e órteses na deambulação. O tempo de lesão e a presença de dor incapacitante não se correlacionaram com as variáveis estudadas. CONCLUSÕES: o grupo de LM traumática era composto por pacientes mais jovens e com maior prevalência de lesão completa. A idade se correlacionou com o uso de aparelhos de auxílio à marcha e órteses. O desempenho funcional da marcha esteve ligado à AIS e ao AIS-LEMS, sendo que a marcha comunitária necessitou de um AIS-LEMS de pelo menos 32 pontos.

Traumatismos da medula espinhal; Marcha; Reabilitação; Locomoção


OBJETIVO: describir el perfil de locomoción de un grupo de pacientes con lesión medular (LM), correlacionándolo con las características de la muestra. MÉTODOS: setenta pacientes (50 con LM traumática y 20 con LM no traumática). Instrumentos: Clasificación Funcional de la Marcha Modificada (CFMM), WISCI-II, Escala de Ashworth Modificada (EAM), Clasificación AIS, AIS Lower Extremities Muscle Score (AIS-LEMS). Estadística: descriptiva, comparación entre grupos, testes de correlación considerando un p<0,05. RESULTADOS: el promedio de la edad de los pacientes fue de 36 años, 72,9% hombres, tiempo promedio de lesión de 4,7 años; 38,6% A, 10% B, 22,8% C, 28,6% D; nivel de lesión de 32,8% cervical, 52,9% torácico y 14,3% lumbo sacro. La causa más frecuente fue PAF 30%, accidente automovilístico con 18,6%. CFMM: CR 34,3% marcha terapéutica 20%, domiciliar 12.8%, comunitaria 32,9% WISCI-II: 7,5. AIS-LEMS: 13,4. Hubo diferencia entre los grupos LM traumático y no traumático según la edad, sexo, AIS, AIS-LEMS, CFMM y WISCI-II. Correlaciones significativas: AIS positivamente con CFMM, WISCI-II, AIS-LEMS. Nivel de lesión negativamente con apoyo y ortesis en la ambulación. El tiempo de lesión y la presencia de dolor discapacitante no se correlacionaron con las variables estudiadas. CONCLUSIONES: el grupo de LM traumático era compuesto por pacientes más jóvenes y con mayor prevalencia de lesión completa. La edad se correlacionó con el uso de aparatos de auxilio para la marcha y ortesis. El desempeño funcional de la marcha se correlacionó con AIS y el AISLEMS, siendo que la marcha comunitaria necesitó de un AISLEMS de por lo menos 32 puntos.

Traumatismos da medula espinal; Marcha; Rehabilitación; Locomoción


OBJECTIVE: to describe the locomotion profile of a group of spinal cord injured (SCI) patients and its correlation with the sample features. METHODS: seventy patients (50 with traumatic SCI and 20 non-traumatic) were assessed. Instruments: Modified Functional Ambulation Classification (MFAC), Walking Index for Spinal Cord Injury II (WISCI-II), Modified Ashworth Scale (MAS), American Spinal Injury Association Impairment Scale (AIS) and AIS Lower Extremities Muscle Score (AIS-LEMS). Statistics: descriptive, comparison between groups, correlation tests (considering p<0,05). RESULTS: average values were: age: 36 years, 72.9% males, average time of lesion 4.7 years. AIS A, 38.6%; AIS B, 10%; AIS C, 22.8%; AIS D, 28.6%. Level of lesion: 32.8% cervical, 52.9% thoracic, 14.3% lumbar. More prevalent etiologies: gunshot wounds 30% and car accidents 18%. MFAC: Non-ambulation, 34.3%; Therapeutic ambulation 20%, Household ambulation 12.8%, community ambulation (32.9%); WISCI-II: 7.5, AIS-LEMS: 13.4. There were differences between traumatic and non-traumatic groups concerning age, sex, AIS, AIS-LEMS, MFAC and WISCI-II. Significant correlations: AIS positively correlated to MFAC, WISCI-II and AIS-LEMS. Level of lesion negatively correlated to MAS. AIS-LEMS positively correlated to AIS, MFAC, WISCI-II and negatively correlated to support and orthosis during ambulation. Time of lesion and presence of disabling pain were not correlated to the studied variables. CONCLUSIONS: traumatic SCI group was composed by younger patients with higher prevalence of complete lesion. Age was correlated to the use of orthosis and walking devices. Functional performance of gait was correlated with AIS and AIS-LEMS, and a AIS-LEMS of at least 32 points was needed to achieve community gait.

Spinal cord injuries; Gait; Rehabilitation; Locomotion


ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE

Perfil funcional de locomoção em um grupo de pacientes com lesão medular atendidos em um centro de reabilitação

Functional ambulation profile in a group of spinal cord injured patients attended at a rehabilitation center

Perfil funcional de locomoción en un grupo de pacientes con lesión medular atendidos en un centro de rehabilitación

Ana Cristina FranzoiI; Ana Luiza BaptistaII; Ana Maria CarvalhoIII; Wagner GonçalvesIII; Anna Christina Boari RosaIII; Alexandre PintoIII; Kátia Regina CarvalhoIII

IMédica Fisiatra da Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação - ABBR - Rio de Janeiro (RJ), Brasil; Professora Adjunta de Medicina Física e Reabilitação da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ - Rio de Janeiro (RJ), Brasil

IIMédica Fisiatra da Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação - ABBR - Rio de Janeiro (RJ), Brasil

IIIFisioterapeuta da Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação - ABBR - Rio de Janeiro (RJ), Brasil

Correspondência Correspondência Ana Cristina Franzoi Rua Jardim Botânico, 660 - Jardim Botânico CEP 22461-000 - Rio de Janeiro (RJ), Brasil Email: anafranzoi@abbr.org.br

RESUMO

OBJETIVO: descrever o perfil de locomoção de um grupo de pacientes com lesão medular (LM), correlacionando-o com as características da amostra.

MÉTODOS: setenta pacientes (50 com LM traumática e 20 com LM não-traumática). Instrumentos: Classificação Funcional da Marcha Modificada (CFMM), WISCI-II, Escala de Ashworth Modificada (EAM), Classificação AIS, Lower Extremities Muscle Score (AIS-LEMS). Estatística: descritiva, comparação entre grupos, testes de correlação considerando p<0,05.

RESULTADOS: a média da idade dos pacientes foi de 36 anos; 72,9% dos pacientes eram homens; tempo médio de lesão: 4,7 anos; AIS: 38,6% A, 10% B, 22,8% C, 28,6% D; Nível de lesão: 32,8% cervical, 52,9% torácico, 14,3% lombossacro. Causas mais frequentes: PAF 30%; acidente automobilístico 18,6%; CFMM: CR 34,3%; marcha terapêutica 20%; domiciliar 12,8%; comunitária 32,9%. WISCI-II: 7,5. AIS-LEMS: 13,4. Houve diferença entre os grupos LM traumática e não-traumática quanto à idade, sexo, AIS, AIS-LEMS, CFMM e WISCI-II. Correlações significativas: AIS correlacionou-se positivamente com CFMM, WISCI-II, AIS-LEMS. Nível de lesão correlacionado negativamente com EAM. AIS-LEMS positivamente com a AIS, CFMM, WISCI-II e negativamente com apoio e órteses na deambulação. O tempo de lesão e a presença de dor incapacitante não se correlacionaram com as variáveis estudadas.

CONCLUSÕES: o grupo de LM traumática era composto por pacientes mais jovens e com maior prevalência de lesão completa. A idade se correlacionou com o uso de aparelhos de auxílio à marcha e órteses. O desempenho funcional da marcha esteve ligado à AIS e ao AIS-LEMS, sendo que a marcha comunitária necessitou de um AIS-LEMS de pelo menos 32 pontos.

Descritores: Traumatismos da medula espinhal; Marcha; Reabilitação; Locomoção

ABSTRACT

OBJECTIVE: to describe the locomotion profile of a group of spinal cord injured (SCI) patients and its correlation with the sample features.

METHODS: seventy patients (50 with traumatic SCI and 20 non-traumatic) were assessed. Instruments: Modified Functional Ambulation Classification (MFAC), Walking Index for Spinal Cord Injury II (WISCI-II), Modified Ashworth Scale (MAS), American Spinal Injury Association Impairment Scale (AIS) and AIS Lower Extremities Muscle Score (AIS-LEMS). Statistics: descriptive, comparison between groups, correlation tests (considering p<0,05).

RESULTS: average values were: age: 36 years, 72.9% males, average time of lesion 4.7 years. AIS A, 38.6%; AIS B, 10%; AIS C, 22.8%; AIS D, 28.6%. Level of lesion: 32.8% cervical, 52.9% thoracic, 14.3% lumbar. More prevalent etiologies: gunshot wounds 30% and car accidents 18%. MFAC: Non-ambulation, 34.3%; Therapeutic ambulation 20%, Household ambulation 12.8%, community ambulation (32.9%); WISCI-II: 7.5, AIS-LEMS: 13.4. There were differences between traumatic and non-traumatic groups concerning age, sex, AIS, AIS-LEMS, MFAC and WISCI-II. Significant correlations: AIS positively correlated to MFAC, WISCI-II and AIS-LEMS. Level of lesion negatively correlated to MAS. AIS-LEMS positively correlated to AIS, MFAC, WISCI-II and negatively correlated to support and orthosis during ambulation. Time of lesion and presence of disabling pain were not correlated to the studied variables.

CONCLUSIONS: traumatic SCI group was composed by younger patients with higher prevalence of complete lesion. Age was correlated to the use of orthosis and walking devices. Functional performance of gait was correlated with AIS and AIS-LEMS, and a AIS-LEMS of at least 32 points was needed to achieve community gait.

Keywords: Spinal cord injuries; Gait; Rehabilitation; Locomotion

RESUMEN

OBJETIVO: describir el perfil de locomoción de un grupo de pacientes con lesión medular (LM), correlacionándolo con las características de la muestra.

MÉTODOS: setenta pacientes (50 con LM traumática y 20 con LM no traumática). Instrumentos: Clasificación Funcional de la Marcha Modificada (CFMM), WISCI-II, Escala de Ashworth Modificada (EAM), Clasificación AIS, AIS Lower Extremities Muscle Score (AIS-LEMS). Estadística: descriptiva, comparación entre grupos, testes de correlación considerando un p<0,05.

RESULTADOS: el promedio de la edad de los pacientes fue de 36 años, 72,9% hombres, tiempo promedio de lesión de 4,7 años; 38,6% A, 10% B, 22,8% C, 28,6% D; nivel de lesión de 32,8% cervical, 52,9% torácico y 14,3% lumbo sacro. La causa más frecuente fue PAF 30%, accidente automovilístico con 18,6%. CFMM: CR 34,3% marcha terapéutica 20%, domiciliar 12.8%, comunitaria 32,9% WISCI-II: 7,5. AIS-LEMS: 13,4. Hubo diferencia entre los grupos LM traumático y no traumático según la edad, sexo, AIS, AIS-LEMS, CFMM y WISCI-II. Correlaciones significativas: AIS positivamente con CFMM, WISCI-II, AIS-LEMS. Nivel de lesión negativamente con apoyo y ortesis en la ambulación. El tiempo de lesión y la presencia de dolor discapacitante no se correlacionaron con las variables estudiadas.

CONCLUSIONES: el grupo de LM traumático era compuesto por pacientes más jóvenes y con mayor prevalencia de lesión completa. La edad se correlacionó con el uso de aparatos de auxilio para la marcha y ortesis. El desempeño funcional de la marcha se correlacionó con AIS y el AISLEMS, siendo que la marcha comunitaria necesitó de un AISLEMS de por lo menos 32 puntos.

Descriptores: Traumatismos da medula espinal; Marcha; Rehabilitación; Locomoción

INTRODUÇÃO

A lesão medular (LM) está associada a sintomas motores e sensitivos que levam a alteração da postura e deambulação1. Em 2008, a Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação (ABBR) atendeu em consulta médica, na especialidade de Fisiatria, 504 pacientes com sequelas de lesões medulares traumáticas (LMT) (295) e lesões medulares não-traumáticas (LMNT) (209), a causa mais comum de incapacidade em adultos em nosso centro de reabilitação (31%), ultrapassando inclusive as sequelas de acidentes vasculares cerebrais (456 pacientes).

A recuperação da marcha é um dos objetivos principais do tratamento de reabilitação tanto do ponto de vista dos pacientes como da equipe terapêutica2. A funcionalidade da marcha está relacionada à classificação da lesão medular American Spinal Injury Association Impairment Scale (AIS)3, nível de lesão e idade4. A marcha funcional tem alguns pré-requisitos incluindo segurança, velocidade, conforto e distância5. Reduções na velocidade da marcha e resistência em associação a outros fatores, como independência nas transferências, capacidade de subir e descer meio-fios, escadas e caminhar em áreas com multidões, podem contribuir para a limitação da capacidade de deambulação, que é o grau de independência da marcha no domicílio e na comunidade6.

O objetivo deste trabalho foi descrever o perfil de locomoção de um grupo de pacientes com LM, correlacionando-o com as características da amostra: idade, sexo, causa, tempo de lesão, espasticidade, presença de dor incapacitante, AIS e força muscular.

MÉTODOS

Desenho do estudo: estudo descritivo em corte transversal

Amostra: consecutiva de conveniência

Local: Centro de Reabilitação na cidade do Rio de Janeiro

Foram avaliados 70 pacientes, 50 deles com lesão medular traumática (LMT) e 20 com lesão medular não-traumática (LMNT).

Instrumentos utilizados

Para a categorização da marcha, foram utilizadas: Classificação Funcional da Marcha Modificada (CFMM)7, e o Índice de Marcha para lesão medular, Walking Index for Spinal Cord Injury II (WISCI-II)8, descritos nas Figuras 1 e 2; para a aferição da espasticidade, foi utilizada a Escala de Ashworth Modificada (EAM)9, obtida pela mobilização passiva dos joelhos e descrita na Figura 3.




A LM foi classificada em relação à sua extensão (completa ou incompleta) e ao seu nível por meio da AIS3.

Os níveis foram categorizados em: cervical, torácico e lombossacro.

A força muscular foi aferida utilizando-se o Exame Manual de Força Muscular (Figura 4) nos músculos-chave de membros inferiores direito e esquerdo: L2 (flexores de coxofemoral), L3 (extensores de joelhos), L4 (flexores de tornozelos), L5 (extensores de hálux) e S1 (extensores de tornozelos), calculando-se o: AIS Lower Extremities Muscle Score (AIS-LEMS) pela soma da pontuação de força muscular nos dez músculos-chave aferidos. O escore varia de 0 a 50.


Análise estatística

Estatística descritiva, testes de diferença entre grupos (Mann-Whitney, Kruskal-Wallis, Teste t de Student e χ2) e testes de correlação (Pearson e Spearman), considerando um p<0,05.

Os pacientes assinaram termo de consentimento livre e informado ao serem incluídos na pesquisa.

RESULTADOS

As características da amostra estudadas estão descriminadas na Tabela 1.

As causas das LM e espasticidade estão descritas nas Figuras 5, 6 e 7.




O desempenho da locomoção aferida pela CFMM e WISCI-II, assim como o índice motor AIS-LEMS estão descritos na Tabela 2.

A utilização de aparelhos de auxílio e órteses na marcha funcional (CFMM >2, n=32) estão descritas nas Figuras 8 e 9.



A análise da diferença entre os grupos de pacientes traumáticos e não-traumáticos está descrita na Tabela 3.

Utilizando-se o Teste de Kruskal-Wallis para calcular diferenças entre os níveis de lesão (cervical, torácico e lombossacro) e a categorização da marcha, não foram encontradas diferenças significativas em relação à CFMM (p=0,12) e WISCI-II (p=0,29). Em relação às diferenças entre as classificações AIS (AIS A, AIS B, AIS C e AIS D) e a categorização da marcha, foram observadas diferenças significativas em relação à CFMM e WISCI-II (p<0,01).

As médias encontradas no índice motor AIS-LEMS e seus respectivos intervalos de confiança para cada categoria da CFMM estão descritos na Tabela 4 e na Figura 10.


Algumas correlações significativas foram encontradas:

A idade se correlacionou com maior utilização de apoio (p=0,05) e de órteses (p=0,01) na deambulação.

A classificação AIS (A, B, C, D) se correlacionou positivamente com a CFMM, WISCI-II e com o índice motor AIS-LEMS, e negativamente com aparelhos de auxílio e órtese (p=0,01).

O nível de lesão (cervical, torácico ou lombossacro) se correlacionou negativamente (p=0,01) com a escala de Ashworth (quanto mais alto o nível, maior a espasticidade).

O índice motor AIS-LEMS se correlacionou positivamente com a Classificação AIS, CFMM, WISCI-II e negativamente com apoio e órteses na deambulação (p=0,01).

A CFMM e o WISCI-II se correlacionaram positivamente com a Classificação AIS e com o índice motor AIS-LEMS, porém negativamente com o uso de apoio e órteses na deambulação (p=0,01).

O tempo de lesão e a presença de dor incapacitante não se correlacionaram estatisticamente com as outras variáveis estudadas.

DISCUSSÃO

Quarenta e cinco por cento dos pacientes estudados readquiriram marcha funcional (pelo menos o nível de marcha domiciliar) após uma lesão medular. O desempenho do grupo traumático foi inferior à do não-traumático (32 e 80%, respectivamente).

Ao continuarmos comparando os grupos da nossa amostra (LMT e LMNT), não encontramos diferença em relação ao sexo, sendo mais prevalente o sexo masculino em ambos os grupos. Não houve diferença entre o tempo de lesão, sendo que nossa amostra era composta por pacientes com lesão já definida e estabilizada. Sessenta e dois pacientes tinham mais do que um ano de lesão ou doença e nenhum paciente tinha menos do queseis meses de lesão. Houve diferença em relação à idade, o que pode ser explicado pelo fato de as duas causas mais prevalentes no grupo de LMNT (11 pacientes, 55%) foram: estenose de canal cervical e paralisia espástica tropical, doenças que usualmente incidem acima da meia-idade10,11.

A classificação AIS foi diferente nos dois grupos, sendo maior a prevalência de lesões incompletas no grupo não-traumático. Este dado está em consonância com a literatura, que atribui uma maior recuperação neurológica no grupo de pacientes com LMNT12. O grupo LMT tinha 33 pacientes (66%) com lesão motora completa (AIS A e B), enquanto o grupo de LMNT tinha somente 1 (5%) paciente com AIS A, que apresentava uma sequela de mielomeningocele. Novamente, é importante salientar que a maioria dos diagnósticos do grupo de LMNT é de doenças caracterizadas por lesões incompletas (estenose de canal cervical e paralisia espástica tropical). As causas mais prevalentes de lesão medular motora completa foram: ferimentos por projétil de arma de fogo (14 pacientes) e acidentes automobilísticos (11 pacientes).

Os níveis de lesão (cervical, torácico e lombossacro) não foram diferentes entre os grupos, prevalecendo o nível torácico nos dois grupos.

O índice motor AIS-LEMS, a CFMM e o WISCI-II foram diferentes em ambos os grupos, o que é facilmente justificável pelo fato de a classificação AIS também ter sido diferente. O fato de o índice motor e o desempenho da marcha serem diferentes é uma consequência do fato de o maior número de lesões incompletas estarem no grupo de lesões não-traumáticas.

Quando se observou o intervalo de confiança do AIS-LEMS para cada categoria da CFMM, identificou-se que o que se destaca (não havendo interposição entre os grupos) é a CFMM 4 (marcha comunitária), que necessita de pelo menos um AIS-LEMS de 32 pontos.

Analisando-se as correlações significativas, observou-se que a idade se correlacionou com maior utilização de apoio e órteses. Indivíduos mais jovens dependeram menos de aparelhos de auxílio à marcha.

A classificação AIS se correlacionou positivamente com a CFMM e o WISCI-II e, consequentemente, com o AIS-LEMS; a correlação com o uso do aparelho de auxílios e órteses foi negativa, o que corrobora achados anteriores13. O único paciente com AIS A que apresentava marcha comunitária tinha um nível neurológico L3.

O nível de lesão não se correlacionou com a funcionalidade da marcha, mas se correlacionou inversamente com a espasticidade aferida pela EAM, o que é plenamente justificável anatomicamente. Lesões baixas frequentemente têm sinais de síndrome de neurônio motor inferior.

CONCLUSÃO

No grupo estudado houve diferenças entre as LMT e LMNT em relação à idade e classificação AIS, sendo que o grupo de LMT era composto por pacientes mais jovens e com maior prevalência de lesão completa.

A idade se correlacionou com o uso de aparelhos de auxílio à marcha e órteses.

O desempenho funcional da marcha neste grupo de pacientes foi correlacionada significativamente com a classificação AIS e com o índice motor de membros inferiores, sendo que a marcha comunitária necessitou de um AIS-LEMS de pelo menos 32 pontos.

Recebido: 14/8/2009

Aceito: 15/11/2009

Trabalho realizado na Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação - ABBR - Rio de Janeiro (RJ), Brasil.

  • 1. Barbeau H, Fung J, Leroux A, Ladouceur M. A review of the adaptability and recovery of locomotion after spinal cord injury. Prog Brain Res. 2002;137:9-25.
  • 2. Ditunno PL, Patrick M, Stineman M, Ditunno JF. Who wants to walk? Preferences for recovery after SCI: a longitudinal and cross-sectional study. Spinal Cord. 2008;46(7):500-6.
  • 3. Maynard FM, Bracken MB, Creasey G, Ditunno JF Jr, Donovan WH, Ducker TB, et al. International standards for neurological and functional classification of spinal cord injury. American Spinal Injury Association. Spinal Cord. 1997;35(5):266-74.
  • 4. Kay ED, Deutsch A, Wuermser LA. Predicting walking at discharge from inpatient rehabilitation after a traumatic spinal cord injury. Arch Phys Med Rehabil. 2007;88(6):745-50.
  • 5. Scivoletto G, Romanelli A, Mariotti A, Marinucci D, Tamburella F, Mammone A, et al. Clinical factors that affect walking level and performance in chronic spinal cord lesion patients. Spine (Phila Pa 1976). 2008;33(3):259-64.
  • 6. Kim CM, Eng JJ, Whittaker MW. Level walking and ambulatory capacity in persons with incomplete spinal cord injury: relationship with muscle strength. Spinal Cord. 2004;42(3):156-62.
  • 7. Viosca E, Martinez JL, Almagro PL, Gracia A, Gonzáles C. Proposal and validation of a new functional ambulation classification scale for clinical use. Arch Phys Med Rehabil. 2005;86(6):1234-8.
  • 8. Ditunno PL, Dittuno JF Jr. Walking index for spinal cord injury (WISCI II): scale revision. Spinal Cord. 2001;39(12):654-6.
  • 9. Bohannon RW, Smith MB. Interrater reliability of a modified Ashworth scale of muscle spasticity. Phys Ther. 1987;67(2):206-7.
  • 10. Araújo AQ, Andrade-Filho AS, Castro-Costa CM, Menna-Barreto M, Almeida SM. HTLV-I-associated myelopathy/tropical spastic paraparesis in Brazil: a nationwide survey. HAM/TSP Brazilian Study Group. J Acquir Immune Defic Syndr Hum Retrovirol. 1998;19(5):536-41.
  • 11. Baron EM, Young WF. Cervical spondylotic myelopathy: a brief review of its pathophysiology, clinical course, and diagnosis. Neurosurgery. 2007;60(1 Suppl 1):S35-41.
  • 12. Catz A, Goldin D, Fishel B, Ronen J, Bluvshtein V, Gelernter I. Recovery of neurologic function following nontraumatic spinal cord lesions in Israel. Spine (Phila Pa 1976). 2004;29(20):2278-82; discussion 2283.
  • 13. Wirz M, van Hedel HJ, Rupp R, Curt A, Dietz V. Muscle force and gait performance: relationships after spinal cord injury. Arch Phys Med Rehabil. 2006;87(9):1218-22.
  • Correspondência

    Ana Cristina Franzoi
    Rua Jardim Botânico, 660 - Jardim Botânico
    CEP 22461-000 - Rio de Janeiro (RJ), Brasil
    Email:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Mar 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2009
    Sociedade Brasileira de Coluna Al. Lorena, 1304 cj. 1406/1407, 01424-001 São Paulo, SP, Brasil, Tel.: (55 11) 3088-6616 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: coluna.columna@uol.com.br