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Impacto dos Fundos de Private Equity e Venture Capital no Desempenho Operacional e Financeiro pós IPO nas empresas brasileiras investidas

RESUMO

O presente artigo buscou analisar o legado e sua persistência ao longo do tempo, em termos de políticas de financiamento e performances operacional e financeira, de empresas investidas por fundos de Private Equity e Venture Capital (PE/VC). A indústria de PE/VC é caracterizada pela função de identificar empresas com grandes potenciais de retorno e que crescem aritmeticamente - devido a limitações de capital - para proporcionar fontes de capital e experiência adequadas e necessárias para o crescimento exponencial. Nesse estudo, utilizaram-se quatro medidas que se relacionam com a política financeira das empresas e sua persistência ao longo do tempo: i) disponibilidades de caixa; ii) alavancagem; iii) ROA (Return on Assets); e iv) crescimento de vendas. Os resultados sugerem que empresas investidas por PE/VC implicam níveis mais elevados de disponibilidades de caixa e estão associadas a um menor nível de alavancagem durante os primeiros 5 anos após o IPO. Além disso, empresas financiadas por fundos de PE/VC apresentam rentabilidade e crescimento de vendas superior se comparadas às empresas não investidas no curto prazo, ou seja, nos primeiros 3 anos após o IPO.

Palavras-chave:
Capital de Risco; Desempenho Operacional; Desempenho Financeiro; Oferta Pública Inicial de Ações

ABSTRACT

The present article seeks to analyze the legacy and its persistence over time in terms of financing and operational policies and financial performance, of companies invested by Private Equity and Venture Capital funds (PE/VC). The PE/VC industry is characterized by the function of identifying companies with large return potentials and that grow arithmetically - due to capital constraints - to provide adequate and necessary sources of capital and experience for exponential growth. In this study, we used four measures that relate to companies' financial policies and their persistence over time: i) cash & equivalents; ii) leverage; iii) Return on Assets (ROA); and iv) sales growth. The results suggest that PE / VC invested companies imply higher levels of cash & equivalents and are associated with a lower level of leverage during the first 5 years after the IPO. In addition, companies financed by PE/VC funds show higher profitability and higher sales growth compared to non-invested companies in the short term, i.e., in the first 3 years after the IPO.

Keywords:
Venture Capital; Operational Performance; Financial Performance; Initial Public Offering of Shares

1. INTRODUÇÃO

Fundos de capital de risco, comumente conhecidos como Venture Capital e Private Equity (PE/VC), buscam por empresas emergentes que apresentam vantagens competitivas e inseridas em mercados de rápido crescimento. A função desses fundos é justamente identificar empresas que crescem aritmeticamente - devido a limitações de capital - para proporcionar fontes de capital e experiência adequadas e necessárias para o crescimento exponencial delas. Os fundos de PE/VC representam uma alternativa viável ao financiamento tradicional, pois são agentes financeiros bem adaptados a mitigar os riscos característicos associados às empresas investidoras. Além disso, os fundos de PE/VC adotam práticas diferenciadas de governança e monitoramento (SAHLMAN, 1990SAHLMAN, W.A. (1990). The structure and governance of venture capital organizations. Jornal of Financial Economics, v. 27, (2), 473-521.).

O desenvolvimento da indústria de PE/VC começou inicialmente nos Estados Unidos, onde empresas como Microsoft, Compaq, Apple, Sun, Amazon, Lotus, Cisco, Staples, Federal Express e Netscape foram investidas por fundos de PE/VC e formaram segmentos industriais completamente novos. Ao analisar o mercado acionário americano, cerca de 30% das empresas inseridas em bolsa de valores, entre os anos de 1991 e 1997, haviam recebido recursos de PE/VC. Essas empresas constituíam aproximadamente 20% do valor total dessas emissões (GOMPERS e LERNER, 1999GOMPERS, P.; LERNER J. (1999). The venture capital cycle. Cambridge, MA: The MIT Press.).

Segundo Kreps (1990)KREPS, D. M. (1990). Corporate Culture and Economic Theory in J. E. Alt and K. A. Shepsle, eds.: Perspectives on Positive Political Economy, Cambridge, England: Cambridge University Press. e Hermalin (2001)HERMALIN, B. E. (2001). Economics and Corporate Culture in Cary L. Cooper, Sue Cartwright and P. Christopher Earley, eds.: The International Handbook of Organizational Culture and Climate, England: John Wiley & Sons., a cultura corporativa é importante para compreender as escolhas estratégicas da empresa e o desempenho financeiro. Cultura corporativa pode ser definida como um conjunto específico de normas, crenças, valores e preferências que são compartilhados entre os executivos e trabalhadores. Dessa forma, a cultura da empresa pode ser fundamental em suas escolhas estratégicas, porque define um perfil de comportamento "alinhado" quando seus gestores são confrontados com contingências imprevistas ou equilíbrios múltiplos (KREPS, 1990KREPS, D. M. (1990). Corporate Culture and Economic Theory in J. E. Alt and K. A. Shepsle, eds.: Perspectives on Positive Political Economy, Cambridge, England: Cambridge University Press.).

Nesse contexto, o presente artigo busca analisar o legado e sua persistência ao longo do tempo, em termos de políticas de financiamento e performance financeira, de empresas investidas por fundos de PE/VC. Utilizaram-se quatro medidas semelhantes às dos autores Cronqvist, Low e Nilsson (2009)CRONQVIST, H.; LOW, A.; NILSSON, M. (2009). Persistence in Firm Policies, Firm Origin, and Corporate Culture: Evidence from Corporate Spin-offs. Robert Day School of Economics and Finance. Working Paper No. 2009-2., que se relacionam com a política financeira das empresas e sua persistência ao longo do tempo: i) disponibilidades de caixa; ii) alavancagem; iii) ROA (Return on Assets); e iv) crescimento de vendas. A análise busca verificar o legado, em termos de cultura de política de financiamento e performance, que os fundos de PE/VC deixam nas empresas investidas após o IPO.

Os resultados encontrados mostram que empresas financiadas por fundos de PE/VC possuem maior nível de disponibilidades de caixa nos primeiros 5 anos após o IPO. Esse resultado pode ser explicado, em parte, pelo fato de que essas empresas são, geralmente, novas e com alto potencial de crescimento. Nesse sentido, o nível elevado de disponibilidades de caixa pode ser reflexo da escolha por distribuir menos dividendos e reinvestir o capital em novas oportunidades.

Sob o mesmo raciocínio, empresas investidas por fundos de PE/VC apresentam menor índice de alavancagem em todos os 5 anos após o IPO, em comparação com aquelas não financiadas por PE/VC. Essas empresas, além de possuírem mais opções de capital, precisam retornar aos fundos de PE/VC os investimentos por eles realizados. Carvalho et al. (2013)CARVALHO, A. G.; NETTO, H. G.; SAMPAIO, J. O. (2013). Private Equity and Venture Capital in Brazil: An Analysis of its Recent Evolution. Available at SSRN: http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1996729.
http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?a...
mostram que 25% das saídas dos fundos de PE/VC, entre 2004 e 2009, foram através de IPO. Nesse sentido, empresas investidas por PE/VC estão mais propensas a emitirem ações em vez de dívidas.

O presente estudo também encontrou evidências que empresas financiadas por PE/VC apresentam maior nível de rentabilidade - medido por ROA - no curto prazo, ou seja, nos primeiros três anos após o IPO. Na mesma direção, empresas financias por PE/VC apresentam maior nível de crescimento de vendas nos primeiros 3 anos após o IPO.

O artigo está estruturado da seguinte forma: a seção 1 inicia-se com a introdução; na seção 2 apresenta-se a literatura, buscando salientar os principais estudos relacionados à PE/VC encontrados no Brasil e em outros países. A metodologia e amostra, bem como a aplicação dos modelos propostos, encontram-se na seção 3. Na sequência, são apresentados os resultados e suas implicações na seção 4. As considerações finais encerram o estudo.

2. REVISÃO DA LITERATURA E DESENVOLVIMENTO DE HIPÓTESES

A indústria de Private Equity e Venture Capital fornece capital para empresas com grandes potenciais de retorno. Sob a ótica dos autores Gompers e Lerner (2001)_______________________. (2001). The venture capital revolution. Journal of Economic Perspectives, 15, (2), p. 145-168., para entender a indústria de PE/VC, é fundamental que se compreenda todo o ciclo de risco, o qual é constituído basicamente por quatro fases: captação, investimento, monitoramento e saída. O ciclo começa com o levantamento do fundo de risco, a prospecção e seleção das propostas mediante análise dos projetos. Na fase de monitoramento verifica-se se os resultados previstos estão se realizando; também há adição de valor em consequência do compartilhamento da gestão. O ciclo finaliza quando os fundos de PE/VC conseguem retornar o capital aos acionistas por mecanismos de saída, e se renova quando esses fundos levantam recursos adicionais para serem reinvestidos. Frequentemente, o IPO (Initial Public Offerings) não é exclusivamente a saída do investidor de PE/VC das empresas investidas, mas sim um mecanismo para obter fundos com o intuito de financiar sua expansão. Investidores de capital de risco mantêm suas ações por anos depois do IPO (BARRY et al., 1990BARRY, C. B.; MUSCARELLA, C. J.; PEAVY III, J. W.; VETSUYPENS, M. R. (1990). The role of venture capital in the creation of public companies: evidence from going-public process. Journal of Financial Economics, v. 27, p. 447-471.). Portanto, os investidores de PE/VC possuem incentivos para colocar em funcionamento sistemas de governança para preservar o valor de seu investimento.

Existe um amplo campo teórico o qual sugere que a indústria de PE/VC contribui significativamente para o sucesso de empresas start-ups. Os fundos de PE/VC são tipicamente investidores ativos que tentam agregar valor por meio de sua participação na gestão das empresas. Adicionalmente, as habilidades dos fundos de PE/VC no rastreamento e monitoramento nas empresas investidas podem auxiliar na performance operacional dessas empresas (BARRY et al., 1990BARRY, C. B.; MUSCARELLA, C. J.; PEAVY III, J. W.; VETSUYPENS, M. R. (1990). The role of venture capital in the creation of public companies: evidence from going-public process. Journal of Financial Economics, v. 27, p. 447-471.).

Brav e Gompers (1997)BRAV, A.; GOMPERS, P. A. (1997). Myth or reality? The long-run underperformance of initial public offerings: evidence from venture and non venture capital-backed companies. Journal of Finance, v. 52, (5), p. 1791-1821. apresentam três razões pelas quais as empresas financiadas por PE/VC no período do IPO podem diferir das não financiadas. Em primeiro lugar, os fundos PE/VC implementam uma estrutura de gestão que auxilia no desempenho operacional das empresas. Além disso, podem utilizar seu conhecimento na indústria para melhorar as suas operações, fornecendo informações valiosas sobre aumento de capital. Em segundo lugar, os fundos de PE/VC podem afetar quem detém as ações das empresas após o IPO. Grandes investidores irão adquirir ações das empresas devido ao fato de os fundos de PE/VC possuírem contatos com grandes bancos de investimento. Essas relações podem levar a futuros relacionamentos após o IPO. Por fim, os fundos de PE/VC possuem posições no conselho de administração das empresas start-ups e as mantêm mesmo após o IPO. A vantagem é que esses conselheiros possuem experiências que podem melhorar a gestão dessas empresas, além de facilitar o financiamento.

Fundos de PE/VC desempenham papéis distintos nas empresas. Eles são financiadores de forma direta e monitoram as operações comerciais de forma indireta (PHILIPS, 1991PHILLIPS, B. D. (1991). The increasing role of small firms in the high-technology sector: evidence from the 1980s. Business and Economics, v. 26, (1), p. 40-47.). Além disso, são muitas vezes considerados investidores estratégicos, e seu envolvimento com as estratégias corporativas é uma atividade de valor agregado fundamental para essas empresas (FRIED; BRUTON; HISRICH, 1998FRIED, V. H.; BRUTON, G. D.; HISRICH, R. D. (1998). Strategy and the board of directors in venture capital-backed firms. Journal of Business Venturing, v. 13, p. 493-503.).

De modo geral, os fundos PE/VC procuram por empresas arriscadas, jovens e com potencial de crescimento elevado, os quais possuem alta expectativa de produção de produtos e serviços inovadores. Assim, esses fundos tendem a fazer seus investimentos em um estágio inicial do desenvolvimento das empresas, quando as perspectivas de sucesso estão longe de serem alcançadas. Os fundos de PE/VC, portanto, possuem um papel influente e relevante na evolução estratégica das empresas investidas e em suas decisões de investimento e financiamento. Desta maneira, empresas financiadas por PE/VC podem estar mais propensas a emitir ações do que dívidas, já que teriam mais fontes de capital disponíveis. Consequentemente, teriam menores níveis de alavancagem se comparadas com empresas não financiadas por PE/VC.

As teorias do ciclo de vida fornecem embasamento teórico para investigar a relação entre o envolvimento de PE/VC e o nível de disponibilidades de caixa após o IPO. A teoria do ciclo de vida sugere que os dividendos são normalmente pagos por empresas maduras, estabelecidas e rentáveis com baixas perspectivas de crescimento, enquanto a retenção dos lucros é escolhida por empresas mais jovens e de alto crescimento, com grandes oportunidades de investimento e recursos limitados (DEANGELO et al, 2006DEANGELO, H.; DEANGELO, L. (2006). The Irrelevance of the MM Dividend Irrelevance Theorem. Journal of Financial Economics, v. 79, 293-315.). Dessa forma, de acordo com a teoria do ciclo de vida, empresas financiadas por PE/VC tipicamente jovens e com alto crescimento (LERNER, 1994LERNER, J. (1994). Venture capitalists and the decision to go public. Journal of Financial Economics, v. 35, p. 293-316.) estão mais propensas a manter maiores níveis de caixa após o IPO.

Kaplan e Stromberg (2003)KAPLAN, S. N.; STROMBERG, P. (2003). Financial contracting theory meets the real world: na empirical analysis of venture capital contracts. Review of Economic Studies, v. 70, (2), p. 281-315. evidenciam que investidores de venture capital impõem direitos de controle complexos quando investem em uma empresa e colocam em funcionamento fortes mecanismos de governança e monitoramento.

Hellmann e Puri (2002)HELLMANN, T.; PURI, M. (2002). Venture capital and the professionalization of start-up firms: empirical evidence. Journal of Finance, v. 57, (1), p. 169-197. ressaltam que os investimentos de PE/VC estão relacionados a diversas medidas de profissionalização, tais como a adoção de um programa de remuneração de opção de ações e a reformulação das políticas de recursos humanos. Os autores também constatam que empresas start-ups investidas por PE/VC trocam mais rapidamente e com mais frequência o fundador da empresa por um CEO (Chief Executive Officer) externo.

No Brasil, Siqueira, Carvalho e Netto (2011)SIQUEIRA, E. M. R.; CARVALHO, A. G.; NETTO, H. G. (2011). Determinantes do sucesso dos investimentos de Private Equity e Venture Capital no Brasil. Revista Brasileira de Finanças, v. 9, (2), p. 189-2008. investigam os determinantes do sucesso dos investimentos de PE/VC, utilizando os dados do período de 1999 a 2007. Eles ressaltam que os fatores influenciadores do desempenho dos veículos de investimento são: volume de capital comprometido, número de investimentos realizados, existência de coinvestimentos, origem estrangeira e experiência da organização gestora, foco em empresas de private equity, intensidade de contato entre gestores e empresas do portfólio e o número de assentos em conselhos de administração das empresas investidas por gestor de fundo. Dessa forma, o sucesso dos investimentos de PE/VC depende das características dos fundos, dos gestores, de como os investimentos são estruturados e do estilo de gestão deles.

Minardi, Kanitz e Bassani (2014)MINARDI, A. M. A. F.; KANITZ, R. V.; BASSANI, R. H. (2014). Private Equity and Venture Capital Industry Performance in Brazil: 1990-2013. The Journal of Private Equity, v. 17, (4), p. 48-58. investigam o desempenho brasileiro de private equity e venture capital entre 1990 e 2013. Os autores concluem que, embora as indústrias brasileiras de PE e VC sejam jovens, os players estão em lenta maturação, com 72% das empresas operando por 5 anos ou mais. A indústria teve um bom desempenho ao longo dos últimos 20 anos, compensando LPs (Limited Partnerships) internacionais para investir no Brasil. Além disso, os fundos brasileiros de PE/VC superaram os fundos dos EUA, entre 1990 e 2008. Portanto, os investidores internacionais foram remunerados por assumir o risco-país no Brasil. Os autores ressaltam que há três explicações para esse bom desempenho: i) o boom econômico brasileiro entre 2004 e 2012; ii) a limitada competição para negócios no Brasil naquela época; e iii) o fato de os gestores de PE/VC no Brasil estarem se tornando mais experientes, conduzindo a empresa para melhores desempenhos.

Por fim, Carvalho, Pinheiro e Sampaio (2015)CARVALHO, A. G.; PINHEIRO, R. B.; SAMPAIO, J. O. (2015). Venture Capital Backing: Operational Performance and Persistence Over Time. Working paper. analisaram o papel dos VC's em termos de política financeira das empresas e a persistência (efeitos fixos da empresa) por empresas investidas por PE/VC ao longo do tempo. A principal conclusão foi que a origem de uma empresa comum conduz a similaridades nas políticas das empresas em um período de tempo após IPO. Empresas investidas por PE/VC escolhem um conjunto de políticas diferentes das empresas não investidas por PE/VC. Os autores encontraram evidências de que empresas investidas por PE/VC implicam um nível mais elevado de reservas de caixa do que as empresas não investidas. Esse efeito é durável por pelo menos 8 anos após o IPO. Ademais, os autores mostraram que empresas investidas por PE/VC estão associadas a menor nível de alavancagem e cobertura de juros durante os primeiros 8 anos após IPO.

2.1. HIPÓTESES

Empresas que distribuem grande parte dos seus rendimentos sob a forma de dividendos estão menos propensas a acumular caixa nos seus balanços, ou se sentem obrigadas a gastar em aquisições ou investimentos marginais. Jain, Shekhar e Torbey (2009)JAIN, B. A.; SHEKHAR, C.; TORBEY, V. (2009). Payout initiation by IPO firms: The choice between dividends and share repurchases. The Quarterly Review of Economics and Finance, v. 49, p. 1275-1297. mostram que empresas investidas por PE/VC são jovens e em crescimento, por conseguinte tendem a distribuir menos dividendos a partir de seus ganhos.

Adicionalmente, como financiadores, PE/VC frequentemente supervisionam as decisões gerenciais (CARPENTER et al., 2003CARPENTER, M. A.; POLLOCK, T. G.; LEARY, M. M. (2003). Testing a model of reasoned risk-taking: governance, the experience of principals and agents, and global strategy in high-technology IPO firms. Strategy Manage Journal, v. 24, p. 803-820.; VAN DER BERGHE e LEVRAU, 2002VAN DEN BERGHE, L. A. A.; LEVRAU, A. (2002). The role of the venture capitalist as monitor of the company: a corporate governance perspective. Corporate Governance International Review, v. 10, (3), p. 124-135.). A hipótese de alinhamento de interesses sugere que a existência de grandes acionistas melhora a proteção dos minoritários, levando a um efeito positivo da presença do PE/VC sobre as disponibilidades de caixa. Chen e Chuang (2009)CHEN, Y. R.; CHUANG, W. T. Alignment or entrenchment? Corporate governance and cash holdings in growing firms. Journal of Business Research, v. 62, (11), p. 1200-1206. ressaltaram a relação entre os Venture Capitalists (VCs) e o impacto nas disponibilidades de caixa. Segundo os autores, a hipótese de alinhamento de interesse sugere que os acionistas estão mais propensos a aceitarem grandes reservas de caixa para financiar novos projetos de investimentos.

No caso do mercado de capitais brasileiro, a obrigação de se distribuir dividendos se encontra prevista nos artigos de 202 a 205 da Lei 6.404 de 1976, conhecida como lei das sociedades anônimas (ARAÚJO, 1996ARAÚJO, C. (1996). A Política de Dividendos das Empresas Brasileiras: Empresas vs Acionistas. Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas - Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração COPEAD. Available at: < http://www.coppead.ufrj.br/upload/publicacoes/Claudia_Araujo.pdf>.
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). De acordo com as previsões do Artigo 202, tais sociedades deverão realizar uma distribuição de no mínimo 25% do lucro líquido ajustado, quando o estatuto da sociedade anônima for omisso. Entretanto, poderá haver situações em que o estatuto estabeleça valores inferiores a esse patamar1 1 Veja, por exemplo o Aviso de Acionistas da OGX - OGX: Pagamento de dividendo (23 de junho de 2009). , e isso na prática faz com que haja conjunto permutativo acerca da forma como as companhias brasileiras irão pagar dividendos a seus acionistas. Nesse contexto, a presença de investidores de risco pode ter um efeito positivo sobre as disponibilidades de caixa das empresas investidas nos anos que precedem o IPO à medida que tais investidores se valendo do Art. 202 da Lei das S.As podem reduzir o percentual de dividendos pagos acarretando uma maior retenção de caixa e equivalentes. Diante desse contexto, a primeira hipótese pode ser formulada da seguinte maneira:

Hipótese 1: Empresas financiadas por PE/VC apresentam maiores níveis de disponibilidade de caixa após o IPO se comparadas com as não financiadas por PE/VC.

O segundo objetivo do artigo é analisar como a presença dos fundos de PE/VC afeta a estrutura financeira da empresa nos próximos anos após o IPO. Esses fundos podem desempenhar um papel importante na transmissão do valor intrínseco das empresas investidas para o mercado financeiro, reduzindo, assim, o grau de assimetria de informação. A redução de assimetria de informação, por sua vez, pode influenciar diversos aspectos da política financeira da empresa (ver, por exemplo, Myers e Majluf (1984)MYERS, S.; MAJLUF, N. (1984). Corporate Financing and Investment Decisions when firms have information that Investors do not have. Journal of Financial Economics, v. 13, p. 187-221.). Singularmente, isso implica que empresas financiadas por PE/VC podem ter maior probabilidade de emitir ações (já que estão mais susceptíveis de obter um preço justo para o seu estoque), de modo que terão menores níveis de alavancagem. Dessa forma, se os fundos de PE/VC forem capazes de comprovar o valor intrínseco das empresas investidas e assim reduzir o grau de assimetria de informação, as empresas financiadas por PE/VC estarão associadas com menores índices de alavancagem. Portanto, a segunda hipótese pode ser formulada da seguinte forma:

Hipótese 2: Empresas financiadas por PE/VC apresentam menores níveis de alavancagem após o IPO se comparadas com as não financiadas por PE/VC.

No que diz respeito à variável ROA, Morsfield e Tan (2006)MORSFIELD, S. G.; TAN, C. E. L. (2006). Do venture capitalists influence the decision to manage earnings in initial public offerings? Accounting Review, v. 81, (5), p. 1119-1150. argumentam que empresas investidas por fundos de PE/VC tendem a ter, em média, melhor desempenho em seus investimentos quando comparadas com as não investidas por PE/VC. Sendo assim, a terceira hipótese pode ser formulada da seguinte forma:

Hipótese 3: Empresas financiadas por PE/VC apresentam maiores níveis de rentabilidade após o IPO se comparadas com as não financiadas por PE/VC.

Por fim, outra forma de medir o desempenho operacional das empresas é por meio do seu desempenho em vendas. No que diz respeito à variável crescimento de vendas, Puri e Zarutskie (2012)PURI, M.; ZARUTSKIE, R. (2012). On the Life Cycle Dynamics of Venture-Capital- and Non-Venture-Capital-Financed Firms. The Journal of Finance, v. 67, (6), p. 2247-2293. relatam que empresas financiadas por PE/VC crescem mais rapidamente em termos de vendas se comparadas a empresas não financiadas. Este resultado é persistente principalmente nos primeiros anos, antes da estabilização do crescimento.

Os estudos realizados por Paglia e Harjoto (2014)PAGLIA, J. K.; HARJOTO, M. A. (2014). The effects of private equity and venture capital on sales and employment growth in small and medium-sized businesses. Journal of Banking & Finance, v. 47, p. 177-197. também evidenciam que empresas financiadas por PE/VC possuem impacto positivo sobre o crescimento de vendas. Os autores afirmam que esse resultado persiste por três anos consecutivos após o início dos investimentos realizados pelos fundos de PE/VC. Adicionalmente, Chemmanur et al. (2011)CHEMMANUR, T. J.; KRISHNAN, K.; NANDY, D. K. (2011). How Does Venture Capital Financing Improve Efficiency in Private Firms? A Look Beneath the Surface. Review of Financial Studies, v. 24, (12), p. 4037-4090. mostram que os ganhos totais de eficiência gerados por PE/VC advêm principalmente de um elevado crescimento de vendas nos anos subsequentes ao recebimento de capital de risco. Então, a quarta hipótese pode ser formulada da seguinte forma:

Hipótese 4: Empresas financiadas por PE/VC apresentam maiores níveis de crescimento de vendas após o IPO se comparadas com as não financiadas por PE/VC.

3. METODOLOGIA

No presente estudo, utilizaram-se quatro medidas para a política financeira da empresa: i) disponibilidade de caixa; ii) alavancagem; iii) ROA (Return on Assets); e iv) crescimento de vendas. Essas medidas são baseadas em Cronqvist, Low e Nilsson (2009)CRONQVIST, H.; LOW, A.; NILSSON, M. (2009). Persistence in Firm Policies, Firm Origin, and Corporate Culture: Evidence from Corporate Spin-offs. Robert Day School of Economics and Finance. Working Paper No. 2009-2..

As hipóteses do estudo proposto referem-se à diferença entre empresas financiadas por PE/VC e não financiadas por PE/VC, em termos de política financeira e sua persistência. A equação que testa as quatro hipóteses pode ser definida da seguinte forma:

(1) Dependente i , t = β 0 + β 1 PE / VC i + y x i , t + θ ind ú stria i + τ t + μ i , t

Onde:

Dependentei: são as quatro variáveis dependentes: i) disponibilidade de caixa; ii) alavancagem; iii) ROA; iv) crescimento de vendas;

x'i,t: é um vetor de características pré-determinadas da empresa i no ano t: Ativo Imobilizado Líquido, dummy de tecnologia, dummy de IFRS, gerenciamento de resultados, valor contábil dos ativos, e crescimento de vendas. Em situações nas quais uma dessas características se torna variável dependente, ela não é inserida como termo independente.

As regressões especificadas no modelo 1 são estimadas usando Pooled OLS com dummy de setor. Foram utilizados, também, erros-padrão robustos seguindo White (1980)WHITE, H. (1980). A heteroskedasticity-consistent covariance matrix estimator and a direct test of heteroskedasticity. Econometrica, v. 48, (4), p. 817-838. e cluster por indústria.

3.1. BASE DE DADOS E AMOSTRA

A amostra é composta por dados contábeis e de mercado das empresas listadas na Bolsa de Valores de São Paulo, BM&FBovespa (Bovespa). A formação de cada variável está explicada na Tabela 1. Os dados foram obtidos por meio de um terminal da Bloomberg, L.P, no qual estão em valores reais de 2017, ajustados para a inflação acumulada período a período usando o IPCA-amplo. O período de IPOs, inicialmente levantado, foi de janeiro de 2000 a dezembro de 2017, com dados anuais. Como o estudo analisa até 5 anos após o IPO, o período de corte foi 2012 para que fosse possível analisar os anos seguinte à emissão.

Tabela 1
Definições das Principais Variáveis

A amostra consiste em 150 empresas, decomposta por 40 empresas investidas e 110 não investidas por PE/VC. Além disso, é composta somente por aquelas que apresentaram dados para os 5 anos de análise deste artigo.

A informação de que parte dessas empresas possuíam em suas bases acionárias fundos de PE e/ou VC se deu por meio do levantamento manual dos prospectos de emissões de ações, divulgados nas realizações dos IPO's.

A tabela 2 apresenta as estatísticas descritivas para as variáveis que caracterizam a heterogeneidade das empresas. Inicialmente, é possível verificar que para essas variáveis as empresas investidas por PE/VC e as não investidas são muito diferentes. Em termos de disponibilidades de caixa, para a amostra de PE/VC, a média é de R$ 0,48 MM um ano após o IPO, enquanto para a amostra de não PE/VC é de R$ 0,33 MM. Essa diferença persiste pelos cinco anos após o IPO, nos quais a média para PE/VC é de R$ 0,78 MM e R$ 0,42 MM para não PE/VC.

Tabela 2
Estatísticas Descritivas das Variáveis Dependentes e de Controle

É possível observar o mesmo padrão para outras variáveis, como ROA e crescimento de vendas. No entanto, para crescimento de vendas, a diferença diminui ao longo do tempo e reverte 4 anos após o IPO.

Em relação ao nível de alavancagem, as empresas investidas e não investidas por PE/VC também são diferentes. Para a amostra de PE/VC, a média de alavancagem é de 14% um ano após o IPO, enquanto para a amostra de não PE/VC é de 42,0%. Essa diferença é persistente nos 5 anos após o IPO. De forma similar, pode-se observar padrão semelhante para outras variáveis como ativo imobilizado, tamanho e empresas do setor de tecnologia.

A persistência dessas diferenças pode ser entendida, em parte, como um legado (efeito fixo) que os fundos de PE/VC deixam nas empresas investidas. Cronqvist, Low e Nilsson (2009)CRONQVIST, H.; LOW, A.; NILSSON, M. (2009). Persistence in Firm Policies, Firm Origin, and Corporate Culture: Evidence from Corporate Spin-offs. Robert Day School of Economics and Finance. Working Paper No. 2009-2. evidenciam que as políticas de financiamento e investimento das empresas são persistentes ao longo do tempo. Na mesma direção, pode-se observar nesses resultados que o legado dos fundos de PE/VC tende a permanecer nas empresas investidas mesmo 5 anos após o IPO.

4. RESULTADOS

Nessa seção são apresentados os resultados obtidos com a estimações dos modelos estatísticos respectivamente orientados pelo estabelecimento das hipóteses na seção 3.

4.1. DISPONIBILIDADE DE CAIXA

De modo geral, disponibilidades de caixa resultam de razões cautelares ou de acesso limitado ao financiamento externo. Neste artigo, analisaram-se os fatores que condicionam as disponibilidades de caixa das empresas e sua persistência ao longo do tempo para as empresas financiadas e não financiadas por PE/VC.

A tabela 3 apresenta os resultados obtidos. As empresas investidas por PE/VC, implicam níveis mais elevados de disponibilidades de caixa, ao longo dos cinco primeiros anos após o IPO. Em termos de características da empresa, empresas grandes em termos de ativos totais e com maior ativo imobilizado líquido implicam maiores níveis de disponibilidades de caixa.

Tabela 3
Disponibilidades de Caixa

Os resultados encontrados foram consistentes com Chen e Chuang (2009)CHEN, Y. R.; CHUANG, W. T. Alignment or entrenchment? Corporate governance and cash holdings in growing firms. Journal of Business Research, v. 62, (11), p. 1200-1206. que ressaltam a relação entre os Venture Capitalists (VCs) e o impacto positivo destes nas disponibilidades de caixa. Ademais, os resultados também vão ao encontro de Carvalho, Pinheiro e Sampaio (2015)CARVALHO, A. G.; PINHEIRO, R. B.; SAMPAIO, J. O. (2015). Venture Capital Backing: Operational Performance and Persistence Over Time. Working paper., que, mesmo analisando empresas americanas, também constaram níveis elevados de disponibilidades de caixa para empresas financiadas por PE/VC. Esses resultados persistem por pelo menos 8 após o IPO.

O maior nível de disponibilidades de caixa por parte das empresas investidas por PE/VC pode estar relacionado ao fato de que essas empresas financiam parte de seu crescimento com liquidez. Como elas têm uma necessidade expressiva de capital de giro devido ao rápido crescimento que apresentam, então maiores níveis de caixa podem financiar suas atividades operacionais sem a necessidade de recorrer a empréstimos repetidamente.

4.2. ALAVANCAGEM

A tabela 4 sugere que empresas investidas por PE/VC estão associadas a menor nível de alavancagem durante os primeiros 5 anos após o IPO.

Tabela 4
Alavancagem

Em termos de características da empresa, empresas maiores em termos de ativos totais implicam maiores níveis de alavancagem nos primeiros cinco anos após o IPO. Empresas com maior nível de ativos imobilizados líquidos, apresentam maiores níveis de alavancagem no médio prazo, ou seja, do terceiro ao quinto ano após o IPO.

Esses resultados são consistentes com Myers e Majluf (1984)MYERS, S.; MAJLUF, N. (1984). Corporate Financing and Investment Decisions when firms have information that Investors do not have. Journal of Financial Economics, v. 13, p. 187-221., os quais mostram que a redução de assimetria de informação pode influenciar diversos aspectos da política financeira da empresa. Como os fundos de PE/VC desempenham um papel importante na transmissão do valor intrínseco das empresas investidas para o mercado financeiro, eles tendem a reduzir o grau de assimetria de informação. Adicionalmente, empresas financiadas por PE/VC podem ter maior probabilidade de emitir ações, já que a saída desses fundos se dá em parte via IPO. Carvalho et al. (2013)CARVALHO, A. G.; NETTO, H. G.; SAMPAIO, J. O. (2013). Private Equity and Venture Capital in Brazil: An Analysis of its Recent Evolution. Available at SSRN: http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1996729.
http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?a...
mostram que 25% das saídas dos fundos de PE/VC, entre 2004 e 2009, foram através de IPO. Carvalho, Pinheiro e Sampaio (2015)CARVALHO, A. G.; PINHEIRO, R. B.; SAMPAIO, J. O. (2015). Venture Capital Backing: Operational Performance and Persistence Over Time. Working paper. também encontraram evidências de que empresas americanas financiadas por PE/VC estão associadas a menor nível de alavancagem por pelo menos 8 anos após IPO.

O menor nível de alavancagem das empresas investidas por PE/VC no Brasil pode ter relação com aspectos econômicos. Um aspecto da economia brasileira que inibe a realização de investimentos em participações privadas é a baixa disponibilidade de crédito e a reduzida possibilidade de alavancagem. Fundos de participações privadas nos EUA, principalmente aqueles especializados em Leverage Buy Outs (compra de controle alavancadas), trabalham com elevados índices de alavancagem que podem chegar a 4 dólares em dívida para cada dólar investido (SCHIFRIN, 1998SCHIFRIN, M. (1998). LBO madness. Forbes, 161(5), 128-134.). No Brasil, a pouca disponibilidade de recursos e o custo de operações de crédito implicam reduzida participação de dívida na estrutura de capital das empresas nas quais fundos de PE/VC investem.

4.3. ROA

Empresas investidas por fundos de PE/VC são mais jovens e com potencial de crescimento expressivo. A tabela 5 evidencia que essas empresas apresentam maior rentabilidade se comparadas às empresas não investidas por PE/VC, nos primeiros 3 anos após o IPO. Em termos de características da empresa, aquelas com maior crescimento de vendas tendem a apresentar maior nível de rentabilidade - medido pela variável ROA.

Tabela 5
ROA

Esse resultado é consistente com Morsfield e Tan (2006)MORSFIELD, S. G.; TAN, C. E. L. (2006). Do venture capitalists influence the decision to manage earnings in initial public offerings? Accounting Review, v. 81, (5), p. 1119-1150., os quais argumentam que as empresas selecionadas para investimentos de fundos de PE/VC podem ter, em média, melhor desempenho do que as restantes.

Caselli (2009)CASELLI, S.; GARCIA A., E.; IPPOLITO, F. (2009). Explaining Returns in Private Equity Investments, Working Paper, n.15/09, Milan, Carefin Bocconi, [Online] Available at: <http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1600227>
http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?a...
analisou 804 investimentos feitos por 87 veículos de Investimentos de 58 Organizações Gestoras de PE/VC na Itália no período de 1999 - 2005 e desinvestidos não antes de 2007. Os resultados encontrados indicaram uma TIR média de 33,17% em seu trabalho e apontam que os maiores retornos são obtidos pelo estágio de Buyouts. O investimento em PE/VC superou a bolsa (17,95%) - naquele período amostral de fraco desempenho do mercado de ações - em quase o dobro de rentabilidade e retornou quatro vezes os títulos do governo - 2 years goverment bonds. O autor também concluiu que a TIR é movida a crescimento de vendas, retorno sobre ativos (ROA) e retorno sobre patrimônio líquido (ROE).

Os maiores níveis de rentabilidade sobre ativos das empresas investidas por PE/VC podem estar relacionados com o fato de esses fundos participarem ativamente da gestão dessas empresas. No geral, os fundos de PE/VC têm assentos nos conselhos de administração e também são gestores atuantes nas operações das empresas investidas. O objetivo da participação ativa desses fundos é melhorar a eficiência operacional e a gestão dessas empresas.

4.4. CRESCIMENTO DE VENDAS

De forma similar aos resultados encontrados para a variável ROA, a variável crescimento de vendas indica que empresas investidas por fundos de PE/VC apresentam desempenho superior às não investidas no curto prazo. Ou seja, nos primeiros 3 anos após o IPO, essas empresas apresentam maior nível de vendas quando comparadas com aquelas que não receberam investimentos de PE/VC.

As empresas investidas por PE/VC são as que estão em estágio de expansão, logo tendem a apresentar maiores taxas de crescimento de vendas. O crescimento das empresas investidas pode se dar de duas maneiras distintas: i) por meio de crescimento orgânico, principalmente relacionado à expansão de suas receitas; ii) por meio de aquisições e fusões. É importante ressaltar que ambas as formas de crescimento tendem a impactar nos níveis de venda das empresas investidas, as quais, devido ao estágio de expansão, buscam ampliar sua participação no mercado.

Tabela 6
Crescimento de Vendas

Os resultados encontrados são consistentes com Puri e Zarutskie (2012)PURI, M.; ZARUTSKIE, R. (2012). On the Life Cycle Dynamics of Venture-Capital- and Non-Venture-Capital-Financed Firms. The Journal of Finance, v. 67, (6), p. 2247-2293. os quais relatam que empresas financiadas por PE/VC, crescem mais rapidamente em termos de vendas se comparadas às não financiadas. Esse resultado é persistente principalmente nos primeiros anos, antes da estabilização do crescimento.

Paglia e Harjoto (2014)PAGLIA, J. K.; HARJOTO, M. A. (2014). The effects of private equity and venture capital on sales and employment growth in small and medium-sized businesses. Journal of Banking & Finance, v. 47, p. 177-197. também comprovam que empresas financiadas por PE/VC possuem impacto positivo sobre o crescimento de vendas. Os autores afirmam que esse resultado persiste por três anos consecutivos após o financiamento. Os resultados também foram consistentes com Chemmanur et al. (2011)CHEMMANUR, T. J.; KRISHNAN, K.; NANDY, D. K. (2011). How Does Venture Capital Financing Improve Efficiency in Private Firms? A Look Beneath the Surface. Review of Financial Studies, v. 24, (12), p. 4037-4090. que mostram uma relação positiva entre as empresas investidas por PE/VC e crescimento de vendas.

4.5. ROBUSTEZ

O intuito no presente estudo foi analisar a relação das políticas financeiras e o desempenho operacional entre empresas financiadas e não financiadas por PE/VC e sua persistência ao longo do tempo. Em um experimento ideal, seria possível observar a política financeira de empresas financiadas por PE/VC e a política financeira que elas experimentariam caso não estivessem recebidos o aporte de capital dos fundos de PE/VC. Isso permitiria realizar inferências causais sobre o efeito do aporte de capital dos fundos de PE/VC na política financeira das empresas. Infelizmente, dada à natureza não experimental dos dados, o que realmente é possível observar é a política financeira das empresas financiadas e não financiadas por PE/VC. Nesse caso, o problema é que o investimento por PE/VC não é distribuído de forma aleatória, introduzindo um viés de seleção, que pode gerar complicações em casos de inferências.

Para reduzir esse viés, utilizou-se uma metodologia semelhante à de Lee e Wahal (2004)LEE, P. M.; WAHAL, S. (2004). Grandstanding, certification and the underpricing of venture capital backed IPOs. Journal of Financial Economics, v. 73, (2), p. 375-407., a qual endogeiniza o recebimento de aporte de capital por parte dos fundos de PE/VC e não impõe linearidade e sequer restrições na forma funcional. Nesse sentido, cada empresa financiada por PE/VC deverá ser combinada com uma ou mais empresas não financiadas por PE/VC considerando o mesmo código SIC de dois dígitos e que sejam similares em relação ao tamanho da empresa, medido pelos ativos totais. Abordando essa questão de endogeneidade, causada pelo efeito de seleção que pode haver na hora da escolha dos investimentos dos fundos de PE/VC, pode-se observar que os resultados se mostram semelhantes aos apresentados neste trabalho.

A tabela 7 apresenta os resultados para a diferença em termos de políticas financeiras e desempenho operacional das empresas financiadas e não financiadas por PE/VC. Cada empresa financiada foi combinada com uma ou mais empresas não financiadas utilizando o método de Propensity Matching Score (PMS). Os estimadores, nessa estrutura, estabelecem uma comparação entre empresas financiadas e não financiadas por PE/VC as quais são semelhantes em termos de características observáveis, como indústria e tamanho. Foi feito o PMS considerando todas as empresas investidas por PE/VC, onde para cada uma delas foi utilizada como contrafactual, sendo uma única empresa não investida, seguindo Almeida et al. (2011).ALMEIDA, H., CAMPELLO, M, LARANJEIRA, B., and WEISBENNER, S. (2011). Corporate Debt Maturity and the Real Effects of the 2007 Credit Crisis. Critical Financial Review, v.1, p.3-58. Também foi seguida a recomendação de Roberts e Whited (2013)ROBERTS, M., WHITED, T.M. (2013). Endogeneity in Empirical Corporate Finance. Handbook of the Economics of Finance, v. 42, (5), p. 493-572, a para qual foi aplicada a substituição do procedimento de correspondência. Após isso, remanesceram 40 empresas investidas e 40 empresas de controle (não investidas por PE/VC)".

Tabela 7
Análise univariada utilizando Propensity Matching Score

5. CONCLUSÃO

No presente artigo, analisou-se o papel dos fundos de PE/VC em termos da política financeira das empresas e sua persistência (efeitos fixos dessas empresas) ao longo do tempo. Para realizar essa análise, foram utilizadas quatro variáveis com a finalidade de medir o desempenho operacional e financeiro dessas empresas. Em termos de estrutura de capital, utilizou-se a variável de alavancagem e disponibilidade de caixa. Já em termos de desempenho operacional, utilizou-se a variável de rentabilidade sobre os ativos, medido pelo ROA, e crescimento de vendas, medido pela variação das receitas líquidas das empresas analisadas.

A principal conclusão foi que a origem comum de uma empresa conduz a semelhanças em suas políticas de financiamento e performance financeira até mesmo em médio período, nesse caso, 5 anos após o IPO. Os resultados indicaram que empresas as quais receberam aporte de capital de fundos de PE/VC escolhem um conjunto de políticas diferentes em relação às não financiadas.

Adicionalmente, empresas financiadas por PE/VC implicam nível mais elevado de disponibilidades de caixa em relação às não financiadas. Esse efeito é constante por pelo menos 5 anos após o IPO. Destaca-se também que empresas financiadas por PE/VC estão associadas a menor nível de alavancagem ao longo dos 5 primeiros anos após o IPO. Em termos de rentabilidade, os resultados indicaram que essas empresas apresentam melhor desempenho, medido por ROA, nos primeiros 3 anos após o IPO. Elas também apresentaram resultado superior ao considerar como variável de desempenho operacional o crescimento de vendas.

A fim de reduzir o recorrente problema de viés de seleção que ocorre nos estudos relacionados aos investimentos de PE/VC, este estudo utilizou uma metodologia similar à de Lee e Wahal (2004)LEE, P. M.; WAHAL, S. (2004). Grandstanding, certification and the underpricing of venture capital backed IPOs. Journal of Financial Economics, v. 73, (2), p. 375-407.. Os resultados encontrados com base no modelo de Propensity Score Matching foram similares aos já encontrados nas regressões multivariadas. Esses resultados deram mais robustez às evidências encontradas neste estudo. Entretanto, é importante ressaltar que esse método não elimina o problema de endogeneidade que há nos investimentos realizados pelos fundos de PE/VC. Sendo assim, os resultados apresentados são indicativos de relações existentes entre essas variáveis financeiras e os investimentos realizados pelos fundos de PE/VC. Para melhor compreensão desses efeitos, estudos futuros são necessários.

  • 1
    Veja, por exemplo o Aviso de Acionistas da OGX - OGX: Pagamento de dividendo (23 de junho de 2009).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2019

Histórico

  • Recebido
    15 Nov 2017
  • Revisado
    12 Mar 2018
  • Aceito
    10 Abr 2018
  • Aceito
    11 Jul 2018
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