Acessibilidade / Reportar erro

Estrutura de Capital, Internacionalização e Países de Destino de Empresas Brasileiras: Uma Análise da Hipótese Upstream-Downstream

RESUMO

Este estudo analisa os efeitos da definição do país de destino da internacionalização no endividamento das empresas multinacionais brasileiras, a partir da hipótese Upstream-Downstream. Para aprofundar na discussão da estabilidade sugerida pela teoria, este trabalho inseriu variáveis institucionais dos países alvo da internacionalização nos modelos econométricos utilizados pelos estudos anteriores, testando se a hipótese Upstream-Downstream continua válida. Partiu-se de uma amostra envolvendo empresas multinacionais e domésticas brasileiras de capital aberto entre os anos de 2007 a 2011, e como método estatístico aplicou-se a regressão com dados em painel. Os resultados mostram que as empresas brasileiras, ao definirem os países de destino de sua internacionalização, independentemente da maior ou menor estabilidade desses países em relação ao Brasil, aumentam seus endividamentos. Dentre as características presentes em países considerados mais estáveis, apenas o Índice de Percepção de Corrupção associou de forma positiva com o nível de endividamento das multinacionais.

Palavras-chave:
Estrutura de capital; Internacionalização; Hipótese upstream-downstream

ABSTRACT

This study examines the effect of defining the country of destination of the international debt of Brazilian multinationals, based on the Upstream-Downstream hypothesis. To deepen the discussion of stability suggested by the theory, this paper inserted institutional variables of the target countries of internationalization in econometric models used by previous studies, testing whether the hypothesis Upstream-Downstream remains valid. Starting from a sample involving Brazilian publicly traded multinational and domestic companies between the years 2007 to 2011 and as a statistical method, we performed a regression with panel data. The results show that Brazilian companies when defining the destination countries of internationalization, regardless of these countries presenting higher or lower stability in relation to Brazil, increase their indebtedness. The results showed that among the characteristics present in countries considered as more stable, only the Corruption Perception Index was positively associated with the level of indebtedness of multinationals.

Keywords:
Capital structure; Internationalization; Upstream-downstream hypothesis

1. INTRODUÇÃO

Segundo a UNCTAD (United Nations Conference on Trade and Development), as empresas multinacionais de países emergentes estão cada vez mais ganhando notoriedade no cenário internacional, e no Brasil os fluxos de investimentos diretos no exterior cresceram cerca de 88% no período de 2007 a 2012 (UNCTAD, 2014).

Em virtude do movimento crescente de internacionalização, estudos como os de Shapiro (1978)SHAPIRO, A. C. Financial structure and cost of capital in the multinational corporation.Journal of Financial and Quantitative Analysis, v.13, n.2, p. 211-26, jun., 1978., Lee e Kwok (1988)LEE, K.; KWOK C. C. Y. Multinational corporations vs. domes-tic corporations: International environmental factors and determinants of capital structure. Journal of International Business Studies, v.19, n.2, p.195-217, 1988. e Burgmann (1996)BURGMAN, T. A. An empirical examination of multinational corporate capital structure.Journal of international Business studies, Third Quarter, p. 553-570, 1996. investigaram as multinacionais sob a ótica financeira, com foco no endividamento, relatando que tais empresas desenvolvem suas atividades em uma realidade distinta daquela das empresas domésticas.

Desse modo, temas relevantes e controversos em finanças corporativas, tais como estrutura de capital associados às estratégias e formas de endividamento passam a ser investigados em um ambiente de internacionalização. Essa abordagem que associa tanto elementos da área de finanças, quanto da área de estratégia empresarial apresenta lacunas teóricas que ainda precisam ser investigadas - uma das linhas de investigação consiste na compreensão da estrutura de capital de multinacionais. As pesquisas sobre o assunto ainda não apresentam resultados conclusivos, tais como as de Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000., Saito e Hiramoto (2010)SAITO, R.; HIRAMOTO, E. Foreign activity effects and capital structure: Brazilian evidence. Academia, RevistaLatinoamericana de Administración, v. 45, p. 59-75, 2010. e Aybar e Thanakijsombat (2015)AYBAR, B.;THANAKIJSOMBAT, T. Financing decisions and gains from cross-border acquisitions by emerging-marketacquirers. Emerging Markets Review, 24, 69-80, 2015..

Nesse sentido, observa-se que os estudos que inserem a variável internacionalização nos modelos tradicionais de estrutura de capital têm apontado para direções opostas. De um lado, nota-se que, em algumas pesquisas, a internacionalização tem causado efeito positivo sobre o endividamento, (SINGH; NEJADMALAYERI, 2004SINGH, M.; NEJADMALAYERI, A. Internationalization, capital structure, and cost of capital: Evidence from French corporations. JournalofMultinational Financial Management, v.142, p. 153-169, 2004.; MITTOO; ZHANG, 2008MITTOO, U. R.; ZHANG, Z. The capital structure of multinational corporations: Canadian versus U.S. evidence. Journal of Corporate Finance, v. 14, p. 706-720, mai., 2008.; SAITO; HIRAMOTO, 2010SAITO, R.; HIRAMOTO, E. Foreign activity effects and capital structure: Brazilian evidence. Academia, RevistaLatinoamericana de Administración, v. 45, p. 59-75, 2010.), e por outro lado, nota-se que alguns estudos têm apontado para a direção contrária, evidenciando um efeito negativo (BURGMAN, 1996BURGMAN, T. A. An empirical examination of multinational corporate capital structure.Journal of international Business studies, Third Quarter, p. 553-570, 1996.; CHEN et al., 1997CHEN, C. J. P.; CHENG, C. S. A.; HE, J.; KIM, J.An investigation of the relationship between international activities and capital structure. Journal of International Business Studies, v.28, n.3, p. 563-577, 1997.).

Nesse sentido, Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000. aprofundaram nas investigações sobre a estrutura de capital de empresas internacionalizadas e constataram que as multinacionais dos Estados Unidos detinham um menor nível de endividamento quando comparadas com suas contrapartes locais, as chamadas empresas domésticas. Os resultados desse estudo culminaram na hipótese denominada de Upstream-Downstream, considerada um marco teórico no estudo do endividamento das multinacionais.

A explicação da proposição de Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000. reside no fato de que quando as empresas sediadas em economias mais estáveis se internacionalizam para economias menos estáveis, há uma tendência de elevação dos riscos da empresa. Esse fato aumenta o custo da dívida e, consequentemente, inibe um maior endividamento de tais empresas (efeito downstream). Por outro lado, quando as empresas sediadas em países de economias menos estáveis, ao se internacionalizarem para economias mais estáveis, estas passam a lidar com riscos menores e, portanto, tendem a apresentar maior nível de endividamento quando comparadas às domésticas (efeito upstream). Dessa forma, Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000. explicam que o grau de endividamento das multinacionais relaciona-se com o nível de estabilidade dos países de origem e destino da internacionalização.

No contexto brasileiro, Saito e Hiramoto (2010)SAITO, R.; HIRAMOTO, E. Foreign activity effects and capital structure: Brazilian evidence. Academia, RevistaLatinoamericana de Administración, v. 45, p. 59-75, 2010. confirmaram a validade da hipótese para o Brasil, porém não avançaram na teoria Upstream-Downstream ao não considerarem as características dos países para os quais as empresas se internacionalizaram. Existem lacunas teóricas as quais não foram abordadas pelos estudos anteriores e que carecem de maior aprofundamento, tal como a variabilidade institucional dos países.

Em relação aos efeitos que as características dos países podem exercer sobre a estrutura de capital das multinacionais, alguns estudos como os de La Porta et al. (1998)LA PORTA, R.; LOPEZ-DE-SILANES, F.; SHLEIFER, A.; VISHNY, R.W..Law and Finance.Journal of Political Economy, v.106, p. 1113-1155, jun.1998., De Jong et al. (2008)DE JONG, A., KABIR, R., NGUYEN, T.T. Capital structure around the world: The roles of firm- and country-specific determinants. Journal of Banking and Finance,v.32, p. 1954-1969, 2008., Kayo e Kimura (2011KAYO, E.K.; KIMURA, H. Hierarchical determinants of capital structure.Journal of Banking & Finance.v. 35, p. 358-371, 2011.) e Aybar e Thanakijsombat (2015)AYBAR, B.;THANAKIJSOMBAT, T. Financing decisions and gains from cross-border acquisitions by emerging-marketacquirers. Emerging Markets Review, 24, 69-80, 2015. podem contribuir para desvendar essa questão. Apesar de os autores não abordarem a condição internacional da firma e não testarem a validade da hipótese Upstream-Downstream, relataram como fatores intrínsecos aos países, tais como os riscos político-legais, o sistema de proteção aos credores e investidores, e o desenvolvimento do mercado de capitais que podem interferir na estrutura de capital das empresas.

Portanto, considerando o estado da arte da hipótese Upstream-Downstream, o objetivo deste estudo é analisar os efeitos da definição do país de destino da internacionalização no endividamento das empresas multinacionais brasileiras, a partir da hipótese Upstream-Downstream. Espera-se que conhecer as características específicas dos países que podem influenciar no endividamento das multinacionais contribua para tornar a hipótese Upstream-Downstream mais objetiva quando comparada com as classificações subjetivas utilizadas nos estudos anteriores, tais como a utilização dos termos “mais estável” e “menos estável”. Este trabalho pretende não apenas testar a hipótese Upstream-Downstream conforme Saito e Hiramoto(2010)SAITO, R.; HIRAMOTO, E. Foreign activity effects and capital structure: Brazilian evidence. Academia, RevistaLatinoamericana de Administración, v. 45, p. 59-75, 2010., mas também contribuir com o seu avanço por meio da inserção das variáveis institucionais e macroeconômicas dos países.

Espera-se que o presente estudo auxilie as empresas a delinear suas estratégias de internacionalização com base em informações mais consistentes e assertivas, permitindo que os gestores das multinacionais compreendam como as escolhas sobre a internacionalização podem afetar o endividamento das empresas.

Portanto, este trabalho pretende mitigar o gap teórico existente na literatura financeira sobre a estrutura de capital de multinacionais, contribuindo com o avanço da hipótese Upstream-Downstream, por meio da verificação empírica da atuação de multinacionais de um país emergente, tal como analisado no Brasil.

2. REVISÃO DE LITERATURA

2.1. ESTRUTURA DE CAPITAL E INTERNACIONALIZAÇÃO

Shapiro (1978)SHAPIRO, A. C. Financial structure and cost of capital in the multinational corporation.Journal of Financial and Quantitative Analysis, v.13, n.2, p. 211-26, jun., 1978., considerado um dos precursores do estudo do endividamento das multinacionais, afirmou que as empresas que se dedicam às atividades internacionais demandam um maior nível de financiamento quando comparadas com as empresas atuantes apenas no mercado doméstico.

Posteriormente, Lee e Kwok (1988)LEE, K.; KWOK C. C. Y. Multinational corporations vs. domes-tic corporations: International environmental factors and determinants of capital structure. Journal of International Business Studies, v.19, n.2, p.195-217, 1988. apresentaram estudos relevantes sobre empresas na condição internacional, e contrapondo-se ao que propunha Shapiro (1978)SHAPIRO, A. C. Financial structure and cost of capital in the multinational corporation.Journal of Financial and Quantitative Analysis, v.13, n.2, p. 211-26, jun., 1978., constataram que as multinacionais não têm menores custos de falência e não possuem maior nível endividamento do que as empresas domésticas. Essas evidências foram explicadas pelo fato de as multinacionais terem maiores custos de agência do que as empresas domésticas.

Chen et al.(1997)CHEN, C. J. P.; CHENG, C. S. A.; HE, J.; KIM, J.An investigation of the relationship between international activities and capital structure. Journal of International Business Studies, v.28, n.3, p. 563-577, 1997. prosseguiram com as investigações, acrescentando outros determinantes, tais como intangibilidade e oportunidades de crescimento. Observaram que as multinacionais com sede nos Estados Unidos são menos endividadas do que as domésticas, ressaltando que quanto maior o nível de internacionalização das empresas, menor seria o grau de alavancagem.

Após as evidências empíricas de que as multinacionais dos Estados Unidos eram menos alavancadas que seus pares domésticos, Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000. decidiram aprofundar nas investigações, procurando elementos entre os países que justificassem as evidências anteriores. Por meio da análise de uma amostra composta por 1.921 firmas de 32 países encontraram evidências de dois tipos de comportamentos distintos entre as empresas analisadas. De um lado, as empresas sediadas em mercados classificados como “menos estáveis”, ao se internacionalizarem, reduziram o risco do negócio e dessa forma perceberam um aumento do nível de endividamento (Efeito Upstream). Por outro lado, observaram que para as empresas dos Estados Unidos, considerado um país “mais estável”, a internacionalização proporcionaria maiores riscos e assim haveria redução na alavancagem das empresas, quando comparadas às contrapartes locais (Efeito Downstream).

Essas evidências contribuíram para os avanços dos estudos sobre estrutura de capital de multinacionais e por esse motivo ficaram conhecidas como a hipótese Upstream-Downstream. Tal proposição afirma a existência de uma relação negativa entre internacionalização e alavancagem financeira para empresas multinacionais dos Estados Unidos que decidem se internacionalizar, e uma relação positiva com o endividamento para empresas multinacionais sediadas em países menos estáveis.

Outros estudos foram feitos com empresas sediadas em outros países como na França (SINGH; NEJADMALAYERI, 2004SINGH, M.; NEJADMALAYERI, A. Internationalization, capital structure, and cost of capital: Evidence from French corporations. JournalofMultinational Financial Management, v.142, p. 153-169, 2004.), Canadá (MITTOO; ZHANG, 2008MITTOO, U. R.; ZHANG, Z. The capital structure of multinational corporations: Canadian versus U.S. evidence. Journal of Corporate Finance, v. 14, p. 706-720, mai., 2008.), Brasil (SAITO; HIRAMOTO, 2010SAITO, R.; HIRAMOTO, E. Foreign activity effects and capital structure: Brazilian evidence. Academia, RevistaLatinoamericana de Administración, v. 45, p. 59-75, 2010.; PEREIRA, 2013PEREIRA, V. S. Ensaios sobre os Efeitos da Internacionalização na Estrutura de Capital e Estrutura de Propriedade de Multinacionais Latino-Americanas. 2013. 135 f. Tese (Doutorado em Administração) - Escola de Administração de Empresas de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 2013.) e ratificaram a hipótese Upstream-Downstream.

Singh e Nejadmalayeri (2004)SINGH, M.; NEJADMALAYERI, A. Internationalization, capital structure, and cost of capital: Evidence from French corporations. JournalofMultinational Financial Management, v.142, p. 153-169, 2004. analisaram o comportamento de empresas francesas e encontraram evidências contrárias aos estudos das multinacionais dos Estados Unidos ao constatarem que o fator internacionalização relacionou-se de forma positiva com a alavancagem das empresas francesas no longo prazo.

Mittoo e Zhang (2008)MITTOO, U. R.; ZHANG, Z. The capital structure of multinational corporations: Canadian versus U.S. evidence. Journal of Corporate Finance, v. 14, p. 706-720, mai., 2008. testaram a hipótese Upstream-Downstream em empresas canadenses e também encontraram evidências contrárias aos estudos com multinacionais dos Estados Unidos ao observarem que as multinacionais canadenses são mais endividadas no longo prazo em comparação com empresas domésticas, corroborando com a hipótese de Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000..

Tratando-se de multinacionais de países emergentes, Aybar e Thanakijsombat (2015)AYBAR, B.;THANAKIJSOMBAT, T. Financing decisions and gains from cross-border acquisitions by emerging-marketacquirers. Emerging Markets Review, 24, 69-80, 2015. buscaram associações entre as decisões de financiamento, de investimento e valor da empresa, no período de 2000 a 2010. Os resultados sugeriram que a internacionalização afeta o valor da empresa no curto prazo, e foi observado também que o país de destino da internacionalização influencia no valor da empresa.

Estudos realizados no Brasil por Saito e Hiramoto (2010)SAITO, R.; HIRAMOTO, E. Foreign activity effects and capital structure: Brazilian evidence. Academia, RevistaLatinoamericana de Administración, v. 45, p. 59-75, 2010. confirmaram que a hipótese Upstream-Downstream é válida para as empresas brasileiras, porém não contribuíram com o seu avanço, pois utilizaram o mesmo modelo econométrico empregado por Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000.. Como resultados, observaram que as multinacionais brasileiras são mais alavancadas que as empresas domésticas em 9,6%, sendo que no longo prazo essa relação perfaz 5,8%.

Em relação aos trabalhos realizados com empresas de outros países (KWOK; REEB, 2000KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000.; SINGH; NEJADMALAYERI, 2004SINGH, M.; NEJADMALAYERI, A. Internationalization, capital structure, and cost of capital: Evidence from French corporations. JournalofMultinational Financial Management, v.142, p. 153-169, 2004.; MITTO; ZHANG, 2008MITTOO, U. R.; ZHANG, Z. The capital structure of multinational corporations: Canadian versus U.S. evidence. Journal of Corporate Finance, v. 14, p. 706-720, mai., 2008.; SAITO; HIRAMOTO, 2010SAITO, R.; HIRAMOTO, E. Foreign activity effects and capital structure: Brazilian evidence. Academia, RevistaLatinoamericana de Administración, v. 45, p. 59-75, 2010.), foram encontrados resultados opostos, uma vez que as multinacionais apresentaram maior nível de endividamento do que as empresas domésticas (efeito Upstream).

As evidências encontradas nos estudos tanto com empresas dos Estados Unidos, quanto com as de outros países, são explicadas pela hipótese Upstream-Downstream, postulada por Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000. e que se fundamenta no aumento dos riscos que a expansão internacional pode trazer para a empresa, impactando nos custos de agência da dívida das multinacionais e influenciando no nível de endividamento das empresas. De modo específico, o efeito Downstream implica que quanto maior for o grau de internacionalização da empresa, maior será o risco incorrido e, consequentemente, menor será a alavancagem. Contrapondo-se a essas implicações, o efeito Upstream explica que quanto maior for o grau de internacionalização da empresa, menores serão os riscos experimentados por elas e, em consequência, gerará maiores oportunidades de endividamento. Diante desse contexto, surge a seguinte hipótese de pesquisa:

H1: O grau de internacionalização das multinacionais brasileiras está associado positivamente ao nível de endividamento no curto, longo e total prazo dessas empresas?

Assim, Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000. ofereceram explicações às evidências empíricas encontradas nos trabalhos relacionados à estrutura de capital de multinacionais. No entanto, ainda cabe aos estudos buscar elementos empíricos que especifiquem o termo “estável” inserido pelos autores sem evidências consistentes. Ademais, este estudo não pretende apenas testar a validade da hipótese Upstream-Downstream no Brasil conforme proposto por Saito e Hiramoto (2010)SAITO, R.; HIRAMOTO, E. Foreign activity effects and capital structure: Brazilian evidence. Academia, RevistaLatinoamericana de Administración, v. 45, p. 59-75, 2010., mas também avançar e contribuir com a hipótese inserindo as características de variabilidade institucional e macroeconômica dos países de origem e destino da internacionalização e a medida DOI em sua forma multidimensional.

2.2. EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS

Tratando-se das variáveis no nível da firma e sob a ótica da teoria da Agência, Titman e Wessels (1988)TITMAN, S.; WESSELS, R. The determinants of capital structure choice. The Journal of Finance, v. 43, n. 1, p. 1-19, mar. 1988. encontraram sinal positivo para a relação entre tamanho da empresa e nível de endividamento e explicaram que quanto maior for a empresa, menor tende a ser o risco de falência. Pela ótica da teoria do Static Tradeoff, Rajan e Zingales (1995)RAJAN, R.G.; ZINGALES, L..What do we know about capital structure? Some evidence from international data.Journal of Finance,v. 50, p. 1421-1460, 1995. afirmam que essa relação pode ser negativa pelo fato de que em empresas maiores a assimetria informacional entre gestores e mercado de capitais é menor.

Em relação à oportunidade de crescimento, a teoria da Agência aponta para uma relação negativa com o nível de endividamento. De forma contrária, a teoria da Pecking Order sugere um sinal positivo para a relação, pois parte do princípio de que as fontes internas têm prioridade na captação de recursos.

A teoria da Pecking Order sugere que as fontes internas, tal como os lucros acumulados, são preferíveis pelos gestores quando comparadas com o endividamento (MYERS, 1984MYERS, S.C. The capital structure puzzle.The Journal of Finance, v. 39, p. 575- 592, jul. 1984.; MYERS; MAJLUF, 1984MYERS, S.C.; MAJLUF, N.S. Corporate financing and investment decisions when firms have information that investors do not have.Journal of Financial Economics,v.13, p. 187-221, jun. 1984.). Estudos no Brasil, como os de Perobelli e Famá (2002)PEROBELLI, F.F.C.; FAMÁ, R. Determinantes da estrutura de capital: aplicação a empresas de capital aberto no Brasil. Revista de Administração da USP (RAUSP), São Paulo, v.37, n.3, jul/set 2002., Procianoy e Schnorrenberger (2004)PROCIANOY, J.L.; SCHNORRENBERGER, A. A influência da estrutura de controle nas decisões de estrutura de capital das companhias brasileiras. Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, v.58, n.1, p.121-146, jan/mar 2004., Kayo et al. (2004)KAYO, E.K.; FAMÁ, R.; NAKAMURA, W.T.; MARTIN, D.M.L. Estrutura de capital e criação de valor: os determinantes da estrutura de capital em diferentes fases de crescimento das empresas. Revista Eletrônica de Administração (REAd), v.10, n.3, p.1-14, Rio Grande do Sul, mai/jun 2004., Silva e Valle (2008)SILVA, A. F.; DO VALLE, M. R. Análise da estrutura de endividamento: um estudo comparativo entre empresas brasileiras e americanas. Revista de Administração Contemporânea, Curitiba, v.12, n.1, p.201-229, Jan/Mar 2008., Silveira, Perobelli e Barros (2008)SILVEIRA, A.D.M.; PEROBELLI, F.F.C.; BARROS, L.A.B.C. Governança corporativa e os determinantes da estrutura de capital: evidências empíricas no Brasil. Revista de Administração Contemporânea(RAC),Curitiba, v.12, n.3, p.763-788, jul/set 2008. também confirmam o sinal negativo para a relação entre lucratividade e endividamento conforme sugere a corrente teórica da Pecking Order.

A teoria do Static Tradeoff explica que quanto maior for o risco de falência da empresa, menos propensos os credores estarão a emprestarem o capital para a firma, e só estarão dispostos a fazê-los mediante taxas de juros mais elevadas que compensem o risco da insolvência (TITMAN; WESSELS, 1988TITMAN, S.; WESSELS, R. The determinants of capital structure choice. The Journal of Finance, v. 43, n. 1, p. 1-19, mar. 1988.).

Segundo Kayo e Kimura (2011)KAYO, E.K.; KIMURA, H. Hierarchical determinants of capital structure.Journal of Banking & Finance.v. 35, p. 358-371, 2011., a tangibilidade é um fator importante para o nível de crédito empresarial pela possibilidade de os ativos serem utilizados como garantia, permitindo, dessa forma, o aumento da capacidade de endividamento da empresa. Em relação às teorias, tanto a Static Tradeoff quanto a Agência apontam para uma relação de sinal positivo entre o nível de tangibilidade dos ativos e o endividamento.

A teoria do Static Tradeoff entra em consenso com a teoria da Agência quanto ao sinal positivo da relação entre tangibilidade e endividamento pelo fato de que quando há excesso de recursos internos, elevar o nível de endividamento é uma forma de disciplinar o comportamento oportunista dos administradores (MYERS; MAJLUF, 1984MYERS, S.C. The capital structure puzzle.The Journal of Finance, v. 39, p. 575- 592, jul. 1984.).

Segundo a teoria da Pecking Order, a liquidez serve com fonte interna de captação de recursos e é preferível ao endividamento. Jensen e Meckling (1976)JENSEN, M.; MECKLING, W. Theory of the Firm: Managerial Behavior, Agency Costs, and Capital Structure. Journal of Financial Economics. v. 3, n. 4, p. 305-360, 1976. explicam que quanto maior a liquidez da empresa, menor será o seu endividamento, apresentando uma relação negativa.

O benefício fiscal, inicialmente proposto por Modigliani e Miller (1963)MODIGLIANI, F.; MILLER, M. Taxes and the cost capital: a correction. TheAmerican Economic Review, v. 53, n. 3, p. 433-443, jun. 1963., aponta o endividamento como opção preferível para a captação de recursos. Desse modo, quanto maior for a taxa de imposto de renda incidente sobre a base de cálculo dos impostos, maior será o benefício fiscal, incentivando assim o uso do de capitais de terceiros.Dessa forma, o endividamento perfaz uma fonte mais barata que o capital próprio e deve ser estimulado, conforme sugere a teoria do Static Tradeoff (TITMAN; WESSELS, 1988TITMAN, S.; WESSELS, R. The determinants of capital structure choice. The Journal of Finance, v. 43, n. 1, p. 1-19, mar. 1988.).

Em relação ao tipo de indústria, Kayo e Kimura (2011)KAYO, E.K.; KIMURA, H. Hierarchical determinants of capital structure.Journal of Banking & Finance.v. 35, p. 358-371, 2011. incluíram essa variável em seus modelos, utilizando características intrínsecas ao setor, tais como risco e índice de concentração. Os autores encontraram evidências empíricas de que as características de sustentabilidade do setor apresentaram relação positiva e significante com o nível de endividamento, indicando que as empresas integrantes dos setores com significativas oportunidades de crescimento são mais endividadas.

Em relação às variáveis no nível país, estudos como o de De Jong et al.(2008)DE JONG, A., KABIR, R., NGUYEN, T.T. Capital structure around the world: The roles of firm- and country-specific determinants. Journal of Banking and Finance,v.32, p. 1954-1969, 2008., fundamentados na teoria do Static Tradeoff, esclarecem que quanto mais o mercado de capitais de um país for desenvolvido e com consequente capitalização de mercado das empresas, maior será a oferta de capital próprio, o que tornará menor o custo dessa fonte de recursos. Assim, o desenvolvimento do mercado de capitais está negativamente relacionado ao nível de endividamento da firma.

Segundo La Porta et al. (1998)LA PORTA, R.; LOPEZ-DE-SILANES, F.; SHLEIFER, A.; VISHNY, R.W..Law and Finance.Journal of Political Economy, v.106, p. 1113-1155, jun.1998., o risco político-legal do país relaciona-se às fragilidades e imperfeições da política e da legislação a ele relacionadas. Kwok e Reeb (2000KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000.) explicam que os riscos incorridos pelas empresas são diferentes para os países e ressaltam que em economias emergentes os riscos dos projetos de investimentos se acentuam em relação às economias desenvolvidas.

A teoria da Agência sugere que a proteção dos direitos dos acionistas relaciona-se negativamente com o endividamento em virtude dos conflitos de interesses entre os stakeholders relacionados às leis de votação dos acionistas em assembleias e da distribuição dos dividendos obrigatórios.

Já os direitos dos credores relacionam-se de forma negativa com o nível de endividamento. Segundo a teoria do Static Tradeoff, se a proteção dos direitos dos credores for maior, os contratos dos credores poderão ser mais rigorosos, e dessa forma, inibir o endividamento das empresas.

Segundo De Jong et al.(2008)DE JONG, A., KABIR, R., NGUYEN, T.T. Capital structure around the world: The roles of firm- and country-specific determinants. Journal of Banking and Finance,v.32, p. 1954-1969, 2008., a formação bruta de capital, assim como o crescimento econômico, influenciam negativamente na estrutura de capital das empresas pelo fato de que quando as empresas possuem um maior nível de fundos disponíveis, como a alta lucratividade e liquidez, elas optam por utilizar essas fontes internas, levando-as à tendência de reduzir a utilização das dívidas.

Faulkender e Petersen (2006)FAULKENDER, M.; PETERSEN, M.A. Does the source of capital affect the capital structure? The Review of Financial Studies, New York, v. 19, n.1, p.45-79, 2006. analisaram a relação entre estrutura de capital e disponibilidade de crédito e obtiveram como resultados que a alavancagem se relaciona positivamente com o crédito disponível às empresas. Segundo a teoria do Static Tradeoff, as empresas preferem se endividar a utilizar fontes próprias de recursos, em função da abundância e das facilidades do crédito oferecido pelas instituições financeiras.

Camara (2012)CAMARA, Omar. Capital Structure Dynamics of US-based Multinationals (MNCs) and Domestic (DCs) firms. Thesis submitted for the degree of PhD at the University of St Andrew, 2012. investigou os efeitos dos fatores macroeconômicos na estrutura de capital de empresas multinacionais e domésticas sediadas nos Estados Unidos, no período compreendido entre 1991 e 2009. Como resultados, o autor observou que as condições macroeconômicas exercem efeitos diferentes sobre multinacionais e domésticas. Em um período de crescimento do PIB, as multinacionais se ajustam mais rapidamente quando comparadas com suas contrapartes locais.

Zeballos, Seifert e Protopappa-Sieke (2013)ZEBALLOS, Ariel C.; SEIFERT, Ralf W.; PROTOPAPPA-SIEKE, Margarita.Single product, finite horizon, periodic review inventory model with working capital requirements and short-term debt.Computers&OperationsResearch n. 40, p. 2940-2949, 2013. investigaram como as empresas podem definir o nível ótimo de capital de giro em conjunto com as dívidas de curto prazo por meio da análise da taxa de juros e dos atrasos de pagamentos. Como resultados, os autores observaram que o maior acesso a financiamentos de curto prazo não interferem no fluxo de caixa das empresas, porém quando há restrição nas dívidas de curto prazo ou quando os atrasos nos pagamentos aumentam, a meta de capital de giro eleva-se rapidamente.

Duppati e Rao (2015)DUPPATI, Geeta R; RAO, Narendar V. Cross-border mergers and acquisitions: Mature markets vs. emerging markets - with special reference to the USA and India. Cogent Business & Management. n. 2, p.1-11, 2015. compararam o desempenho financeiro de longo prazo de empresas indianas com o de empresas dos Estados Unidos após a internacionalização. Como resultados, os autores observaram que além de os mercados terem reagido positivamente no curto prazo, o desempenho financeiro no longo prazo também foi positivo.

A variação cambial influencia no nível de endividamento das multinacionais à medida que essas empresas obtêm dívidas em moeda estrangeira, como no caso do dólar dos Estados Unidos, e não se protegem contra os riscos de uma subvalorização da moeda doméstica.Nesse contexto, elaborou-se a seguinte hipótese de pesquisa:

H2: Após a inserção de variáveis relacionadas ao grau de estabilidade dos países de origem e destino da internacionalização, a hipótese Upstream-Downstream torna-se válida para as empresas brasileiras?

As hipóteses serão testadas empiricamente com o objetivo de avançar na hipótese Upstream-Downstream, conforme procedimentos metodológicos a serem testados a seguir.

3. ASPECTOS METODOLÓGICOS

Em decorrência dos objetivos da pesquisa, optou-se por realizar um estudo descritivo, por meio de uma abordagem quantitativa, a partir dos pressupostos da construção das hipóteses, as quais serão testadas mediante o tratamento estatístico.

3.1. AMOSTRA E FONTE DE DADOS

A pesquisa teve como escopo todas as empresas não financeiras e ativas de capital aberto no Brasil, sendo excluídas as empresas que apresentaram valores negativos para o total de ativos ou patrimônio líquido. Em relação aos outliers, os casos situados no limite superior ou inferior a 1,5 interquartis foram excluídos da amostra.

A inserção das empresas domésticas na amostra teve a finalidade de controle dos resultados, permitindo verificar se os possíveis efeitos ocorreram em função da internacionalização, ou se o mesmo efeito pode ser observado nas empresas domésticas.

A pesquisa utilizou o critério Grau de Internacionalização (DOI) superior a 0%. Logo, as firmas com DOI igual a 0% foram consideradas como domésticas. Após o tratamento dos dados e exclusões, obteve-se uma amostra final formada por 1.199 observações empresa-ano, entre multinacionais e domésticas, conforme Tabela 1.

Tabela 1
Amostra final: total de observações distribuídas por ano

A partir da amostra final, investigaram-se quais foram os países envolvidos nas relações com as multinacionais, que posteriormente foram associados às respectivas empresas. Dessa forma, cada empresa se internacionalizou para no mínimo um país em cada ano da amostra.

Os dados referentes às variáveis independentes no nível da empresa e da indústria foram extraídos do Economática e do Compustat. Em relação às variáveis condizentes ao grau de internacionalização e dos respectivos modos de entrada, foram utilizados os relatórios financeiros disponíveis nos sites das bolsas de valores, dados da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e Caribe), da UNCTAD, de informações da base de dados do Worldscope, Economática, Compustat, dos Guias da Revista Exame 500 Melhores e Maiores e do Ranking das Transnacionais Brasileiras publicado pela Fundação Dom Cabral (FDC).

A listagem dos países de destino internacionalização foi obtida por meio dos relatórios da administração e notas explicativas constantes no site da BM&FBOVESPA, nos sites das empresas e nas edições do Ranking das Transnacionais Brasileiras (FDC). A outra parcela das informações foi obtida de forma primária por meio de contatos realizados com os departamentos de relações com investidores das empresas. Os dados relacionados às variáveis institucionais e macroeconômicas dos países foram extraídos da base de dados disponível no site do Banco Mundial. Para extrair informações relativas à variável Índice de Percepção de Corrupção, utilizou-se o site da organização mundial,Transparency International.

3.2. VARIÁVEIS DO ESTUDO

As variáveis dependentes são representadas pelo endividamento de curto, de longo e total prazo. Os dados para composição dessas variáveis foram extraídos somente pelo valor de mercado para que fossem evitadas possíveis distorções dos valores contábeis. Posteriormente, foram inseridas no modelo de análise pela sigla LEVERAGE, conforme Quadro 1.

Quadro 1
Variáveis dependentes utilizadas no modelo: formas de endividamento.

As variáveis independentes utilizadas no estudo são apresentadas nos Quadros 3, 4 e 5, onde são descritos os critérios de mensuração, a fonte, os efeitos encontrados pelas respectivas teorias e os principais autores que estudaram essas relações.

Quadro 2
Variáveis independentes relacionadas às características da firma
Quadro 3
Variáveis independentes relacionadas à internacionalização de empresas
Quadro 4
Variáveis independentes relacionadas às características dos países
Quadro 5
Agrupamento das variáveis em fatores conforme análise fatorial

A seguir, o Quadro 3 apresenta as variáveis independentes relacionadas às características da internacionalização das empresas, a sigla utilizada no modelo econométrico, a forma de mensuração, a fonte, os efeitos esperados e os autores dos estudos relacionados com a referida base teórica.

A pesquisa utilizou como parâmetro do nível de internacionalização das empresas o índice DOI (Degree of Internationalization) da UNCTAD lançado no relatório anual da entidade, por tratar de um índice multidimensional que abrange tanto aspectos de mercado, quanto de mão de obra e ativos no exterior, sendo adotado no Ranking das Transnacionais do Brasil (FDC) realizado anualmente pela Fundação Dom Cabral e utilizado também no Ranking das Transnacionais da Índia (2012).

Assim, conforme o Quadro 4, partiu-se de oito características institucionais dos países de destino da internacionalização, envolvendo fatores macroeconômicos e institucionais dos países de origem e destino da internacionalização.

A literatura financeira tem mostrado que fatores intrínsecos aos países, como as características macroeconômicas, influenciam na estrutura de capital das empresas (LA PORTA et al., 1998LA PORTA, R.; LOPEZ-DE-SILANES, F.; SHLEIFER, A.; VISHNY, R.W..Law and Finance.Journal of Political Economy, v.106, p. 1113-1155, jun.1998.; KAYO; KYMURA, 2011KAYO, E.K.; KIMURA, H. Hierarchical determinants of capital structure.Journal of Banking & Finance.v. 35, p. 358-371, 2011.). Portanto, conforme os estudos apontados, esta pesquisa analisará os seguintes determinantes macroeconômicos e institucionais dos países que podem influenciar no endividamento das empresas.

Conforme relatado por Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000., as variáveis do Quadro 4 se traduzem em parâmetros que caracterizam a estabilidade dos países, e com base nessas variáveis, a hipótese Upstream-Downstream justifica as diferenças de níveis de endividamento das empresas. Portanto, ressalta-se que as variáveis relacionadas no Quadro 4 serão analisadas posteriormente na estimação do modelo de regressão com dados em painel.

Ressalta-se que os efeitos dos anos (2007-2011), dos modos de entrada (EMODT) e do setor da indústria (IND) foram controlados por meio de variáveis dummies com o objetivo de identificar comportamentos específicos no período da amostra e quais os impactos nos resultados da estimação dos modelos.

3.3. PROCEDIMENTOS ECONOMÉTRICOS

Com o intuito de verificar a possível multicolinearidade entre as variáveis de controle, realizou-se o teste VIF (Variance Inflation Factor) do conjunto de regressores com a variável dependente, adotando-se como parâmetro o valor médio do VIFda Equação1de tal forma que não extrapolasse o valor 10, conforme explicado por Gujarati (2006).

(1) LEVERAGE it = α 1 + β 1 SIZE it + β 2 GROW it + β 3 PROF it + β 4 RISK it + β 5 TANG it + β 6 LIQUID it + β 7 TAX it + β 8 DOI it + β 9 CPREV it + β 10 DIRLEG it + β 11 SP it + β 12 CPMER it + β 13 CPI it + β 14 FBCAP it + β 15 PIB it + β 16 INFL it 2008 2011 γ j * Y E A R T + J = 1 18 θ T * I N D j + C = 1 2 θ C * E M O D T C + ω it

No entanto, os testes mostraram que o valor do VIF foi de 10,53. Para corrigir esse problema, optou-se por realizar a análise fatorial das variáveis institucionais e macroeconômicas com a finalidade de resumi-las em fatores e mitigar a colinearidade entre elas.

O Quadro 5, a seguir, apresenta os fatores, a nomenclatura, as siglas e a descrição das variáveis que o compõem, conforme resultados do teste VIF.

A variável representada pelo FACTOR 1 relaciona-se ao contexto de capitalização propiciado pelo mercado às empresas e à proteção dos direitos legais baseados no princípio da segurança jurídica adotado pelos países.

O FACTOR 2 relaciona-se à percepção da corrupção nos respectivos países sendo representada pela variável Índice de Percepção de Corrupção (CPI). O FACTOR 3 corresponde aos fundamentos macroeconômicos do crescimento e é representado pela variação anual do Produto Interno Bruto (PIB) e pela Inflação (INFL) dos países.

Após a análise fatorial, realizou-se novamente o teste de multicolinearidade e encontrou-se como valor médio o resultado de 4,39 (aceito pela literatura de finanças corporativas). O resultado completo do teste encontra-se disponível no Apêndice A APÊNDICE A. Tabela 4 Resultado do teste VIF Variáveis STLEV Variáveis de Controle VIF size 26.84 factor1 22.91 _ind_10 10.75 _ind_6 7.46 _ind_4 6.07 _ind_18 6.01 factor3 5.91 _ind_14 5.77 _ind_3 4.86 _ind_19 4.16 _ind_13 3.3 _ind_17 3.14 _ind_16 3.11 _ind_2 3.11 factor2 2.58 doi 2.46 _ind_5 2.32 _ind_11 2.29 _year_2009 2.28 _year_2011 2.18 _emodt_2 2.17 _ind_7 2.06 _ind_9 2.04 _year_2008 1.95 _ind_12 1.9 _ind_15 1.88 _ind_8 1.77 grow 1.77 _year_2010 1.76 _emodt_3 1.71 tang 1.59 risk 1.57 prof 1.47 liquid 1.41 tax 1.09 VIF Médio 4.39 Fonte: Resultados da pesquisa .

Em decorrência da análise fatorial, obteve-se a Equação 2 que foi testada nas três modalidades de endividamento, curto (STLEV), longo (LTLEV) e total (TLEV), conforme:

(2) LEVERAGE it = α 1 + β 1 SIZE it + β 2 GROW it + β 3 PROF it + β 4 RISK it + β 5 TANG it + β 6 LIQUID it + β 7 TAX it + β 8 DOI it + β 9 F A C T O R 1 it + β 10 F A C T O R 2 it + β 11 F A C T O R 3 it + 2008 2011 γ J * Y E A R T + J = 1 18 θ T * I N D J + C = 1 2 θ C * E M O D T C + ω it

Para as análises dos dados, utilizou-se regressão múltipla de dados em painéis. Para verificar qual o modelo (efeitos fixos, aleatórios ou pooled) mais adequado para a amostra, utilizou-se o teste de Chow, Hausman e Breush-Pagan. Ao nível de significância de 1%, o modelo de efeitos fixos mostrou-se mais adequado para as variáveis dependentes STLEV e TLEV. Já para a variável dependente LTLEV, o modelo de efeitos aleatórios mostrou-se mais adequado, conforme Tabela 2.

Tabela 2
Teste de Wooldridge para verificação dos problemas de autocorrelação

No entanto, em função dos resultados dos p-valor para os modos de endividamento, STLEV (7%) e TLEV (4%), optou-se por estimar os dados também no modelo de efeitos fixos, com o objetivo de dar maior robustez aos resultados.

Para identificar a adequação dos modelos aos pressupostos, além da multicolinearidade, foi realizado o teste de Wooldridge para identificar problemas de autocorrelação, o teste de Wald para identificar problemas de heterocedasticidade, o teste de Jarque-Bera para testar a normalidade dos resíduos e a plotagem gráfica para verificar a linearidade dos coeficientes. Foram encontrados problemas de multicolinearidade que foram resolvidos por meio da análise fatorial; problemas de autocorrelação e heterocedasticidade que foram resolvidos utilizando-se os erros-padrão robustos, através da estimação da variância pela matriz de variâncias-covariâncias robusta de Huber-White (SandwichEstimatorof Variance). Não houve violação dos pressupostos quanto à normalidade dos resíduos. Os gráficos das variáveis de teste do estudo (fatores) com as variáveis dependentes apresentaram comportamento próximos à linearidade.

4. RESULTADOS EMPÍRICOS

O modelo desenvolvido partiu do estado da arte em que se encontra a hipótese Upstream-Downstream, iniciada com o trabalho de Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000., sendo corroborado por Singh e Nejadmalayeri (2004)SINGH, M.; NEJADMALAYERI, A. Internationalization, capital structure, and cost of capital: Evidence from French corporations. JournalofMultinational Financial Management, v.142, p. 153-169, 2004., Mittoo e Zhang (2008)MITTOO, U. R.; ZHANG, Z. The capital structure of multinational corporations: Canadian versus U.S. evidence. Journal of Corporate Finance, v. 14, p. 706-720, mai., 2008., Saito e Hiramoto (2010)SAITO, R.; HIRAMOTO, E. Foreign activity effects and capital structure: Brazilian evidence. Academia, RevistaLatinoamericana de Administración, v. 45, p. 59-75, 2010. e Pereira (2013)PEREIRA, V. S. Ensaios sobre os Efeitos da Internacionalização na Estrutura de Capital e Estrutura de Propriedade de Multinacionais Latino-Americanas. 2013. 135 f. Tese (Doutorado em Administração) - Escola de Administração de Empresas de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 2013.. Ressalta-se que esses estudos não consideraram a variabilidade institucional dos países.

Portanto, este estudo critica os estudos anteriores e insere no modelo as referidas variáveis. Assim, a Tabela 3 apresenta os resultados dos testes estatísticos estimados por meio de regressões conforme Modelo 2, sendo realizados com correção de problemas de autocorrelação e heterocedasticidade o robust para os três modos de endividamento (STLEV, LTLEV e TLEV). Observou-se que os coeficientes das regressões de STLEV e TLEV mantiveram a mesma relação tanto para as estimativas realizadas por efeitos fixos quanto para efeitos aleatórios, o que dá robustez aos resultados encontrados.

Tabela 3
Resultados das regressões com dados em painel conforme Modelo 2

Nesse sentido, este estudo pretende contribuir com o avanço da hipótese por meio da inserção das características dos países alvo da internacionalização de forma a controlar, por meio de variáveis dummies, os efeitos dos anos, do modo de entrada e do setor da indústria sobre o endividamento das multinacionais brasileiras, conforme descrito no Modelo 2.

4.1. ANÁLISES DO ENDIVIDAMENTO NO CURTO PRAZO (STLEV)

Observa-se na Tabela 3 que as variáveis DOI e a EMODT 2 apresentaram relação estatística positiva e significante ao nível de 1%. Em nível de significância estatística de 5%, a variável TAX (benefício fiscal) apresentou relação negativa.

Já as variáveis FACTOR 1 (capitalização e proteção), controle do ano YEAR 2009 e EMODT 3 (modo de entrada patrimonial) apresentaram relação estatística positiva ao nível de significância de 10%. Nota-se que tanto o DOI quanto o FACTOR 1 associaram-se de forma positiva com o endividamento, indicando que quanto mais internacionalizadas forem as multinacionais brasileiras em relação aos países em que se oferecem boas condições de obter crédito privado, que possuem bom nível de capitalização de mercado e de formação bruta de capital, um sistema jurídico-legal eficiente e seguro, mais endividadas serão essas empresas no curto prazo.

O controle realizado com os modos de entrada evidenciou que as duas modalidades, tanto a patrimonial quanto a não patrimonial, associaram-se de forma negativa e significante com o endividamento de curto prazo, ratificando a hipótese de que as multinacionais como um todo são mais endividadas em relação às domésticas.

Em relação ao controle realizado para os anos da amostra, observou-se que os anos de 2008 e 2009 foram estatisticamente significantes, apresentando uma relação positiva no curto prazo, sendo que uma possível justificativa seria a influência da crise financeira americana.

Desse modo, observou-se que a inserção das variáveis institucionais que caracterizam os países trouxe elementos que avançam a aplicação da hipótese para multinacionais de países emergentes. Notou-se que as características de capitalização e proteção oferecidas pelos países às multinacionais brasileiras influenciaram na determinação do nível de endividamento de curto prazo.

4.2. ANÁLISES DO ENDIVIDAMENTO NO LONGO E TOTAL PRAZO

O grau de internacionalização (DOI) relacionou-se positivamente ao nível de significância de 5%, no longo e total prazo conforme a Tabela 3. Assim como apontado no curto prazo, o longo e o prazo total também condizem com a hipótese Upstream-Downstream ao afirmar que em países emergentes, quanto mais internacionalizadas forem as multinacionais, maiores serão os seus níveis de endividamento.

A variável (FACTOR 1), que representa a capitalização e a proteção dos países, relacionou-se de modo significativo a 1% e de forma negativa com o nível de endividamento. Esse fato aponta para a hipótese de que quanto melhores forem as condições de obter crédito privado associado a um mercado de capitais desenvolvido, com uma significativa formação bruta de capital e uma eficiente segurança jurídica do país, menor será o endividamento de longo e total prazo. Essas evidências não condizem com os pressupostos da hipótese Upstream-Downstream ao afirmarem que multinacionais de países emergentes, ao se internacionalizarem para países mais estáveis, tenderiam ao maior endividamento.

A variável FACTOR 2 (Índice de Percepção de Corrupção) associou-se de forma positiva e significante com o endividamento, apontando para o fato de que quanto mais o país atua na prevenção da corrupção, maior será o endividamento das multinacionais brasileiras com atividades naquele país. Essa evidência torna a hipótese mais objetiva ao evidenciar resultados contundentes.

Os fundamentos macroeconômicos do desenvolvimento, representado pelo FACTOR 3 (PIB e Inflação), mostraram-se significativos, porém relacionaram-se de forma negativa com o endividamento de longo prazo. Essa constatação também não condiz com a hipótese Upstream-Downstream, a qual afirma que as multinacionais de países menos estáveis, ao se internacionalizarem para países mais estáveis, tendem a ser mais endividadas do que suas contrapartes locais.

Assim como na análise do curto prazo, no longo prazo os anos de 2009 e 2011 foram significativos estatisticamente e relacionaram-se de forma negativa com o endividamento. A justificativa também seria a mesma do curto prazo, a influência da crise financeira americana.

Em relação aos modos de entrada, os resultados desta pesquisa foram condizentes com a previsão teórica para o endividamento total, e segundo Pereira (2013)PEREIRA, V. S. Ensaios sobre os Efeitos da Internacionalização na Estrutura de Capital e Estrutura de Propriedade de Multinacionais Latino-Americanas. 2013. 135 f. Tese (Doutorado em Administração) - Escola de Administração de Empresas de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 2013., estes incrementam em 5% na explicação da dívida.

4.3. SÍNTESE DOS RESULTADOS

Diante das análises dos modos de endividamento, encontrou-se associação positiva entre grau de internacionalização e nível de endividamento. Portanto, não se rejeita a validade da hipótese H1: O grau de internacionalização das multinacionais brasileiras está associado positivamente ao nível de endividamento no curto, longo e total prazo dessas empresas. Nos três modos de endividamento, o grau de internacionalização foi condizente com a previsão teórica, ou seja, quanto mais internacionalizadas forem as empresas de países emergentes, maior tende a ser o nível de endividamento, conforme apresentado no Quadro 6.

Quadro 6
Internacionalização: Síntese dos Principais Resultados

No nível país, a variável Capitalização e Proteção não se mostrou condizente com a explicação teórica proposta por Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000.. Os autores afirmam que se multinacionais de países menos estáveis, ao se internacionalizarem para países mais estáveis e com menores riscos, o nível de endividamento tende a se elevar. Porém, as análises estatísticas evidenciaram o oposto. Países que detêm bons indicadores de nível de crédito privado, com sistema de mercado de capitais desenvolvido, com crescente formação bruta de capital e segurança jurídica dos direitos de acionistas e credores não proporcionam às multinacionais brasileiras melhores condições para elevar o nível de endividamento conforme sugerido pela teoria de Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000..

O Índice de Percepção de Corrupção (FACTOR 2), mostrou-se estatisticamente significante ao nível de endividamento no longo e total prazo. As empresas que se internacionalizam para países menos corruptos, tendem a elevar seu nível de endividamento no longo prazo e no total também.

Diante dos resultados das variáveis institucionais e macroeconômicas, não se rejeita, parcialmente, a hipótese H2: Após a inserção de variáveis relacionadas ao grau de estabilidade dos países de origem e destino da internacionalização, a hipótese Upstream-Downstream torna-se válida para as empresas brasileiras. Nesse sentido, apenas o Índice de Percepção de Corrupção mostrou-se condizente com a previsão teórica. A capitalização e a proteção, representadas por variáveis do FACTOR 1 e os fundamentos macroeconômicos do desenvolvimento, representados pelo FACTOR 3, associaram-se de forma negativa com o nível de endividamento.

Portanto, esses resultados contribuem de forma objetiva para reduzir o gap teórico da hipótese Upstream-Downstream que afirma de forma ampla e subjetiva que as multinacionais de países emergentes, considerados menos estáveis, ao se internacionalizarem para países mais estáveis, fazem com que o nível de endividamento se eleve.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo se propôs a analisar os efeitos da definição do país de destino da internacionalização no endividamento das empresas multinacionais brasileiras, a partir da hipótese Upstream-Downstream. Trata-se de um estudo inovador na literatura de internacionalização, pois consiste no primeiro trabalho empírico que relacionou as multinacionais brasileiras com a realidade macroeconômica e institucional dos países de destino da internacionalização, e que culminou em importantes contribuições, tais como a influência que o nível de corrupção de um país pode afetar no endividamento e consequentemente na gestão financeira de uma multinacional brasileira.

As três modalidades de endividamento, curto, longo e total prazos apresentaram resultados condizentes com a hipótese Upstream-Downstream no quesito quanto maior o grau de internacionalização de multinacionais de países emergentes, maior seria o endividamento. Entretanto, as explicações teóricas propostas por Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000. não foram integralmente validadas no contexto brasileiro, conforme apontado nas análises dos resultados.

Ao identificar os países de destino da internacionalização das multinacionais brasileiras e inserir as suas respectivas variáveis macroeconômicas e institucionais no modelo proposto por Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000., este artigo contribui para o aprofundamento da hipótese, trazendo maior objetividade e avanço ao modelo. Os autores da hipótese Upstream-Downstream sugerem que a redução ou elevação do nível de endividamento das multinacionais a partir da internacionalização refere-se à diferença de estabilidade entre os países de origem e destino. Essa afirmação, além de ser abrangente e subjetiva, não respalda em comprovação empírica. Este trabalho demonstrou empiricamente que variáveis sugeridas por Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000. com o intuito de fundamentar a estabilidade dos países, tais como o desenvolvimento do mercado de capitais e a segurança jurídica, não forneceram subsídios para confirmar a previsão teórica dos autores. De forma antagônica, o nível de corrupção dos países, revelou-se como um indicador consistente para avaliar os impactos que a escolha de se internacionalizar para determinado país pode trazer sobre o endividamento das empresas.

Desse modo, este estudo desmistificou, por meio de comprovação empírica, que as explicações sugeridas por Kwok e Reeb (2000)KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000. de que a simples percepção de estabilidade entre os países seria o critério causador das diferenças de nível de endividamento entre as multinacionais. Os termos “mais estáveis” e “menos estáveis” utilizados para classificar os países são falhos e insuficientes, pois o estudo mostrou que os fundamentos macroeconômicos do desenvolvimento (PIB e Inflação) relacionaram-se de forma negativa com o endividamento. Este estudo trouxe elementos novos à literatura de internacionalização ao evidenciar que o nível de percepção da corrupção dos países de destino exerce maior influência no endividamento das multinacionais do que fatores de mercado ou econômicos, tais como o nível de crédito privado ou a segurança jurídica do país.

Portanto, propõe-se que se insiram nos modelos econométricos da hipótese o Índice de Percepção de Corrupção, variável condizente com os pressupostos da teoria no longo e no total do endividamento, com o objetivo de tornar a hipótese Upstream-Downstream objetiva e consistente, ,e também para que as empresas possam delinear suas estratégias com maior assertividade com base em fundamentos empíricos.

Para trabalhos futuros, sugere-se que sejam verificadas condições internas de financiamento do Brasil, com o objetivo de averiguar indícios de comportamento diferente deste país em relação aos pressupostos da hipótese Upstream-Downstream quando se refere a países emergentes.

APÊNDICE A.

Tabela 4
Resultado do teste VIF

REFERENCES

  • AYBAR, B.;THANAKIJSOMBAT, T. Financing decisions and gains from cross-border acquisitions by emerging-marketacquirers. Emerging Markets Review, 24, 69-80, 2015.
  • BOOTH, L.; AIVAZIAN, V.; DERMIRGUE-KUNT, A.; MAKSIMOVIC, V. Capital structures in developing countries.The Journal of Finance, v. 56, n. 1, p. 87-130, Feb. 2001.
  • BURGMAN, T. A. An empirical examination of multinational corporate capital structure.Journal of international Business studies, Third Quarter, p. 553-570, 1996.
  • CAMARA, Omar. Capital Structure Dynamics of US-based Multinationals (MNCs) and Domestic (DCs) firms. Thesis submitted for the degree of PhD at the University of St Andrew, 2012.
  • CHEN, C. J. P.; CHENG, C. S. A.; HE, J.; KIM, J.An investigation of the relationship between international activities and capital structure. Journal of International Business Studies, v.28, n.3, p. 563-577, 1997.
  • DE JONG, A., KABIR, R., NGUYEN, T.T. Capital structure around the world: The roles of firm- and country-specific determinants. Journal of Banking and Finance,v.32, p. 1954-1969, 2008.
  • DUPPATI, Geeta R; RAO, Narendar V. Cross-border mergers and acquisitions: Mature markets vs. emerging markets - with special reference to the USA and India. Cogent Business & Management. n. 2, p.1-11, 2015.
  • FAMÁ, R.; BARROS, L. A. B. de C.; SILVEIRA, A. D. M. A estrutura de capital é relevante? Novas evidências a partir de dados norte-americanos e latino-americanos. Caderno de Pesquisas em Administração, São Paulo, v.8, n.2, p.71-84, abr./jun. 2001.
  • FAULKENDER, M.; PETERSEN, M.A. Does the source of capital affect the capital structure? The Review of Financial Studies, New York, v. 19, n.1, p.45-79, 2006.
  • FRANK, M.Z.; GOYAL, V.K. Testing the Pecking Ordertheory of capital structure.Journal of Financial Economics, v. 67, p. 217-248, 2003.
  • FUNDAÇÃO DOM CABRAL. Ranking das Transnacionais Brasileiras: Os benefícios da Internacionalização, 2012. Disponível em <http://www.fdc.org.br/professoresepesquisa/publicacoes/Paginas/publicacao-detalhe.aspx?publicacao=18305>. Acesso em 15 jan. 2013.
    » http://www.fdc.org.br/professoresepesquisa/publicacoes/Paginas/publicacao-detalhe.aspx?publicacao=18305
  • JENSEN, M.; MECKLING, W. Theory of the Firm: Managerial Behavior, Agency Costs, and Capital Structure. Journal of Financial Economics. v. 3, n. 4, p. 305-360, 1976.
  • KAYO, E.K.; FAMÁ, R.; NAKAMURA, W.T.; MARTIN, D.M.L. Estrutura de capital e criação de valor: os determinantes da estrutura de capital em diferentes fases de crescimento das empresas. Revista Eletrônica de Administração (REAd), v.10, n.3, p.1-14, Rio Grande do Sul, mai/jun 2004.
  • KAYO, E.K.; KIMURA, H. Hierarchical determinants of capital structure.Journal of Banking & Finance.v. 35, p. 358-371, 2011.
  • KWOK, C.C.Y.; REEB, D.M. Internationalization and firm risk: an upstream-downstream hypothesis. Journal of International Business Studies, v.31, p. 611-629, 2000.
  • LA PORTA, R.; LOPEZ-DE-SILANES, F.; SHLEIFER, A.; VISHNY, R.W..Law and Finance.Journal of Political Economy, v.106, p. 1113-1155, jun.1998.
  • LEE, K.; KWOK C. C. Y. Multinational corporations vs. domes-tic corporations: International environmental factors and determinants of capital structure. Journal of International Business Studies, v.19, n.2, p.195-217, 1988.
  • MITTOO, U. R.; ZHANG, Z. The capital structure of multinational corporations: Canadian versus U.S. evidence. Journal of Corporate Finance, v. 14, p. 706-720, mai., 2008.
  • MODIGLIANI, F.; MILLER, M. Taxes and the cost capital: a correction. TheAmerican Economic Review, v. 53, n. 3, p. 433-443, jun. 1963.
  • MYERS, S.C.; MAJLUF, N.S. Corporate financing and investment decisions when firms have information that investors do not have.Journal of Financial Economics,v.13, p. 187-221, jun. 1984.
  • MYERS, S.C. The capital structure puzzle.The Journal of Finance, v. 39, p. 575- 592, jul. 1984.
  • PEREIRA, V. S. Ensaios sobre os Efeitos da Internacionalização na Estrutura de Capital e Estrutura de Propriedade de Multinacionais Latino-Americanas. 2013. 135 f. Tese (Doutorado em Administração) - Escola de Administração de Empresas de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 2013.
  • PEROBELLI, F.F.C.; FAMÁ, R. Determinantes da estrutura de capital: aplicação a empresas de capital aberto no Brasil. Revista de Administração da USP (RAUSP), São Paulo, v.37, n.3, jul/set 2002.
  • PROCIANOY, J.L.; SCHNORRENBERGER, A. A influência da estrutura de controle nas decisões de estrutura de capital das companhias brasileiras. Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, v.58, n.1, p.121-146, jan/mar 2004.
  • RAJAN, R.G.; ZINGALES, L..What do we know about capital structure? Some evidence from international data.Journal of Finance,v. 50, p. 1421-1460, 1995.
  • SAITO, R.; HIRAMOTO, E. Foreign activity effects and capital structure: Brazilian evidence. Academia, RevistaLatinoamericana de Administración, v. 45, p. 59-75, 2010.
  • SHAPIRO, A. C. Financial structure and cost of capital in the multinational corporation.Journal of Financial and Quantitative Analysis, v.13, n.2, p. 211-26, jun., 1978.
  • SILVA, A. F.; DO VALLE, M. R. Análise da estrutura de endividamento: um estudo comparativo entre empresas brasileiras e americanas. Revista de Administração Contemporânea, Curitiba, v.12, n.1, p.201-229, Jan/Mar 2008.
  • SILVEIRA, A.D.M.; PEROBELLI, F.F.C.; BARROS, L.A.B.C. Governança corporativa e os determinantes da estrutura de capital: evidências empíricas no Brasil. Revista de Administração Contemporânea(RAC),Curitiba, v.12, n.3, p.763-788, jul/set 2008.
  • SINGH, M.; NEJADMALAYERI, A. Internationalization, capital structure, and cost of capital: Evidence from French corporations. JournalofMultinational Financial Management, v.142, p. 153-169, 2004.
  • TERRA, P. R. S. Estrutura de capital e fatores macroeconômicos na América Latina. Revista de Administração da Universidade de São Paulo, v.42, n. 2, p. 192-204, abril / maio / junho, 2007.
  • TITMAN, S.; WESSELS, R. The determinants of capital structure choice. The Journal of Finance, v. 43, n. 1, p. 1-19, mar. 1988.
  • UNCTAD, United Nations Conference on Trade and Development, World Investment Report 2013: Global Value Chains: Investiment and Trade for Development, New York and Geneva United Nations, 2013.
  • ZEBALLOS, Ariel C.; SEIFERT, Ralf W.; PROTOPAPPA-SIEKE, Margarita.Single product, finite horizon, periodic review inventory model with working capital requirements and short-term debt.Computers&OperationsResearch n. 40, p. 2940-2949, 2013.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    16 Fev 2016
  • Revisado
    06 Set 2016
  • Aceito
    26 Set 2016
Fucape Business School Av. Fernando Ferrari, 1358, Boa Vista, 29075-505, Vitória, Espírito Santo, Brasil, (27) 4009-4423 - Vitória - ES - Brazil
E-mail: bbronline@bbronline.com.br