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A Verdade Agridoce: Responsabilidade Social Corporativa na Comunicação Online entre um Fabricante de Café e seus Consumidores

RESUMO

Com o aumento no uso da internet, as redes sociais têm atuado como um canal de relacionamento entre consumidores e empresas. Esta pesquisa tem como objetivo analisar a comunicação entre uma empresa e seus clientes em uma comunidade online brasileira, utilizando como base o critério de Responsabilidade Social Corporativa (RSC) do Modelo VBA, que é composto dos elementos valor, equilíbrio e transparência. Para tal, aplicou-se uma netnografia na página do Facebook de uma marca que fabrica e comercializa máquinas e cápsulas de café. Os resultados demonstram que os elementos trabalhados no Modelo VBA não atendem aos critérios esperados na rede social da empresa estudada, evidenciando a discrepância entre o que a empresa pretende entregar e o que é, de fato, entregue aos consumidores. Esses achados trazem implicações para a teoria e a prática das organizações, ampliando a discussão sobre práticas de RSC e o comportamento do consumidor. Além disso, destaca a necessidade de investigar profundamente os construtos que compõem o Modelo VBA, contribuindo para o desenvolvimento do campo de estudo.

PALAVRAS-CHAVE
Comunidade online; reponsabilidade social corporativa; comunicação; comportamento do consumidor; netnografia

ABSTRACT

With the increased use of the internet, social networks have acted as a relationship channel between consumers and companies. This paper aims to analyze the communication between an organization and its customers in a Brazilian online community, based on corporate social responsibility (CSR) criteria VBA model, which is composed of the elements of value, balance, and accountability. Netnography was applied to the Facebook fan page of a company brand that manufactures and sells coffee machines and capsules. The results demonstrated that the elements of the VBA model do not meet the expected criteria in the social network analyzed, showing a discrepancy between what the organization intends to deliver and what is delivered to customers. These findings have implications for the theory and practice of organizations, broadening the discussion about CSR practices and consumer behavior. It also highlighted the need to investigate deeply the constructs that built the VBA Model contributing to develop the field.

KEYWORDS
Online community; corporate social responsibility; communication; consumer behavior; netnography

1. INTRODUÇÃO

Com o advento da tecnologia, as redes sociais têm concretizado seu papel como um canal de comunicação entre empresas e consumidores. Através da internet, as organizações podem estabelecer um relacionamento direto com seus stakeholders (Kent et al., 2003Kent, M. L., Taylor, M., & White, W. J. (2003). The relationship between web site design and organizational responsiveness to stakeholders. Public Relations Review, 29(1), 63-77.).

No Brasil, de acordo com uma pesquisa conduzida pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 2019, estima-se que mais de dois terços da população do país, cerca de 79,9%, conta com uma conexão de internet em casa, principalmente por meio do telefone celular. Tais números representam um aumento de quase 10% em comparação com a mesma pesquisa feita pelo IBGEIBGE. Síntese de Indicadores Sociais. Retrieved from: <https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9221-sintese-de-indicadores-sociais.html?edicao=25875&t=downloads
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em 2018. Esse aumento direciona para um movimento que vem sendo gradualmente absorvido pelas empresas, que é o uso da internet e das redes sociais como uma estratégia de relacionamento com seu público.

No mesmo cenário, comunidades online (ou virtuais), identificadas como fóruns e espaços para discussão no ambiente da internet que possuem um significado real para os participantes e determinam o comportamento do consumidor (Kozinets, 2002Kozinets, R. V. (2002). The field behind the screen: using netnography for marketing research in online communities. Journal of Marketing Research. 39, 61-72.; 2010), permitem a identificação de tendências e direcionamentos para o mercado mediante a comunicação dos indivíduos. Noble, Noble e Adjei (2012Noble, C. H., Noble, S. M., & Adjei, M. T. (2012). Let them talk! Managing primary and extended online brand communities for success, Business Horizons, 55(5), 475-483.) afirmam que consumidores aproveitam o ambiente para se expressar livremente e que se encontram em seu estado mais aberto e honesto quando compartilham opiniões de produtos e experiências de consumo em comunidades online.

De fato, o ato de interagir e compartilhar informações entre indivíduos é a atividade principal nas plataformas de mídia social (Quinton & Wilson, 2016Quinton, S., & Wilson, D. (2016). Tensions and ties in social media networks: Towards a model of understanding business relationship development and business performance enhancement through the use of LinkedIn. Industrial Marketing Management, 54, 15-24.). O Facebook, uma rede social criada em 2004, atingiu cerca de 2.5 bilhões de usuários ativos em 2019, sendo a maior rede social mundial atualmente. Dados de uma pesquisa realizada em 2016 pela DeloitteDeloitte. The economic impact of disruptions to Internet connectivity: A report for Facebook. Retrieved from: <https://www2.deloitte.com/global/en/pages/technology-media-and-telecommunications/articles/the-economic-impact-of-disruptions-to-internet-connectivity-report-for-facebook.html>.
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destacaram que mais de três milhões de empresas usam as comunidades do Facebook como uma ferramenta de marketing. Além de estimular novos negócios, essas comunidades permitem que as empresas fortaleçam relacionamentos já estabelecidos no mercado, uma vez que consumidores preferem visitar uma página empresarial no Facebook ao website oficial de uma organização (Haigh, Brubakera & Whiteside, 2013Haigh, M. M., Brubaker, P., & Whiteside, E. (2013). Facebook: examining the information presented and its impact on stakeholders, Corporate Communications: An International Journal, 18 (1), 52-69.).

O referido ambiente de relacionamentos entre empresas e consumidores tornou-se também uma ferramenta acessível para os clientes transmitirem suas insatisfações em relação a produtos, serviços, à empresa ou à marca. Assim, questões éticas emergem desse contexto, estimulando empresas a trabalharem a manutenção do valor que oferecem a seus consumidores, de modo a atender a suas necessidades de forma transparente e responsável (SCHWARTZ E CARROLL, 2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.). Ainda, Wang et al. (2016) indicaram a necessidade de investigar práticas e resultados de RSC perante as lentes de diferentes stakeholders, como os consumidores. Nesse contexto, empresas devem usar estratégias de responsabilidade social corporativa, as quais permitem que as organizações se engajem em temáticas sociais e ambientais, indo além do que está descrito por lei e tendo como argumento central tópicos como obrigação moral, sustentabilidade, licença para operar e reputação (Carroll & Brown, 2018Carroll, A.B., & Brown, J.A. (2018).Corporate social responsibility: A review of current concepts, research, and issues. In: Wasieleski, D.M., Weber, J. (eds) Corporate Social Responsibility: Business and Society 360, 2. Pittsburgh, PA: Emerald, 39-69.).

Tendo em vista o papel das redes sociais e sabendo da importância do relacionamento entre as empresas e seus consumidores para o desenvolvimento e sobrevivência das organizações, este trabalho pretende investigar a aplicação da RSC por parte da empresa na comunicação online com o consumidor em uma fanpage do Facebook ou redes sociais de marcas online, como especificado por Lim e Kumar (2019Lim, H., & Kumar, A. (2019). Variations in consumers’ use of brand online social networking: A uses and gratifications approach, Journal of Retailing and Consumer Services, 51, 450-457. ).

Assim, utilizou-se como base o Modelo VBA de Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.), que explora os conceitos de valor, equilíbrio e transparência praticados pelas empresas. Esses conceitos refletem o que a sociedade almeja e permitem que a organização alcance certo grau de cidadania corporativa, gerando discussões e respeito por aspectos econômicos, legais e éticos com a mesma intensidade e importância (Schwartz & Carroll, 2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.).

Para tal, foi aplicada uma netnografia na página de uma empresa que comercializa máquinas e cápsulas de café. Desta forma, buscou-se descrever como ocorre a comunicação entre empresa e consumidor nas redes sociais e identificar o cumprimento dos critérios de RSC pela empresa no que diz respeito ao relacionamento com stakeholders, em específico, seus consumidores.

O artigo está estruturado de forma a conceituar as comunidades online e seu papel nas empresas; apresentar o Modelo VBA de Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.); descrever o método utilizado na pesquisa como também analisar os aspectos mais relevantes à proposta do trabalho e proporcionar maior compreensão do relacionamento entre empresa e consumidor em comunidades online, principalmente do ponto de vista ético.

2. MARCO TEÓRICO

O arcabouço teórico deste artigo conta com conceitos relacionados a comunidades online e seu papel nas organizações. Ainda, explora o Modelo VBA de Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.) como parte de uma estratégia adequada de responsabilidade social corporativa para empresas.

2.1. Comunidades Online

A internet continua em crescimento constante no mundo e no Brasil. De acordo com pesquisa administrada pelo Statista, o número de pessoas com acesso a mídias sociais no país atingiu a marca de 95.2 milhões em 2018, representando um aumento de quase 5% em relação ao ano anterior. Atualmente, a internet tem um tempo médio de acesso por usuário de mais de duas horas por mês, entre uso residencial e no ambiente de trabalho (Statista, 2018Statista. Internet Usage in Brazil. Retrieved from: < https://www.statista.com/study/22625/internet-usage-in-brazil-statista-dossier/>.
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). De fato, as redes sociais vêm crescendo gradualmente nos últimos anos. Segundo Kaplan e Haenlein (2010Kaplan, A. M., & Haenlein, M. (2010). Users of the world, unite! The challenges and opportunities of Social Media, Business Horizons, 53(1), 59-68. ), o conceito de mídias sociais é fortalecido entre executivos de grandes empresas que, juntamente com consultores e outros profissionais, buscam identificar novas formas de uso para comunidades online como o YouTube, Twitter e Facebook, fazendo-as mais lucrativas para as corporações.

Kent e Taylor (1998Kent, M. L., and Taylor, M. (1998). Building dialogic relationships through the World Wide Web, Public Relations Review, 24(3), 321-334.) estudaram a comunicação dialógica entre organizações e consumidores e mostraram que, mesmo antes do surgimento de diversas redes sociais, inúmeras regras continuam a ser aplicáveis. Em seu trabalho, os autores apresentaram algumas ações a serem seguidas, desde princípios básicos desta relação até a inclusão de informações úteis no site, sendo elas: atualizar constantemente a página, gerar novos conteúdos que encorajem o retorno dos visitantes, facilitar o acesso e utilização do site e, por fim, manter esforços para que os visitantes se interessem pelo site.

De fato, desde que sites como Facebook e MySpace abriram espaço para que as empresas criassem perfis e virassem membros ativos de comunidades online, as organizações começaram a incorporar estratégias relacionadas a esses meios (Waters et al., 2009Waters, R. D., Burnett, E., Lamm, A., & Lucas, J. (2009). Engaging stakeholders through social networking: How nonprofit organizations are using Facebook. Public Relations Review, 35 , 102-106. ). As comunidades online permitem contato direto dos consumidores com as empresas e, ainda, poder de resposta em tempo real. Noble, Noble e Adjei (2012Noble, C. H., Noble, S. M., & Adjei, M. T. (2012). Let them talk! Managing primary and extended online brand communities for success, Business Horizons, 55(5), 475-483.) afirmam que comunidades de marca online trazem benefícios para empresas através de soluções consumidor-para-consumidor, mas também acarretam riscos quando se tratam de comunidades empresariais não reguladas, como o impacto nocivo de notícias com viés negativo sendo espalhadas.

Segundo a definição de Kozinets (1998Kozinets, R. V. (1998). On Netnography: Initial Reflections on Consumer Research Investigations of Cyberculture. Advances in Consumer Research, 25, 366- 371.; 2002Kozinets, R. V. (2002). The field behind the screen: using netnography for marketing research in online communities. Journal of Marketing Research. 39, 61-72.), comunidades online são fóruns com base na internet. O autor difere comunidade online de comunidade virtual por serem grupos que têm uma existência “real” para seus participantes, gerando consequências em seu comportamento como consumidor. A ideia das comunidades online é oferecer outra forma de abordar e engajar consumidores, sem exigir tempo ou locomoção, estando presente nos meios diários. Essas comunidades facilitam a troca de informação, conhecimento e experiência, contribuindo para o desenvolvimento pessoal e profissional de seus membros.

2.1.1. O Facebook como comunidade online

No contexto de comunidade online, o Facebook conta com imensa popularidade entre usuários e empresas. Criada em 2004 com intuito inicial de desenvolver relacionamentos entre estudantes de uma universidade americana (Phillips, 2007Phillips, S. A brief story of Facebook. Retrieved from: <http://www.theguardian.com/technology/2007/jul/25/media.newmedia>.
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), somente em 2007 passou a estimular organizações a fazerem parte de seu ambiente, seja por meio de propaganda ou de páginas de fãs (do inglês fanpages) que disseminem informações a seu respeito.

Com mais de 2.5 bilhões de usuários ativos com acesso diário, sendo 85% de fora dos Estados Unidos (Facebook, 2019Facebook. Facebook Statistics. Retrieved from: <http://newsroom.fb.com/company-info/>
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), a plataforma engloba consumidores e empresas em um ambiente virtual de uso comum, combinando os interesses de diferentes grupos e indivíduos. Esses grupos coexistem no cenário do Facebook, seja estabelecendo relacionamentos como stakeholders de empresas, seja utilizando o sistema para momentos de lazer.

Vorvoreanu (2009Vorvoreanu, M. (2009). Perceptions of Corporations on Facebook: An Analysis of Facebook Social Norms, Journal of New Communications Research, 4(1), 67-86.) exalta a importância de compreender quais esforços de relações públicas são apropriados e efetivos na rede, uma vez que o Facebook representa, como canal de comunicação, diversas peculiaridades quanto à cultura e normas sociais. A autora conduziu uma série de grupos focais com estudantes e descobriu que, embora os participantes atribuam como objetivo principal no uso do Facebook a possibilidade de contato com amigos e conhecidos, os esforços de organizações para comunicarem-se com usuários são percebidos e identificados como uma forma de as empresas manterem consumidores leais.

Ao “curtir” uma página do Facebook, o usuário tem acesso a todas as atualizações e conteúdos compartilhados, podendo interagir com outros usuários da internet. O segredo é que a organização deve conhecer sua audiência e identificar a melhor forma de corresponder a suas necessidades. Lim e Kumar (2019Lim, H., & Kumar, A. (2019). Variations in consumers’ use of brand online social networking: A uses and gratifications approach, Journal of Retailing and Consumer Services, 51, 450-457. ) analisaram a variação no uso de redes sociais de marcas online (do inglês brand online social networking - BOSN, tradução nossa) e descobriram que informação, incentivos, entretenimento e conectividade são motivos principais em BOSN para que os consumidores sejam ativos nas páginas do Facebook.

Farquhar (2012Farquhar, l. (2012). Performing and interpreting identity through Facebook imagery. Convergence: The International Journal of Research into New Media Technologies, 19(4), 446-471) estudou sobre identidade e imagens no Facebook. O autor enfatizou que, quando as pessoas se engajam em comunicação online, a performance de suas identidades tende a ser exagerada para compensar a falta recursos não verbais ou visuais. Ele também explica que os usuários de Facebook tentam atingir aceitação social por meio da rede, gerindo as atualizações de seus perfis e interações em comunidades.

Por outro lado, os estudos de Haigh, Brubaker e Whiteside (2013Haigh, M. M., Brubaker, P., & Whiteside, E. (2013). Facebook: examining the information presented and its impact on stakeholders, Corporate Communications: An International Journal, 18 (1), 52-69.) evidenciaram que empresas divulgam serviços oferecidos, prêmios ganhos e outras vitórias em suas páginas no Facebook. A principal estratégia empregada na página é a habilidade corporativa, e a interação com fanpage da empresa aumenta a percepção dos consumidores no tocante a relações públicas, responsabilidade social corporativa e intenção de compra. Seguindo esse ponto de vista, apresentamos a literatura em RSC.

2.2. Responsabilidade Social Corporativa

Construto originado na década de 30 (Carroll, 1999Carroll, A. B. (1999). Corporate social responsibility: Evolution of a definitional constructo. Business & Society, 38(3), 268-295.) e utilizado amplamente na literatura de negócios e sociedade, a responsabilidade social corporativa viu seu foco ampliado ao longo do tempo. Partindo inicialmente da preocupação com impactos sociais negativos para uma atual noção geral de fazer o bem para a sociedade, a RSC está cada vez mais presente no dia a dia das organizações (Schwart & Carroll, 2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.).

Carroll (1991Carroll, A. B. (1991). The Pyramid of Corporate Social Responsibility: Toward the Moral Management of Organizational Stakeholders. Business Horizons.) afirma que o conceito personaliza responsabilidades sociais ou societais ao delinear os grupos específicos que um negócio deve considerar ao conduzir suas ações. Os estudos de O’Riordan e Fairbrass (2008O’Riordan, L., & Fairbrass, J. (2008). Corporate Social Responsibility (CSR): Models and Theories in Stakeholder Dialogue. Journal of Business Ethics , 83(4), 745-758. ), por sua vez, discorrem que, ao buscar cumprir suas obrigações de responsabilidade social corporativa, as empresas devem engajar-se diretamente com seus stakeholders. O termo stakeholder assume diversas interpretações na literatura. Freeman (1984Freeman, R.E. (1984). Strategic management: A stakeholder approach. Boston: Pitman Publishing Inc.) afirma que se trata de grupos ou indivíduos que podem afetar ou são afetados pelo atingimento da missão de uma organização. Em outras palavras, são partes distintas que impactam o valor da empresa e participam ativamente do desenvolvimento do negócio. Exemplos de stakeholders são fornecedores, funcionários, consumidores, governo e sociedade (Certo & Certo, 2005Certo, S. C., & Certo, S. T. (2005). Modern Management. Pearson.).

Parmar et al. (2010Parmar, B. R., Freeman, R. E., Harrison, J. S., Wicks, A. C., De Colle, S., & Purnel, L. (2010). Stakeholder Theory: the state of the art. The Academy of Management Annals.) consideram que qualquer conjunto de ações da empresa envolve consequências morais e financeiras para os stalkeholders. Em seu trabalho, os autores evidenciam o estado da arte relacionado à teoria dos stakeholders (Freeman, 1984Freeman, R.E. (1984). Strategic management: A stakeholder approach. Boston: Pitman Publishing Inc.) e criticam a dicotomia entre políticas de responsabilidade social corporativa disseminadas pelas organizações e o não enfrentamento de questões éticas de forma adequada, o que vem a impactar negativamente o valor da empresa perante os demais agentes envolvidos.

Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.) apresentam o conceito de “gestão de stakeholders” como um dos cinco construtos trabalhados no Modelo VBA, ao lado de RSC, Sustentabilidade, Ética nos Negócios e Cidadania Corporativa. Os autores afirmam que gerir as relações com stakeholders adequadamente provê uma ferramenta poderosa para organizações que visam estabelecer estratégias corporativas.

Carroll e Laarsch (2020Carroll, A. B., & Laasch, O. (2020). From Managerial Responsibility to CSR and Back to Responsible Management. In: Laasch, O., Jamali, D., Freeman, R. E., Suddaby, R. (eds) The Research Handbook of Responsible Management, Cheltenham, UK: Edward Elgar, 1-10.) afirmam que o elemento fundamental que circunda o campo de negócios e sociedade é a geração de valor. Eles também explicam que, ao longo dos anos, o Modelo VBA adicionou três outros construtos à sua teoria: Criando Valor Compartilhado, Capitalismo Consciente e Negócios Direcionados por Propósito. Todos eles incluem os princípios básicos de valor, equilíbrio e transparência. Embora o conceito de stakeholder de uma empresa englobe muitos grupos, esta pesquisa limitou-se a compreender os relacionamentos de comunicação entre empresas e o grupo de interesse que se refere a consumidores, a partir da abordagem do Modelo VBA por Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.).

2.2.1. O Modelo VBA

De acordo com Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.), todas as organizações e indivíduos que operam no contexto organizacional têm responsabilidade (CSR) como bons cidadãos (Cidadania Corporativa), de contribuir com valor social sustentável (Sustentabilidade), equilibrar apropriadamente os interesses dos stakeholders (Teoria dos Stakeholders) e agir de acordo com padrões morais (Ética nos Negócios), enquanto demonstram transparência suficiente de suas ações à sociedade.

Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.) desenvolveram o Modelo VBA, que serve de base para a análise realizada neste artigo. Em seu trabalho, os autores propõem a integração e unificação de cinco construtos: responsabilidade social corporativa, gestão (ou teoria) dos stakeholders, sustentabilidade, ética nos negócios e cidadania corporativa.

Os pesquisadores sugerem uma nova abordagem que permite a definição e conexão entre as cinco temáticas, alegando competitividade e conceitualização difusa entre os construtos. Por meio do Modelo VBA (do acrônimo em inglês para Value, Balance e Accountability), que corresponde à criação de valor, equilíbrio e transparência, objetiva-se definir o papel apropriado dos construtos indicados para o êxito de negócios na sociedade (Schwartz & Carroll, 2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.).

A proposição de valor corresponde, segundo Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.), ao momento em que o negócio vai ao encontro das necessidades da sociedade, através da produção de serviços e produtos de forma eficiente, enquanto evitam externalidades negativas desnecessárias. Em outras palavras, o valor é percebido quando a empresa demonstra preocupação sobre a eficiência e a qualidade de seus produtos e serviços, da mesma forma que se preocupa com sua marca e imagem no mercado.

O equilíbrio trata-se da preocupação da empresa em direcionar e atender aos interesses dos stakeholders, bem como padrões morais sociais. Uma empresa que garante a satisfação nas necessidades de seus agentes de interesse enquanto busca prever possíveis conflitos entre eles é uma organização que respeita o princípio de equilíbrio.

Por fim, a transparência remete-se à necessidade de os negócios engajarem-se em atividades corretas e verificáveis, enquanto passíveis de afetar os demais envolvidos no processo. Por exemplo, com a prestação de contas acerca de suas metas, atividades e resultados para todos os seus grupos de interesse, por meio de relatório social, newsletters ou qualquer tipo de ferramenta informativa, a empresa permite que seus stakeholders se informem apropriadamente sobre suas operações na sociedade.

Recentemente, os cinco construtos principais foram atualizados com outros três conceitos: Criando Valor Compartilhado, Capitalismo Consciente e Negócios Direcionados por Propósito. Entretanto, todos eles continuam a servir como base para o modelo original do VBA, que significa valor, equilíbrio e transparência de um negócio específico (Carroll & Laasch, 2020Carroll, A. B., & Laasch, O. (2020). From Managerial Responsibility to CSR and Back to Responsible Management. In: Laasch, O., Jamali, D., Freeman, R. E., Suddaby, R. (eds) The Research Handbook of Responsible Management, Cheltenham, UK: Edward Elgar, 1-10.).

Como se acredita que, para a obtenção de resultados com impacto positivo para empresas e seus stakeholders, o negócio deve atender às premissas de responsabilidade social corporativa indicadas pelo Modelo VBA, este trabalho visa analisar o cumprimento desses parâmetros a partir da comunicação estabelecida entre empresa e consumidor em uma comunidade online.

De fato, Lyra e Souza (2015Lyra, F. R., and Souza, M. J. B. (2015). Responsabilidade Social Corporativa en el Sector Turístico. Un estudio de caso en el Parque Temático Beto Carrero World. Estudios y Perspectivas en Turismo, 24(2), 264-278. ) afirmam que há a necessidade de formulação de mais pesquisas que testem a aplicabilidade do modelo VBA proposto por Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.) e suas relações com RSC, de modo a contribuir para melhores práticas exercidas pelos gestores das organizações, conforme o que é proposto neste artigo.

3. METODOLOGIA

Esta pesquisa caracteriza-se como qualitativa e utilizou como metodologia a netnografia, técnica desenvolvida Robert V. Kozinets na década de 90. Em seu trabalho, o autor identifica a netnografia como uma etnografia adaptada ao estudo de comunidades online, considerada uma pesquisa de marketing em ambiente virtual, de modo a prover insights sobre consumidores (Kozinets, 2002Kozinets, R. V. (2002). The field behind the screen: using netnography for marketing research in online communities. Journal of Marketing Research. 39, 61-72.; 2010Kozinets, R. V. (2010). Netnography. Doing ethnographic research online. Thousand Oaks, CA: Sage Publications. ). Assim, através de adaptações das técnicas de pesquisa utilizadas na etnografia, faz-se possível estudar culturas e comunidades que emergem de comunicações mediadas na internet.

Netnografia se difere de outros métodos digitais por sua ênfase em traços online, interações entre pessoas e empresas, bem como sua socialização (Kozinets, 2019Kozinets, R. V. (2019). c Thousand Oaks, CA: Sage Publications.). É considerada uma análise cultural de uma comunidade ou mídia social em ambiente virtual e segue uma gama de regras, como apresentadas ao fim desta seção.

Costello, McDermott e Wallace (2017Costello, L., McDermott, M., & Wallace, R. (2017). Netnography: Range of Practices, Misperceptions, and Missed Opportunities, International Journal of Qualitative Methods,16, 1-12., p.3) especificam que “netnografia é particularmente adequada para lidar com tópicos sensíveis do ponto pessoal ou político, ou ainda, atos ilegais, discutidos em comunidades online por indivíduos que preferem preservar suas identidades e se favorecer do caráter anônimo presente no contexto virtual”. Em outras palavras, os autores defendem que o método netnográfico é amplamente usado para trabalhar com tópicos delicados em diversos ambientes de pesquisa.Kozinets (2015Kozinets, R. V. (2015). Netnography: Redefined. Thousand Oaks, CA: Sage Publications.) também explica que o método vem sendo usado em diferentes campos acadêmicos ao longo do tempo, quando da decisão dos pesquisadores por analisar narrativas pessoais, estilos de interação, formas de colaboração inovativas, bem como regras online, práticas e rituais.

Dholakia e Zhang (2004Dholakia, N., & Zhang, D. (2004). Online qualitative research in the age of e-commerce: data sources and approaches. Forum: Qualitative Social Research, 5(2), 1-10. ), por sua vez, defendem o uso da netnografia em pesquisas científicas por sua flexibilidade temporal e espacial. A flexibilidade temporal refere-se à sua capacidade de ser gerada por meio de comunicação assíncrona, habilitando o pesquisador a acessar os dados a qualquer momento; e sua flexibilidade espacial diz respeito à sua permissividade perante o campo e as culturas, muito mais abrangentes do que em outros métodos qualitativos. Entretanto, embora seja realizada em ambiente virtual e, muitas vezes, analisada por meio de dados com linguagem informal como fóruns, chats e comentários de redes sociais, a netnografia exige certo rigor em sua aplicação.

Tendo isso em vista, Kozinets (2010Kozinets, R. V. (2010). Netnography. Doing ethnographic research online. Thousand Oaks, CA: Sage Publications. ) dividiu o processo netnográfico em seis etapas: 1) definição das questões de pesquisa, websites sociais ou tópicos de estudo; 2) identificação e seleção da comunidade online a ser analisada; 3) observação participante da comunidade mediante imersão e coleta de dados por meio de procedimentos éticos; 4) análise dos dados coletados e interpretação dos resultados; (5) redação e apresentação de relatório dos resultados de pesquisa, bem como implicações teóricas e práticas. Seguindo essa sequência, foi possível operacionalizar a pesquisa netnográfica proposta neste trabalho.

3.1. Corpus de Pesquisa

O website analisado como comunidade virtual base da netnografia trata-se de uma fanpage brasileira de uma empresa fabricante de máquinas e cápsulas de café. Por questões éticas, o nome da empresa foi omitido no desenvolvimento deste trabalho.

Foram coletados os dados publicados na página do Facebook referente ao período de 29 de outubro a 29 de novembro de 2018, considerando posts e comentários publicados até 28 de novembro de 2018. Para Kozinets (2010Kozinets, R. V. (2010). Netnography. Doing ethnographic research online. Thousand Oaks, CA: Sage Publications. ), o que define o espaço de tempo de análise na netnografia é a presença de um número de interações e exposição ao longo do tempo que estabeleça um senso de comunidade. O período da pesquisa compreendeu a coleta de 3.352 comentários, extraídos através do software ExportComments para exportar os dados para Microseft Excel e Atlas.ti, para codificação. O software excluiu comentários de usuários privados ou qualquer spam detectado.

Os membros da fanpage da empresa no Facebook, que ultrapassa a marca de um milhão de usuários, apesar de terem em comum o interesse pelos produtos da marca, são caracterizados por sua heterogeneidade quanto à idade, gênero e profissão. Embora não seja possível afirmar quantos são consumidores de fato, a participação na página sugere engajamento, interesse ou pretensão de compra futura.

3.2. Imersão, Coleta e Preparação dos Dados

Um dos autores da pesquisa é consumidor da marca há cinco anos, possui uma máquina de café e consome regularmente as cápsulas de sabores oferecidas pelo fabricante no mercado. Sabe-se que um dos requisitos da netnografia é um vasto envolvimento do pesquisador com relação ao tema de estudo. Kozinets (2019Kozinets, R. V. (2019). c Thousand Oaks, CA: Sage Publications.) explica que a participação nesse contexto significa tomar parte e compartilhar.

Com isso, ele participa da fanpage como membro há mais de três anos, e comenta eventualmente em postagens de interesse como lançamentos de sabores e promoções do site oficial que são divulgadas através do Facebook. Costello et al. (2017Costello, L., McDermott, M., & Wallace, R. (2017). Netnography: Range of Practices, Misperceptions, and Missed Opportunities, International Journal of Qualitative Methods,16, 1-12.) explanam que, dependendo do envolvimento dos pesquisadores, a netnografia vai de abordagens não participativas a abordagens participativas.

Além disso, Heinonen e Medberg (2018Heinonen, K. and Medberg, G. (2018). Netnography as a tool for understanding customers: implications for service research and practice. Journal of Services Marketing,32(6), 657-679.) indicam que a maioria dos estudos de marketing que utilizam netnografia adotam observação participante passiva em espaços online. Essa abordagem é considerada não-in não intrusiva e foi utilizada anteriormente em outros estudos que usam o método netnográfico, como no estudo de Schaap (2002Schaap, F. (2002). The Words That Took Us There: ethnography in a virtual reality. Amsterdam: Aksant Academic Publishers.), no qual o autor seguia determinado grupo e participava ativamente dele mesmo antes de iniciar sua coleta de dados. Essa posição permitiu a percepção do diálogo diário entre consumidores e empresa, com ênfase em reclamações sobre entrega e preços, destacando um problema que estimulou a pesquisa em questão.

Kozinets (2019Kozinets, R. V. (2019). c Thousand Oaks, CA: Sage Publications.) explica que a netnografia é centrada na pesquisa de traços online. Em seu trabalho, ele acentua que alguns trabalhos netnográficos coletam e analisam exclusivamente traços online, mas outras se estendem além desses traços em outras formas de coleta e criação de dados. Este estudo é limitado a transformar a observação de traços online no conjunto de dados, sem qualquer forma de cocriação entre os pesquisadores e os demais membros da comunidade ou a organização. Em adição, optamos por proteger os membros da comunidade, usando pseudônimos e não expondo o nome da empresa. Devido à posição assumida, o conteúdo referente aos comentários do consumidor é apresentado com identificação “U” (da palavra “usuário”) seguido de numeração 1, 2, 3, e assim por diante.

Após uma análise preliminar, optou-se por dividir as observações por postagens coletadas e seus respectivos comentários através do software de análise em pesquisa qualitativa Atlas.ti. Tal programa é amplamente utilizado em estudos netnográficos (Belz & Baumbach, 2010Belz, F., & Baumbach, W. (2010). Netnography as a Method of Lead User Identification. Creativity and Innovation Management, 19(3), 304-313.; Kozinets, 2010Kozinets, R. V. (2010). Netnography. Doing ethnographic research online. Thousand Oaks, CA: Sage Publications. ) e permite a codificação de texto para classificação, atuando como um suporte para realização da análise de conteúdo.

A codificação dos dados envolveu a categorização de trechos dos comentários de acordo com atributos específicos pelo uso de palavras-chave (Kozinets, 2010Kozinets, R. V. (2010). Netnography. Doing ethnographic research online. Thousand Oaks, CA: Sage Publications. ) e, após, os códigos foram combinados em famílias de códigos relacionados. Desta forma, as unidades de análise foram as palavras citadas nos trechos dos comentários que permitem responder às perguntas deste estudo, desde que dentro do contexto de debate dos usuários e das postagens feitas pela empresa.

Assim, com o auxílio do Atlas.ti e do Microsoft Excel para manipulação de dados qualitativos, foi realizada a análise de conteúdo do material coletado que, segundo Bardin (1977Bardin, L. (1977). L’analyse de contenu. Le Psychologue. Paris: Presses Universitaires de France. ), se constitui em um conjunto de técnicas de análise da comunicação as quais permitem a aquisição de conhecimentos acerca das condições de envio/recebimento das mensagens, considerando categorias. Por essa razão, considerou-se como método de análise de dados mais pertinente para a pesquisa em questão.

4. ANÁLISE DOS DADOS E RESULTADOS DA PESQUISA

Durante o período considerado para coleta, a empresa em questão publicou cinco postagens e obteve 3.352 comentários de fãs e consumidores no total. De posse dos dados coletados na fanpage e dispostos no Microsoft Word, foi realizada uma leitura geral, considerando cada postagem publicada pela empresa e todos os comentários relacionados, bem como as respostas dadas pela organização.

Assim, de acordo com os pressupostos da netnografia, buscou-se identificar o tópico principal explorado nos posts publicados pela empresa. Identificou-se que as temáticas dos posts são bastante similares. Os cinco posts enfatizam diferentes sabores de cápsula de café vendidos no site da empresa, convidando usuários a experimentar e saborear esses produtos. Considerando os inúmeros tópicos de conteúdo que podem ser usados estrategicamente pela empresa para desenvolver esse canal de mídia social, tais como promover patrocínios e parceiros, descontos e promoções, informações sobre o mercado cafeeiro, receitas usando seus produtos como ingredientes e outros, o relatado indica um investimento pequeno por parte da empresa em oferecer conteúdo interessante e que venham a engajar os usuários da comunidade.

Na sequência, os comentários dos posts foram analisados. Identificou-se que os comentários pertencem a três grandes categorias: 1) elogios ao produto/empresa; 2) reclamações diversas e 3) resposta da empresa. Dentro desses parâmetros, foram criadas subcategorias das unidades de análise: 1a) elogios ao produto/empresa, 1b) marcação de amigos; 2a) reclamações quanto ao preço dos produtos e do frete; 2b) reclamações quanto a informações, disponibilidade e entrega dos produtos; 3) resposta da empresa aos comentários.

Desta forma, com base nas premissas do Modelo VBA de Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.), que considera os conceitos de valor, equilíbrio e transparência assumidos por empresas socialmente responsáveis, propôs-se seguir uma sequência de procedimentos de análise (Quadro 1), considerando as postagens e os comentários da fanpage.

Quadro 1.
Relações entre o Modelo VBA e a Análise da Pesquisa

Para clarificar a identificação de fatores do Modelo VBA com relação ao conteúdo das mensagens da página da empresa no Facebook, a Figura 1 apresenta um esquema teórico, o qual divide as subcategorias de comentários identificadas por sua aproximação com cada elemento.

Figura 1.
Esquema Teórico da Pesquisa.

5. DISCUSSÃO

A partir da divisão proposta pelo esquema teórico apresentado anteriormente, a comunicação intermediada nas redes sociais da organização frente ao consumidor é analisada segundo os elementos valor, equilíbrio e transparência do Modelo VBA.

O critério de valor que faz com que uma organização possa suceder com êxito em suas operações, respeitando as premissas de Responsabilidade Social Corporativa segundo Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.), compreende a concretização da oferta de produtos e serviços eficientes ao longo do tempo, suprindo as necessidades da sociedade. Considerando esse elemento, analisou-se o conteúdo dos comentários que apresentavam elogios aos produtos do fabricante de cafés e máquinas.

Com base nas citações de palavras como “amei”, “linda” e “ótimo” nos comentários foi possível identificar um retorno positivo dos consumidores nas postagens, principalmente sobre sabores específicos de café. Alguns usuários da comunidade demonstraram endossar os produtos e ações da empresa, como U1: “Eu amo isso (emoji de coração)!” e U2: “Amo! Sempre compro pelo site as cápsulas e sempre chegam rapidinho (emoji de sorriso)!”, enquanto outros se denominam “sortudos” em suas experiências de compra, como se vê na fala de U3: “Delicioso! Somos sortudos, compramos duas máquinas e inúmeras cápsulas, sem problemas, tudo bem certinho (emoji sorridente)”.

Inúmeros comentários se referem aos altos preços dos produtos e frete cobrados pela empresa. Palavras-chave como “preço”, “valor”, “custo”, “frete” e “barato” (em contexto negativo, como em “não é barato”) são constantes na comunicação praticada pelos usuários, além de reclamações sobre negligências na entrega do produto. Muitos usuários enfatizaram os altos preços praticados na loja do website em relação a outros pontos de venda, bem como práticas enganosas quanto ao valor cobrado. U4 disse: “Não comprem nada deste site, pessoal! Eles não entregam os produtos e depois enviam um cupom promocional e mudam os preços dos produtos na loja! Decepção total! Eles não respeitam os clientes!!! (texto original em caixa alta)”.

A utilização de comentários para reclamações não relacionadas com o conteúdo das postagens chama atenção. U5 reclama: “Façam promoções, mas também respeitem a demanda. Eu comprei cápsulas na Black Friday e não recebi meus produtos até agora. Isso é absurdo. Eu estava planejando usar como parte de uma mesa de café no aniversário do meu pai, mas não chegou a tempo”. Como U5, muitos outros usuários reclamaram sobre as vendas da Black Friday. Parece que a empresa não conseguiu entregar o que foi prometido inicialmente.

Carroll e Laasch (2020Carroll, A. B., & Laasch, O. (2020). From Managerial Responsibility to CSR and Back to Responsible Management. In: Laasch, O., Jamali, D., Freeman, R. E., Suddaby, R. (eds) The Research Handbook of Responsible Management, Cheltenham, UK: Edward Elgar, 1-10., p.5) explicam que o “V” de valor do modelo VBA “é criado quando negócios encontram as necessidades da sociedade ao produzir serviços e produtos de uma maneira eficiente enquanto evitam externalidades negativas desnecessárias”. A validade do construto está relacionada principalmente com a geração de valor ou benefício pelo negócio em prol da sociedade. Os exemplos antes relatados claramente não atendem a esses critérios. Mesmo sabendo que o papel da responsabilidade social de uma empresa não pode ser mensurado apenas por meio de suas redes sociais, é evidente que as plataformas de mídia social desempenham um forte papel na comunicação e posicionamento de marca de uma organização atualmente.

Ainda quanto à geração de valor pela organização, consideraram-se as manifestações dos usuários baseadas na marcação de amigos nos comentários. Em comentários de marcação, o usuário marca o nome de um amigo de Facebook, chamando atenção para a postagem, uma forma de atrair novos interesses para o que a organização está comunicando no post.

Netto et al. (2016 Netto, N. S. R., Carneiro, T. C. J., Oliveira, M. P. V., & Monteiro, R. A. (2016). What Must be Considered when to Perform Consumption Analytics with Facebook Posts? Brazilian Business Review, 13(4), 1-23. ) explicam que consumidores frequentemente buscam por experiências e opiniões de outras pessoas com relação a um produto quando elas querem saber mais sobre sua qualidade. Embora algumas marcações venham acompanhadas de termos como “olha” ou “olha isso”, a grande maioria trata-se de apenas o nome do amigo marcado como comentário, sem outras informações. U6 chama um amigo para ler um comentário negativo sobre o serviço ao consumidor dizendo “Olha isso, U7! Estamos ferrados”, enfatizando que comprar algo da empresa parecia um grande erro.

Pelas manifestações estudadas, identifica-se que alguns usuários ainda simpatizam com a empresa, principalmente expondo seu “amor pela marca”. Batra, Ahuvia e Bagozzi (2012Batra, R., Ahuvia, A. C., & Bagozzi, R. P. (2012). Band Love.Journal of Marketing,76(1), 1-16.) explicaram que esse fenômeno é usual entre marcas que requerem compras frequentes e contínuas ao invés de produtos de consumo único. Os autores também sugeriram o desenvolvimento de programas de fidelidade para aumentar o “poder” do amor nesse tipo de organização. No entanto, a empresa em questão já tem um programa de fidelidade - que falha frequentemente, conforme análise. Assim, o componente de valor é vastamente comprometido pela falta de eficiência da empresa para lidar com problemas, bem como as fragilidades no processo, constantemente expostas pelos membros da comunidade.

O elemento equilíbrio diz respeito ao atendimento dos interesses de todos os stakeholders, bem como os direitos de equidade e o respeito da organização frente aos pares, sempre obedecendo a padrões morais sociais (Schwartz & Carroll, 2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.). Como dito anteriormente, nesta pesquisa, os autores limitaram a figura do stakeholder apenas ao consumidor na análise. Carroll (2020) indica que um grau de equilíbrio é essencial para direcionar e responder de forma apropriada a interesses de stakeholders potencialmente conflitantes ou padrões éticos que podem emergir. Em outras palavras, significa que cada empresa deve acompanhar de perto qualquer movimento de seus consumidores em ordem de gerir com êxito suas expectativas e demandas de maneira ética.

A empresa demonstra certa preocupação em responder aos comentários e reclamações dos usuários nas postagens, utilizando linguagem polida, mas informal, como em:

“Oi, U8! Devido ao grande sucesso das ofertas, acabamos ficando sem estoque de alguns produtos. Mas não se preocupe, logo eles retornam! Fique de olho na Fanpage e no site para acompanhar as novidades. Continuo por aqui! (emoji de café).” (A empresa, em resposta a uma questão sobre a falta de produtos disponíveis na loja online).

“Olá, U9! Saiba que tenho trabalhado para melhorar o valor do frete em todas as regiões, enquanto isso tenho assinaturas com frete grátis e desconto nas caixas de cápsulas. De todo modo, registrei sua crítica em forma de sugestão para futuras melhorias! Conte comigo. (emoji de café).” (A empresa, em resposta a uma reclamação sobre preços de frete em diferentes regiões brasileiras).

Entretanto, a recorrência de respostas padronizadas da empresa às mesmas reclamações compromete diretamente o fator de equilíbrio, que defende a necessidade de resposta a conflitos de interesse ou morais da empresa perante os stakeholders, conforme Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.). Esse fator é considerado essencial para o desenvolvimento de negócios que correspondam a critérios de RSC e não parece ser atendido pela organização no cenário discutido.

Noble et al. (2012Noble, C. H., Noble, S. M., & Adjei, M. T. (2012). Let them talk! Managing primary and extended online brand communities for success, Business Horizons, 55(5), 475-483.) descobriram que comentários sobre os produtos, como funcionalidade, valor, durabilidade e outros, são mais críticos, e devem ser direcionados para evitar danos às vendas e lucro da empresa. De acordo com os autores, a natureza social e visibilidade de comunidades online amplificam as preocupações sobre o produto e, se consideradas críveis, podem afastar outros clientes potenciais. Esse é o ponto principal que precisa ser considerado por empresas nas mídias sociais e está intimamente conectado com o conceito de equilíbrio.

Mesmo enfatizando o equilíbrio para vias de análise da pesquisa, reforça-se que os demais elementos (valor e transparência) também acabam sendo comprometidos em diversas situações, visto que se relacionam diretamente, considerando que a empresa não apresenta uma preocupação maior em prover o que os consumidores e a sociedade realmente precisam e esperam dela.

Em adição, a empresa de café não apresenta soluções suficientes para os problemas enfrentados pelos consumidores, que podem ser facilmente compreendidas como negligência da firma no contexto das reclamações dos clientes. No fim, como Carroll e Laasch (2020Carroll, A. B., & Laasch, O. (2020). From Managerial Responsibility to CSR and Back to Responsible Management. In: Laasch, O., Jamali, D., Freeman, R. E., Suddaby, R. (eds) The Research Handbook of Responsible Management, Cheltenham, UK: Edward Elgar, 1-10.) definiram em seu estudo, equilíbrio é fortemente relacionado com a urgência do negócio de seguir passos ativamente para atingir os interesses e demandas de seus stakeholders.

Por fim, o elemento de transparência emerge no conteúdo analisado através de comentários que remetem à falta de responsabilidade e prestação de contas quanto a prazos na entrega dos produtos adquiridos por meio do website da empresa, frequentemente disponibilizado para acesso na fanpage mediante links. Consoante Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.), a transparência diz respeito a honestidade e integridade da empresa em suas ações, não podendo ser negligenciada por seus gestores. Nesse contexto, U10 questionou a empresa quanto a uma falha na entrega de sua compra:

“Estou extremamente insatisfeita com o atendimento. O correio devolveu a minha máquina por erro do remetente. A empresa não pode fazer nada segundo o atendimento por telefone. Lesam o cliente que pagou um valor a mais para ter o produto em determinado prazo e não podem fazer nada, mesmo o erro sendo da empresa. Triste demais presenciar o meu dinheiro descendo pelo ralo (...)”. (Usuário U10)

A empresa respondeu ao cliente que iriam contatá-la em mensagem privada. Após alguns dias, outro cliente perguntou para U10:

“U10, seu problema foi resolvido através do contato inbox da empresa?” (Usuário U11)

Da mesma forma, U12 comentou:

“Comprei uma máquina de café três meses atrás, e ela quebrou. Estou tentando entrar em contato com o suporte técnico, mas sem resposta ainda”. (Usuário U12)

Após, a empresa notificou o usuário para que verificasse suas mensagens privadas (inbox). Ao mesmo tempo, outro usuário (U13) entrou na discussão, dizendo:

“A minha quebrou apenas 15 dias depois da compra e até agora sem solução ou suporte técnico da empresa”. (Usuário U13)

Depois disso, U12 replicou para U13:

“U13, foi uma grande decepção Produtos caros e infelizmente não muito bons. Minha máquina fez uma pressão d’água tão forte que me queimou. Perigoso.” (Usuário U12)

A empresa retornou para U12 novamente, dizendo que “ficou preocupada com o comentário” e pediu alguns dados pessoais, tais como nome, telefone e e-mail. No entanto, após alguns dias, U12 escreveu na mesma troca de mensagens:

“Infelizmente não recebi nenhuma manifestação da empresa ou mesmo interesse em entender o que aconteceu com minha máquina (…). Eu não recomendo este produto.” (Usuário U12)

Em comentários como esses, parece clara a decepção de alguns usuários da comunidade, demonstrando que a empresa falhou em assumir a responsabilidade por seus atos ao cometer erros recorrentes que levam tempo para serem retificados ou não são corrigidos adequadamente. Carroll e Laasch (2020Carroll, A. B., & Laasch, O. (2020). From Managerial Responsibility to CSR and Back to Responsible Management. In: Laasch, O., Jamali, D., Freeman, R. E., Suddaby, R. (eds) The Research Handbook of Responsible Management, Cheltenham, UK: Edward Elgar, 1-10.) afirmam que transparência se refere exatamente a firmas assumindo a responsabilidade por suas ações e decisões, tomando providências para corrigir falhas, garantindo que elas não ocorram novamente.

Esses diálogos entre consumidor e empresa ocorrem repetidamente e ficam à disposição para outros usuários da comunidade online visualizarem a qualquer momento. Percebe-se que, conquanto seja visível a preocupação da empresa em responder às críticas quase que instantaneamente, existe um gap entre o que a organização pretende e o que realmente é entregue, impactando em sua responsabilidade social.

Dessa forma, os três elementos do Modelo VBA devem estar equilibrados e presentes para a completa atuação de uma organização que preza pelos valores da RSC e atende seus consumidores e demais stakeholders apropriadamente. A empresa estudada deve prestar atenção aos aspectos múltiplos que permeiam seus negócios para harmonizar suas estratégias com o bem-estar da sociedade e, consequentemente, sua própria sobrevivência no mercado.

6. CONCLUSÃO

O exercício da comunicação entre organização e o stakeholder (em especifico, o consumidor) nas redes sociais, a curiosidade perante o cumprimento (ou não) de princípios de responsabilidade social da empresa e a possibilidade de analisar essas relações através de um método dinâmico como a netnografia foram os impulsos que desencadearam o interesse sobre o problema de pesquisa.

Compreender as relações e conexões em uma rede social de marca online por intermédio de uma fanpage do Facebook de uma popular fabricante de máquinas de café possibilita diversas contribuições teóricas e empíricas, tanto para a gestão das organizações quanto para seus consumidores.

Considerando as implicações teóricas, o artigo amplia a discussão acerca do Modelo VBA de Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.), trazendo aportes para novos estudos na área. Ao analisar a realidade de uma comunidade de uma empresa de café no Facebook, encontra-se que o componente de valor demonstra nuances ambíguas. Inicialmente, evidenciam-se elogios sobre os produtos e a marca por parte dos clientes. No entanto, existe uma presença constante de comentários negativos, mesmo em contextos positivos, tais como consumidores que se sentem “sortudos” por ter sua compra entregue no prazo ou marcações de amigos para mostrar os problemas de desconhecidos com a empresa. Isso demonstra que a comunicação de forma geral se apresenta de forma tendenciosa pela participação ativa e opinião compartilhada por usuários.

Na teoria de redes sociais, isso pode ser atribuído devido à reciprocidade, que envolve comportamentos coincidentes daqueles que participam de uma rede ou relacionamento para benefício mútuo por um período (Quinton & Wilson, 2016Quinton, S., & Wilson, D. (2016). Tensions and ties in social media networks: Towards a model of understanding business relationship development and business performance enhancement through the use of LinkedIn. Industrial Marketing Management, 54, 15-24.). De acordo com os autores, o conteúdo compartilhado tem valor potencial para o criador, distribuidor e recebedor em níveis de indivíduo e da empresa. Em outras palavras, é perceptível que não somente a subcategoria de valor, mas todos os três conceitos principais do VBA de Schwartz e Carroll (2008Schwartz, M. S., & Carroll, A. B. (2008). Integrating and Unifying Competing and Complementary Frameworks: The Search for a Common Core in the Business and Society Fields, Business & Society, 47(2), 148-186.) estavam “inundados” por comentários negativos dos usuários.

Como avanço teórico, acredita-se que a pesquisa abriu novas possibilidades para conexão de temas tais como RSC e Sustentabilidade no contexto de redes sociais, destacando as consequências de interações online nesse cenário. Esta pesquisa também evidencia a necessidade por novos estudos relacionados a outros stakeholders além dos consumidores e pesquisas que envolvam outros construtos conectados pelos elementos de valor, equilíbrio e transparência, ajudando a desenvolver a fronteira do conhecimento no campo. Ainda, o estudo amplia a abordagem qualitativa ao utilizar a netnografia, que embora validada e bastante útil, ainda é incipiente em pesquisas acadêmicas brasileiras.

Do ponto de vista empírico, os resultados da pesquisa reforçam para os usuários de redes sociais a importância do manifesto dos consumidores como forma de expressão e de reivindicação de seus direitos, tais como a aplicação de preço justo pela empresa e exigência quanto à diversificação de produtos. No entanto, a voz do consumidor ainda não se faz suficientemente ouvida. Mesmo com diversas marcas sofrendo boicotes através de movimentos culturais existentes nos dias atuais, as tensões nas relações entre empresas e consumidores permanecem difusas e devem ser investigadas. A adoção de práticas de cocriação pode ser uma forma razoável de resolver alguns pontos divergentes entre os lados.

Para as empresas, fica o alerta para a necessidade de não apenas interagir respondendo às críticas e reclamações online, mas também solucionar efetiva e rapidamente o problema apontado pelo consumidor. Para isso, as equipes de marketing estratégico e tomada de decisão devem levar em consideração as demandas do público presente em plataformas virtuais em tempo real, como sugerido anteriormente, usando estratégias de cocriação. Como definido anteriormente por Noble et al. (2012Noble, C. H., Noble, S. M., & Adjei, M. T. (2012). Let them talk! Managing primary and extended online brand communities for success, Business Horizons, 55(5), 475-483.), as empresas podem extrair valor das comunidades online ao encorajar e gerir ideias de produto usando concursos, premiações e reconhecimento público como incentivo aos membros. Esses tópicos não foram abordados em nenhuma das postagens de fãs analisadas.

Finalmente, considerando a visão direcionada ao consumidor adotada pelo mercado nos dias atuais, RSC tornou-se uma questão principal, e as empresas devem ser responsabilizadas por sua baixa performance e comportamento com relação à sociedade. Ao utilizar as premissas de VBA, uma organização pode atingir todas as metas para um relacionamento saudável e uma boa comunicação com seus consumidores.

6.1. Limitações de Pesquisa e Sugestões de Estudos Futuros

O estudo em questão apresenta algumas limitações. Por tratar-se de pesquisa qualitativa que abrange técnicas de observação com análise de conteúdo, eventualmente alguma informação pode ter deixado de ser captada pelo olhar dos pesquisadores. Recomenda-se fortemente aos pesquisadores do campo a aplicação adicional de abordagens quantitativas e/ou mistas para investigar esses construtos, expandindo os resultados obtidos.

Além disso, pela grande quantidade de dados disponíveis na fanpage pesquisada, optou-se por um recorte limitado de tempo. Acredita-se que novos estudos podem ser aplicados com a empresa escolhida, desta vez considerando como corpus de pesquisa um recorte ampliado, que permita a geração de ainda mais conhecimento acerca da temática estudada.

Em relação à esfera de redes sociais e comunidades de marca, sugere-se a ampliação de estudos sobre as consequências das tensões entre empresas e consumidores nesse ambiente, considerando o Modelo VBA como base teórica. De forma complementar, direciona-se para a pesquisa de orientações para as redes sociais de marca online utilizando produtos/serviços diferentes como objetos de estudo. Sabendo como o fenômeno se desdobra em diversas categorias, gestores ficarão aptos a compreender as necessidades de sua audiência com relação a indicadores de responsabilidade social.

Por fim, sugere-se explorar as proposições do modelo VBA mediante a análise dos oito construtos individualmente, abordando setores de negócio diferentes e a partir de outras comunidades online, tais como Twitter, Instagram, LinkedIn e YouTube.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    Mar-Apr 2021

Histórico

  • Recebido
    18 Dez 2019
  • Revisado
    02 Maio 2020
  • Aceito
    13 Maio 2020
  • Publicado
    18 Jan 2021
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