Acessibilidade / Reportar erro

Consumo sustentável e teorias da prática: conectando elementos do compartilhamento de roupas

Resumo

As mudanças nos estilos de vida e nos padrões de consumo de roupas, que vêm sendo debatidas como caminhos para uma sociedade mais sustentável, definem o compartilhamento como uma das estratégias do slow fashion para promover o consumo consciente. Por meio das teorias da prática, esta pesquisa explora materiais, competências e significados que compõem a prática. Assim, buscou-se identificar como se configuram os elementos e a dinâmica do compartilhamento de roupas. Utilizando um estudo de caso qualitativo, os dados foram coletados por meio de observações, entrevistas semiestruturadas (individuais e em grupo) e grupo focal, realizados com praticantes (consumidores) e provedores (fornecedores) de uma loja colaborativa. Os resultados revelaram que: (a) para os praticantes, a prática do compartilhamento significa exclusividade, economia e consumo sustentável; (b) para os provedores, a prática está atrelada ao consumo consciente como oportunidade de negócios mais sustentáveis, inclusive financeiramente; e (c) diversos materiais orientam a prática do compartilhamento de roupas. Os elementos do compartilhamento de roupas são semelhantes entre praticantes e provedores, portanto indicam a eficácia da prática, além de buscar um consumo sustentável. A pesquisa, então, contribui para o desenvolvimento de pesquisas sobre consumo sustentável, uma vez que identifica práticas de gestão voltadas ao consumo colaborativo de vestuário.

Palavras -chave :
Consumo Sustentável; Consumo Colaborativo; Slow Fashion; Teorias da Prática; Compartilhamento de Roupas

Abstract

Changes in lifestyles and clothing consumption patterns as paths to a sustainable society defines sharing as one of the strategies of slow fashion. Through practice theories, this research explores materials, competences and meanings that make up the practice. Thus, we sought to identify how the elements and the dynamics of clothing sharing are configured. Using a qualitative case study, data were collected through observations, semi-structured interviews (individual and group), and a focus group carried out with practitioners and providers of a collaborative store. Our results revealed that: (a) for practitioners, the practice of sharing means exclusivity, economy, and sustainable consumption; (b) for providers, the practice is linked to a conscious consumption as an opportunity for more sustainable business, including financially (c) and different materials guide the practice of sharing clothes. The elements of clothing sharing are similar between practitioners and providers; therefore, they indicate the effectiveness of the practice, in addition to pursuing sustainable consumption. The research then contributes to the development of research on sustainable consumption once it identifies management practices aimed at the collaborative consumption of clothing.

Keywords:
Sustainable Consumption; Collaborative Consumption; Slow Fashion; Practice Theories; Clothing Sharing

1. Introdução

Ao longo dos últimos anos, as estratégias de consumo e produção sustentáveis têm sido cada vez mais voltadas para a redução dos impactos ambientais ( Jackson, 2014Jackson, T. (2008). The challenge of sustainable lifestyles. In Worldwatch Institute (Ed.), State of the word 2008: Innovations for the sustainable economy (pp. 45‒60). W. W. Norton & Company.). Representados pelo décimo segundo objetivo de desenvolvimento sustentável (ODS), estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU), o consumo e a produção sustentáveis visam combater as atuais crises socioambientais ( Bengtsson et al., 2018Bengtsson, M., Alfredsson, E., Cohen, M., Lorek, S., & Schroeder, P. (2018). Transforming systems of consumption and production for achieving the sustainable development goals: Moving beyond efficiency. Sustainability Science. 13(6), 1533-1547. https://doi.org/10.1007/s11625-018-0582-1
https://doi.org/10.1007/s11625-018-0582-...
), e promover a transformação das práticas empresariais para sustentabilidade ( Silva & Figueiredo, 2020Silva, M. E., & Figueiredo, M. D. (2017). Sustainability as practice: Reflections on the creation of institutional logic. Sustainability, 9(10), 1839. https://doi.org/10.3390/su9101839
https://doi.org/10.3390/su9101839...
; Vita et al., 2019Tunn, V. S. C., Bocken, N. M. P., Van den Hende, E. A., & Schoormans, J. P. L. (2018). Business models for sustainable consumption in the circular economy: An expert study. Journal of Cleaner Production , 212, 324‒333. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2018.11.290
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2018.1...
). A literatura sobre o assunto vem crescendo nos últimos anos ( Roy & Singh, 2017Roux, D., & Korchia, M. (2006). Am I what I wear? An exploratory study of symbolic meanings associated with secondhand clothing. Advances in Consumer Research, 33(1), 29‒35.; Wang et al., 2018Vita, G., Lundström, J. R., Hertwich, E. G., Quist, J., Ivanova, D., Stadler, K., & Wood, R. (2019). The environmental impact of green consumption and sufficiency lifestyles scenarios in Europe: Connecting local sustainability visions to global consequences. Ecological Economics, 164(C), 106322. https://doi.org/10.1016/j.ecolecon.2019.05.002
https://doi.org/10.1016/j.ecolecon.2019....
) e enfatiza a necessidade de ver a produção e o consumo como fatores interdependentes e indissociáveis ( Tukker et al., 2008Trejo, H. X., Smith, H. A., Trejo, N. K., & Lewis, T. L. (2019). Made in New York: A collaborative model to encourage slow fashion. Clothing and Textiles Research Journal, 37(3), 1‒16. https://doi.org/10.1177/0887302X19838331
https://doi.org/10.1177/0887302X19838331...
). Além disso, é necessário ampliar as pesquisas críticas sobre o consumo sustentável, uma vez que este é visto de forma heterogênea na literatura ( Silva et al., 2013Silva, M. E., Oliveira, A. P. G., & Gómez, C. R. P. (2013). Can collaboration between firms and stakeholders stimulate sustainable consumption? Discussing roles in the Brazilian electricity sector. Journal of Cleaner Production , 47, 236‒244.). Para ampliar a compreensão do tema, estuda-se o consumo sustentável com base em teorias da prática no contexto do vestuário.

Compreender como as práticas cotidianas se desenvolvem, se estabelecem, como mudam e, fundamentalmente, como podem ser mudadas para se tornarem mais sustentáveis são potenciais contribuições das teorias da prática para o campo da sustentabilidade ( Gherardi, 2009Foudation Ellen Macarthur (2017). A new textiles economy: Redesingning fashion’s future. Ellen Macarthur Foundation. https://www.ellenmacarthurfoundation.org/assets/downloads/publications/A-New-Textiles-Economy_Full-Report.pdf
https://www.ellenmacarthurfoundation.org...
; Hargreaves, 2011Gupta, S., Wencke, G., & Gentry, J. (2019). The role of style versus fashion orientation on sustainable apparel consumption. Journal of Macromarketing , 39(3), 27614671983528. https://doi.org/10.1177/0276146719835283
https://doi.org/10.1177/0276146719835283...
; Sahakian & Whilite, 2013Roy,V., & Singh, S. (2017). Mapping the business focus in sustainable production and consumer literary: Review and research framework. Journal of Cleaner Production , 150(2017), 224‒236. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.03.040
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.0...
; Spurling et al., 2013Spaargaren, G., & Oosterveer, P. (2010) Citizen-consumers as agents of change in globalizing modernity: The case os sustainable consumption. Sustainability, 2(7), 1887‒1908. https://doi.org/10.3390/su2071887
https://doi.org/10.3390/su2071887...
). Assim, estudos com ênfase em práticas apontam para intervenções mais eficientes para políticas de consumo sustentável, em detrimento do comportamento individual e das inovações tecnológicas ( Nicolini, 2017Mukendi, A., Davies, I., Sarah, G., & McDonagh, P. (2019). Sustainable fashion: Current and future research directions. European Journal of Marketing, 54(11), 2873‒2909. https://doi.org/10.1108/EJM-02-2019-0132
https://doi.org/10.1108/EJM-02-2019-0132...
; Spurling et al., 2013Spaargaren, G., & Oosterveer, P. (2010) Citizen-consumers as agents of change in globalizing modernity: The case os sustainable consumption. Sustainability, 2(7), 1887‒1908. https://doi.org/10.3390/su2071887
https://doi.org/10.3390/su2071887...
; Sahakian & Wilhite, 2013Roy,V., & Singh, S. (2017). Mapping the business focus in sustainable production and consumer literary: Review and research framework. Journal of Cleaner Production , 150(2017), 224‒236. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.03.040
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.0...
; Shove et al., 2012Shove, E., & Pantzar, M. (2005). Consumers, producers and practices: Understanding the invention and reinvention of Nordic walking. Journal of Consumer Culture , 5(1), 43‒64. https://doi.org/10.1177/1469540505049846
https://doi.org/10.1177/1469540505049846...
; Shove, 2010Shove, E. (2010). Beyond the ABC: Climate change policy and theories of social change. Environment and Planning A,4(2), 1273-1285. https://doi.org/10.1068/a42282
https://doi.org/10.1068/a42282...
). Há, nesse entendimento, o deslocamento investigativo da intencionalidade do indivíduo, para a ação reflexiva ocorrendo por meio de uma rede de “conexões em ação”, para a tessitura da sociedade ( Gherardi, 2009Gherardi, S. (2009). Introduction: The critical power of the ‘practice lens’. Management Learning, 40(2), 115-128. https://doi.org/10.1177/1350507608101225
https://doi.org/10.1177/1350507608101225...
).

Para entender sobre o consumo, suas consequências e a prática do consumo sustentável, Fletcher e Grose (2012Fletcher, K., & Grose, L. (2012). Fashion & sustainability. Laurence King Publishing.) apontam três áreas com as quais lidamos todos os dias e que têm grande impacto no mundo: combustível (energia), alimentação e moda. Na moda, a maioria dos estudos com foco em sustentabilidade explora o escopo da produção, como a cadeia de suprimentos e os esforços para redução dos efeitos gerados pelas manufaturas de fibra, tingimento, corte, entre outros ( Fletcher, 2017Fletcher, K. (2017). Local wisdom: Post-growth fashion. The learning network on sustainability (LENS). Greenleaf. ). No nível do consumidor, as pesquisas relacionadas ao slow fashion são realizadas predominantemente usando modelos comportamentais e métodos quantitativos ( Diddi et al., 2019Diddi, S., Yan, R.-N., Bloodhart, B., Bajtelsmit, V., & McShane, K. (2019). Exploring young adult consumers’ sustainable clothing consumption intention-behavior gap: A behavioral reasoning theory perspective. Sustainable Production and Consumption, 18, 200-209. https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.009
https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.00...
). A presente pesquisa, porém, é qualitativa e analisada sob a lente das teorias da prática, especificamente pela abordagem sociotécnica apresentada por Shove et al. (2012Shove, E., & Pantzar, M. (2005). Consumers, producers and practices: Understanding the invention and reinvention of Nordic walking. Journal of Consumer Culture , 5(1), 43‒64. https://doi.org/10.1177/1469540505049846
https://doi.org/10.1177/1469540505049846...
).

A indústria da moda, responsável por produzir algumas das piores práticas de consumo dos indivíduos ao legitimar o consumo excessivo ( Gupta et al., 2019Glaser, B. & Strauss, A. (1967) The discovery of grounded theory: Strategies for qualitative research. Aldine Publishing Company.; Diddi et al., 2019Diddi, S., Yan, R.-N., Bloodhart, B., Bajtelsmit, V., & McShane, K. (2019). Exploring young adult consumers’ sustainable clothing consumption intention-behavior gap: A behavioral reasoning theory perspective. Sustainable Production and Consumption, 18, 200-209. https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.009
https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.00...
), tem sido questionada e levada a redesenhar seu sistema e suas práticas ( Gupta et al., 2019Gupta, S., Wencke, G., & Gentry, J. (2019). The role of style versus fashion orientation on sustainable apparel consumption. Journal of Macromarketing , 39(3), 27614671983528. https://doi.org/10.1177/0276146719835283
https://doi.org/10.1177/0276146719835283...
; Diddi et al., 2019Diddi, S., Yan, R.-N., Bloodhart, B., Bajtelsmit, V., & McShane, K. (2019). Exploring young adult consumers’ sustainable clothing consumption intention-behavior gap: A behavioral reasoning theory perspective. Sustainable Production and Consumption, 18, 200-209. https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.009
https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.00...
; Liu et al., 2018Lim, W. M. (2017). Inside the sustainable consumption theoretical toolbox: Critical concepts for sustainability, consumption, and marketing. Journal of Business Research , 78, 69-80. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2017.05.001
https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2017.0...
). Nos últimos 20 anos, o modelo de negócios fast fashion dobrou a produção de roupas e o consumo médio cresceu 60%, por pessoa. O descarte também aumentou, menos de 1% das roupas usadas é reciclada ( Work Bank, 2019Work Bank (2019). How much do our wardrobes cost to the environment? World Bank. https://www.worldbank.org/en/news/feature/2019/09/23/costo-moda-medio-ambiente
https://www.worldbank.org/en/news/featur...
), e quase três quartos vão para aterros ( Legere & Kang, 2020Lang, C., & Joyner Armstrong, C. M. (2018). Collaborative consumption: The influence of fashion leadership, need for uniqueness, and materialism on female consumers’ adoption of clothing renting and swapping. Sustainable Production and Consumption, 13, 37-47. https://doi.org/10.1016/j.spc.2017.11.005
https://doi.org/10.1016/j.spc.2017.11.00...
). Consequentemente, a indústria do vestuário é uma das mais poluentes do mundo ( Work Bank, 2019Work Bank (2019). How much do our wardrobes cost to the environment? World Bank. https://www.worldbank.org/en/news/feature/2019/09/23/costo-moda-medio-ambiente
https://www.worldbank.org/en/news/featur...
). Diante desse cenário, o slow fashion atua como uma das formas de promover a moda sustentável ( Mukendi et al., 2019Mayring, P. (2003). Qualitative content analysis. Forum: Qualitative Social Research, 1(2). https://doi.org/10.17169/fqs-1.2.1089
https://doi.org/10.17169/fqs-1.2.1089...
; Trejo et al., 2019Thorisdottir, T. S., & Johannsdottir, L. (2019). Sustainability within fashion business models: A systematic literature review. Sustainability, 11(8), 2233. https://doi.org/10.3390/su11082233
https://doi.org/10.3390/su11082233...
; Jung & Jin, 2014Jung, S., & Jin, B. (2016). Sustainable development of slow fashion business: Customer value approach. Sustainability, 8(6), 3‒15. https://doi.org/10.3390/su8060540
https://doi.org/10.3390/su8060540...
, 2016Jung, S., & Jin, B. (2016). Sustainable development of slow fashion business: Customer value approach. Sustainability, 8(6), 3‒15. https://doi.org/10.3390/su8060540
https://doi.org/10.3390/su8060540...
).

Embora a indústria do vestuário seja responsável por causar um grande impacto ambiental tanto nas etapas de produção quanto na de consumo ( Diddi et al., 2019Diddi, S., Yan, R.-N., Bloodhart, B., Bajtelsmit, V., & McShane, K. (2019). Exploring young adult consumers’ sustainable clothing consumption intention-behavior gap: A behavioral reasoning theory perspective. Sustainable Production and Consumption, 18, 200-209. https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.009
https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.00...
), esta última é reconhecida como a mais difícil de resolver, e as intervenções políticas voltadas para ela estão alicerçadas em uma lógica cognitiva e perspectiva individualista ( Bellotti & Mora, 2016Bellotti, E., & Mora, E. (2016). Networks of practices in critical consumption. Journal of Consumer Culture, 16(3), 718-760. https://doi.org/10.1177/1469540514536191
https://doi.org/10.1177/1469540514536191...
). Pesquisas sobre o que acontece após a produção e a venda de roupas, ou seja, pesquisas com foco nos padrões de uso do consumidor, visando mudanças para a sustentabilidade por meio de práticas baseadas na experiência real, ainda não são frequentes ( Fletcher, 2017Fletcher, K. (2017). Local wisdom: Post-growth fashion. The learning network on sustainability (LENS). Greenleaf. ).

Como forma de responder a essa problemática, o presente estudo aborda a seguinte questão de pesquisa: Como se configuram os elementos e a dinâmica de compartilhar peças do vestuário? A partir dessa questão, pretendemos identificar os elementos (materiais, competências e significados) e a dinâmica (ligações entre os elementos) que constituem a prática de compartilhar peças de vestuário. Para tanto, realizamos um estudo de caso qualitativo em uma loja colaborativa na cidade de Fortaleza, Ceará, Brasil. É importante destacar que, apesar de a pesquisa focar nas práticas realizadas pelo consumidor, ou seja, na malha de práticas-arranjos que o agente carrega ( Schatzki, 2005Schatzki, T. R. (2002). The site of the social: A philosophical account of the constitution of social life and change. The Pennsylvania State University Press.), segundo Jarzabkowski et al. (2015Jackson, T., & Michaelis, L. (2003). Policies for sustainable consumption. Sustainable Development Commission.), à luz das teorias da prática, a análise da prática tem de ser submetida ao contexto, contemplando além das práticas, quem as implementa (praticantes e provedores) ( Shove & Pantzar, 2005Shove, E. (2010). Beyond the ABC: Climate change policy and theories of social change. Environment and Planning A,4(2), 1273-1285. https://doi.org/10.1068/a42282
https://doi.org/10.1068/a42282...
), e como elas são realizadas ( Jarzabkowski et al., 2015Jackson, T., & Michaelis, L. (2003). Policies for sustainable consumption. Sustainable Development Commission.).

Avançando em relação aos estudos sobre sustentabilidade ( Bengtsson et al., 2018Bengtsson, M., Alfredsson, E., Cohen, M., Lorek, S., & Schroeder, P. (2018). Transforming systems of consumption and production for achieving the sustainable development goals: Moving beyond efficiency. Sustainability Science. 13(6), 1533-1547. https://doi.org/10.1007/s11625-018-0582-1
https://doi.org/10.1007/s11625-018-0582-...
), esta pesquisa se concentra em práticas pequenas, micro ou locais para ilustrar a prática de consumo sustentável ( Silva & Figueiredo, 2020Silva, M. E., & Figueiredo, M. D. (2017). Sustainability as practice: Reflections on the creation of institutional logic. Sustainability, 9(10), 1839. https://doi.org/10.3390/su9101839
https://doi.org/10.3390/su9101839...
). Portanto, a pesquisa responde ao chamado de Süßbauer e Schäfer (2019Spurling, N., Mcmeekin, A., Shove, E., Southerton, D., & Welch D. (2013). Interventions in practice: Re-framing policy approaches to consumer behavior. Sustainable Practices Research Group report.) e Jarzabkowski et al . (2015Jackson, T., & Michaelis, L. (2003). Policies for sustainable consumption. Sustainable Development Commission.), quanto à escassez de estudos empíricos os quais contemplem uma percepção do corpo holístico das práticas. Assim, contribuímos para a teoria ao promovermos o debate sobre o ODS 12, mais especificamente no que se refere ao consumo de vestuário sustentável, analisado por meio das teorias da prática. Além disso, os resultados também ajudam a academia, indústrias, os formuladores de políticas públicas e consumidores, por meio de insights sobre práticas como formas de mudanças para a moda sustentável.

2. Consumo Sustentável e slow fashion: uma mudança para o paradigma da moda

O consumo é inerente à espécie humana e é um fenômeno tão antigo quanto os seres vivos ( Bauman, 2008Bauman, Z. (2008). Vida para o consumo: A transformação de pessoas em mercadorias. Zahar.). No entanto, o ethos materialista que orienta grande parte da sociedade associa a posse material ao bem-estar, e isso resulta em consumo excessivo ( Gupta et al., 2019Glaser, B. & Strauss, A. (1967) The discovery of grounded theory: Strategies for qualitative research. Aldine Publishing Company.; Erketing & Atik, 2015Erketing, Z., & Atik, D. (2015). Sustainable markets: Motivating factors, barriers, and remedies for mobilization of slow fashion. Journal of Macromarketing, 35(1), 53-69. https://doi.org/10.1177/0276146714535932
https://doi.org/10.1177/0276146714535932...
; Jackson & Marks, 1999Jackson, T. (2014). Chapter 18. In G. Atkinson, S. Dietz & E. Neumayer (Eds.), Handbook of sustainable development (pp. 279‒290). Edward Elgar Publishing.). Entretanto, ao produzir degradação ambiental, mental ( Tunn et al., 2018Tukker, A., Emmert, S., Charter, M., Vezzoli, C., Sto, E., Munch Andersen, M., Geerken, T., Tischner, U., & Lahlou, S. (2008). Fostering change to sustainable consumption and production: An evidence based view. Journal of Cleaner Production , 16(11), 1218-1225. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2007.08.015
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2007.0...
; Erketing & Atik, 2015Erketing, Z., & Atik, D. (2015). Sustainable markets: Motivating factors, barriers, and remedies for mobilization of slow fashion. Journal of Macromarketing, 35(1), 53-69. https://doi.org/10.1177/0276146714535932
https://doi.org/10.1177/0276146714535932...
) e social, o consumo excessivo acaba entrando em conflito com o bem-estar ( Jackson, 2008Jackson, T. (2008). The challenge of sustainable lifestyles. In Worldwatch Institute (Ed.), State of the word 2008: Innovations for the sustainable economy (pp. 45‒60). W. W. Norton & Company.; Jackson & Marks, 1999Jackson, T. (2014). Chapter 18. In G. Atkinson, S. Dietz & E. Neumayer (Eds.), Handbook of sustainable development (pp. 279‒290). Edward Elgar Publishing.). Uma das indústrias que estimulou a cultura do consumo excessivo foi a da moda ( Gupta et al., 2019Glaser, B. & Strauss, A. (1967) The discovery of grounded theory: Strategies for qualitative research. Aldine Publishing Company.), composta por têxteis, roupas ou vestuário e calçados, devido ao uso de estratégias de produção e marketing ( Thorisdottir & Johannsdottir, 2019Sutherland, W., & Jarrahi, M. H. (2018). The sharing economy and digital platforms: A review and research agenda. International Journal of Information Management, 43, 328-341. https://doi.org/10.1016/j.ijinfomgt.2018.07.004
https://doi.org/10.1016/j.ijinfomgt.2018...
) com base na obsolescência ( Gupta et al ., 2019Glaser, B. & Strauss, A. (1967) The discovery of grounded theory: Strategies for qualitative research. Aldine Publishing Company.; Erketing & Atik, 2015Erketing, Z., & Atik, D. (2015). Sustainable markets: Motivating factors, barriers, and remedies for mobilization of slow fashion. Journal of Macromarketing, 35(1), 53-69. https://doi.org/10.1177/0276146714535932
https://doi.org/10.1177/0276146714535932...
). Na moda, a obsolescência psicológica promove tanto o encurtamento da vida útil das roupas (feitas com matérias-primas de baixa qualidade), como a criação de produtos de curta duração, em função da estética desatualizada ( Fletcher & Grose, 2012Fletcher, K., & Grose, L. (2012). Fashion & sustainability. Laurence King Publishing.).

Os altos volumes de aquisição e descarte de roupas são atribuídos ao modelo de negócios fast fashion ( Diddi et al., 2019Diddi, S., Yan, R.-N., Bloodhart, B., Bajtelsmit, V., & McShane, K. (2019). Exploring young adult consumers’ sustainable clothing consumption intention-behavior gap: A behavioral reasoning theory perspective. Sustainable Production and Consumption, 18, 200-209. https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.009
https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.00...
; Erketing & Atik, 2015Erketing, Z., & Atik, D. (2015). Sustainable markets: Motivating factors, barriers, and remedies for mobilization of slow fashion. Journal of Macromarketing, 35(1), 53-69. https://doi.org/10.1177/0276146714535932
https://doi.org/10.1177/0276146714535932...
). Para Jung e Jin (2014Jung, S., & Jin, B. (2016). Sustainable development of slow fashion business: Customer value approach. Sustainability, 8(6), 3‒15. https://doi.org/10.3390/su8060540
https://doi.org/10.3390/su8060540...
), o aumento da produção e do consumo no fast fashion é ocasionado por algumas práticas: encurtamento dos ciclos de vida das coleções de moda, criação contínua de desejo por novos produtos ( Niinimäki & Hassi, 2011Niinimäki, K. (2013). Sustainable fashion: New approaches. Earthscan.) e uso de materiais de baixa qualidade ( Fletcher & Grose, 2012Fletcher, K., & Grose, L. (2012). Fashion & sustainability. Laurence King Publishing.). A globalização também desempenha um papel fundamental nesse fenômeno ( Diddi et al, 2019Diddi, S., Yan, R.-N., Bloodhart, B., Bajtelsmit, V., & McShane, K. (2019). Exploring young adult consumers’ sustainable clothing consumption intention-behavior gap: A behavioral reasoning theory perspective. Sustainable Production and Consumption, 18, 200-209. https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.009
https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.00...
), uma vez que as roupas são produzidas em países que oferecem mão de obra mais barata ( Foudation Ellen Macarthur, 2017Foudation Ellen Macarthur (2017). A new textiles economy: Redesingning fashion’s future. Ellen Macarthur Foundation. https://www.ellenmacarthurfoundation.org/assets/downloads/publications/A-New-Textiles-Economy_Full-Report.pdf
https://www.ellenmacarthurfoundation.org...
), muitas vezes composta por mulheres, minorias, trabalhadores imigrantes e, em alguns casos, crianças ( Boström & Micheletti, 2016Boström, M., & Micheletti, M. (2016). Introducing the sustainability challenge of textiles and clothing. Journal of Consumer Policy, 39, 367-375. https://doi.org/10.1007/s10603-016-9336-6
https://doi.org/10.1007/s10603-016-9336-...
). Os baixos salários e as condições insalubres de trabalho, que levam à má qualidade de vida dos trabalhadores, também influenciam o aumento da produção e do consumo no fast fashion ( Jung & Jin, 2016Jung, S., & Jin, B. (2016). Sustainable development of slow fashion business: Customer value approach. Sustainability, 8(6), 3‒15. https://doi.org/10.3390/su8060540
https://doi.org/10.3390/su8060540...
).

Esse crescimento contínuo na indústria do vestuário coloca o segmento como um contribuinte relevante para a crise ecológica ( Armstrong & Lehew, 2011Armstrong, C. M., & Lehew, M. L. A. (2011). Sustainable apparel product development: In search of a new dominant social paradigm for the field using sustainable approaches, fashion practice. The Journal of Design, Creative Process & the Fashion Industry, 3(1), 29-62. https://doi.org/10.2752/175693811X12925927157018
https://doi.org/10.2752/175693811X129259...
; Fletcher & Grose, 2012Fletcher, K., & Grose, L. (2012). Fashion & sustainability. Laurence King Publishing.). O grande descarte de roupas, por exemplo, tem abarrotado aterros sanitários a cada ano ( Diddi et al ., 2019Diddi, S., Yan, R.-N., Bloodhart, B., Bajtelsmit, V., & McShane, K. (2019). Exploring young adult consumers’ sustainable clothing consumption intention-behavior gap: A behavioral reasoning theory perspective. Sustainable Production and Consumption, 18, 200-209. https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.009
https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.00...
), devido à sua crescente subutilização: o número médio de roupas usadas diminuiu 36% em comparação a 15 anos atrás ( Niinimäki, 2013Nicolini, D. (2017). Practice theory as a package of theory, method and vocabulary: Affordances and limitations. In M. Jonas, B. Littig & A. Wroblewski (Eds.), Methodological reflections on practice oriented theories, (pp. 19‒34). Springer.). Esses índices mostram as razões pelas quais a indústria do vestuário foi chamada a redesenhar suas práticas de consumo e produção ( Erketing & Atik, 2015Erketing, Z., & Atik, D. (2015). Sustainable markets: Motivating factors, barriers, and remedies for mobilization of slow fashion. Journal of Macromarketing, 35(1), 53-69. https://doi.org/10.1177/0276146714535932
https://doi.org/10.1177/0276146714535932...
; Clark, 2008Clark, H. (2008). Slow fashion - an oxymoron- or a promise for the future? Fashion Theory, 12(4), 427-446. https://doi.org/10.2752/175174108X346922
https://doi.org/10.2752/175174108X346922...
). A importância de mudar os padrões de consumo, como reduzir a frequência de compras, prolongar a vida útil do produto por meio de reparos, reutilização ou compartilhamento, vem ganhando força no debate sobre o ODS 12 ( Lang & Armstrong, 2018Jung, S., & Jin, B. (2014). A theoretical investigation of slow fashion: Sustainable future of the apparel industry. International Journal of Consumer Studies, 38(5), 510‒519. https://doi.org/10.1111/ijcs.12127
https://doi.org/10.1111/ijcs.12127...
; Diddi et al., 2019Diddi, S., Yan, R.-N., Bloodhart, B., Bajtelsmit, V., & McShane, K. (2019). Exploring young adult consumers’ sustainable clothing consumption intention-behavior gap: A behavioral reasoning theory perspective. Sustainable Production and Consumption, 18, 200-209. https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.009
https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.00...
). Há um entendimento nas comunidades científica e política de que o nível atual de consumo de recursos e as práticas atuais são insustentáveis, daí o esforço para entender como mudanças podem ser feitas para promover um consumo mais sustentável ( Lim, 2017Legere, A., & Kang, J. (2020). The role of self-concept in shaping sustainable consumption: A model of slow fashion. Journal of Cleaner Production, 258, 120699. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2020.120699
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2020.1...
; Sahakian & Whilite, 2013Roy,V., & Singh, S. (2017). Mapping the business focus in sustainable production and consumer literary: Review and research framework. Journal of Cleaner Production , 150(2017), 224‒236. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.03.040
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.0...
).

“Consumo sustentável não é consumir menos, é consumir de forma diferente e eficiente”, é um consumo reflexivo ( Jackson & Michaelis, 2003Jackson, T., & Marks, N. (1999). Consumption, sustainable welfare and human needs with reference to UK expenditure patterns between 1954 and 1994. Ecological Economics, 28(3), 421-441. https://doi.org/10.1016/S0921-8009(98)00108-6
https://doi.org/10.1016/S0921-8009(98)00...
, p. 14). Considerando que a ênfase no consumidor é clara ( Bengtsson et al., 2018Bengtsson, M., Alfredsson, E., Cohen, M., Lorek, S., & Schroeder, P. (2018). Transforming systems of consumption and production for achieving the sustainable development goals: Moving beyond efficiency. Sustainability Science. 13(6), 1533-1547. https://doi.org/10.1007/s11625-018-0582-1
https://doi.org/10.1007/s11625-018-0582-...
; Jackson & Michaelis, 2003Jackson, T., & Marks, N. (1999). Consumption, sustainable welfare and human needs with reference to UK expenditure patterns between 1954 and 1994. Ecological Economics, 28(3), 421-441. https://doi.org/10.1016/S0921-8009(98)00108-6
https://doi.org/10.1016/S0921-8009(98)00...
), os formuladores de políticas começaram a tentar entender como é possível intervir nos padrões de consumo e influenciar os estilos de vida em prol do desenvolvimento sustentável, por meio do consumo sustentável ( Jackson, 2014Jackson, T. (2014). Chapter 18. In G. Atkinson, S. Dietz & E. Neumayer (Eds.), Handbook of sustainable development (pp. 279‒290). Edward Elgar Publishing.). Além de ser reflexo das preferências individuais, o consumo também pode ser entendido como resultado do envolvimento nas práticas da vida cotidiana ( Süßbauer & Schäfer, 2019Spurling, N., Mcmeekin, A., Shove, E., Southerton, D., & Welch D. (2013). Interventions in practice: Re-framing policy approaches to consumer behavior. Sustainable Practices Research Group report.); os estilos de vida, por sua vez, estão diretamente relacionados aos padrões de consumo ( Bauman & May, 2010Bauman, Z., & May, T. (2010). Aprendendo a pensar com a sociologia. Zahar.; Spaargaren & Oosterveer, 2010Silva, M. E., Oliveira, A. P. G., & Gómez, C. R. P. (2013). Can collaboration between firms and stakeholders stimulate sustainable consumption? Discussing roles in the Brazilian electricity sector. Journal of Cleaner Production , 47, 236‒244.; Schäfer et al., 2021Schäfer, M., Figueiredo, M. D., Iran, S., Jaeger-Erben, M., Silva, M. E., Lazaro, J. C., & Meißner, M. (2021). Imitation, adaptation, or local emergency?-A cross-country comparison of social innovations for sustainable consumption in Brazil, Germany, and Iran. Journal of Cleaner Production , 284, 124740. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2020.124740
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2020.1...
).

Para atender à demanda por um consumo mais consciente e sustentável, bem como por uma produção mais responsável, surge na moda o slow fashion ( Jung & Jin, 2016Jarzabkowski, P., Kaplan, S., Seidl, D., & Whittington, R. (2015). On the risk of studying practices in isolation: Linking what, who, and how in strategy research. Strategic Organization, 14(3), 248‒259. https://doi.org/10.1177/1476127015604125
https://doi.org/10.1177/1476127015604125...
). O termo slow fashion foi utilizado pela primeira vez em 2007, por Kate Fletcher do Center for Sustainable Fashion, no Reino Unido ( Erketing & Atik, 2015Erketing, Z., & Atik, D. (2015). Sustainable markets: Motivating factors, barriers, and remedies for mobilization of slow fashion. Journal of Macromarketing, 35(1), 53-69. https://doi.org/10.1177/0276146714535932
https://doi.org/10.1177/0276146714535932...
; Jung & Jin, 2014Jung, S., & Jin, B. (2014). A theoretical investigation of slow fashion: Sustainable future of the apparel industry. International Journal of Consumer Studies, 38(5), 510‒519. https://doi.org/10.1111/ijcs.12127
https://doi.org/10.1111/ijcs.12127...
). Ele foi inspirado no movimento slow food, fundado por Carlos Petrini, na Itália, em 1986, como reação ao crescente estilo de vida promovido pelo fast food ( Fletcher, 2010Fletcher, K. (2010). Slow fashion: An invitation for systems change. Fashion Practice, 2(2), 259-265. https://doi.org/10.2752/175693810X12774625387594
https://doi.org/10.2752/175693810X127746...
; Clark, 2008Clark, H. (2008). Slow fashion - an oxymoron- or a promise for the future? Fashion Theory, 12(4), 427-446. https://doi.org/10.2752/175174108X346922
https://doi.org/10.2752/175174108X346922...
). Inicialmente classificado como movimento, assim como seu antecessor, o slow fashion deixou de ser considerado como tal, visto que seu conceito não se desenvolveu com a mesma coesão do slow food ( Pookulangara & Shephard, 2013Piscicelli, L., Cooper, T., & Fisher, T. (2015). The role of values in collaborative consumption: Insights from a product-service system for lending and borrowing in the UK. Journal of Cleaner Production , 97, 21-29. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2014.07.032
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2014.0...
; Fletcher, 2010Fletcher, K. (2010). Slow fashion: An invitation for systems change. Fashion Practice, 2(2), 259-265. https://doi.org/10.2752/175693810X12774625387594
https://doi.org/10.2752/175693810X127746...
).

O slow fashion não aborda literalmente a desaceleração da cadeia de suprimentos têxtil e de vestuário, ele orienta uma visão holística sobre a criação de processos de produção e consumo de moda mais sustentáveis ( Legere & Kang, 2020Lang, C., & Joyner Armstrong, C. M. (2018). Collaborative consumption: The influence of fashion leadership, need for uniqueness, and materialism on female consumers’ adoption of clothing renting and swapping. Sustainable Production and Consumption, 13, 37-47. https://doi.org/10.1016/j.spc.2017.11.005
https://doi.org/10.1016/j.spc.2017.11.00...
; Fletcher, 2010Fletcher, K. (2010). Slow fashion: An invitation for systems change. Fashion Practice, 2(2), 259-265. https://doi.org/10.2752/175693810X12774625387594
https://doi.org/10.2752/175693810X127746...
; Clark, 2008Clark, H. (2008). Slow fashion - an oxymoron- or a promise for the future? Fashion Theory, 12(4), 427-446. https://doi.org/10.2752/175174108X346922
https://doi.org/10.2752/175174108X346922...
). A ideia é estimular uma maior conscientização dos produtores sobre o que está sendo produzido. Nos consumidores, a intenção é difundir o entendimento de que a compra do produto deve ser baseada menos na quantidade e mais na qualidade ( Jung & Jin, 2016Jarzabkowski, P., Kaplan, S., Seidl, D., & Whittington, R. (2015). On the risk of studying practices in isolation: Linking what, who, and how in strategy research. Strategic Organization, 14(3), 248‒259. https://doi.org/10.1177/1476127015604125
https://doi.org/10.1177/1476127015604125...
). Na perspectiva dos produtores, os princípios do slow fashion são qualidade, autenticidade, durabilidade, conforto, desperdício zero e o uso de materiais naturais ligados ao local ( Trejo et al., 2019Thorisdottir, T. S., & Johannsdottir, L. (2019). Sustainability within fashion business models: A systematic literature review. Sustainability, 11(8), 2233. https://doi.org/10.3390/su11082233
https://doi.org/10.3390/su11082233...
; Fletcher, 2010Fletcher, K. (2010). Slow fashion: An invitation for systems change. Fashion Practice, 2(2), 259-265. https://doi.org/10.2752/175693810X12774625387594
https://doi.org/10.2752/175693810X127746...
). No que diz respeito aos consumidores, incluem equidade, localismo, autenticidade, exclusividade e funcionalidade ( Legere & Kang, 2020Legere, A., & Kang, J. (2020). The role of self-concept in shaping sustainable consumption: A model of slow fashion. Journal of Cleaner Production, 258, 120699. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2020.120699
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2020.1...
; Trejo et al., 2019Trejo, H. X., Smith, H. A., Trejo, N. K., & Lewis, T. L. (2019). Made in New York: A collaborative model to encourage slow fashion. Clothing and Textiles Research Journal, 37(3), 1‒16. https://doi.org/10.1177/0887302X19838331
https://doi.org/10.1177/0887302X19838331...
; Jung & Jin, 2014Jung, S., & Jin, B. (2014). A theoretical investigation of slow fashion: Sustainable future of the apparel industry. International Journal of Consumer Studies, 38(5), 510‒519. https://doi.org/10.1111/ijcs.12127
https://doi.org/10.1111/ijcs.12127...
). A necessidade de exclusividade e a consciência da sustentabilidade, que no slow fashion é muito pautada pela valorização do lugar ( Fletcher, 2017Fletcher, K. (2017). Local wisdom: Post-growth fashion. The learning network on sustainability (LENS). Greenleaf. ), são identificadas respectivamente pelos consumidores, como motivadores internos e externos para a adesão ao slow fashion ( Liu et al., 2018Lim, W. M. (2017). Inside the sustainable consumption theoretical toolbox: Critical concepts for sustainability, consumption, and marketing. Journal of Business Research , 78, 69-80. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2017.05.001
https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2017.0...
; Erketing & Atik, 2015Erketing, Z., & Atik, D. (2015). Sustainable markets: Motivating factors, barriers, and remedies for mobilization of slow fashion. Journal of Macromarketing, 35(1), 53-69. https://doi.org/10.1177/0276146714535932
https://doi.org/10.1177/0276146714535932...
).

A presente pesquisa, então, que está alinhada à importância de deslocar a raiz do problema da sustentabilidade do produtor para o usuário do produto ( Fletcher, 2017Fletcher, K. (2017). Local wisdom: Post-growth fashion. The learning network on sustainability (LENS). Greenleaf. ), definido, sob a lente das teorias da prática, como um praticante criativo e ativo ( Shove & Pantzar, 2005Shove, E. (2010). Beyond the ABC: Climate change policy and theories of social change. Environment and Planning A,4(2), 1273-1285. https://doi.org/10.1068/a42282
https://doi.org/10.1068/a42282...
), responde às estatísticas as quais apontam que 60% do impacto ambiental produzido pelos produtos vêm da etapa de consumo, como no processo de limpeza e na substituição de produtos ( Iran & Schrader, 2017Iran, S., & Schrader, U. (2017). Collaborative fashion consumption and its environmental effects. Journal of Fashion Marketing and Management, 21(4), 468-482. https://doi.org/10.1108/JFMM-09-2016-0086
https://doi.org/10.1108/JFMM-09-2016-008...
). Por isso, a relevância em pesquisar as práticas nascidas pelo uso das roupas como parte da vida cotidiana, pois elas possuem uma visão ampliada da realidade da prática no campo, e isso faz com que elas apresentem melhor potencial de transformação em direção à sustentabilidade ( Fletcher, 2017Fletcher, K. (2017). Local wisdom: Post-growth fashion. The learning network on sustainability (LENS). Greenleaf. ).

O compartilhamento é uma das práticas que destaca a mudança para a moda sustentável a partir do usuário, como forma de promover mudanças nos padrões de consumo e descarte ( Fletcher, 2017Fletcher, K. (2017). Local wisdom: Post-growth fashion. The learning network on sustainability (LENS). Greenleaf. ). O compartilhamento de roupas, analisado na presente pesquisa, é uma das alternativas para manter o uso de recursos utilizados na fabricação de peças de vestuário ( Fletcher & Grose, 2012Fletcher, K., & Grose, L. (2012). Fashion & sustainability. Laurence King Publishing.), além de apresentar a possibilidade de reduzir o consumo excessivo de material na indústria da moda ( Iran & Schrader, 2017Iran, S., & Schrader, U. (2017). Collaborative fashion consumption and its environmental effects. Journal of Fashion Marketing and Management, 21(4), 468-482. https://doi.org/10.1108/JFMM-09-2016-0086
https://doi.org/10.1108/JFMM-09-2016-008...
) .

3. Consumo colaborativo e teorias da prática

O consumo colaborativo é um “modelo socioeconômico emergente” ( Piscicelli et al ., 2015Pedersen, E. R. G., & Netter, S. (2015). Collaborative consumption: Business model opportunities and barriers for fashion libraries. Journal of Fashion Marketing and Management: An International Journal, 19(3), 258-273.), definido como a rápida explosão do compartilhamento tradicional, troca, empréstimo, comércio, aluguel, presentes e troca redefinido pela tecnologia e comunidades de pares ( Bostman & Rogers, 2011Bostman, R., & Rogers, R. (2011). What’s mine is yours: How collaborative consumption is changing the way we live. HarperCollins Business.). Embora o ato de compartilhar seja um fenômeno tão antigo quanto a humanidade, o consumo colaborativo e a economia compartilhada são fenômenos nascidos na era da internet ( Sutherland & Jarrahi, 2018Süßbauer, E., & Schäfer, M. (2019). Corporate strategies for greening the workplace: Findings from sustainability-oriented companies in Germany. Journal of Cleaner Production , 226(1), 564‒577. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2019.04.009
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2019.0...
; Belk, 2014Belk, R. (2014). You are what you can access: Sharing and collaborative consumption online. Journal of Business Research, 67(8),1595-1600. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2013.10.001
https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2013.1...
). Incentivado pelo compartilhamento, o consumo colaborativo tem o potencial de prevenir ou retardar o descarte de bens. Portanto, é uma forma de acomodar necessidades e desejos de modo mais sustentável e com menores custos para o indivíduo ( Bostman & Rogers, 2011Bostman, R., & Rogers, R. (2011). What’s mine is yours: How collaborative consumption is changing the way we live. HarperCollins Business.).

Esse modelo socioeconômico, baseado no uso compartilhado de algum tipo de mercadoria, fornece acesso a produtos que continuam sendo propriedade de uma empresa (por exemplo, esquemas de compartilhamento de bicicletas e carros, lavanderias) ou disponibiliza bens de propriedade privada para outras pessoas, dentro de uma comunidade, como compartilhamento de caronas, troca de roupas e acomodação entre pares ( Piscicelli et al., 2015Pedersen, E. R. G., & Netter, S. (2015). Collaborative consumption: Business model opportunities and barriers for fashion libraries. Journal of Fashion Marketing and Management: An International Journal, 19(3), 258-273.). Recentemente, a ideia de economia colaborativa também chegou ao setor da moda ( Rohden et al., 2015Reckwitz, A. (2002). The status of the “Material” in theories of culture: From “Social Structure” to “Artefacts”. Journal for the Theory of Social Behaviour, 32(2), 195‒217. https://doi.org/10.1111/1468-5914.00183
https://doi.org/10.1111/1468-5914.00183...
; Choi & Shen, 2017Choi, T. M., & Shen, B. (2017). Luxury fashion retail management: An introduction. In T. M. Choi & B. Shen (Eds.), Luxury fashion retail management. Springer.; Shen et al., 2017Shen, B., Choi, T. M., & Chow, P. S., (2017). Brand loyalties in designer luxury and fast fashion co-branding alliances. Journal of Business Research , 81, 173-180. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2017.06.017
https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2017.0...
). O termo Collaborative Fashion Consumption (CFC) foi cunhado para explicar uma tendência de consumo “na qual os consumidores, em vez de comprar novos produtos de moda, têm acesso a roupas já existentes, seja por meio de oportunidades alternativas de aquisição de propriedade individual (presente, troca ou segunda mão) ou por meio de opções de uso da moda” ( Iran & Schrader, 2017Iran, S., & Schrader, U. (2017). Collaborative fashion consumption and its environmental effects. Journal of Fashion Marketing and Management, 21(4), 468-482. https://doi.org/10.1108/JFMM-09-2016-0086
https://doi.org/10.1108/JFMM-09-2016-008...
, p. 472).

Embora o consumo colaborativo ainda não seja uma proposta consolidada no mainstream da indústria da moda, já é possível observar diversas iniciativas baseadas na ideia de compartilhamento e comunidade surgindo no segmento, o mercado de roupas usadas online é um exemplo ( Pedersen & Netter, 2015Niinimäki, K., 2017. Fashion in a circular economy. In C. E. Henninger, P.J. Alevizou, H. Goworek & D. Ryding (Eds.), Sustainable fashion a cradle to upcycle approach (pp. 151‒169). Springer.). As pessoas que vendem artigos de segunda mão são motivadas pelo desejo de se desfazer de bens que não lhes interessam mais, além da vantagem no ganho monetário . Quanto aos consumidores, eles são identificados na literatura por quatro motivadores: desejo de exclusividade, possibilidade de adquirir bens de alto valor a preços mais acessíveis, nostalgia proporcionada por roupas de outros tempos e sustentabilidade ( Roux & Korchia, 2006Rohden, S. F., Durayski, J., Teixeira, A. P. P., Montelongo, A., & Rossi, C. A. V. (2015). Consumo colaborativo: Modismo ou revolução? DESENVOLVE: Revista de Gestão do Unisalle, 4(2), 9‒25. https://doi.org/10.18316/2316-5537.15.1
https://doi.org/10.18316/2316-5537.15.1...
). Como o compartilhamento ainda é uma prática recente, questões sobre sua adoção e difusão carecem de mais estudos que explorem suas possíveis barreiras e potencialidades. Uma das linhas de pesquisa potencialmente capazes de aprofundar tais aspectos é a perspectiva das teorias da prática ( Piscicelli et al., 2015Pedersen, E. R. G., & Netter, S. (2015). Collaborative consumption: Business model opportunities and barriers for fashion libraries. Journal of Fashion Marketing and Management: An International Journal, 19(3), 258-273.).

Nos últimos anos, estudos gerenciais e organizacionais redescobriram o conceito de prática e construíram um corpo de pesquisa sob a sigla PBS - Practice-Based Studies ( Gherardi, 2009Foudation Ellen Macarthur (2017). A new textiles economy: Redesingning fashion’s future. Ellen Macarthur Foundation. https://www.ellenmacarthurfoundation.org/assets/downloads/publications/A-New-Textiles-Economy_Full-Report.pdf
https://www.ellenmacarthurfoundation.org...
). Nessa perspectiva, as práticas cotidianas são identificadas como responsáveis pela construção ( Feldman & Orlikowski, 2011Feldman, M. S., & Orlikowski, W. J. (2011). Theorizing practice and practicing theory. Organization Science, 22(5), 1240-1253. https://www.jstor.org/stable/41303116
https://www.jstor.org/stable/41303116...
; Schatzki, 2019Schatzki, T. R. (2012). A primer on practices. In Practice-based education (Ed.), Practice, education, work and society (pp. 13‒26, Vol. 6). Sense Publishers.) e transformação da sociedade ( Shove et al., 2012Shove, E., & Pantzar, M. (2005). Consumers, producers and practices: Understanding the invention and reinvention of Nordic walking. Journal of Consumer Culture , 5(1), 43‒64. https://doi.org/10.1177/1469540505049846
https://doi.org/10.1177/1469540505049846...
). Dessa maneira, é possível verificar a importância de compreender como as práticas realizadas no dia a dia se desenvolvem, se estabelecem e como podem se tornar mais sustentáveis ( Gherardi, 2009Gherardi, S. (2009). Introduction: The critical power of the ‘practice lens’. Management Learning, 40(2), 115-128. https://doi.org/10.1177/1350507608101225
https://doi.org/10.1177/1350507608101225...
; Hargreaves, 2011Gupta, S., Wencke, G., & Gentry, J. (2019). The role of style versus fashion orientation on sustainable apparel consumption. Journal of Macromarketing , 39(3), 27614671983528. https://doi.org/10.1177/0276146719835283
https://doi.org/10.1177/0276146719835283...
; Sahakian & Wilhite, 2013Roy,V., & Singh, S. (2017). Mapping the business focus in sustainable production and consumer literary: Review and research framework. Journal of Cleaner Production , 150(2017), 224‒236. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.03.040
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.0...
; Silva & Figueiredo, 2017Shove, E., Pantzar, M., & Watson, M. (2012). The dynamics of social practice: Everyday life and how it changes. Sage Publications.; Spurling et al., 2013Spaargaren, G., & Oosterveer, P. (2010) Citizen-consumers as agents of change in globalizing modernity: The case os sustainable consumption. Sustainability, 2(7), 1887‒1908. https://doi.org/10.3390/su2071887
https://doi.org/10.3390/su2071887...
). Assim, o foco das pesquisas sobre consumo e sustentabilidade, antes dado aos comportamentos individuais e às inovações tecnológicas, nas teorias da prática passa a ser a compreensão das práticas cotidianas ( Sahakian & Wilhite, 2013Roy,V., & Singh, S. (2017). Mapping the business focus in sustainable production and consumer literary: Review and research framework. Journal of Cleaner Production , 150(2017), 224‒236. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.03.040
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.0...
; Spurling et al., 2013Spaargaren, G., & Oosterveer, P. (2010) Citizen-consumers as agents of change in globalizing modernity: The case os sustainable consumption. Sustainability, 2(7), 1887‒1908. https://doi.org/10.3390/su2071887
https://doi.org/10.3390/su2071887...
).

Schatzki (2019Schatzki, T. R. (2012). A primer on practices. In Practice-based education (Ed.), Practice, education, work and society (pp. 13‒26, Vol. 6). Sense Publishers.) é um dos teóricos que se destaca na discussão das práticas como componentes do social. Sua abordagem é baseada na suposição de que todos os fenômenos sociais estão enraizados na prática. Uma prática é definida como “um conjunto aberto e temporário de ações e dizeres, ligados por entendimentos práticos, regras, estrutura teleafetiva e entendimento geral” ( Schatzki, 2002Schatzki, T. R. (2002). The site of the social: A philosophical account of the constitution of social life and change. The Pennsylvania State University Press., p. 8). O conceito de arranjos materiais, que inclui humanos, artefatos, organismos e coisas da natureza ( Schatzki, 2005Schatzki, T. R. (2005). Peripheral vision: The sites of organizations. Organization Studies, 26(3), 465‒484. https://doi.org/10.1177/0170840605050876
https://doi.org/10.1177/0170840605050876...
, 2012Schatzki, T. R. (2012). A primer on practices. In Practice-based education (Ed.), Practice, education, work and society (pp. 13‒26, Vol. 6). Sense Publishers.) é útil para reconhecer uma gama de relações materiais mais extensas entre as quais as práticas ocorrem. Reckwitz (2002Pookulangara, S., & Shephard, A. (2013). Slow fashion movement: Understanding consumer perceptions-An exploratory study. Journal of Retailing and Consumer Services, 20(2), 200‒206. https://doi.org/10.1016/j.jretconser.2012.12.002
https://doi.org/10.1016/j.jretconser.201...
) fornece mais detalhes afirmando que uma prática pressupõe a interligação de elementos entre si: “formas de atividades corporais, formas de atividades mentais, 'coisas' e seu uso, know-how, estados de emoção e conhecimento motivacional” ( Reckwitz, 2002Pookulangara, S., & Shephard, A. (2013). Slow fashion movement: Understanding consumer perceptions-An exploratory study. Journal of Retailing and Consumer Services, 20(2), 200‒206. https://doi.org/10.1016/j.jretconser.2012.12.002
https://doi.org/10.1016/j.jretconser.201...
, p. 249). Sendo o social o campo das práticas, elas estão, inevitavelmente, imbricadas em arranjos materiais que elas corroboram para criar, nos quais se realizam e por meio dos quais (as práticas) existem ( Schatzki, 2005Schatzki, T. R. (2005). Peripheral vision: The sites of organizations. Organization Studies, 26(3), 465‒484. https://doi.org/10.1177/0170840605050876
https://doi.org/10.1177/0170840605050876...
). Práticas e arranjos estão, assim, sempre ligados de uma ou mais formas, formando um amálgama inseparável ( Schatzki, 2002Pookulangara, S., & Shephard, A. (2013). Slow fashion movement: Understanding consumer perceptions-An exploratory study. Journal of Retailing and Consumer Services, 20(2), 200‒206. https://doi.org/10.1016/j.jretconser.2012.12.002
https://doi.org/10.1016/j.jretconser.201...
, 2012Schatzki, T. R. (2012). A primer on practices. In Practice-based education (Ed.), Practice, education, work and society (pp. 13‒26, Vol. 6). Sense Publishers.), um conjunto de práticas resulta em uma constelação de práticas ( Schatzki, 2019Schatzki, T. R. (2019). Social change in a material world. Routledge.).

As práticas como entidades são fundadas ou constituídas por três elementos: materiais, competências e significados; tais elementos são interligados dinamicamente por profissionais qualificados, por meio de atuação regular e repetitiva, constituindo assim a prática ( Shove & Pantzar, 2005Shove, E. (2010). Beyond the ABC: Climate change policy and theories of social change. Environment and Planning A,4(2), 1273-1285. https://doi.org/10.1068/a42282
https://doi.org/10.1068/a42282...
; Hargreaves, 2011Gupta, S., Wencke, G., & Gentry, J. (2019). The role of style versus fashion orientation on sustainable apparel consumption. Journal of Macromarketing , 39(3), 27614671983528. https://doi.org/10.1177/0276146719835283
https://doi.org/10.1177/0276146719835283...
; Shove et al., 2012Shove, E., Pantzar, M., & Watson, M. (2012). The dynamics of social practice: Everyday life and how it changes. Sage Publications.; Spurling et al., 2013Spaargaren, G., & Oosterveer, P. (2010) Citizen-consumers as agents of change in globalizing modernity: The case os sustainable consumption. Sustainability, 2(7), 1887‒1908. https://doi.org/10.3390/su2071887
https://doi.org/10.3390/su2071887...
). Inspirados nos pontos de vista de Schatzki (2002Schatzki, T. R. (2001). Introduction: Practice theory. In T. R. Schatzki, K. Knorr-Cetina, & E. Savigny (Eds.), The practice turn in contemporary (pp. 10-23). Routledge., 2012Schatzki, T. R. (2012). A primer on practices. In Practice-based education (Ed.), Practice, education, work and society (pp. 13‒26, Vol. 6). Sense Publishers.) e Reckwitz (2002Pookulangara, S., & Shephard, A. (2013). Slow fashion movement: Understanding consumer perceptions-An exploratory study. Journal of Retailing and Consumer Services, 20(2), 200‒206. https://doi.org/10.1016/j.jretconser.2012.12.002
https://doi.org/10.1016/j.jretconser.201...
), Shove et al., 2012 Shove, E., Pantzar, M., & Watson, M. (2012). The dynamics of social practice: Everyday life and how it changes. Sage Publications.propuseram uma abordagem sociotécnica para compreender os elementos essenciais da prática e como eles se relacionam entre si. Nessa perspectiva, tanto os agentes humanos, ou seja, os indivíduos, constituídos de corpos e mentes ( Schatzki, 2001Schatzki, T. R. (2001). Introduction: Practice theory. In T. R. Schatzki, K. Knorr-Cetina, & E. Savigny (Eds.), The practice turn in contemporary (pp. 10-23). Routledge.) quanto os não humanos (objetos/artefatos) são requisitos indispensáveis para a prática ( Reckwitz, 2002Reckwitz, A. (2002). The status of the “Material” in theories of culture: From “Social Structure” to “Artefacts”. Journal for the Theory of Social Behaviour, 32(2), 195‒217. https://doi.org/10.1111/1468-5914.00183
https://doi.org/10.1111/1468-5914.00183...
; Spaargaren & Oosterveer, 2010Silva, M. E., Oliveira, A. P. G., & Gómez, C. R. P. (2013). Can collaboration between firms and stakeholders stimulate sustainable consumption? Discussing roles in the Brazilian electricity sector. Journal of Cleaner Production , 47, 236‒244.). O próprio corpo humano é considerado um elemento material e a mente um componente de significado ( Shove et al., 2012Shove, E., Pantzar, M., & Watson, M. (2012). The dynamics of social practice: Everyday life and how it changes. Sage Publications.; Süßbauer & Schäfer, 2019Spurling, N., Mcmeekin, A., Shove, E., Southerton, D., & Welch D. (2013). Interventions in practice: Re-framing policy approaches to consumer behavior. Sustainable Practices Research Group report.). A seguir, a Figura 1 detalha os três elementos componentes da prática.

Figura 1
Elementos da prática

Ao dirigir, caminhar ou cozinhar, as pessoas (praticantes) combinam dinamicamente os três elementos os quais compõem suas práticas ( Shove et al., 2012Shove, E., & Pantzar, M. (2005). Consumers, producers and practices: Understanding the invention and reinvention of Nordic walking. Journal of Consumer Culture , 5(1), 43‒64. https://doi.org/10.1177/1469540505049846
https://doi.org/10.1177/1469540505049846...
). Ao servir o jantar, por exemplo, são necessários objetos materiais e ferramentas, como alimentos, bebidas, louças, mesas e cadeiras, além da cozinha e das infraestruturas de energia e abastecimento de água. Algumas competências, como cozinhar e conhecimento de etiqueta para servir, são básicas; um diferencial, ou conhecimento especializado, por sua vez, como harmonização com vinho, é uma competência baseada em convenções e expectativas culturais ( Spurling et al., 2013Spaargaren, G., & Oosterveer, P. (2010) Citizen-consumers as agents of change in globalizing modernity: The case os sustainable consumption. Sustainability, 2(7), 1887‒1908. https://doi.org/10.3390/su2071887
https://doi.org/10.3390/su2071887...
).

As práticas são situadas em contextos de vida que estão sempre passando por processos de mudança ao longo do tempo (história) e do espaço (contexto) ( Schatzki, 2019Schatzki, T. R. (2012). A primer on practices. In Practice-based education (Ed.), Practice, education, work and society (pp. 13‒26, Vol. 6). Sense Publishers.; Reckwitz, 2002Pookulangara, S., & Shephard, A. (2013). Slow fashion movement: Understanding consumer perceptions-An exploratory study. Journal of Retailing and Consumer Services, 20(2), 200‒206. https://doi.org/10.1016/j.jretconser.2012.12.002
https://doi.org/10.1016/j.jretconser.201...
; Sahakian & Wilhite, 2013Roy,V., & Singh, S. (2017). Mapping the business focus in sustainable production and consumer literary: Review and research framework. Journal of Cleaner Production , 150(2017), 224‒236. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.03.040
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.0...
). As práticas são formadas e reformadas por fatores históricos, de modo que uma prática sempre terá informações de práticas anteriores ( Bourdieu, 1977Bourdieu, P. (1977). Outline of a theory of practice. Cambridge University Press.; Sahakian & Wilhite, 2013Roy,V., & Singh, S. (2017). Mapping the business focus in sustainable production and consumer literary: Review and research framework. Journal of Cleaner Production , 150(2017), 224‒236. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.03.040
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.0...
). Esses dados fornecem indicações para entender como as práticas podem ser mudadas ( Sahakian & Wilhite, 2013Roy,V., & Singh, S. (2017). Mapping the business focus in sustainable production and consumer literary: Review and research framework. Journal of Cleaner Production , 150(2017), 224‒236. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.03.040
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.0...
). De posse de todas essas informações, é possível explorar os agentes (praticantes/provedores), mediados pelos elementos, na emergência e desenvolvimento de uma prática. Vale ressaltar que o foco do estudo não são os indivíduos ( Reckwitz, 2002Pookulangara, S., & Shephard, A. (2013). Slow fashion movement: Understanding consumer perceptions-An exploratory study. Journal of Retailing and Consumer Services, 20(2), 200‒206. https://doi.org/10.1016/j.jretconser.2012.12.002
https://doi.org/10.1016/j.jretconser.201...
), nem os objetos, mas as práticas que eles (indivíduos e objetos) carregam. Assim, é fundamental considerar a relação dinâmica e interdependente entre praticantes e provedores, emaranhados aos elementos (materiais, competências e significados), na evolução e difusão das práticas ( Shove & Pantzar, 2005Shove, E. (2010). Beyond the ABC: Climate change policy and theories of social change. Environment and Planning A,4(2), 1273-1285. https://doi.org/10.1068/a42282
https://doi.org/10.1068/a42282...
).

A Figura 2, abaixo, ilustra as premissas teóricas sobre as quais este estudo foi desenvolvido. Mostra o consumo colaborativo como parte de um conjunto de modelos de consumo sustentável. Dentre essas possibilidades, o slow fashion surge como um conjunto ilimitado de estratégias propostas para alcançar um consumo mais sustentável. Então, o compartilhamento de roupas representa a interseção entre o slow fashion e o consumo colaborativo. Isso representa uma possibilidade de contrabalançar os impactos negativos da indústria da moda, que busca se afastar do sistema econômico 'pegar-fazer-usar-descartar', em direção a um sistema regenerativo baseado em circuitos fechados ( Niinimäki, 2017Niinimäki, K., & Hassi, L. (2011). Emerging design strategies in Sustainable Production and Consumption of textiles and clothing. Journal of Cleaner Production , 19(16), 1876‒1888. https://doi.org/10.1016/J.JCLEPRO.2011.04.020
https://doi.org/10.1016/J.JCLEPRO.2011.0...
; Henninger et al., 2020Hargreaves, T. (2011). Practice-ing behaviour change: Applying social practice theory to pro-environmental behaviour change. Journal of Consumer Culture , 11(1), 79-99. https://doi.org/10.1177/1469540510390500
https://doi.org/10.1177/1469540510390500...
).

Com os consumidores cada vez mais conscientes das questões ambientais e sociais no setor da moda, recorrer a 'novos' modelos de negócios colaborativos pode se tornar uma opção atraente ( Henninger et al., 2021Henninger, C. E., Blazquez Cano, M., Boardman, R., Jones, C., McCormick, H., & Sahab, S. (2020). Cradle-to-cradle vs consumer preferences. In I. Choudhury & S. Hashmi (Eds.), Encyclopedia of renewable and sustainable materials (pp. 353-357). Elsevier. ). Neste estudo, argumentamos que o compartilhamento de roupas é mais bem compreendido se explorado sob as lentes das teorias da prática (lupa na Figura 2). De acordo com a análise que será apresentada, foi possível afirmar que o compartilhamento de roupas pode ser uma estratégia eficaz para o consumo sustentável na indústria da moda.

Figura 2
Quadro Teórico

Assim, o principal ponto de pesquisa sobre consumo e sustentabilidade, antes centrado em comportamentos individuais e inovações tecnológicas, passa a ser compreender as práticas cotidianas que permeiam o consumo sustentável, sob a ótica das teorias da prática ( Sahakian & Wilhite, 2013Roy,V., & Singh, S. (2017). Mapping the business focus in sustainable production and consumer literary: Review and research framework. Journal of Cleaner Production , 150(2017), 224‒236. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.03.040
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.0...
; Spurling et al., 2013Spaargaren, G., & Oosterveer, P. (2010) Citizen-consumers as agents of change in globalizing modernity: The case os sustainable consumption. Sustainability, 2(7), 1887‒1908. https://doi.org/10.3390/su2071887
https://doi.org/10.3390/su2071887...
). Isso porque os comportamentos, chamados de práticas como performances, são considerados apenas como a parte observável dos fenômenos sociais, resultados de atitudes, crenças e outros fatores motivacionais. No entanto, como a nova perspectiva da prática visa compreender como se dá a mudança social, é necessário compreender o comportamento e o desempenho das práticas intrincadas aos seus contextos materiais, sociais e culturais. Portanto, as mudanças de comportamento só serão bem-sucedidas por meio da intervenção nas bases socialmente incorporadas à ação, as práticas como entidades ( Spurling et al., 2013Spaargaren, G., & Oosterveer, P. (2010) Citizen-consumers as agents of change in globalizing modernity: The case os sustainable consumption. Sustainability, 2(7), 1887‒1908. https://doi.org/10.3390/su2071887
https://doi.org/10.3390/su2071887...
; Piscicelli et al., 2015Pedersen, E. R. G., & Netter, S. (2015). Collaborative consumption: Business model opportunities and barriers for fashion libraries. Journal of Fashion Marketing and Management: An International Journal, 19(3), 258-273.). Em outras palavras, materializar as teorias sociais da prática é importante porque elas ocorrem antes da ação, pois orientam o curso do consumo ( Warde, 2005Wang, C., Ghadimi, P., Lim, M. K., & Tseng, M.-L. (2018). A literature review of sustainable consumption and production: A comparative analysis in developed and developing economies. Journal of Cleaner Production , 206, 741‒754. ).

4. Método de Pesquisa

Para identificar os elementos e a dinâmica da prática de compartilhar roupas em Fortaleza, bem como suas implicações para o consumo sustentável, esta pesquisa, que se configura como um estudo de caso qualitativo ( Yin, 2014Work Bank (2019). How much do our wardrobes cost to the environment? World Bank. https://www.worldbank.org/en/news/feature/2019/09/23/costo-moda-medio-ambiente
https://www.worldbank.org/en/news/featur...
), investiga os diversos significados associados às práticas, bem como como as performances realizadas pelos praticantes ( Bellotti & Mora, 2016Bellotti, E., & Mora, E. (2016). Networks of practices in critical consumption. Journal of Consumer Culture, 16(3), 718-760. https://doi.org/10.1177/1469540514536191
https://doi.org/10.1177/1469540514536191...
). Construtivista por natureza ( Nicolini, 2017Mukendi, A., Davies, I., Sarah, G., & McDonagh, P. (2019). Sustainable fashion: Current and future research directions. European Journal of Marketing, 54(11), 2873‒2909. https://doi.org/10.1108/EJM-02-2019-0132
https://doi.org/10.1108/EJM-02-2019-0132...
), a menor unidade de análise desta pesquisa é a prática e seus arranjos materiais ( Spurling et al., 2013Spaargaren, G., & Oosterveer, P. (2010) Citizen-consumers as agents of change in globalizing modernity: The case os sustainable consumption. Sustainability, 2(7), 1887‒1908. https://doi.org/10.3390/su2071887
https://doi.org/10.3390/su2071887...
), pois, para a construção social da realidade, por meio de estruturas simbólicas e cognitivas, as teorias da prática colocam o “lugar do social” nas práticas ( Reckwitz, 2002Pookulangara, S., & Shephard, A. (2013). Slow fashion movement: Understanding consumer perceptions-An exploratory study. Journal of Retailing and Consumer Services, 20(2), 200‒206. https://doi.org/10.1016/j.jretconser.2012.12.002
https://doi.org/10.1016/j.jretconser.201...
). Foi realizada uma etapa exploratória de visitas para entender o contexto do campo e obter informações para elaborar o protocolo de pesquisa que, segundo Yin (2014Yin, R. K. (2014). Case study research: Design and methods (5th ed.). SAGE Publications.), depende do escopo do estudo de caso. A partir daí, elencamos os procedimentos de campo e a coleta de dados.

Considerando a definição de prática como um “nexo temporalmente disperso de ditos e feitos” ( Schatzki, 2012Schatzki, T. R. (2005). Peripheral vision: The sites of organizations. Organization Studies, 26(3), 465‒484. https://doi.org/10.1177/0170840605050876
https://doi.org/10.1177/0170840605050876...
, p. 14), a coleta de dados incluiu observações e entrevistas. A pesquisa foi realizada em uma loja colaborativa, localizada em Fortaleza, Ceará, a quinta maior cidade do Brasil. A loja foi escolhida por sua representatividade local no sentido de promover um consumo mais consciente e por estar localizada em um tradicional corredor de vendas do varejo da cidade: a Avenida Monsenhor Tabosa. O processo teve início com as observações, que ocorreram durante as visitas à loja e em todos os eventos promovidospor ela , de julho a dezembro de 2019 ( Tabela 1). Um exemplo desses eventos foram as feiras em parceria, inclusive com a prefeitura local, realizadas com o objetivo de promover a sustentabilidade. As feiras reuniam produtos de vários domínios de consumo: roupas usadas e novas (feitas por produtores locais), alimentos, acessórios, produtos de beleza e higiene pessoal, utensílios domésticos, fraldas ecológicas, entre outros.

Entre setembro e dezembro de 2019 também realizamos entrevistas individuais e em grupo, além de um grupo focal ( Tabela 2), contabilizando um total de 17 participantes entre provedores (empreendedores) e praticantes de compartilhamento de roupas (consumidores; ver roteiro de entrevista no apêndice Apêndice - Amostra do roteiro de entrevista PERFIL PESSOAL Podemos começar com uma breve introdução sobre você? (incluindo experiência) Há quanto tempo você participa da loja colaborativa? Você poderia compartilhar sua história com peças de segunda mão? O que significa moda sustentável para você? PRATICANTES O que uma loja colaborativa como esta, em Fortaleza, significa para você? Para você, existe alguma diferença entre um espaço colaborativo (loja) e uma loja convencional/fast-fashion? Se sim, qual ou quais? O que você aprendeu ao escolher usar roupas compartilhadas/de segunda mão? PROVEDORES O que o levou a investir em uma loja colaborativa? Qual a diferença entre uma loja colaborativa e uma loja convencional/fast-fashion? Para gerenciar essa loja colaborativa, você precisou aprender alguma coisa em particular? ). O desenvolvimento dos roteiros de entrevista (individual e grupal) e do grupo focal foi orientado pelas teorias da prática, mais especificamente pela perspectiva sociotécnica apresentada por Shove et al. (2012Shove, E., & Pantzar, M. (2005). Consumers, producers and practices: Understanding the invention and reinvention of Nordic walking. Journal of Consumer Culture , 5(1), 43‒64. https://doi.org/10.1177/1469540505049846
https://doi.org/10.1177/1469540505049846...
). Em relação à saturação dos dados, seguimos a premissa geral da pesquisa qualitativa a qual diz que os dados qualitativos são saturados quando os tópicos ou temas derivados do conjunto de dados são repetidos ( Glaser & Strauss, 1967Gherardi, S. (2009). Introduction: The critical power of the ‘practice lens’. Management Learning, 40(2), 115-128. https://doi.org/10.1177/1350507608101225
https://doi.org/10.1177/1350507608101225...
). Eles são então saturados “quando um conjunto de dados deixa de fornecer novas informações ou temas, que se relacionam com a questão de pesquisa” ( Constantinou et al., 2017Constantinou, C. S., Georgiou, M., & Perdikogianni, M. (2017). A comparative method for themes saturation (CoMeTS) in qualitative interviews. Qualitative Research , 17(5), 571-588. https://doi.org/10.1177/1468794116686650
https://doi.org/10.1177/1468794116686650...
, p. 5), sinalizando a descontinuação da coleta de dados ( Saunders et al., 2018Sahakian, M., & Wilhite, H. (2013). Making practice theory practicable: Towards more sustainable forms of consumption. Journal of Consumer Culture , 14(1), 25‒44. https://doi.org/10.1177/14695405135055607
https://doi.org/10.1177/1469540513505560...
), como ocorreu na presente pesquisa. Quanto ao grupo focal, não há consenso na literatura sobre o número exato acerca do tamanho ideal, mas a maioria dos pesquisadores aconselha grupos compostos de 4 a 12 pessoas, embora outros indiquem grupos maiores ( Arthur et al., 2012Arthur, J., Waring, M., Coe, R., & Hedges, L. V. (2012). Research methods and methodologies in education. SAGE Publications.).

As entrevistas individuais foram realizadas com sete praticantes e dois provedores. Os praticantes foram entrevistados durante eventos ocorridos na loja e nas feiras. A entrevista em grupo foi realizada com 3 praticantes. E o grupo focal aconteceu na loja colaborativa, com 5 praticantes. Os participantes da entrevista em grupo e grupo focal foram convidados através das redes sociais da loja. De acordo com Arthur et al. (2012Arthur, J., Waring, M., Coe, R., & Hedges, L. V. (2012). Research methods and methodologies in education. SAGE Publications.), tanto as entrevistas em grupo quanto os grupos focais são discussões em grupo organizadas com o objetivo de reunir várias opiniões sobre um determinado tema. No entanto, na entrevista em grupo há uma dinâmica mais linear entre o pesquisador e cada entrevistado, mesmo em ambiente de grupo. Já no grupo focal, há maior interação entre os participantes, e a opinião do grupo pode se tornar tão relevante quanto a opinião dos indivíduos ( Arthur et al., 2012Arthur, J., Waring, M., Coe, R., & Hedges, L. V. (2012). Research methods and methodologies in education. SAGE Publications.).

Tabela 1.
Coleta de dados: observações
Tabela 2
Coleta de dados: entrevistas

A todos os participantes da pesquisa foi assegurado o anonimato e, para identificá-los, estabelecemos os seguintes pseudônimos: (EO) entrevista com o provedor; (EA) entrevista com praticante; (GF) grupo focal; e, (EC) entrevistas em grupo. O critério de seleção dos entrevistados foi que eles tivessem o hábito de compartilhar itens de segunda mão na loja colaborativa pesquisada. Todos os entrevistados foram aleatoriamente do sexo feminino, com idade entre 22 e 39 anos. De acordo com os sócios empreendedores, as mulheres são aproximadamente 85% do público que compartilha roupas.

Para analisar os dados, utilizamos a análise de conteúdo qualitativa ( Mayring, 2003Liu, C., State, L., Pookulanga, S., & Shephard, A. (2018). Will youg consumers buys fast fashion with the luxury ingrediente of american alligator leather: A study of lifestyle characteristics and motivating factors. Institute for Global Business Research: International Conference Proceedings, 2(1), 129‒132.). Diante disso, elencamos categorias definidas a partir dos elementos da prática (materiais, significados e competências), evidenciados por Shove et al. (2012Shove, E., & Pantzar, M. (2005). Consumers, producers and practices: Understanding the invention and reinvention of Nordic walking. Journal of Consumer Culture , 5(1), 43‒64. https://doi.org/10.1177/1469540505049846
https://doi.org/10.1177/1469540505049846...
). O processo ocorreu, inicialmente, pela transcrição dos dados coletados (grupo focal, entrevistas individuais e grupais) ( Tabela 2). Os dados foram lidos e revisados para que as categorias fossem apresentadas de acordo com a teoria proposta por Shove et al. (2012Shove, E., & Pantzar, M. (2005). Consumers, producers and practices: Understanding the invention and reinvention of Nordic walking. Journal of Consumer Culture , 5(1), 43‒64. https://doi.org/10.1177/1469540505049846
https://doi.org/10.1177/1469540505049846...
). Além disso, as informações apreendidas e registradas nas observações também passaram pelo mesmo processo ( Tabela 1). Em seguida, todos os dados foram listados em uma tabela onde foi possível verificar a existência dos elementos de cada categoria. Esse processo foi realizado com o uso do Excel.

Durante a análise, os dados foram triangulados para permitir que o fenômeno, ou questão de pesquisa, fosse analisado e compreendido a partir de mais de uma fonte de dados. Informações de diferentes ângulos podem ser usadas para corroborar, elaborar ou iluminar o problema de pesquisa, limitando vieses pessoais e metodológicos ( Decrop, 1999Decrop, A. (1999). Triangulation in qualitative tourism research. Tourism Management, 20, 157-161. https://doi.org/10.1016/S0261-5177(98)00102-2
https://doi.org/10.1016/S0261-5177(98)00...
). As entrevistas, depois de ouvidas e transcritas, foram enviadas aos participantes da pesquisa para serem validadas. Dessa forma, foram consideradas as variações internas e externas dos dados coletados. Quanto à ética, os pesquisadores, ao realizarem as entrevistas, sempre se apresentavam e explicavam o foco da pesquisa e como procederiam com a análise: a verificação da prática do compartilhamento de roupas e suas implicações para o consumo sustentável. Os dados foram codificados para manter o sigilo dos entrevistados.

5. Resultados

O objeto pesquisado (loja colaborativa compartilhada semelhante a um brechó) compartilha roupas novas (produzidas por produtores locais) e faz o compartilhamento consignado de roupas usadas. O compartilhamento em consignação ocorre da seguinte forma: os clientes retiram peças de roupas indesejadas, do seu próprio guarda-roupa, para serem vendidas na loja. Uma porcentagem da venda vai para a loja, e o cliente é pago em dinheiro ou crédito para comprar roupaslá. A prestação de contas é mensal, e as roupas têm um período de até quatro meses de exposição no estabelecimento.

Mesmo que o foco da pesquisa seja o consumidor, chamado de praticante nas teorias da prática ( Shove & Pantzar, 2005Shove, E. (2010). Beyond the ABC: Climate change policy and theories of social change. Environment and Planning A,4(2), 1273-1285. https://doi.org/10.1068/a42282
https://doi.org/10.1068/a42282...
), a análise da prática tem de ser submetida ao contexto, envolvendo as práticas, os provedores e praticantes, e como as práticas são realizadas ( Jarzabkowski et al., 2015Jackson, T., & Michaelis, L. (2003). Policies for sustainable consumption. Sustainable Development Commission.). Por meio do contexto, é possível identificar os três elementos componentes da prática localizada ( Shove et al., 2012Shove, E., & Pantzar, M. (2005). Consumers, producers and practices: Understanding the invention and reinvention of Nordic walking. Journal of Consumer Culture , 5(1), 43‒64. https://doi.org/10.1177/1469540505049846
https://doi.org/10.1177/1469540505049846...
): materiais (objetos, ferramentas e infraestrutura), competências (conhecimentos e habilidades incorporados) e significados (convenções culturais, expectativas e significados socialmente compartilhados) ( Shove et al., 2012Shove, E., & Pantzar, M. (2005). Consumers, producers and practices: Understanding the invention and reinvention of Nordic walking. Journal of Consumer Culture , 5(1), 43‒64. https://doi.org/10.1177/1469540505049846
https://doi.org/10.1177/1469540505049846...
; Spurling et al., 2013Spaargaren, G., & Oosterveer, P. (2010) Citizen-consumers as agents of change in globalizing modernity: The case os sustainable consumption. Sustainability, 2(7), 1887‒1908. https://doi.org/10.3390/su2071887
https://doi.org/10.3390/su2071887...
).

A pesquisa descobriu que praticantes e provedores apontaram, em grande parte, elementos idênticos nas três categorias. Os demais elementos (não idênticos), foram observados como complementares para a obtenção de um dos outros elementos elencados na pesquisa. Por exemplo, na categoria de elementos materiais, os praticantes citaram objetos decorativos e os provedores mencionaram a música. Esses elementos, somados à iluminação (referida por praticantes e provedores), compõem um ambiente aconchegante que, por sua vez, é indicado como elemento significativo para o compartilhamento de roupas. Outro exemplo de elementos diferentes, mas complementares, agora na categoria de significados: a desmistificação da roupa usada (provedor), relacionada aos elementos de qualidade, exclusividade e curadoria (praticantes), promove o significado de consumo sustentável. Outro aspecto importante, relatado por praticantes e provedores, é o consumo sustentável como elementos de competências e significados. Assim, conforme apresentado por Shove e Pantzar (2005Shove, E. (2010). Beyond the ABC: Climate change policy and theories of social change. Environment and Planning A,4(2), 1273-1285. https://doi.org/10.1068/a42282
https://doi.org/10.1068/a42282...
), a interação entre provedores e praticantes, ambos envolvidos na constituição e reprodução de uma prática, possibilita a realização bem-sucedida de uma prática específica.

Para identificar os elementos que constituem a prática de compartilhar roupas, é necessário elencar e explorar as percepções dos praticantes (subseção 5.1) e dos provedores (subseção 5.2) sobre eles (elementos), pois são esses os agentes (praticantes e provedores) que estabelecem o contexto e a dinâmica da prática (subseção 5.3). Nas páginas a seguir, apresentaremos as principais citações de praticantes e provedores apontando suas percepções sobre os elementos da prática de compartilhar roupas e como esses elementos se articulam dinamicamente entre si para sustentar e estabelecer essa prática.

5.1. Percepção dos praticantes

Os achados da pesquisa mostraram que, para os praticantes, materiais como roupas usadas, etiqueta e objetos decorativos (objetos e ferramentas), iluminação e acesso à internet (infraestrutura), são aspectos importantes na prática do compartilhamento. Quanto às competências, cuidado com as peças, consumo consciente, desapego e autoconhecimento corporal, ilustram como “fazer e reproduzir” ( Shove & Pantzar, 2005Shove, E. (2010). Beyond the ABC: Climate change policy and theories of social change. Environment and Planning A,4(2), 1273-1285. https://doi.org/10.1068/a42282
https://doi.org/10.1068/a42282...
) a prática do compartilhamento. Por fim, os significados evidenciados foram exclusividade, desmistificação do vestuário, economia, qualidade, aconchego e curadoria. A seguir, a Tabela 3 apresenta as verbalizações que ilustram os elementos, na perspectiva dos profissionais.

Tabela 3
Principais resultados dos praticantes

É possível observar que os elementos materiais (objetos e ferramentas e infraestrutura), indicados nas citações da Tabela 3, fazem alusão à loja colaborativa como um lugar aconchegante. O aconchego (significado) está associado a elementos materiais como: objetos decorativos, plantas, livros e adesivo 'Peças com História' (que destaca um aspecto local ao reproduzir a Praia de Iracema, ponto turístico de Fortaleza) e iluminação. Além disso, o adesivo 'Peças com História' também remete às ideias de roupas usadas (materiais) e vintage, vinculando-as dinamicamente à exclusividade, qualidade e à desmistificação das roupas usadas (significados), tanto quanto ao desapego e ao cuidado com as roupas (competências).

A internet (material) é destacada pelos praticantes, conforme Tabela 3, como importante promotora da prática do compartilhamento de roupas. No que se refere ao elemento competência, o cuidado com as roupas, assim como o desapego e a autoconsciência corporal estão relacionados a outro elemento da competência, o consumo consciente. Além disso, a competência de consumo consciente, por sua vez, está diretamente ligada ao elemento que significa consumo consciente, pois, conforme mostra a Tabela 3, o consumo consciente é tanto um elemento de competência quanto um elementosignificado.

Outro significado é a economia, que está relacionada com a qualidade (significado) das roupas usadas (material), com o cuidado com as roupas e com o desapego (competências). De acordo com a Tabela 3, a qualidade está frequentemente associada com a durabilidade e, portanto, com a sustentabilidade. Por fim, temos o elemento significado curadoria que é possibilitado pelo desapego (competência), que em geral está relacionado com a exclusividade e com a qualidade (significados) e, circunstancialmente, com o aconchego (significado). O elemento significado aconchego é proporcionado por diversos elementos materiais.

5.2. Percepção dos provedores

Como elementos materiais que compõem a prática do compartilhamento, os provedores identificaram: roupas usadas, etiquetas, computador e software (objetos e ferramentas), música, iluminação e internet (infraestrutura). As competências apontadas foram: cuidado com as roupas, organização, consumo consciente e autoconhecimento corporal. Quanto aos significados, os destaques foram para exclusividade, desmistificação de roupas usadas e consumo consciente. Na Tabela 4, apresentamos as verbalizações sobre os elementos mencionados pelos provedores.

Tabela 4
Principais resultados dos provedores

Para os provedores, conforme Tabela 4, além das roupas usadas, diretamente relacionadas ao consumo consciente (competência e significado), e à exclusividade (significado) os materiais necessários também contemplam: etiquetas, computadores e softwares; todos associados à organização (competência) que, segundo os provedores, é muito importante para o funcionamento do negócio. Os materiais objetos de decoração, iluminação e música compõem o ambiente acolhedor (significado). A soma de elementos materiais música e roupas usadas em excelente estado (resultado da competência de ‘cuidado com as roupas’), e a percepção de loja 'normal' (resultado do elemento significado de ‘desmistificar roupas usadas’), resume bem a perspectiva dos provedores sobre o negócio de compartilhamento. A internet (material) ganha destaque como meio de organização (competência), de divulgação do empreendimento e canal de comunicação com os clientes.

Quanto às competências elencadas pelos provedores, destacam-se: cuidado com as roupas, organização, consumo consciente e conhecimento corporal. O conhecimento corporal é uma habilidade associada aos elementos significado, exclusividade e desmistificação da roupa usada, todos em prol da sustentação do negócio, em termos financeiros, e do consumo consciente (significado).

5.3. Dinâmica dos elementos da prática

A fim de explorar e descrever detalhadamente como ocorre a dinâmica dos links formados entre os elementos acima identificados, algumas verbalizações retiradas das Tabelas 3 e 4 compuseram a elaboração da Tabela 5. Para Gherardi (2009Foudation Ellen Macarthur (2017). A new textiles economy: Redesingning fashion’s future. Ellen Macarthur Foundation. https://www.ellenmacarthurfoundation.org/assets/downloads/publications/A-New-Textiles-Economy_Full-Report.pdf
https://www.ellenmacarthurfoundation.org...
), a investigação das práticas, na visão sociotécnica, é “de dentro para fora”, ou seja, do ponto de vista do praticante. Como os provedores também praticam o compartilhamento, eles foram classificados como praticantes para a análise da dinâmica dos elementos. A Tabela 5 apresenta algumas das verbalizações as quais indicam as ligações entre os três elementos.

Tabela 5
Dinâmica dos elementos da prática

A Tabela 5 ilustra que há conexão/links entre os três elementos da prática, e destaca a dinâmica simultânea entre eles. Para Shove et al. (2012Shove, E., & Pantzar, M. (2005). Consumers, producers and practices: Understanding the invention and reinvention of Nordic walking. Journal of Consumer Culture , 5(1), 43‒64. https://doi.org/10.1177/1469540505049846
https://doi.org/10.1177/1469540505049846...
), essas conexões indicam que a prática se estabeleceu e que há a formação de um circuito de reprodução que sustenta essa prática. Nas teorias da prática, o objetivo é justamente entender como, por meio de novos links , é possível mudar práticas cotidianas tornando-as mais sustentáveis ( Spurling et al., 2013Spaargaren, G., & Oosterveer, P. (2010) Citizen-consumers as agents of change in globalizing modernity: The case os sustainable consumption. Sustainability, 2(7), 1887‒1908. https://doi.org/10.3390/su2071887
https://doi.org/10.3390/su2071887...
; Sahakian & Whilite, 2013Roy,V., & Singh, S. (2017). Mapping the business focus in sustainable production and consumer literary: Review and research framework. Journal of Cleaner Production , 150(2017), 224‒236. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.03.040
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.0...
).

6. Discussão

Sob a perspectiva da abordagem sociotécnica acerca dos elementos da prática e suas dinâmicas, desenvolvida por Shove et al. (2012Shove, E., & Pantzar, M. (2005). Consumers, producers and practices: Understanding the invention and reinvention of Nordic walking. Journal of Consumer Culture , 5(1), 43‒64. https://doi.org/10.1177/1469540505049846
https://doi.org/10.1177/1469540505049846...
), esta pesquisa avança no entendimento teórico sobre o consumo sustentável ao se basear na experiência real das práticas cotidianas locais. Este estudo contribui para a literatura em três questões. A primeira, está relacionada ao entendimento das práticas locais para analisar o consumo sustentável, respondendo à demanda de Silva e Figueiredo (2020Silva, M. E., & Figueiredo, M. D. (2017). Sustainability as practice: Reflections on the creation of institutional logic. Sustainability, 9(10), 1839. https://doi.org/10.3390/su9101839
https://doi.org/10.3390/su9101839...
). A partir do estudo de caso, foi possível identificar o conjunto de ações e arranjos materiais que constituem a prática do compartilhamento de roupas. Os elementos materiais são: roupas usadas, internet, iluminação, objetos decorativos, música, computador e software. As competências identificadas referem-se ao cuidado com a roupa, organização, consumo consciente, desapego, autoconsciência e consciência corporal. Quanto aos significados, destacam-se: exclusividade, desmistificação da roupa usada, consumo consciente, economia, qualidade, aconchego e curadoria.

A segunda contribuição é alusiva à escassez de estudos empíricos que contemplem uma visão holística do corpo de práticas, que atende ao pedido de Süßbauer e Schäfer (2019Spurling, N., Mcmeekin, A., Shove, E., Southerton, D., & Welch D. (2013). Interventions in practice: Re-framing policy approaches to consumer behavior. Sustainable Practices Research Group report.) e Jarzabkowski et al. (2015Jackson, T., & Michaelis, L. (2003). Policies for sustainable consumption. Sustainable Development Commission.). A pesquisa, localizada em Fortaleza, Ceará (Brasil), apresentou o contexto da prática do compartilhamento de roupas, identificando-a como uma prática de consumo sustentável. Essa constatação ocorreu porque o consumo consciente é destacado por praticantes e provedores, como elementos de significado e competência, evidenciando a reflexividade que envolve o ato de compartilhar roupas: não é só 'dizer' que pratica o consumo consciente, é 'fazer', através de habilidades incorporadas, o consumo consciente factual. A implementação da prática também requer elementos materiais, e a rede de internet (elemento material) foi destacada como meio de divulgação e promoção do consumo compartilhado, além de ser fundamental para a gestão do negócio de compartilhamento.

Por fim, os achados desta pesquisa contribuem para o estudo da moda sustentável por se apoiarem em práticas, uma perspectiva diferente das análises realizadas na literatura, que focam, até então, nos estudos de comportamento do consumidor ( Bellotti & Mora, 2016Bellotti, E., & Mora, E. (2016). Networks of practices in critical consumption. Journal of Consumer Culture, 16(3), 718-760. https://doi.org/10.1177/1469540514536191
https://doi.org/10.1177/1469540514536191...
). Importa ainda salientar que o compartilhamento de roupas tem sido promotor do consumo consciente também em outros domínios de consumo (alimentação, acessórios, produtos de beleza e higiene pessoal, fraldas ecológicas, entre outros) disponíveis na loja colaborativa e nas feiras analisadas; desse modo, o consumo compartilhado foi iniciado ou promovido por um desses domínios de consumos conscientes ( Schäfer et al., 2021Saunders, B., Sim, J., Sim, J., Kingstone, T., Baker, S., Waterfield, J., & Bartlam, B. (2018). Saturation in qualitative research: Exploring its conceptualization and operationalization. Quality & Quantity, 52(4), 1893-1907. https://doi.org/10.1007/s11135-017-0574-8
https://doi.org/10.1007/s11135-017-0574-...
). Esse fato sinaliza a relevância dos significados compartilhados, analisados nas teorias da prática, em detrimento das motivações individuais investigadas no comportamento do consumidor. Isso porque o compartilhamento de roupas não se configurou apenas como uma prática de consumo sustentável, mas também como um vetor que levou ao surgimento de constelações de práticas ( Schatzki, 2019Schatzki, T. R. (2012). A primer on practices. In Practice-based education (Ed.), Practice, education, work and society (pp. 13‒26, Vol. 6). Sense Publishers.) que geraram mudanças comportamentais, por meio de uma consciência coletiva e reflexiva de consumo, promovendo estilos de vida mais sustentáveis.

A partir de uma ótica individualista ( Bellotti & Mora, 2016Bellotti, E., & Mora, E. (2016). Networks of practices in critical consumption. Journal of Consumer Culture, 16(3), 718-760. https://doi.org/10.1177/1469540514536191
https://doi.org/10.1177/1469540514536191...
), a literatura identifica a necessidade de exclusividade (interna) e consumo consciente (externo), como determinantes para aqueles que aderem ao slow fashion ( Liu et al., 2018Lim, W. M. (2017). Inside the sustainable consumption theoretical toolbox: Critical concepts for sustainability, consumption, and marketing. Journal of Business Research , 78, 69-80. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2017.05.001
https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2017.0...
; Erketing & Atik, 2015Erketing, Z., & Atik, D. (2015). Sustainable markets: Motivating factors, barriers, and remedies for mobilization of slow fashion. Journal of Macromarketing, 35(1), 53-69. https://doi.org/10.1177/0276146714535932
https://doi.org/10.1177/0276146714535932...
). Em relação ao consumo de roupas usadas, quatro motivadores são identificados em ordem hierárquica: desejo de exclusividade, possibilidade de bens de alto valor a preços mais acessíveis, nostalgia que as roupas de outros tempos proporcionam (peças vintage) e sustentabilidade ( Roux & Korchia, 2006Rohden, S. F., Durayski, J., Teixeira, A. P. P., Montelongo, A., & Rossi, C. A. V. (2015). Consumo colaborativo: Modismo ou revolução? DESENVOLVE: Revista de Gestão do Unisalle, 4(2), 9‒25. https://doi.org/10.18316/2316-5537.15.1
https://doi.org/10.18316/2316-5537.15.1...
). Vale ressaltar que o slow fashion propõe o uso/compartilhamento de peças de segunda mão, a fim de prolongar sua vida útil e evitar o descarte ( Fletcher & Grose, 2012Fletcher, K., & Grose, L. (2012). Fashion & sustainability. Laurence King Publishing.).

Os achados da atual pesquisa identificam esses quatro motivadores como significados, além de agregar qualidade, aconchego e desmistificar roupas usadas. A necessidade de exclusividade é, sem dúvida, o significado mais apontado; seguido de economia (relação custo-benefício), que está diretamente associada à qualidade da peça; curadoria, relacionada ao estilo (vintage); e, por fim, a sustentabilidade. No entanto, a pesquisa observou que a economia está diretamente ligada à relação preço versus qualidade, e a qualidade está associada à durabilidade da peça. Assim, os significados de economia e qualidade estão atrelados às questões de sustentabilidade e consumo consciente que, por sua vez, são incentivados pela desmistificação das roupas e pelo conforto proporcionado pela loja. Dito isso, a exclusividade e o consumo consciente e sustentável são os significados internos e externos, respectivamente, mais apontados entre aqueles que adotam o compartilhamento de roupas usadas.

Portanto, a partir da análise do contexto, composto por praticantes e provedores e pelo conjunto de ações e arranjos materiais que constituem a prática de compartilhar de roupas em Fortaleza, foi possível verificar que prática de valorização do local, que é baseada nos princípios do slow fashion, permite e promove o consumo mais sustentável de roupas.

7. Conclusões

O uso das teorias da prática para compreender o consumo sustentável enfatiza as práticas locais, realizadas pelos praticantes, como formas promissoras de promover mudanças nos padrões de consumo e descarte. Durante a pesquisa, foi possível identificar que a prática do compartilhamento de roupas, possibilitada pela combinação de materiais, praticantes ativos e qualificados, e significados compartilhados, tem o potencial de aproximar moda e sustentabilidade por meio de um consumo mais reflexivo. Portanto, nossos resultados demonstram a existência de extensão da vida útil das roupas e redução de novas aquisições e descartes rápidos. Ao identificar a dinâmica dos elementos de compartilhar roupas, concluímos que, além de melhorar a experiência dos praticantes com o vestuário e retardar ou impedir a ampliação do uso de recursos, a utilização de uma loja colaborativa promove um novo negócio de moda, menos voltado para a economia, crescimento e mais congruentes com as demandas ambientais, sociais e mentais que o zeigeist no mundo exige, pois a degradação ambiental já atingiu níveis alarmantes.

Quanto às implicações práticas, a pesquisa traz uma visão abrangente sobre ações de compartilhamento como uma prática que deve ser utilizada como referência em outros lugares que propõem o slow fashion e, consequentemente, o consumo sustentável. Nossa pesquisa fornece diretrizes estratégicas eficientes para empresas que oferecem esse tipo de comercialização, não apenas no segmento de vestuário, mas também em geral. Assim, os gestores podem aprimorar suas ações para garantir ações de compartilhamento de roupas em lojas colaborativas entendendo o que foi apresentado aqui como materiais, competências e significados percebidos por praticantes e provedores. É claro que a prática será realizada de forma diferente em outros contextos, porém dinâmicas semelhantes de elementos podem orientar os gestores a tomarem decisões em direção ao consumo sustentável.

Com base nos nossos resultados, e a fim de identificar outras evidências empíricas que possam revelar mais informações sobre a prática, novas pesquisas podem abordar outros contextos e modalidades da prática de compartilhar roupas, bem como outras atividades, inclusive mencionadas neste estudo quando atuam entrelaçadas com a prática do compartilhamento de roupas. Especificamente no campo da moda, sugere-se também explorar, sob a ótica das práticas, outras atividades alternativas, como o upcycling, também conhecido como reuso criativo, e o armário cápsula. Todas essas contribuições podem possibilitar uma melhor compreensão do ODS 12.

Em relação às limitações identificadas na pesquisa, a primeira é a escassez de estudos na área. Praticamente ainda não há debates sobre o compartilhamento de roupas, como prática de consumo sustentável, na perspectiva das teorias da prática, na visão sociotécnica. Outra limitação deve-se ao fato de algumas iniciativas de consumo consciente, como o compartilhamento de roupas, serem muito recentes no Brasil e, principalmente, em Fortaleza, Ceará. Portanto, o campo para análise ainda é pequeno. Outro fator limitante ocorre devido aos vários modelos que podem sistematizar um negócio de compartilhamento de vestuário, pois não há uma definição precisa da modalidade. Como mencionado, tudo nesse campo ainda é muito recente e, em geral, essas inconsistências dificultam o processo de pesquisa.

References

  • Armstrong, C. M., & Lehew, M. L. A. (2011). Sustainable apparel product development: In search of a new dominant social paradigm for the field using sustainable approaches, fashion practice. The Journal of Design, Creative Process & the Fashion Industry, 3(1), 29-62. https://doi.org/10.2752/175693811X12925927157018
    » https://doi.org/10.2752/175693811X12925927157018
  • Arthur, J., Waring, M., Coe, R., & Hedges, L. V. (2012). Research methods and methodologies in education SAGE Publications.
  • Bauman, Z. (2008). Vida para o consumo: A transformação de pessoas em mercadorias Zahar.
  • Bauman, Z., & May, T. (2010). Aprendendo a pensar com a sociologia Zahar.
  • Belk, R. (2014). You are what you can access: Sharing and collaborative consumption online. Journal of Business Research, 67(8),1595-1600. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2013.10.001
    » https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2013.10.001
  • Bellotti, E., & Mora, E. (2016). Networks of practices in critical consumption. Journal of Consumer Culture, 16(3), 718-760. https://doi.org/10.1177/1469540514536191
    » https://doi.org/10.1177/1469540514536191
  • Bengtsson, M., Alfredsson, E., Cohen, M., Lorek, S., & Schroeder, P. (2018). Transforming systems of consumption and production for achieving the sustainable development goals: Moving beyond efficiency. Sustainability Science. 13(6), 1533-1547. https://doi.org/10.1007/s11625-018-0582-1
    » https://doi.org/10.1007/s11625-018-0582-1
  • Bostman, R., & Rogers, R. (2011). What’s mine is yours: How collaborative consumption is changing the way we live HarperCollins Business.
  • Boström, M., & Micheletti, M. (2016). Introducing the sustainability challenge of textiles and clothing. Journal of Consumer Policy, 39, 367-375. https://doi.org/10.1007/s10603-016-9336-6
    » https://doi.org/10.1007/s10603-016-9336-6
  • Bourdieu, P. (1977). Outline of a theory of practice Cambridge University Press.
  • Choi, T. M., & Shen, B. (2017). Luxury fashion retail management: An introduction. In T. M. Choi & B. Shen (Eds.), Luxury fashion retail management Springer.
  • Clark, H. (2008). Slow fashion - an oxymoron- or a promise for the future? Fashion Theory, 12(4), 427-446. https://doi.org/10.2752/175174108X346922
    » https://doi.org/10.2752/175174108X346922
  • Constantinou, C. S., Georgiou, M., & Perdikogianni, M. (2017). A comparative method for themes saturation (CoMeTS) in qualitative interviews. Qualitative Research , 17(5), 571-588. https://doi.org/10.1177/1468794116686650
    » https://doi.org/10.1177/1468794116686650
  • Decrop, A. (1999). Triangulation in qualitative tourism research. Tourism Management, 20, 157-161. https://doi.org/10.1016/S0261-5177(98)00102-2
    » https://doi.org/10.1016/S0261-5177(98)00102-2
  • Diddi, S., Yan, R.-N., Bloodhart, B., Bajtelsmit, V., & McShane, K. (2019). Exploring young adult consumers’ sustainable clothing consumption intention-behavior gap: A behavioral reasoning theory perspective. Sustainable Production and Consumption, 18, 200-209. https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.009
    » https://doi.org/10.1016/j.spc.2019.02.009
  • Erketing, Z., & Atik, D. (2015). Sustainable markets: Motivating factors, barriers, and remedies for mobilization of slow fashion. Journal of Macromarketing, 35(1), 53-69. https://doi.org/10.1177/0276146714535932
    » https://doi.org/10.1177/0276146714535932
  • Feldman, M. S., & Orlikowski, W. J. (2011). Theorizing practice and practicing theory. Organization Science, 22(5), 1240-1253. https://www.jstor.org/stable/41303116
    » https://www.jstor.org/stable/41303116
  • Fletcher, K. (2010). Slow fashion: An invitation for systems change. Fashion Practice, 2(2), 259-265. https://doi.org/10.2752/175693810X12774625387594
    » https://doi.org/10.2752/175693810X12774625387594
  • Fletcher, K. (2017). Local wisdom: Post-growth fashion. The learning network on sustainability (LENS) Greenleaf.
  • Fletcher, K., & Grose, L. (2012). Fashion & sustainability Laurence King Publishing.
  • Foudation Ellen Macarthur (2017). A new textiles economy: Redesingning fashion’s future Ellen Macarthur Foundation. https://www.ellenmacarthurfoundation.org/assets/downloads/publications/A-New-Textiles-Economy_Full-Report.pdf
    » https://www.ellenmacarthurfoundation.org/assets/downloads/publications/A-New-Textiles-Economy_Full-Report.pdf
  • Gherardi, S. (2009). Introduction: The critical power of the ‘practice lens’. Management Learning, 40(2), 115-128. https://doi.org/10.1177/1350507608101225
    » https://doi.org/10.1177/1350507608101225
  • Glaser, B. & Strauss, A. (1967) The discovery of grounded theory: Strategies for qualitative research Aldine Publishing Company.
  • Gupta, S., Wencke, G., & Gentry, J. (2019). The role of style versus fashion orientation on sustainable apparel consumption. Journal of Macromarketing , 39(3), 27614671983528. https://doi.org/10.1177/0276146719835283
    » https://doi.org/10.1177/0276146719835283
  • Hargreaves, T. (2011). Practice-ing behaviour change: Applying social practice theory to pro-environmental behaviour change. Journal of Consumer Culture , 11(1), 79-99. https://doi.org/10.1177/1469540510390500
    » https://doi.org/10.1177/1469540510390500
  • Henninger, C. E., Blazquez Cano, M., Boardman, R., Jones, C., McCormick, H., & Sahab, S. (2020). Cradle-to-cradle vs consumer preferences. In I. Choudhury & S. Hashmi (Eds.), Encyclopedia of renewable and sustainable materials (pp. 353-357). Elsevier.
  • Henninger, C., Brydges, T., Iran, S., & Vladimirova, K. (2021). Collaborative fashion consumption - a synthesis and future research agenda. Journal of Cleaner Production, 319(2), 128648. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2021.128648
    » https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2021.128648
  • Iran, S., & Schrader, U. (2017). Collaborative fashion consumption and its environmental effects. Journal of Fashion Marketing and Management, 21(4), 468-482. https://doi.org/10.1108/JFMM-09-2016-0086
    » https://doi.org/10.1108/JFMM-09-2016-0086
  • Jackson, T. (2008). The challenge of sustainable lifestyles. In Worldwatch Institute (Ed.), State of the word 2008: Innovations for the sustainable economy (pp. 45‒60). W. W. Norton & Company.
  • Jackson, T. (2014). Chapter 18. In G. Atkinson, S. Dietz & E. Neumayer (Eds.), Handbook of sustainable development (pp. 279‒290). Edward Elgar Publishing.
  • Jackson, T., & Marks, N. (1999). Consumption, sustainable welfare and human needs with reference to UK expenditure patterns between 1954 and 1994. Ecological Economics, 28(3), 421-441. https://doi.org/10.1016/S0921-8009(98)00108-6
    » https://doi.org/10.1016/S0921-8009(98)00108-6
  • Jackson, T., & Michaelis, L. (2003). Policies for sustainable consumption Sustainable Development Commission.
  • Jarzabkowski, P., Kaplan, S., Seidl, D., & Whittington, R. (2015). On the risk of studying practices in isolation: Linking what, who, and how in strategy research. Strategic Organization, 14(3), 248‒259. https://doi.org/10.1177/1476127015604125
    » https://doi.org/10.1177/1476127015604125
  • Jung, S., & Jin, B. (2016). Sustainable development of slow fashion business: Customer value approach. Sustainability, 8(6), 3‒15. https://doi.org/10.3390/su8060540
    » https://doi.org/10.3390/su8060540
  • Jung, S., & Jin, B. (2014). A theoretical investigation of slow fashion: Sustainable future of the apparel industry. International Journal of Consumer Studies, 38(5), 510‒519. https://doi.org/10.1111/ijcs.12127
    » https://doi.org/10.1111/ijcs.12127
  • Lang, C., & Joyner Armstrong, C. M. (2018). Collaborative consumption: The influence of fashion leadership, need for uniqueness, and materialism on female consumers’ adoption of clothing renting and swapping. Sustainable Production and Consumption, 13, 37-47. https://doi.org/10.1016/j.spc.2017.11.005
    » https://doi.org/10.1016/j.spc.2017.11.005
  • Legere, A., & Kang, J. (2020). The role of self-concept in shaping sustainable consumption: A model of slow fashion. Journal of Cleaner Production, 258, 120699. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2020.120699
    » https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2020.120699
  • Lim, W. M. (2017). Inside the sustainable consumption theoretical toolbox: Critical concepts for sustainability, consumption, and marketing. Journal of Business Research , 78, 69-80. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2017.05.001
    » https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2017.05.001
  • Liu, C., State, L., Pookulanga, S., & Shephard, A. (2018). Will youg consumers buys fast fashion with the luxury ingrediente of american alligator leather: A study of lifestyle characteristics and motivating factors. Institute for Global Business Research: International Conference Proceedings, 2(1), 129‒132.
  • Mayring, P. (2003). Qualitative content analysis. Forum: Qualitative Social Research, 1(2). https://doi.org/10.17169/fqs-1.2.1089
    » https://doi.org/10.17169/fqs-1.2.1089
  • Mukendi, A., Davies, I., Sarah, G., & McDonagh, P. (2019). Sustainable fashion: Current and future research directions. European Journal of Marketing, 54(11), 2873‒2909. https://doi.org/10.1108/EJM-02-2019-0132
    » https://doi.org/10.1108/EJM-02-2019-0132
  • Nicolini, D. (2017). Practice theory as a package of theory, method and vocabulary: Affordances and limitations. In M. Jonas, B. Littig & A. Wroblewski (Eds.), Methodological reflections on practice oriented theories, (pp. 19‒34). Springer.
  • Niinimäki, K. (2013). Sustainable fashion: New approaches Earthscan.
  • Niinimäki, K., & Hassi, L. (2011). Emerging design strategies in Sustainable Production and Consumption of textiles and clothing. Journal of Cleaner Production , 19(16), 1876‒1888. https://doi.org/10.1016/J.JCLEPRO.2011.04.020
    » https://doi.org/10.1016/J.JCLEPRO.2011.04.020
  • Niinimäki, K., 2017. Fashion in a circular economy. In C. E. Henninger, P.J. Alevizou, H. Goworek & D. Ryding (Eds.), Sustainable fashion a cradle to upcycle approach (pp. 151‒169). Springer.
  • Pedersen, E. R. G., & Netter, S. (2015). Collaborative consumption: Business model opportunities and barriers for fashion libraries. Journal of Fashion Marketing and Management: An International Journal, 19(3), 258-273.
  • Piscicelli, L., Cooper, T., & Fisher, T. (2015). The role of values in collaborative consumption: Insights from a product-service system for lending and borrowing in the UK. Journal of Cleaner Production , 97, 21-29. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2014.07.032
    » https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2014.07.032
  • Pookulangara, S., & Shephard, A. (2013). Slow fashion movement: Understanding consumer perceptions-An exploratory study. Journal of Retailing and Consumer Services, 20(2), 200‒206. https://doi.org/10.1016/j.jretconser.2012.12.002
    » https://doi.org/10.1016/j.jretconser.2012.12.002
  • Reckwitz, A. (2002). The status of the “Material” in theories of culture: From “Social Structure” to “Artefacts”. Journal for the Theory of Social Behaviour, 32(2), 195‒217. https://doi.org/10.1111/1468-5914.00183
    » https://doi.org/10.1111/1468-5914.00183
  • Rohden, S. F., Durayski, J., Teixeira, A. P. P., Montelongo, A., & Rossi, C. A. V. (2015). Consumo colaborativo: Modismo ou revolução? DESENVOLVE: Revista de Gestão do Unisalle, 4(2), 9‒25. https://doi.org/10.18316/2316-5537.15.1
    » https://doi.org/10.18316/2316-5537.15.1
  • Roux, D., & Korchia, M. (2006). Am I what I wear? An exploratory study of symbolic meanings associated with secondhand clothing. Advances in Consumer Research, 33(1), 29‒35.
  • Roy,V., & Singh, S. (2017). Mapping the business focus in sustainable production and consumer literary: Review and research framework. Journal of Cleaner Production , 150(2017), 224‒236. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.03.040
    » https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.03.040
  • Sahakian, M., & Wilhite, H. (2013). Making practice theory practicable: Towards more sustainable forms of consumption. Journal of Consumer Culture , 14(1), 25‒44. https://doi.org/10.1177/14695405135055607
    » https://doi.org/10.1177/14695405135055607
  • Saunders, B., Sim, J., Sim, J., Kingstone, T., Baker, S., Waterfield, J., & Bartlam, B. (2018). Saturation in qualitative research: Exploring its conceptualization and operationalization. Quality & Quantity, 52(4), 1893-1907. https://doi.org/10.1007/s11135-017-0574-8
    » https://doi.org/10.1007/s11135-017-0574-8
  • Schäfer, M., Figueiredo, M. D., Iran, S., Jaeger-Erben, M., Silva, M. E., Lazaro, J. C., & Meißner, M. (2021). Imitation, adaptation, or local emergency?-A cross-country comparison of social innovations for sustainable consumption in Brazil, Germany, and Iran. Journal of Cleaner Production , 284, 124740. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2020.124740
    » https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2020.124740
  • Schatzki, T. R. (2001). Introduction: Practice theory. In T. R. Schatzki, K. Knorr-Cetina, & E. Savigny (Eds.), The practice turn in contemporary (pp. 10-23). Routledge.
  • Schatzki, T. R. (2002). The site of the social: A philosophical account of the constitution of social life and change The Pennsylvania State University Press.
  • Schatzki, T. R. (2005). Peripheral vision: The sites of organizations. Organization Studies, 26(3), 465‒484. https://doi.org/10.1177/0170840605050876
    » https://doi.org/10.1177/0170840605050876
  • Schatzki, T. R. (2012). A primer on practices. In Practice-based education (Ed.), Practice, education, work and society (pp. 13‒26, Vol. 6). Sense Publishers.
  • Schatzki, T. R. (2019). Social change in a material world Routledge.
  • Shen, B., Choi, T. M., & Chow, P. S., (2017). Brand loyalties in designer luxury and fast fashion co-branding alliances. Journal of Business Research , 81, 173-180. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2017.06.017
    » https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2017.06.017
  • Shove, E. (2010). Beyond the ABC: Climate change policy and theories of social change. Environment and Planning A,4(2), 1273-1285. https://doi.org/10.1068/a42282
    » https://doi.org/10.1068/a42282
  • Shove, E., & Pantzar, M. (2005). Consumers, producers and practices: Understanding the invention and reinvention of Nordic walking. Journal of Consumer Culture , 5(1), 43‒64. https://doi.org/10.1177/1469540505049846
    » https://doi.org/10.1177/1469540505049846
  • Shove, E., Pantzar, M., & Watson, M. (2012). The dynamics of social practice: Everyday life and how it changes Sage Publications.
  • Silva, M. E., & Figueiredo, M. D. (2017). Sustainability as practice: Reflections on the creation of institutional logic. Sustainability, 9(10), 1839. https://doi.org/10.3390/su9101839
    » https://doi.org/10.3390/su9101839
  • Silva, M. E., & Figueiredo, M. D. (2020). Practicing sustainability for responsible business in supply chains. Journal of Cleaner Production , 251(4), 119621.
  • Silva, M. E., Oliveira, A. P. G., & Gómez, C. R. P. (2013). Can collaboration between firms and stakeholders stimulate sustainable consumption? Discussing roles in the Brazilian electricity sector. Journal of Cleaner Production , 47, 236‒244.
  • Spaargaren, G., & Oosterveer, P. (2010) Citizen-consumers as agents of change in globalizing modernity: The case os sustainable consumption. Sustainability, 2(7), 1887‒1908. https://doi.org/10.3390/su2071887
    » https://doi.org/10.3390/su2071887
  • Spurling, N., Mcmeekin, A., Shove, E., Southerton, D., & Welch D. (2013). Interventions in practice: Re-framing policy approaches to consumer behavior Sustainable Practices Research Group report.
  • Süßbauer, E., & Schäfer, M. (2019). Corporate strategies for greening the workplace: Findings from sustainability-oriented companies in Germany. Journal of Cleaner Production , 226(1), 564‒577. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2019.04.009
    » https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2019.04.009
  • Sutherland, W., & Jarrahi, M. H. (2018). The sharing economy and digital platforms: A review and research agenda. International Journal of Information Management, 43, 328-341. https://doi.org/10.1016/j.ijinfomgt.2018.07.004
    » https://doi.org/10.1016/j.ijinfomgt.2018.07.004
  • Thorisdottir, T. S., & Johannsdottir, L. (2019). Sustainability within fashion business models: A systematic literature review. Sustainability, 11(8), 2233. https://doi.org/10.3390/su11082233
    » https://doi.org/10.3390/su11082233
  • Trejo, H. X., Smith, H. A., Trejo, N. K., & Lewis, T. L. (2019). Made in New York: A collaborative model to encourage slow fashion. Clothing and Textiles Research Journal, 37(3), 1‒16. https://doi.org/10.1177/0887302X19838331
    » https://doi.org/10.1177/0887302X19838331
  • Tukker, A., Emmert, S., Charter, M., Vezzoli, C., Sto, E., Munch Andersen, M., Geerken, T., Tischner, U., & Lahlou, S. (2008). Fostering change to sustainable consumption and production: An evidence based view. Journal of Cleaner Production , 16(11), 1218-1225. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2007.08.015
    » https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2007.08.015
  • Tunn, V. S. C., Bocken, N. M. P., Van den Hende, E. A., & Schoormans, J. P. L. (2018). Business models for sustainable consumption in the circular economy: An expert study. Journal of Cleaner Production , 212, 324‒333. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2018.11.290
    » https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2018.11.290
  • Vita, G., Lundström, J. R., Hertwich, E. G., Quist, J., Ivanova, D., Stadler, K., & Wood, R. (2019). The environmental impact of green consumption and sufficiency lifestyles scenarios in Europe: Connecting local sustainability visions to global consequences. Ecological Economics, 164(C), 106322. https://doi.org/10.1016/j.ecolecon.2019.05.002
    » https://doi.org/10.1016/j.ecolecon.2019.05.002
  • Wang, C., Ghadimi, P., Lim, M. K., & Tseng, M.-L. (2018). A literature review of sustainable consumption and production: A comparative analysis in developed and developing economies. Journal of Cleaner Production , 206, 741‒754.
  • Warde, A. (2005). Consumption and theories of practice. Journal of Consumer Culture , 5(2), 131‒153. https://doi.org/10.1177/1469540505053090
    » https://doi.org/10.1177/1469540505053090
  • Work Bank (2019). How much do our wardrobes cost to the environment? World Bank. https://www.worldbank.org/en/news/feature/2019/09/23/costo-moda-medio-ambiente
    » https://www.worldbank.org/en/news/feature/2019/09/23/costo-moda-medio-ambiente
  • Yin, R. K. (2014). Case study research: Design and methods (5th ed.). SAGE Publications.

Apêndice - Amostra do roteiro de entrevista

PERFIL PESSOAL

Podemos começar com uma breve introdução sobre você? (incluindo experiência)

Há quanto tempo você participa da loja colaborativa?

Você poderia compartilhar sua história com peças de segunda mão?

O que significa moda sustentável para você?

PRATICANTES

O que uma loja colaborativa como esta, em Fortaleza, significa para você?

Para você, existe alguma diferença entre um espaço colaborativo (loja) e uma loja convencional/fast-fashion? Se sim, qual ou quais?

O que você aprendeu ao escolher usar roupas compartilhadas/de segunda mão?

PROVEDORES

O que o levou a investir em uma loja colaborativa?

Qual a diferença entre uma loja colaborativa e uma loja convencional/fast-fashion?

Para gerenciar essa loja colaborativa, você precisou aprender alguma coisa em particular?

Editado por

EDITOR CHEFE

Talles Vianna Brugni https://orcid.org/0000-0002-9025-9440

EDITOR ASSOCIADO

Emerson Mainardes https://orcid.org/0000-0003-2525-275X

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    24 Jan 2022
  • Revisado
    29 Abr 2022
  • Aceito
    18 Jul 2022
  • Publicado
    24 Abr 2023
Fucape Business School Av. Fernando Ferrari, 1358, Boa Vista, 29075-505, Vitória, Espírito Santo, Brasil, (27) 4009-4423 - Vitória - ES - Brazil
E-mail: bbronline@bbronline.com.br