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As participações governamentais na indústria do petróleo sob a perspectiva do estado-membro: importância econômica, natureza jurídica e possibilidade de fiscalização direta

Resumos

As participações governamentais, introduzidas pelo § 1º do artigo 20 da constituição de 1988, têm a natureza jurídica de compensação financeira pela exploração e produção de petróleo, por se tratar de recursos finitos e com sérios problemas ambientais. neste contexto, o presente artigo procura analisar a participação dos entes federativos no resultado da arrecadação de todas as espécies de participação governamental, previstas pela lei nº 9.478/97 (lei do petróleo). Objetiva-se demonstrar que cabe ao estado-membro exercer diretamente a fiscalização de suas próprias participações governamentais, sem implicar em colisão com o papel regulador da Agência Nacional de Petróleo- ANP, sendo, ao revés, atividades harmônicas e complementares.

Participações governamentais; indústria do petróleo no brasil; histórico; evolução legislativa; importância econômica; natureza jurídica das participações governamentais; formas de fiscalização; possibilidade de fiscalização direta pelo estado-membro; papel da agência nacional do petróleo (ANP)


The government take, introduced by the brazilian constitution in its article 20, paragraph 1º, is legally treated as financial compensation for the exploration and production of oil, due to the serious environmental impacts associated with the activity and given the nature of oil as a finite resource. in this context, this article aims to analyze the distribution amongst states of all levels of government take maintained by the law nº 9.478/97 (oil law). It is each member states' responsibility to directly audit its share of the government take, and this does not imply a necessary collision with anp's regulatory role. In fact, anp's and states' activities should be harmonious and complementary.

Governmet take; brazilian oil industry; oil legislation development in brazil; legal nature; economic relevance; brazlian oil agency


ARTIGOS

As participações governamentais na indústria do petróleo sob a perspectiva do estado-membro: importância econômica, natureza jurídica e possibilidade de fiscalização direta

The government take in Brazilian oil industry under the view of the state

Fabricio do Rozario Valle Dantas LeiteI, II, III, IV, V, VI

IProcurador do estado do rio de janeiro

IISubsecretário de fazenda para assuntos jurídicos do estado do Rio de Janeiro

IIIRepresentante da fazenda no conselho de contribuintes do Estado do Rio de Janeiro

IVMembro efetivo do Instituto dos advogados brasileiros

VMembro do Instituto brasileiro de advocacia pública

VIAdvogado

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rua da Alfandega, 42, 1º andar Centro Rio de Janeiro - RJ - Brasil fabricio.do@terra.com.br

RESUMO

As participações governamentais, introduzidas pelo § 1º do artigo 20 da constituição de 1988, têm a natureza jurídica de compensação financeira pela exploração e produção de petróleo, por se tratar de recursos finitos e com sérios problemas ambientais. neste contexto, o presente artigo procura analisar a participação dos entes federativos no resultado da arrecadação de todas as espécies de participação governamental, previstas pela lei nº 9.478/97 (lei do petróleo). Objetiva-se demonstrar que cabe ao estado-membro exercer diretamente a fiscalização de suas próprias participações governamentais, sem implicar em colisão com o papel regulador da Agência Nacional de Petróleo- ANP, sendo, ao revés, atividades harmônicas e complementares.

Palavras-chave: Participações governamentais; indústria do petróleo no brasil; histórico; evolução legislativa; importância econômica; natureza jurídica das participações governamentais; formas de fiscalização; possibilidade de fiscalização direta pelo estado-membro; papel da agência nacional do petróleo (ANP)

ABSTRACT

The government take, introduced by the brazilian constitution in its article 20, paragraph 1º, is legally treated as financial compensation for the exploration and production of oil, due to the serious environmental impacts associated with the activity and given the nature of oil as a finite resource. in this context, this article aims to analyze the distribution amongst states of all levels of government take maintained by the law nº 9.478/97 (oil law). It is each member states' responsibility to directly audit its share of the government take, and this does not imply a necessary collision with anp's regulatory role. In fact, anp's and states' activities should be harmonious and complementary.

Keywords: Governmet take; brazilian oil industry; oil legislation development in brazil; legal nature. economic relevance; brazlian oil agency

INTRODUÇÃO

A configuração jurídica da indústria petrolífera1 1 A Lei nº 9.478, de 06.08.97, no artigo 6º, inciso XIX, define indústria do petróleo como o "conjunto de atividades econômicas relacionadas com a exploração, desenvolvimento, produção, refino, processamento, transporte, importação e exportação de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos e seus derivados". O conceito legal será adotado ao longo do presente estudo. brasileira passou por alterações significativas ao longo das últimas décadas. Com o intuito de atrair investimentos, foi desenhado um novo modelo legislativo para acompanhar o desenvolvimento econômico do setor.

Desde o início da exploração efetiva de petróleo em território nacional, na década de 1930, com as perfurações dos primeiros poços economicamente viáveis na Bahia, até a auto-suficiência da produção, atingida em 2006,2 2 Como afirmam alguns especialistas, com base no déficit apresentado pela balança comercial do petróleo nos últimos anos, atingir a auto-suficiência da produção de petróleo não é o mesmo que manter a auto-suficiência sustentada do produto, principalmente pela necessidade de se importar petróleo qualitativamente superior ao produzido no Brasil e, conseqüentemente, com preços superiores. O presente artigo, no entanto, não é o local adequado para o desenvolvimento desta complexa questão, motivo pelo qual utilizaremos o termo apenas como um marco histórico. após o início das operações da FPSO (Floating Production Storage Offloading) P-50 no campo de Albacora Leste, no norte da Bacia de Campos (RJ), o setor de petróleo e gás natural viveu sob a égide de disciplinas jurídicas distintas.

Duas se destacam, em especial: o monopólio estatal das principais atividades da indústria, exercido através da Petróleo Brasileiro S.A. - Petrobras,3 3 Por questões mercadológicas, a sigla da empresa perdeu a acentuação gráfica a partir de 1994. que "agia isolada do mercado";4 4 "Tanto isto é verdade que todas as decisões, inclusive de preços e custos, eram definidas na perspectiva de um grande agente do mercado, mas que não tinha a possibilidade de ver constatadas as suas decisões internas de imposição de políticas". JOBIM, Nelson. "Aspectos jurídicos da abertura do mercado de petróleo", in Estudos e pareceres - direito do petróleo e gás. Marilda Rosado de Sá Ribeiro (org.), Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 395. e a possibilidade de participação do capital privado, sob regime regulatório, decorrente da total incapacidade de o poder público fazer frente aos vultosos investimentos que o desenvolvimento da indústria passou a exigir.

A partir da criação, pela Lei nº 2.004, de 03 de outubro de 1953, da Petrobras, o mercado brasileiro passou a ser influenciado por um único agente, em uma intervenção monopolista que atravessou as duas grandes crises do petróleo pós 1960, recebeu status constitucional com a Carta de 19675 5 Em 1976, como reflexo da crise mundial do petróleo de 1973 e da falta de investimentos no setor de exploração e produção, passou-se a adotar no Brasil os contratos de risco que "se constituíam como contratos de adesão, mediante os quais empresas ou consócios brasileiros ou estrangeiros prestavam serviços de exploração de petróleo à Petrobrás, executora do monopólio estatal do petróleo, nos termos da Lei 2.004/53. Os contratos previam que, na fase de produção, a operação ficaria a cargo da Petrobrás e que as empresas teriam participação no resultado" (BUCHEB, José Alberto. Direito do Petróleo: a Regulação das Atividades de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, pp. 3-4). Este modelo, que não mitigou o monopólio da Petrobras (continuava executora única da fase de produção, sendo permitido a contratação de serviços apenas para as fase de estudos de exploração), foi expressamente proibido pela redação original do §1º do artigo 177 da Constituição de 1988, com a exceção dos contratos já celebrados até aquela data, nos termos do parágrafo único do artigo 45 do ADCT. e perdurou até a regulamentação da Emenda Constitucional nº 09/95, pela Lei nº 9.478, em 06 de agosto de 1997.6 6 A edição da Emenda Constitucional nº 09/95 ultrapassou debates políticos acalorados, principalmente por focar uma indústria, em cujo bojo a defesa da soberania e do protecionismo estratégico foi uma bandeira nacionalista defendida ao longo de décadas. Por todos, ficamos com a fina ironia de Monteiro Lobato que, crítico da política de petróleo de então, escreve, em 1936, O Escândalo do Petróleo e do Ferro e, logo em sua introdução, ataca: "Os trusts sabem tudo e sorriem lá entre si. Sabem que a partir de 1930 o brasileiro cada vez menos se utiliza do cérebro para pensar, como fazem todos os povos. Sabem que os nossos estadistas dos últimos tempos positivamente pensam com outros órgãos que não o cérebro - com o calcanhar, com o cotovelo, com certos penduricalhos - raramente com os miolos(...)". in LOBATO, José Bento Monteiro. O escândalo do petróleo e do ferro. São Paulo: Brasiliense, 1979, p. 11.

A flexibilização do monopólio,7 7 A flexibilização do monopólio do petróleo foi atacada pelo Governador do Estado do Paraná, através da propositura da ADI 3273-9 DF, em que se sustentou, em linhas gerais, que a transferência de propriedade dos hidrocarbonetos após a extração ao concessionário, tal como prevista no artigo 26 da Lei nº 9.478/97, iria de encontro aos artigos 20 e 177 da Constituição. A tese foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, por maioria, em síntese porque "a distinção entre atividade e propriedade permite que o domínio do resultado da lavra das jazidas de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluídos possa ser atribuída a terceiros pela União, sem qualquer ofensa à reserva de monopólio [art. 177 da CB/88]", como afirmou o Ministro Eros Grau em seu voto condutor, que, na mesma oportunidade, também julgou improcedente a ADI 3366, proposta com argumentos semelhantes, pelo Partido Democrático Trabalhista - PDT, considerando que "seriam desastrosas, para a economia nacional, as conseqüências de eventual declaração de inconstitucionalidade do artigo 26, caput, da Lei n. 9.478/97." por sua vez, permitiu o aporte de recursos privados em um setor, cuja viabilidade econômica de crescimento estava limitada pela insuficiência de recursos públicos, e possibilitou o desenvolvimento das atividades de exploração e produção do petróleo (upstream), em direção à auto-suficiência sustentável de uma das mais importantes indústrias do setor de infra-estrutura nacional, marco este que ainda se busca no tocante ao gás natural.

A participação das empresas privadas nas atividades de upstream foi regulamentada8 8 Artigo 23 da Lei nº 9.478/98. através de um modelo de concessão, identificado pelo direito internacional como de natureza sui generis,9 9 SOUTO. Marcos Juruena Villela. Direito Administrativo das Concessões. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, pp. 84/85. porque, muito embora a denominação equívoca, não se aplicam ao contrato de concessão de petróleo e gás natural os princípios inerentes aos contratos administrativos, e tampouco as disposições da Lei nº 8.987/95.10 10 No mesmo sentido, discorre Carlos Ari Sundfeld: "A chamada Lei de Concessões (...) não se aplica ao Direito do Petróleo, já que não se trata de concessão de serviços público, mas de outro tipo de privilégio. A Lei do Petróleo trata exaustivamente da concessão de exploração da produção de petróleo, de maneira a excluir a aplicação da Lei de Concessões". "Regime jurídico do setor petrolífero", in Direito Administrativo Econômico. Carlos Ari Sundfeld (coord.), São Paulo: Malheiros, 2002, p. 393.

Ao revés, o contrato de concessão de petróleo e gás natural possui natureza jurídica híbrida: é regido pelo direito privado, mas possui contornos de direito público, na medida em que observa preceitos constitucionais e seus reflexos infralegais.11 11 A natureza jurídica do referido contrato causa enorme controvérsia no Brasil, com reflexos negativos na segurança dos investimentos privados, como bem observa Marilda Rosado de Sá Ribeiro: "No tocante ao debate acerca da natureza jurídica do contrato de concessão para exploração e produção de petróleo e gás, o posicionamento da indústria petrolífera pode ser sintetizado nos argumentos do advogado Sílvio Rodrigues, como coordenador do Subcomitê Jurídico do IBP, para quem é mais interessante a posição defendida por Toshio Mukai, no sentido de que o contrato de concessão brasileiro deva ser classificado como de Direito Privado, e não como um contrato administrativo, eis que a ANP atua no âmbito de uma atividade econômica. Por outro lado, a matéria é controvertida, pois se nos contratos administrativos vige o princípio da supremacia do interesse público, indaga-se se seria possível ao Estado - representado pela ANP - alterar, unilateralmente, as normas que vigem no contrato, ou ainda denunciá-lo, também de forma unilateral. Por estes fundamentos, observa-se que a classificação do contrato de concessão como de Direito Administrativo pode ser crítica para os investidores, pois estes buscam uma estabilidade de investimentos." RIBEIRO. Marilda Rosado de Sá. Direito do Petróleo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 340. Confira, ainda: ARAGÃO. Alexandre Santos de. "As Concessões e Autorizações Petrolíferas e o Poder Normativo da ANP", in Revista de Direito da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro. Marcos Juruena Villela Souto (coord.), Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, pp. 33-63; MUKAI. Toshio Mukai. "Contrato de Concessão Formulado pela Agência Nacional do Petróleo - Comentários e Sugestões", in RTDP 25/82-93; OLIVEIRA. Regis Fernandes de. Curso de Direito Financeiro. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2006. É regido pelo direito privado, com atuação do Estado como agente econômico (empresário) e tendo a natureza de contrato econômico e não de contrato administrativo,12 12 SOUTO. Marcos Juruena Villela. op. cit. pp. 84-85. mas possui inserções de normas de direito público.13 13 OLIVEIRA. Regis Fernandes de. op. cit., p. 213-214.

Por este modelo, a União mantém o domínio sobre as reservas minerais, transferindo às empresas concessionárias as atividades de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural, e passando a desempenhar as funções de definição da política energética, através do Conselho Nacional de Política Energética - CNPE, e regulatória, por meio da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis - ANP.

Enquanto isso, o concessionário possui o direito de exercer as atividades de exploração e produção de petróleo, por sua conta e risco, utilizando equipamentos e instalações próprias, e detendo a propriedade do petróleo e do gás, após a sua extração.

Um importante aspecto do modelo que se passou a adotar, até pelos altos valores econômicos que a indústria movimenta, é a forma de remuneração a ser imposta aos concessionários (government take). E, neste particular, a estrutura legislativa brasileira não inovou muito em relação ao que normalmente se pratica em outros países, exigindo-se do concessionário o pagamento de tributos e participações governamentais (Royalty/Tax - R/T).

E é justamente em relação às participações governamentais que reside o objeto precípuo do presente estudo. Mais precisamente na forma de fiscalização destas receitas, cuja importância ultrapassa a barreira arrecadatória, por se tratar de compensação financeira pela exploração de recursos finitos e de uma indústria com sérios resíduos ambientais.

Considerando a importância econômica que estas receitas alcançaram com o forte desenvolvimento da indústria na última década, aquecida por pesados investimentos privados, e sua evolução legislativa, com a entrada em vigor da Lei nº 9.478/97, referenciada como o início da 4ª fase da legislação brasileira de petróleo e seu marco regulatório,14 14 BARRETO. Celso de Albuquerque. "Geopolítica do petróleo: Tendências mundiais pós guerra do Iraque de 2003. Brasil: situação e marco regulatório", in Estudos e pareceres - direito do petróleo e gás. Marilda Rosado de Sá Ribeiro (org.), Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 17. iremos enfocar o papel do Estado-membro na participação e fiscalização destas receitas e as relações desta fiscalização com a atuação da ANP, como agente regulador do setor.

A partir de uma análise acerca da natureza jurídica das compensações financeiras, introduzidas pelo § 1º do artigo 20 da Constituição de 1988, o presente estudo procurará demonstrar que a fiscalização direta pelo Estado-membro de suas próprias participações governamentais não colide com o papel regulador da ANP, sendo, ao revés, harmônica e complementar.

A questão, no entanto, enseja enormes divergências na literatura científica e até mesmo de cunho político, pois envolve pelo menos quatro personagens em torno de uma das mais relevantes indústrias do mundo: de um lado, a União e o papel regulador da ANP; de outro lado os Estados, o Distrito Federal e os Municípios e sua dependência das verbas oriundas de tais compensações financeiras; e, finalmente, as empresas que exploram tais atividades, dentre as quais a própria Petrobras, que deixa de exercer as obrigações de regulação, passa a se sujeitar às regras gerais da Lei das Sociedades Anônimas e a atuar em regime de livre concorrência com as demais empresas privadas que vierem a explorar o setor.

Devido à complexidade do tema e por questões didáticas, o presente estudo irá se subdividir nos itens que abaixo se alinham.

1 A IMPORTÂNCIA ECONÔMICA DAS PARTICIPAÇÕES GOVERNAMENTAIS

A PARTIR DA EVOLUÇÃO DO MODELO LEGISLATIVO DA INDÚSTRIA

O contexto econômico vem sendo fator determinante para a definição do contorno legislativo da indústria do petróleo em nosso país, em especial após a flexibilização do monopólio, em que as principais atividades do setor passaram a se submeter à livre concorrência e a conviver com o dinamismo próprio da economia, exigindo uma resposta normativa rápida e eficiente.15 15 Como afirma Alexandre Santos de Aragão, "a economia, ainda mais em uma conjuntura globalizada, que alguns chegam a chamar de pós-moderna, possui um dinamismo, uma mutabilidade, que nenhum outro setor da sociedade possui. Se o ramo do Direito que corresponde à regulação da economia também não tivesse estas características, estaria fadado a produzir uma regulação ineficiente e descompassada temporalmente em relação aos fatos e às atividades a serem reguladas". In "Princípios de direito regulatório do petróleo", in Estudos e pareceres - direito do petróleo e gás. Marilda Rosado de Sá Ribeiro (org.), Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 313.

Esta afirmativa é facilmente comprovada, observando-se a relação entre a evolução da produção e do consumo de petróleo no Brasil e as modificações legislativas na indústria, desde a década de 1970 e suas crises mundiais, até os tempos atuais e a auto-suficiência produtiva, como se verifica no gráfico abaixo:

As recentes descobertas na camada do pré-sal, aliadas a uma conjuntura econômica internacional em que o preço do petróleo encontra-se em franca curva ascendente, permitindo a exploração de jazidas antes consideradas economicamente inviáveis, deverão, inclusive, impor novas alterações legislativas no setor. Já há discussões a respeito da possibilidade de, ao lado do modelo de concessão tradicional, adotarem-se outras opções com a finalidade de reduzir riscos e custos, tanto de capital, quanto operacionais (capex e opex).16 16 Principalmente o contrato de partilha de produção, que tem sido defendido pelo atual Presidente da Petrobras, como a modalidade "asseguradora de maior segurança para o Estado brasileiro" ( in PRATES. Jean-Paul. "Brasil pós-pré-sal: partilha não paga royalties, entre outras coisas". Artigo publicado no sítio www.oglobo.globo.com/blogs/ petroleo/post.asp?cod_post= 110375. Consulta em 03.07.08). A adoção deste modelo poderá gerar impactos significativos na arrecadação de participações governamentais, pois, em seu desenho tradicional, a obrigação imposta à empresa contratante de financiar por sua conta e risco o desenvolvimento da área contratada é remunerada através de uma parcela líquida da produção ( profit oil), após a dedução dos custos da produção ( cost oil). É de se notar que, por força do disposto no § 1º do art. 20 da Constituição, a adoção deste modelo exige lei regulamentadora específica e há de haver a participação das unidades federativas e dos órgãos da administração direta da União no resultado do profit oil. Esta discussão, entretanto, ainda é incipiente e a adoção desta nova modalidade encontra fundada resistência, inclusive, dentro da própria ANP (Cf.: Nota Técnica nº 021/2007-SCM).

Como se observa, portanto, a perspectiva da indústria nacional do petróleo no cenário econômico atual é de se aproximar cada vez mais dos investimentos privados.17 17 Segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro do Petróleo, Gás e Biocombustíveis - IBP - a indústria nacional de petróleo, em 10 anos de vigência da Lei nº 9.478/97, apresentou um crescimento extraordinário, evoluindo de cerca de 2% para 10% do PIB, sendo que boa parte deste crescimento foi impulsionado pela própria Petrobras. In TEIXEIRA. Álvaro. "Perspectivas do Setor do Petróleo Pós-Descobertas do Pré-Sal". Palestra apresentada no IV Seminário de Petróleo e Gás no Brasil, em 14 de abril de 2008, na Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro. Neste contexto, as participações governamentais tendem a aumentar em importância, formando, assim, parcela indispensável da receita pública.

As participações governamentais na indústria do petróleo possuem base constitucional no § 1º do artigo 20, que assegura aos Estados, Distrito Federal e Municípios e órgãos da administração direta da União "participação no resultado da exploração" de recursos naturais, modalidade ainda não regulamentada, "ou compensação financeira por essa exploração", nos termos da lei, no caso, a já citada Lei nº 9.478/97.

Com critérios de cálculo e cobrança regulamentados pelo Decreto nº 2.705/98, as referidas participações governamentais podem ser de quatro espécies: (i) bônus de assinatura (artigo 46 da Lei nº 9.478/97); (ii) royalties (artigo 47 da Lei nº 9.478/97); (iii) participação especial (artigo 50 da Lei nº 9.478/97); e (iv) pagamento pela ocupação ou retenção da área (artigo 51 da Lei nº 9.478/97).

O bônus de assinatura é o pagamento de valor oriundo da conquista da licitação promovida pela ANP, para a produção e exploração de petróleo e gás natural, que tem valor mínimo previsto no edital e deverá ser pago em parcela única no ato da assinatura do contrato de concessão.

Possui, portanto, valor mínimo fixado em edital pela ANP e parcela de sua destinação serve para compor a receita própria da autarquia, de acordo com suas necessidades operacionais, definidas em orçamento previamente aprovado, como prevê o inciso II do artigo 15 da Lei nº 9.478/97, regulamentado pelo artigo 10 do Decreto nº 2.705/98.18 18 A autonomia financeira da ANP, por exercer a atividade de regulação, não só é desejável, como necessária. Porém, as formas de financiamento, como previsto na Lei nº 9.478/97, não encontram referibilidade nas distintas atividades desempenhadas pela Agência. Vejamos, a respeito, o que discorrem Marcos André Vinhas Catão e Julio Salles Costa Janolio: "vemos que não há qualquer correlação entre as receitas disponibilizadas à ANP, por meio dos arts. 15 e 16 da Lei nº 9.478/97, e os respectivos custos inerentes a qualquer uma dessas atuações, o que leva à conclusão da necessidade de se encontrar um novo modelo que possa servir de base ao financiamento das atividades empreendidas pela ANP". In "O financiamento das atividades empreendidas pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) e sua respectiva autonomia financeira, in. Tributação no Setor de Petróleo. Heleno Taveira Tôrres e Marcos André Vinhas Catão (coord.). São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 98.

Estas são a definição e a destinação legais. Não há qualquer previsão expressa na lei ou na regulamentação de critérios para a participação dos outros entes federativos no resultado da arrecadação. A legislação não prevê, por exemplo, a hipótese de ocorrer excedente de valor pago, já que o edital fixa apenas o valor mínimo, com parâmetros de discricionariedade técnica definidos pela ANP, em razão das especificidades dos blocos e com o intuito de promover uma prévia seleção da capacidade financeira das empresas que irão celebrar os contratos de concessão.19 19 Neste sentido, esclarece José Gutman: "O bônus de assinatura tem seu valor mínimo estabelecido no edital de licitação ( ex vi do art. 46 da Lei do Petróleo), sendo certo que, apesar da ausência de norma expressa, tal fixação pela ANP é ato discricionário, devendo-se orientar pela conveniência e oportunidade, sem jamais se afastar do razoável e do proporcional. Orientada por esta ratio, vem a ANP fixando, desde a Primeira Rodada de Licitação, valores mínimos diferenciados, contemplando as especificidades dos blocos. Por óbvio, aos blocos terrestres de bacias maduras, que podem vir a interessar apenas às pequenas empresas, é atribuído um valor mínimo mais baixo do que, por exemplo, aos blocos marítimos em água profunda, que só poderão vir a ser operados por empresas com experiência nesta restrita tecnologia (i. e. empresas com 'grande poder de fogo', capazes de investir cerca de 20 milhões ou mais num poço exploratório, com risco de insucesso)." In Tributação e Outras Obrigações na Indústria do Petróleo. Rio de Janeiro: Freitas Bastos: Maria Augusta Delgado, 2007.

Como o bônus de assinatura se insere no gênero legal das participações governamentais que, por sua vez, é parte do conceito constitucional de compensação financeira pela exploração dos recursos minerais,20 20 Como afirma José Gutman, "o bônus de assinatura, tal qual as demais participações governamentais instituídas pela Lei do Petróleo, é uma compensação financeira (...)" in op. cit. p. 86. os valores excedentes desta receita, ou seja, aqueles que forem superiores ao valor mínimo fixado em edital e que, ademais, sejam superiores às necessidades orçamentárias da ANP, deverão ser repartidos, na forma prevista no § 1º do artigo 20 da Constituição.

A aparente omissão legal, ao contrário do que vem sendo praticado desde a primeira rodada de licitação promovida pela ANP, é insuficiente para afastar a participação dos Estados, Distrito Federal e Municípios no resultado da arrecadação da referida compensação financeira.21 21 Como decidiu o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do MS nº 24.312-RJ - que será analisado com maior detalhe no próximo item -, as participações governamentais são compensações financeiras previstas no § 1º do artigo 20 da Constituição, configurando receita originária dos entes federativos. Não se trata, pois, de verba de repasse voluntário por parte da União, sendo a repartição entre Estados, Distrito Federal e Municípios obrigatória. Em seu voto, o Ministro Gilmar Mendes chega a afirmar: "que se trata de um direito subjetivo da unidade federada. Trata-se de receita originária que lhe é confiada diretamente pela Constituição. Cabe à lei disciplinar todo esse procedimento (...) Não há nenhuma dúvida, inclusive para o legislador, de que não se trata de um repasse voluntário (...)"

E os valores não são desprezíveis. Ao revés, segundo dados da ANP,22 22 Consulta ao sítio www.anp.gov.br/doc/participações_governamentais/consolidado_2007.pdf. Acesso em jul 2008. a arrecadação de bônus de assinatura, abrangendo as nove rodadas de licitações de blocos exploratórios e as duas rodadas de licitações de áreas inativas de acumulação marginal, de 1999 a 2007, totaliza a quantia de R$ 5.371.000.000,00 (cinco bilhões e trezentos e setenta e um milhões de reais), sendo que, somente em 2007, a arrecadação foi de R$ 2.101.000.000,00 (dois bilhões e cento e um milhão de reais).

Os royalties incidentes sobre a indústria do petróleo, por sua vez, constituem compensação financeira devida pelos concessionários de exploração e produção de petróleo ou gás natural, e serão pagos mensalmente, com relação a cada campo, a partir do mês em que ocorrer a respectiva data de início da produção, vedadas quaisquer deduções.23 23 SANTOS, Sérgio Honorato. Royalties do Petróleo à luz do direito positivo. Rio de Janeiro: Esplanada, 2002, p. 80

Os critérios para cálculo do valor devido estão previstos no Decreto nº 2.705/98 e levam em consideração conceitos técnicos, como as especificações do produto, localização dos campos e preços de referência do petróleo ou gás natural no mercado, com alíquota básica fixada em 10% (dez por cento), podendo a ANP reduzi-la até um mínimo de 5% (cinco por cento) em função dos riscos geológicos, expectativas de produção e outros fatores. A forma de divisão entre as unidades federativas varia de acordo com a alíquota aplicada e a localização da lavra (plataforma continental ou em terra).

Sua importância econômica, a partir da flexibilização do monopólio das atividades de upstream, vem aumentando expressivamente,24 24 GUTMAN. José. op. cit., p. 09 atingindo, segundo dados da ANP,25 25 Consulta ao sítio www.anp.gov.br/doc/participações_governamentais/consolidado_2007.pdf. Acesso em jul 2008. o valor total de R$ 39.400.000.000,00 (trinta e nove bilhões e quatrocentos milhões de reais), neste período, ou seja, de 1997 a 2007.

A participação especial é a compensação extraordinária devida pelos concessionários de exploração e produção de petróleo ou gás natural, nos casos de grande volume de produção ou de grande rentabilidade.

Sua apuração é trimestral e incide sobre a receita bruta da produção, deduzidos os royalties, os investimentos da exploração, os custos operacionais, a depreciação e os tributos previstos na legislação. As alíquotas adotadas são progressivas de acordo com a localização da lavra, número de anos de produção e volume de produção fiscalizada no trimestre.

Do valor arrecadado, a União detém 50%; o Estado onde ocorrer a produção em terra ou confrontante com a plataforma continental em que se realizar a produção fica com 40%; enquanto o Município onde ocorrer a produção em terra, ou confrontante com a plataforma continental, na qual se realizar a produção, perceberá 10% da arrecadação.

Os expressivos valores arrecadados atualmente se situam na mesma ordem de grandeza dos royalties.26 26 GUTMAN. José. op. cit. p. 55. De acordo com a ANP,27 27 Consulta ao sítio www.anp.gov.br/doc/participações_governamentais/consolidado_2007.pdf. Acesso em jul 2008. de 2000 a 2007, foi arrecadado o valor total de R$ 38.500.000.000,00 (trinta e oito bilhões e quinhentos milhões de reais), sendo que, somente em fevereiro de 2008, foi arrecadado o valor de R$ 2.166.529.915,13 (dois bilhões cento e sessenta e seis milhões quinhentos e vinte e nove mil e novecentos e quinze reais e treze centavos), a título de participação especial, relativo ao período de competência do 4º trimestre de 2007.

O pagamento pela ocupação ou retenção da área, segundo dispõe o artigo 51 da Lei nº 9.478/97, é realizado anualmente e tem o valor fixado por quilômetro quadrado ou por fração da superfície do bloco, no edital e no contrato.

Mais uma vez, como ocorre com o bônus de assinatura, não há previsão de critério legal para a repartição do resultado da arrecadação com todas as unidades da federação, em clara violação ao § 1º do artigo 20 da Constituição. Pelo contrário, o artigo 16 da Lei nº 9.478/97, prevê que os recursos arrecadados com esta participação governamental serão exclusivamente utilizados para o financiamento das despesas da ANP no exercício de suas atividades, desconsiderando a imposição constitucional de repartição com os demais entes.28 28 O pagamento pela ocupação ou retenção de área não é um contrato de aluguel de bem. É, ao revés, uma obrigação que nasce de um contrato: a concessão para o exercício de atividade econômica ( upstream), cujo propósito primordial, como afirma José Gutman, "é o de encorajar o abandono voluntário da área de concessão pelo concessionário que não estiver fazendo esforços exploratórios ou que não possuir interesse em desenvolver a produção" ( in op. cit. p. 101). Não se trata, portanto, de valor pago por aluguel de bem patrimonial da União, o que poderia afastar, em tese, a participação dos demais entes. Como afirma o Ministro Eros Grau no julgamento da ADI nº 3273-9 DF, " Atividades e bens, uma coisa distinta da outra. (...) o conceito de atividade econômica [enquanto atividade empresarial] prescinde da propriedade dos bens de produção". E, nas palavras de José Gutman, "a participação pela ocupação ou retenção de área, tal qual as demais participações governamentais instituídas pela Lei do Petróleo, é uma compensação financeira, não sendo, portanto, uma receita tributária.". ( op. cit., p. 98)

E, mais uma vez, os valores envolvidos não são desprezíveis: segundo dados da ANP,29 29 Consulta ao sítio www.anp.gov.br/doc/participações_governamentais/consolidado_2007.pdf. Acesso em jul 2008. entre 1998 e 2007, o valor total arrecadado corresponde a R$ 1.121.000.000,00 (um bilhão e cento e vinte e um milhões de reais), sendo que no início da arrecadação desta receita, em 1998, arrecadava-se um valor em torno de R$ 28.957.315,00 (vinte e oito milhões novecentos e cinqüenta e sete mil trezentos e quinze reais), enquanto, em 2007, o valor arrecadado saltou para R$ 142.465.879,44 (cento e quarenta e dois milhões quatrocentos e sessenta e cinco mil oitocentos e setenta e nove reais e quarenta e quatro centavos).

A importância econômica e financeira das participações governamentais revela-se, não só pelos valores envolvidos, mas por desempenhar papel de destaque na formação do government take, tornando-se um dos fatores decisivos para a alocação de investimentos privados,30 30 A influência do government take como um dos fatores de alocação de investimentos privados, especialmente estrangeiros, na indústria do petróleo é abordado Marilda Rosado de Sá Ribeiro: "A empresa petrolífera tem uma preocupação preliminar, quando se trata de atuação no exterior, qual seja, verificar quem tem o direito de autorizar o desenvolvimento dos recursos petrolíferos, encontrando-se, nos diferentes regimes, uma variação de atores que representam os interesses dos países hospedeiros e de modelos contratuais que consagram diferentes sistemas de divisão de alocação de recursos entre o governo ( government take) e as empresas privadas". In "Introdução à unitização de reservatórios petrolíferos", in Estudos e pareceres - direito do petróleo e gás. Marilda Rosado de Sá Ribeiro (org.), Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 119. e por configurar parcela significativa da receita pública dos entes da federação.31 31 Sobre a crescente importância das participações governamentais para o setor público, após o advento da Lei do Petróleo, afirma Haroldo Lima, atual presidente da ANP, que "a partir das modificações feitas com a Lei 9.478, de 1997, o Estado brasileiro passou a recolher da produção de petróleo para o setor público recursos verdadeiramente substanciais. Os mecanismos introduzidos pela lei permitiram ao Estado apropriar-se de parcela qualitativamente superior da renda gerada pelo petróleo e garantiram uma distribuição desses recursos a um número elevado de unidades da Federação". In Petróleo no Brasil: a situação, o modelo e a política atual. Rio de Janeiro: Synergia, 2008, pp. 39/40.

Neste contexto, por força constitucional, os entes federativos possuem participação obrigatória no resultado da arrecadação de todas as espécies legais de participação governamental. Além disso, seus critérios de cálculo e cobrança são previstos em lei de caráter nacional, cabendo a todos os entes exercer diretamente a fiscalização financeira dos ingressos destes recursos, sem prejuízo das atividades regulatórias exercidas pela ANP, conforme veremos nos itens a seguir.

2 A NATUREZA JURÍDICA DAS PARTICIPAÇÕES GOVERNAMENTAIS

Uma questão que vem suscitando debates acirrados desde o advento da Constituição de 1988, a natureza jurídica das participações governamentais é também ponto fundamental do presente estudo, para se definir como as unidades federativas podem exercer a fiscalização direta de sua parcela nestas receitas, sem mitigar a função regulatória atribuída à ANP.

O foco da polêmica ultrapassa um pouco os limites da indústria do petróleo e das participações governamentais a ela referentes, e reside na interpretação do § 1º do artigo 20 da Constituição, em relação à exploração de todos os recursos minerais e de ambas as opções nele previstas para escolha infraconstitucional, ou seja, tanto a participação no resultado, ainda não regulamentada, quanto as compensações financeiras, das quais as participações governamentais na indústria do petróleo são espécie.

Em um primeiro plano, busca-se definir se as duas modalidades de receitas públicas pela exploração dos recursos minerais, previstas no referido texto constitucional, possuem natureza tributária ou não.

A natureza tributária é sustentada a partir da suposta adequação dos conceitos constitucionais de participação nos resultados da exploração e de compensação financeira, aos parâmetros legais previstos no artigo 3º do Código Tributário Nacional.

Neste sentido, Alberto Xavier defende que três características precípuas decorrem do § 1º do artigo 20 da Constituição, apesar de toda a fluidez e hibridez do texto: o fato de serem prestações patrimoniais, compulsórias e necessariamente instituídas por lei federal. Por estes contornos, portanto, "pode desde já concluir-se pela natureza tributária das prestações em causa, pois os seus traços essenciais se subsumem por inteiro no conceito de tributo dado pelo artigo 3º do Código Tributário Nacional",32 32 In "Natureza Jurídica e Âmbito de Incidência da Compensação Financeira por Exploração de Recursos Minerais", in Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 1998. v. 29, pp. 10-25. tendo como fato gerador a exploração dos recursos minerais e, por via de conseqüência, nos termos do artigo 4º do CTN, a natureza de imposto.33 33 Também defendem a natureza tributária: Roque Antonio Carraza. Natureza jurídica da compensação financeira pela exploração de recursos minerais. Sua manifesta inconstitucionalidade. São Paulo: Max Limonad, 1995; e Adriano Daleffe. "Ilegalidade da compensação financeira pela exploração de recursos minerais", in Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 1998. v. 33, pp. 7-15.

De fato, a compulsoriedade é característica fundamental no conceito de tributo. Não nos parece, entretanto, que haja compulsoriedade no pagamento de verbas para a exploração de um bem público dominial,34 34 O Ministro Eros Grau, em seu voto condutor na ADI 3237-9 DF, especificamente em relação ao petróleo, já assentou tratar-se de bem público dominial, superando a controvérsia levantada ao longo do julgamento pelo Ministro Carlos Britto de que seria um bem público de uso comum em relação à União e de uso especial em relação às empresas concessionárias. No mesmo sentido, confira: TORRES. Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 188; e ARAGÃO. Alexandre Santos de. "As Concessões e Autorizações Petrolíferas e o Poder Normativo da ANP", in Revista de Direito da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro. Marcos Juruena Villela Souto (coord.), Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, pp. 33-63. através da delegação de atividades econômicas monopolizadas pelo Estado, sendo regidas, em linhas gerais, por normas de direito privado, apesar de a lei ou o próprio contrato preverem obrigações e poderes publicistas.35 35 ARAGÃO, Alexandre dos Santos de. "O Contrato de Concessão de Exploração de Petróleo e Gás", in Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 430. Ou seja, a contraprestação devida pela empresa concessionária, assim o é porque ela aderiu por vontade própria a um contrato, em uma atividade sujeita à livre concorrência e à livre iniciativa.36 36 Como afirma José Marcos Domingues de Oliveira, em ensaio profundo sobre o tema: "basta à descaracterização da compulsoriedade tributária a possibilidade de mínima manifestação da vontade particular. Se ela assim existe (como mera adesão) em matéria de contratos de prestação de serviços públicos, cuja retribuição sequer é fixada pelas partes, mas pela Administração (órgãos administrativos ou agências reguladoras) através das chamadas cláusulas regulamentares, o que dizer do contrato de concessão em que, primeiro há livre licitação e depois há o direito a exigir a adjudicação do contrato?" In "Aspectos tributários do direito do petróleo - natureza jurídica das participações governamentais - government take", in Estudos e pareceres - direito do petróleo e gás. Marilda Rosado de Sá Ribeiro (org.). Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 499.

Não se trata de receitas devidas por constrições impostas à economia particular, mas sim pela exploração direta do patrimônio público. São, portanto, receitas originárias, em ambos os seus elementos identificadores, alinhados com precisão por Aliomar Baleeiro:37 37 In: Uma Introdução à Ciência das Finanças. Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 122-123. o político-jurídico (desnecessidade do exercício do poder coativo reservado ao Estado38 38 Na palavras de Kiyoshi Harada, "entre a União, proprietária dos bens, e os concessionários de recursos hídricos ou minerais não há uma relação de poder a legitimar a imposição tributária". In Direito Financeiro e Tributário. São Paulo: Atlas, 2006, pp. 79-80. (grifos originais). ) e o econômico (a origem dos recursos está no próprio setor público).

Assim também entendeu o Supremo Tribunal Federal, a partir do julgamento do Recurso Extraordinário nº 228.800-5/DF, com relação à compensação financeira pela exploração de recursos minerais (CFEM), instituída pela Lei nº 7.990/89 e, com relação especificamente às participações governamentais previstas pela Lei nº 9.478/97, através do julgamento no Mandado de Segurança nº 24.312-1 DF. Perfila também deste entendimento, da natureza não tributária das compensações financeiras, a maioria da literatura científica especializada.39 39 Cf. RIBEIRO, Marilda Rosado de Sá. Direito do Petróleo. As joint ventures na indústria do petróleo. Rio de Janeiro: Renovar, 2ª ed., 2003, p.184. TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 12ª ed., p. 191. SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Natureza Jurídica da Compensação Financeira por Exploração de Recursos Minerais, in Grandes Questões Atuais do Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 1998, v. 2, p. 35. OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. "Aspectos tributários do direito do petróleo - natureza jurídica das participações governamentais - government take", in Estudos e pareceres - direito do petróleo e gás. Marilda Rosado de Sá Ribeiro (org.). Rio de Janeiro: Renovar, 2005. MANEZELLO, Maria D´Assunção Costa. Comentários à Lei do Petróleo. São Paulo: Atlas, 2000. GUTMAN. José. Tributação e Outras Obrigações na Indústria do Petróleo. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2007. OLIVEIRA. Régis Fernandes de. Curso de Direito Financeiro. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2006. SANTOS. Sérgio Honorato dos. Royalties do Petróleo à luz do Direito Positivo. Rio de Janeiro: Esplanada, 2002. HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. São Paulo: Atlas, 2006. SCAFF. Fernando Facury. "Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM): Natureza Jurídica, Competência Normativa e Prescrição", in Revista de Direito do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, vol. 3. TAVEIRA. Heleno Torres. "A Compensação financeira devida pela utilização de recursos hídricos, exploração de recursos minerais ou produção de petróleo, xisto betuminoso e gás natural (art. 20, § 1º, CF) - sua natureza jurídica", in Grandes questões atuais do direito tributário. Valdir de Oliveira Rocha (coord.). São Paulo: Dialética, 1998. ROSA JR. Luiz Emygdio da. Curso de Direito Financeiro e Tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.

A natureza financeira de receita originária parece evidente,40 40 A própria literalidade do texto legal distingue as participações governamentais dos tributos, como se verifica no artigo 26 da Lei nº 9.478/97: "A concessão implica, para o concessionário, a obrigação de explorar, por sua conta e risco e, em caso de êxito, produzir petróleo ou gás natural em determinado bloco, conferindo-lhe a propriedade desses bens, após extraídos, com os encargos relativos ao pagamento dos tributos incidentes e das participações legais ou contratuais correspondentes" (grifos nossos). como esclarece trecho do voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes no julgamento do Ag. Reg. no Agravo de Instrumento nº 453.025-1/DF, resumindo a posição da Corte, adotada nos precedentes acima citados:

Ora, no MS 24.312 restou inequivocamente assentada a natureza da 'compensação financeira', prevista no § 1º do art. 20 da CF, como receita constitucional originária dos entes federados beneficiados, o que per se afasta a sua tipificação tributária - ou sujeita à disciplina do sistema constitucional tributário. (...)

Naquele precedente também foi expressamente consignado nos votos dos Ministros Sepúlveda Pertence (inicialmente, inclusive invocando o decidido pela 1ª Turma no RE 228.800) e Nelson Jobim (posteriormente), cujos fundamentos foram incorporados pela relatora e pela integralidade do Plenário, que a causa à compensação não é a propriedade do bem, pertencente exclusivamente à União, mas sim a sua exploração e o dano por ela causado. (grifos nossos)

O direito de explorar com finalidade econômica os recursos minerais que constitucionalmente pertencem à União (artigos 176 e 177 da Constituição) integra o patrimônio público e sua concessão a particulares gera uma contrapartida que, ao ingressar nos cofres públicos, configura uma entrada financeira.

Esta entrada que, por força do § 1º do artigo 20 da Constituição, pode ser uma participação no resultado da exploração ou uma compensação financeira por esta exploração, tem de ser repartida entre os Estados, Distrito Federal, Municípios e órgãos da administração direta da União, e é receita originária de cada ente político citado, possuindo, na concepção de Ricardo Lobo Torres, a natureza de preço público41 41 A natureza de preço das compensações financeiras foi defendida pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 2.586/DF, rel. Min. Carlos Velloso, DJ 01.08.2003. Em sentido contrário, entendendo que não há qualquer relação jurídica consensual que permita à contraprestação ser qualificada como preço público, posiciona-se Heleno Taveira Torres ( in op. cit. p. 77). Apesar do profundo estudo realizado pelo prof. Heleno Torres, não nos parece ser a melhor posição, visto que, apesar de haver, como visto no item II, inserções de normas de direito público, o contrato de concessão é regido essencialmente por normas de direito privado, havendo, portanto, manifestação de vontade na formação da relação jurídica contratual. pela utilização de recursos minerais situados em seus territórios, justificando-se como contraprestação pelas despesas que as empresas exploradoras destes recursos causam aos poderes públicos.42 42 Op. cit. p. 191.

As participações governamentais na indústria do petróleo, como espécie do gênero compensações financeiras, são receitas originárias de cada ente público beneficiado constitucionalmente por esta verba, cuja valoração deve levar em conta a expressão econômica do recurso mineral explorado, os impactos na infra-estrutura estatal que a indústria impõe e critérios ambientais à luz do princípio do poluidor-pagador, expressamente previsto no § 3º do artigo 225 da Constituição.

A natureza jurídica de receita originária de cada ente beneficiado será fundamental para nortear a possibilidade de fiscalização direta do Estado-membro em sua arrecadação, conforme se verá no item que passamos a desenvolver.

3 OS CRITÉRIOS DE PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS-MEMBROS NO RESULTADO DA ARRECADAÇÃO DAS PARTICIPAÇÕES GOVERNAMENTAIS E A POSSIBILIDADE DE FISCALIZAÇÃO DIRETA DESTAS RECEITAS: MECANISMOS QUE CONVIVEM HARMONICAMENTE COM O PAPEL REGULADOR DA ANP

Como visto, a participação dos Estados, Distrito Federal e Municípios na arrecadação das participações governamentais decorre de imperativo constitucional expresso e é assegurada na forma da lei, nos termos do § 1º do artigo 20 da Constituição.

Esta lei a que se refere o dispositivo constitucional tem nítido caráter financeiro e alcance nacional, por estabelecer normas gerais que se dirigem por igual à União, Estados, Distrito Federal, Municípios e Territórios.43 43 Cf.: SOUZA. Rubens Gomes de. "Normas gerais de direito financeiro", in Revista Forense. Rio de Janeiro: Forense, 1954, v. 155, p. 21.

Ives Gandra da Silva Martins,44 44 In: Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, tomo I, 2001, pp. 107-108. comentando o referido parágrafo constitucional, possui posição semelhante quanto ao caráter nacional, com fundamentos bastante sólidos:

Determina o parágrafo que tal participação ou compensação será determinada por lei. Creio que a lei deveria ser complementar, apesar de não falar ao constituinte nessa espécie legislativa. É que a lei complementar, sobre ser mais permanente, é uma lei nacional, em que a União apenas oferta seu aparelho legislativo para que seja produzido comando normativo que obrigue União, Estados, Distrito Federal e Municípios. (...) Ora, na medida em que pretendeu o constituinte outorgar participações e compensações, objetivando a descentralização federativa, que é a tônica idealizada pelo novo Texto, não pode deixar nas mãos do legislador federal a determinação dos termos e percentuais de tal participação ou compensação, visto que correriam os demais entes federados o risco de pouco receber.

É evidente que qualquer norma que regulamente este dispositivo irá alcançar diferentes entes políticos, revelando alcance nacional, como ocorre com as previsões legais das compensações financeiras, feitas pela Lei nº 7.990/89 e pela Lei nº 9.478/97. A necessidade de adoção de lei complementar apontada, no entanto, deve ser reservada apenas para as hipóteses em que a Constituição expressamente a exige, sendo uma questão de competência constitucional e não de aplicação do princípio da hierarquia.

As participações governamentais na indústria do petróleo, portanto, estão previstas em lei de caráter nacional e neste sentido deve a Lei nº 9.478/97 ser interpretada. Se não houver a previsão de critérios para participação dos entes políticos no resultado da arrecadação de alguma participação governamental, haverá clara ofensa ao caráter nacional imposto constitucionalmente à lei regulamentadora.

Além disso, o caráter nacional como vetor interpretativo denota que os critérios de repartição entre os entes políticos devem ser razoáveis, proporcionais e adequados à medida da efetiva participação dos referidos entes no resultado da exploração. Não pode, pois, haver critérios que privilegiem desmesuradamente um ente em detrimento dos demais. Ao revés, os critérios legais devem refletir a correta distribuição dos recursos através de uma sistemática que meça a exata proporcionalidade da importância dos entes nos resultados da arrecadação das participações governamentais, em interpretação sistemática atenta à forma de Estado federativa e a seus princípios fundamentais (arts. 1º e 18 da CRFB).45 45 Cf.: COUTO E SILVA. Sandra Maria do; OLIVEIRA. Jorge Rubem Folena de. "Dos royalties do petróleo: o princípio federativo e a competência dos estados editarem leis para sua cobrança e fiscalização". Artigo ainda não publicado, gentilmente cedido pelos autores.

E, neste particular, a Lei nº 9.478/97 peca, principalmente, por reservar a arrecadação de duas das quatro espécies de participação governamental, exclusivamente para a União, como ocorre, como visto, com o bônus de assinatura e com o pagamento pela ocupação ou retenção do solo.

Por outro lado, o texto constitucional coloca como competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios "registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios", conforme disposto no inciso XI do artigo 23.

Decorre, portanto, da interpretação conjunta do § 1º do artigo 20 e do inciso XI do artigo 23 da Constituição a possibilidade de fiscalização direta pelo Estado-membro da arrecadação das participações governamentais a ele devidas, decorrentes da exploração das atividades concernentes à indústria do petróleo.

Como a competência é comum, não há competência privativa da União, como afirma Régis Fernandes de Oliveira,46 46 "Ora se Estados e Municípios podem efetuar registros das concessões concedidas pela União, a quem cabe efetuar outorga, pode fiscalizar tais atos. (...) Seria inadmissível que ente federativo fosse credor de determinada receita não tributária e não pudesse fiscalizar seu recolhimento ou a produção mineral ou geração de energia elétrica, na preservação de seu interesse. Os órgãos da administração direta da União nenhum interesse terão, uma vez que integram uma só pessoa jurídica. No entanto, Estados e Municípios são entes federativos, dotados de personalidade jurídica de direito público. Logo, aptos a exercerem seus direitos no mundo do direito." In: Curso de Direito Financeiro. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2006, pp. 221-222. sendo a solução a aplicação do princípio da predominância do interesse.

O Estado-membro, como legítimo interessado no produto da arrecadação, não deve e não pode ser expectador passivo, aguardando que o órgão regulador e a União verifiquem, respectivamente, a exatidão do recolhimento das participações governamentais e o repasse para o ente federativo, como se fosse uma transferência voluntária de recursos. Pelo contrário, não se está diante das verbas a que se refere o inciso VI do artigo 71 da Constituição e sim de "receitas originárias do ente federativo que suporta a exploração".47 47 Expressão utilizada pela Min. Ellen Gracie, no julgamento do RE 253.906-6/MG.

No julgamento do MS nº 24.312/DF, o Plenário do Supremo Tribunal Federal se posicionou de forma contundente no sentido de que, "embora os recursos naturais da plataforma continental e os recursos minerais sejam bens da União (CF, art. 20, V e IX), a participação ou compensação aos Estados, Distrito Federal e Municípios no resultado da exploração de petróleo, xisto betuminoso e gás natural são receitas originárias destes últimos entes federativos (CF, art. 20, § 1º)".

E como se trata de receita originária, o Estado-membro possui não só a competência de fiscalizar, como todos os atos inerentes a esta fiscalização, inclusive o de impor sanções e o de editar leis para procedimentalizar este sistema de fiscalização,48 48 Cf.: OLIVEIRA. Régis Fernandes de. op. cit. p. 223. que terão claramente a natureza de leis de direito financeiro, por contemplar uma modalidade de entrada financeira, atraindo a competência legislativa concorrente prevista no inciso I do artigo 24 da Constituição49 49 "Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;" e a observância das normas gerais de direito financeiro, previstas na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964.

Com base neste entendimento, os Estados vêm editando leis para a fiscalização de receitas não tributárias decorrentes da exploração de recursos hídricos e minerais,50 50 A partir da Lei Estadual nº 6.710, de 14 de janeiro de 2005, do Estado do Pará, foram editadas a Lei Estadual nº 6.095, de 14 de dezembro de 2006, do Estado de Sergipe, a Lei Estadual nº 8.501, de 10 de maio de 2007, do Estado do Espírito Santo e a Lei Estadual nº 5.139, de 29 de novembro de 2007, do Estado do Rio de Janeiro, a qual tivemos a honra de elaborar o anteprojeto e cuja justificativa ressalta justamente o fato de que essas receitas são originárias do Estado, nos seguintes termos: "Por se tratar de receita originária do Estado, que lhe é confiada diretamente pela Constituição, e não mero repasse de verbas da União, tem o Estado-membro a prerrogativa constitucionalmente consagrada de fiscalizar e de controlar as receitas não-tributárias oriundas das compensações financeiras e das participações governamentais decorrentes da exploração de recursos hídricos e minerais, inclusive petróleo e gás natural, efetuada em seu território (art. 23, XI da CRFB)". através do exercício de uma competência fiscalizatória que vai ao encontro do disposto no § 1º do artigo 20 e do inciso XI do artigo 23 da Constituição e não mitiga o exercício do poder regulador da ANP.

A Lei nº 9.478/97, ao criar a ANP, atribui a ela funções de órgão regulador da indústria do petróleo, gás natural, seus derivados e biocombustíveis (artigo 7º), podendo promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo, do gás natural e dos biocombustíveis (artigo 8º).

Dentre as atribuições previstas nos incisos do artigo 8º, não se inclui a de fiscalizar a arrecadação das participações governamentais devidas aos Estados-membros, e nem poderia, pela sistemática constitucional exposta.

O exercício desta fiscalização pela ANP é defendido a partir de uma interpretação equivocada do inciso IV do artigo 8º da Lei nº 9.478/97. Neste sentido, defende-se que "em relação às participações governamentais previstas no art. 45 da Lei do Petróleo, dentre as quais destacamos os royalties, é função da ANP fiscalizar se estas participações são corretamente recolhidas pelos concessionários, uma vez que tais obrigações pressupõem a existência de um contrato de concessão, cuja execução deve ser fiscalizada pela ANP (ex vi art. 8º, IV da Lei do Petróleo)".51 51 GUTMAN. José. op. cit. pp. 10-11.

Esta interpretação, no entanto, coloca o referido dispositivo em choque com o disposto no § 1º do artigo 20 e no inciso XI do artigo 23 da Constituição, exigindo, portanto, uma interpretação conforme, a fim de se resguardar a competência constitucional dos entes federativos e a atribuição legal da ANP.52 52 A estrutura e atribuições da ANP decorrem de lei, nos termos do inciso III do artigo 177 da Constituição. Como afirma o Min. Eros Grau, em voto condutor no julgamento da ADI nº 3273-9/DF, "a ANP não pode ser, e efetivamente não é, senão uma autarquia" e, como tal, tem sua criação e atuação dependente de lei específica.

Admite-se que a ANP possa e deva fiscalizar a execução dos contratos de concessão, atuando ao lado dos entes federativos no que concerne à sua atribuição legal,53 53 Como afirma Pedro Dutra, "a Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, que criou a Agência Nacional de Petróleo - ANP - dispõe que ' a ANP terá como finalidade promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo...'. Em verdade, esta é a finalidade da Lei nº 9.478/97 - a regulação do mercado de petróleo em território brasileiro - e não da ANP, órgão administrativo especialmente criado ao qual a lei atribui competência para aplicá-la". In "Concorrência em Mercado regulado: a ação da ANP", in Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar. 2002. 229. p. 348). A ampliação pela referida via interpretativa equivocada não visa a suprir omissão legal. Pelo contrário, desvirtua totalmente o ambiente regulatório da atividade econômica, aumentando, sem lastro constitucional ou legal, o âmbito de atuação do órgão regulador. enquanto a estes caberá, em caráter definitivo, o exercício do poder de controle, fiscalização e sanção,54 54 OLIVEIRA. Regis Fernandes de. op. cit. p. 223. no que diz respeito à sua parcela das participações governamentais.55 55 O Ministro Marco Aurélio, ao proferir seu voto no julgamento do MS nº 24.312-1/DF, inclusive, manifestou-se expressamente no sentido de que o produto da arrecadação das participações governamentais pertence ao Estado-membro, destacando a autonomia governamental, nos seguintes termos: "Acompanho Sua Excelência porque estabeleço uma distinção entre o repasse de que cogita o inciso VI do artigo 71 da Constituição Federal, a pressupor sempre recurso federal, e o assegurado aos Estados como direito próprio, em termos de participação. Portanto, o numerário pertence ao Estado, que participa, tem um aporte de recursos, considerado o § 1º do artigo 20 da Constituição Federal. A óptica, sem dúvida, homenageia a autonomia governamental, tão pertinente quando se vive em uma federação."

Outra interpretação iria gerar o que Marçal Justen Filho,56 56 In: "Agências Reguladoras e Democracia: Existe um Déficit Democrático na 'Regulação Independente'?", in O Poder Normativo das Agências Reguladoras. Alexandre Santos de Aragão (coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2006, pp. 301-332. invocando David Marquand, chama de déficit democrático na atuação reguladora, sem que haja a necessária legitimação pelo procedimento,57 57 Marcos Juruena Villela Souto, a respeito da legitimidade democrática das agências reguladoras, com base em Ruy Santacruz, afirma que três foram as teorias que "buscaram fundamentar essa função, a saber, a teoria da transmissão democrática ( transmission belt model), teoria dos burocratas técnicos ( expertise model), teoria do procedimento (procedural model). A primeira aceita tal delegação às agências pelo fato de ser o legislador, legitimado constitucionalmente, que cria o ente e lhe transfere balizas de atuação. A segunda teoria justifica a transferência por estarem estas agências formadas por técnicos especializados em matérias as quais o Congresso não teria condições de regular. Já a teoria do procedimento legitima a atuação das agências por garantir aos interessados a participação no seu processo de tomada de decisões. Esta parece ser a que mais se ajusta à teoria da Democracia, a ser abordada um pouco adiante." In Direito Administrativo Regulatório. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2002 p. 235. muito pelo contrário, com exercício arbitrário do poder regulador,58 58 Como afirma Marçal Justen Filho, a respeito da forma de superação do aparente déficit democrático na regulação independente: "a existência de agências independentes apenas pode ser admitida, num Estado Democrático, na medida em que sua estruturação assegure a ampliação do nível de democracia do sistema em seu conjunto. Quando se identifica a agência independente como um mecanismo de suprimento do déficit democrático externo, presume-se uma organização institucional que assegure a realização dos fins democráticos buscados. Uma agência independente organizada de forma não democrática agrava o déficit democrático geral do sistema político examinado e propicia males maiores do que benefícios." Op. cit. p. 314. uma vez que não haveria a participação dos interessados diretos - entes políticos beneficiados pelo § 1º do artigo 20 da Constituição - nos procedimentos decisórios do órgão regulador, cujos membros são indicados discricionariamente pelo Chefe do Poder Executivo Federal e não podem ser exonerados ad nutum.59 59 Alexandre Santos de Aragão afirma, a respeito da legitimação do processo decisório das agências reguladoras: "(...) um dos mecanismos de legitimação da Administração Pública que mais vem sendo institucionalizado em nosso direito positivo é o da participação dos titulares e defensores dos interesses individuais, coletivos e difusos no processo de tomada das decisões que lhes afetarão." In Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2004. Já Paulo Todescan Lessa Mattos, em profundo estudo dedicado ao tema, conclui que: "A tensão entre a criação de burocracias tecnicamente especializadas dotadas de autonomia decisória e a exigência de legitimação poderia, contudo, ser tomada em outra perspectiva, que levasse em consideração a atuação de grupos de interesse sobre as agências reguladoras e as possibilidades de legitimação a partir dos canais de participação institucionalizados e a partir das condições efetivas de participação passariam a importar dentro do debate sobre teorias da democracia." In "Autonomia decisória, discricionariedade administrativa e legitimidade da função reguladora do Estado no debate jurídico brasileiro", in O Poder Normativo das Agências Reguladoras. Alexandre Santos de Aragão (coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 361.

Neste contexto, o pagamento centralizado das participações governamentais à Secretaria do Tesouro Nacional - STN, previsto pelo artigo 27 do Decreto nº 2.705/98, em regime de conta única do Governo Federal (artigo 29), é apenas uma das formas de controle que pode ser adotada pelos entes federativos. Nada impede que o pagamento seja realizado diretamente ao Estado-membro beneficiário, se houver previsão expressa em lei estadual, por exemplo, nos termos do inciso I do artigo 24 da Constituição.60 60 Cf.: OLIVEIRA. Regis Fernandes de. op. cit. p. 223.

A fiscalização direta pelos Estados-membros de sua receita oriunda da arrecadação de participações governamentais na indústria do petróleo, por seu contorno constitucional, não é mera possibilidade e sim um dever imposto, podendo ser editadas leis para procedimentalizar esta atuação que em nada se choca com as atribuições da ANP, sendo, ao revés, harmônica e complementar, dentro da estrutura legislativa atual da indústria do petróleo.

CONCLUSÃO

Em desfecho das idéias desenvolvidas ao longo do presente ensaio, podemos sintetizar seus principais contornos nos seguintes tópicos:

1) após a flexibilização do monopólio da Petrobras, a perspectiva da indústria nacional do petróleo no cenário econômico atual é de se aproximar cada vez mais dos investimentos privados, de modo que as participações governamentais tendem a aumentar em importância econômica, tanto no que se refere às entradas financeiras em receita pública dos entes beneficiários, quanto por representar uma compensação financeira pela exploração de recursos finitos e com sérios impactos ambientais;

2) a adoção do modelo de concessão a partir da regulamentação da Emenda 09/95 pela Lei nº 9.478/97 inaugurou a fase regulatória da estruturação jurídica da indústria petrolífera brasileira, em que a União mantém o domínio patrimonial sobre as reservas minerais, o Conselho Nacional de Política Energética - CNPE desempenha a função de definição da política energética e a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis - ANP a executa, no limite de suas atribuições legais, exercendo atividades regulatórias;

3) as participações governamentais na indústria do petróleo são espécie do gênero compensação financeira, previsto no § 1º do artigo 20 da Constituição, e possuem a natureza jurídica de receita originária de cada um dos entes federativos beneficiados pelo texto constitucional;

4) a Lei nº 9.478/97, que regulamenta o § 1º do artigo 20 da Constituição, possui caráter nacional, de modo que se não houver a previsão de critérios para participação dos entes políticos no resultado da arrecadação de todas as participações governamentais, haverá clara ofensa ao caráter nacional imposto constitucionalmente à lei regulamentadora;

5) não poderia, portanto, a Lei nº 9.478/97 reservar a arrecadação de duas das quatro espécies de participação governamental exclusivamente para a União, como ocorre com o bônus de assinatura e com o pagamento pela ocupação ou retenção do solo, por violação direta ao referido dispositivo constitucional e, em interpretação sistemática, por atentar à forma de Estado federativa e seus princípios fundamentais (arts. 1º e 18 da CRFB); e

6) a fiscalização direta pelos Estados-membros de sua receita originária oriunda da arrecadação de participações governamentais na indústria do petróleo, nos termos do disposto no § 1º do artigo 20 e do inciso XI do artigo 23 da Constituição, por seu contorno constitucional, não é mera possibilidade e sim um dever, podendo ser editadas leis para procedimentalizar esta atuação (inciso I do artigo 24 da Constituição), que em nada se choca com as atribuições da ANP, sendo, ao revés, harmônica e complementar, dentro da estrutura legislativa atual da indústria do petróleo.

NOTAS

INTERNET

Artigo aprovado (12/11/2009)

Recebido em 15/05/2009

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  • 1
    A Lei nº 9.478, de 06.08.97, no artigo 6º, inciso XIX, define
    indústria do petróleo como o "conjunto de atividades econômicas relacionadas com a exploração, desenvolvimento, produção, refino, processamento, transporte, importação e exportação de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos e seus derivados". O conceito legal será adotado ao longo do presente estudo.
  • 2
    Como afirmam alguns especialistas, com base no déficit apresentado pela balança comercial do petróleo nos últimos anos, atingir a auto-suficiência da produção de petróleo não é o mesmo que manter a auto-suficiência sustentada do produto, principalmente pela necessidade de se importar petróleo qualitativamente superior ao produzido no Brasil e, conseqüentemente, com preços superiores. O presente artigo, no entanto, não é o local adequado para o desenvolvimento desta complexa questão, motivo pelo qual utilizaremos o termo apenas como um marco histórico.
  • 3
    Por questões mercadológicas, a sigla da empresa perdeu a acentuação gráfica a partir de 1994.
  • 4
    "Tanto isto é verdade que todas as decisões, inclusive de preços e custos, eram definidas na perspectiva de um grande agente do mercado, mas que não tinha a possibilidade de ver constatadas as suas decisões internas de imposição de políticas". JOBIM, Nelson. "Aspectos jurídicos da abertura do mercado de petróleo", in
    Estudos e pareceres - direito do petróleo e gás. Marilda Rosado de Sá Ribeiro (org.), Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 395.
  • 5
    Em 1976, como reflexo da crise mundial do petróleo de 1973 e da falta de investimentos no setor de exploração e produção, passou-se a adotar no Brasil os contratos de risco que "se constituíam como contratos de adesão, mediante os quais empresas ou consócios brasileiros ou estrangeiros prestavam serviços de exploração de petróleo à Petrobrás, executora do monopólio estatal do petróleo, nos termos da Lei 2.004/53. Os contratos previam que, na fase de produção, a operação ficaria a cargo da Petrobrás e que as empresas teriam participação no resultado" (BUCHEB, José Alberto.
    Direito do Petróleo: a Regulação das Atividades de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, pp. 3-4). Este modelo, que não mitigou o monopólio da Petrobras (continuava executora única da fase de produção, sendo permitido a contratação de serviços apenas para as fase de estudos de exploração), foi expressamente proibido pela redação original do §1º do artigo 177 da Constituição de 1988, com a exceção dos contratos já celebrados até aquela data, nos termos do parágrafo único do artigo 45 do ADCT.
  • 6
    A edição da Emenda Constitucional nº 09/95 ultrapassou debates políticos acalorados, principalmente por focar uma indústria, em cujo bojo a defesa da soberania e do protecionismo estratégico foi uma bandeira nacionalista defendida ao longo de décadas. Por todos, ficamos com a fina ironia de Monteiro Lobato que, crítico da política de petróleo de então, escreve, em 1936, O Escândalo do Petróleo e do Ferro e, logo em sua introdução, ataca: "Os trusts sabem tudo e sorriem lá entre si. Sabem que a partir de 1930 o brasileiro cada vez menos se utiliza do cérebro para pensar, como fazem todos os povos. Sabem que os nossos estadistas dos últimos tempos positivamente pensam com outros órgãos que não o cérebro - com o calcanhar, com o cotovelo, com certos penduricalhos - raramente com os miolos(...)".
    in LOBATO, José Bento Monteiro.
    O escândalo do petróleo e do ferro. São Paulo: Brasiliense, 1979, p. 11.
  • 7
    A flexibilização do monopólio do petróleo foi atacada pelo Governador do Estado do Paraná, através da propositura da ADI 3273-9 DF, em que se sustentou, em linhas gerais, que a transferência de propriedade dos hidrocarbonetos após a extração ao concessionário, tal como prevista no artigo 26 da Lei nº 9.478/97, iria de encontro aos artigos 20 e 177 da Constituição. A tese foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, por maioria, em síntese porque "a distinção entre atividade e propriedade permite que o domínio do resultado da lavra das jazidas de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluídos possa ser atribuída a terceiros pela União, sem qualquer ofensa à reserva de monopólio [art. 177 da CB/88]", como afirmou o Ministro Eros Grau em seu voto condutor, que, na mesma oportunidade, também julgou improcedente a ADI 3366, proposta com argumentos semelhantes, pelo Partido Democrático Trabalhista - PDT, considerando que "seriam desastrosas, para a economia nacional, as conseqüências de eventual declaração de inconstitucionalidade do artigo 26,
    caput, da Lei n. 9.478/97."
  • 8
    Artigo 23 da Lei nº 9.478/98.
  • 9
    SOUTO. Marcos Juruena Villela.
    Direito Administrativo das Concessões. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, pp. 84/85.
  • 10
    No mesmo sentido, discorre Carlos Ari Sundfeld: "A chamada Lei de Concessões (...) não se aplica ao Direito do Petróleo, já que não se trata de
    concessão de serviços público, mas de outro tipo de privilégio. A Lei do Petróleo trata exaustivamente da concessão de exploração da produção de petróleo, de maneira a excluir a aplicação da Lei de Concessões". "Regime jurídico do setor petrolífero",
    in Direito Administrativo Econômico. Carlos Ari Sundfeld (coord.), São Paulo: Malheiros, 2002, p. 393.
  • 11
    A natureza jurídica do referido contrato causa enorme controvérsia no Brasil, com reflexos negativos na segurança dos investimentos privados, como bem observa Marilda Rosado de Sá Ribeiro: "No tocante ao debate acerca da natureza jurídica do contrato de concessão para exploração e produção de petróleo e gás, o posicionamento da indústria petrolífera pode ser sintetizado nos argumentos do advogado Sílvio Rodrigues, como coordenador do Subcomitê Jurídico do IBP, para quem é mais interessante a posição defendida por Toshio Mukai, no sentido de que o contrato de concessão brasileiro deva ser classificado como de Direito Privado, e não como um contrato administrativo, eis que a ANP atua no âmbito de uma atividade econômica. Por outro lado, a matéria é controvertida, pois se nos contratos administrativos vige o princípio da supremacia do interesse público, indaga-se se seria possível ao Estado - representado pela ANP - alterar, unilateralmente, as normas que vigem no contrato, ou ainda denunciá-lo, também de forma unilateral. Por estes fundamentos, observa-se que a classificação do contrato de concessão como de Direito Administrativo pode ser crítica para os investidores, pois estes buscam uma estabilidade de investimentos." RIBEIRO. Marilda Rosado de Sá.
    Direito do Petróleo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 340. Confira, ainda: ARAGÃO. Alexandre Santos de. "As Concessões e Autorizações Petrolíferas e o Poder Normativo da ANP",
    in Revista de Direito da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro. Marcos Juruena Villela Souto (coord.), Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, pp. 33-63; MUKAI. Toshio Mukai. "Contrato de Concessão Formulado pela Agência Nacional do Petróleo - Comentários e Sugestões",
    in RTDP 25/82-93; OLIVEIRA. Regis Fernandes de.
    Curso de Direito Financeiro. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2006.
  • 12
    SOUTO. Marcos Juruena Villela.
    op. cit. pp. 84-85.
  • 13
    OLIVEIRA. Regis Fernandes de.
    op. cit., p. 213-214.
  • 14
    BARRETO. Celso de Albuquerque. "Geopolítica do petróleo: Tendências mundiais pós guerra do Iraque de 2003. Brasil: situação e marco regulatório",
    in Estudos e pareceres - direito do petróleo e gás. Marilda Rosado de Sá Ribeiro (org.), Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 17.
  • 15
    Como afirma Alexandre Santos de Aragão, "a economia, ainda mais em uma conjuntura globalizada, que alguns chegam a chamar de pós-moderna, possui um dinamismo, uma mutabilidade, que nenhum outro setor da sociedade possui. Se o ramo do Direito que corresponde à regulação da economia também não tivesse estas características, estaria fadado a produzir uma regulação ineficiente e descompassada temporalmente em relação aos fatos e às atividades a serem reguladas".
    In "Princípios de direito regulatório do petróleo",
    in Estudos e pareceres - direito do petróleo e gás. Marilda Rosado de Sá Ribeiro (org.), Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 313.
  • 16
    Principalmente o contrato de partilha de produção, que tem sido defendido pelo atual Presidente da Petrobras, como a modalidade "asseguradora de maior segurança para o Estado brasileiro" (
    in PRATES. Jean-Paul. "Brasil pós-pré-sal: partilha não paga royalties, entre outras coisas". Artigo publicado no sítio
    www.oglobo.globo.com/blogs/ petroleo/post.asp?cod_post= 110375. Consulta em 03.07.08). A adoção deste modelo poderá gerar impactos significativos na arrecadação de participações governamentais, pois, em seu desenho tradicional, a obrigação imposta à empresa contratante de financiar por sua conta e risco o desenvolvimento da área contratada é remunerada através de uma parcela líquida da produção (
    profit oil), após a dedução dos custos da produção (
    cost oil). É de se notar que, por força do disposto no § 1º do art. 20 da Constituição, a adoção deste modelo exige lei regulamentadora específica e há de haver a participação das unidades federativas e dos órgãos da administração direta da União no resultado do
    profit oil. Esta discussão, entretanto, ainda é incipiente e a adoção desta nova modalidade encontra fundada resistência, inclusive, dentro da própria ANP (Cf.: Nota Técnica nº 021/2007-SCM).
  • 17
    Segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro do Petróleo, Gás e Biocombustíveis - IBP - a indústria nacional de petróleo, em 10 anos de vigência da Lei nº 9.478/97, apresentou um crescimento extraordinário, evoluindo de cerca de 2% para 10% do PIB, sendo que boa parte deste crescimento foi impulsionado pela própria Petrobras.
    In TEIXEIRA. Álvaro. "Perspectivas do Setor do Petróleo Pós-Descobertas do Pré-Sal". Palestra apresentada no IV Seminário de Petróleo e Gás no Brasil, em 14 de abril de 2008, na Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro.
  • 18
    A autonomia financeira da ANP, por exercer a atividade de regulação, não só é desejável, como necessária. Porém, as formas de financiamento, como previsto na Lei nº 9.478/97, não encontram referibilidade nas distintas atividades desempenhadas pela Agência. Vejamos, a respeito, o que discorrem Marcos André Vinhas Catão e Julio Salles Costa Janolio: "vemos que não há qualquer correlação entre as receitas disponibilizadas à ANP, por meio dos arts. 15 e 16 da Lei nº 9.478/97, e os respectivos custos inerentes a qualquer uma dessas atuações, o que leva à conclusão da necessidade de se encontrar um novo modelo que possa servir de base ao financiamento das atividades empreendidas pela ANP".
    In "O financiamento das atividades empreendidas pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) e sua respectiva autonomia financeira,
    in.
    Tributação no Setor de Petróleo. Heleno Taveira Tôrres e Marcos André Vinhas Catão (coord.). São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 98.
  • 19
    Neste sentido, esclarece José Gutman: "O bônus de assinatura tem seu valor mínimo estabelecido no edital de licitação (
    ex vi do art. 46 da Lei do Petróleo), sendo certo que, apesar da ausência de norma expressa, tal fixação pela ANP é ato discricionário, devendo-se orientar pela conveniência e oportunidade, sem jamais se afastar do razoável e do proporcional. Orientada por esta
    ratio, vem a ANP fixando, desde a Primeira Rodada de Licitação, valores mínimos diferenciados, contemplando as especificidades dos blocos. Por óbvio, aos blocos terrestres de bacias maduras, que podem vir a interessar apenas às pequenas empresas, é atribuído um valor mínimo mais baixo do que, por exemplo, aos blocos marítimos em água profunda, que só poderão vir a ser operados por empresas com experiência nesta restrita tecnologia (i. e. empresas com 'grande poder de fogo', capazes de investir cerca de 20 milhões ou mais num poço exploratório, com risco de insucesso)."
    In Tributação e Outras Obrigações na Indústria do Petróleo. Rio de Janeiro: Freitas Bastos: Maria Augusta Delgado, 2007.
  • 20
    Como afirma José Gutman, "o bônus de assinatura, tal qual as demais participações governamentais instituídas pela Lei do Petróleo, é uma
    compensação financeira (...)"
    in op.
    cit. p. 86.
  • 21
    Como decidiu o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do MS nº 24.312-RJ - que será analisado com maior detalhe no próximo item -, as participações governamentais são compensações financeiras previstas no § 1º do artigo 20 da Constituição, configurando receita originária dos entes federativos. Não se trata, pois, de verba de repasse voluntário por parte da União, sendo a repartição entre Estados, Distrito Federal e Municípios obrigatória. Em seu voto, o Ministro Gilmar Mendes chega a afirmar: "que se trata de um direito subjetivo da unidade federada. Trata-se de receita originária que lhe é confiada diretamente pela Constituição. Cabe à lei disciplinar todo esse procedimento (...) Não há nenhuma dúvida, inclusive para o legislador, de que não se trata de um repasse voluntário (...)"
  • 22
    Consulta ao sítio
  • 23
    SANTOS, Sérgio Honorato.
    Royalties do Petróleo à luz do direito positivo. Rio de Janeiro: Esplanada, 2002, p. 80
  • 24
    GUTMAN. José.
    op.
    cit., p. 09
  • 25
    Consulta ao sítio
  • 26
    GUTMAN. José.
    op.
    cit. p. 55.
  • 27
    Consulta ao sítio
  • 28
    O pagamento pela ocupação ou retenção de área não é um contrato de aluguel de bem. É, ao revés, uma obrigação que nasce de um contrato: a concessão para o exercício de atividade econômica (
    upstream), cujo propósito primordial, como afirma José Gutman, "é o de encorajar o abandono voluntário da área de concessão pelo concessionário que não estiver fazendo esforços exploratórios ou que não possuir interesse em desenvolver a produção" (
    in op. cit. p. 101). Não se trata, portanto, de valor pago por aluguel de bem patrimonial da União, o que poderia afastar, em tese, a participação dos demais entes. Como afirma o Ministro Eros Grau no julgamento da ADI nº 3273-9 DF, "
    Atividades e bens, uma coisa distinta da outra. (...) o conceito de atividade econômica [enquanto atividade empresarial] prescinde da propriedade dos bens de produção". E, nas palavras de José Gutman, "a participação pela ocupação ou retenção de área, tal qual as demais participações governamentais instituídas pela Lei do Petróleo, é uma compensação financeira, não sendo, portanto, uma receita tributária.". (
    op. cit., p. 98)
  • 29
    Consulta ao sítio
  • 30
    A influência do
    government take como um dos fatores de alocação de investimentos privados, especialmente estrangeiros, na indústria do petróleo é abordado Marilda Rosado de Sá Ribeiro: "A empresa petrolífera tem uma preocupação preliminar, quando se trata de atuação no exterior, qual seja, verificar quem tem o direito de autorizar o desenvolvimento dos recursos petrolíferos, encontrando-se, nos diferentes regimes, uma variação de atores que representam os interesses dos países hospedeiros e de modelos contratuais que consagram diferentes sistemas de divisão de alocação de recursos entre o governo (
    government take) e as empresas privadas".
    In "Introdução à unitização de reservatórios petrolíferos",
    in Estudos e pareceres - direito do petróleo e gás. Marilda Rosado de Sá Ribeiro (org.), Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 119.
  • 31
    Sobre a crescente importância das participações governamentais para o setor público, após o advento da Lei do Petróleo, afirma Haroldo Lima, atual presidente da ANP, que "a partir das modificações feitas com a Lei 9.478, de 1997, o Estado brasileiro passou a recolher da produção de petróleo para o setor público recursos verdadeiramente substanciais. Os mecanismos introduzidos pela lei permitiram ao Estado apropriar-se de parcela qualitativamente superior da renda gerada pelo petróleo e garantiram uma distribuição desses recursos a um número elevado de unidades da Federação".
    In Petróleo no Brasil: a situação, o modelo e a política atual. Rio de Janeiro: Synergia, 2008, pp. 39/40.
  • 32
    In "Natureza Jurídica e Âmbito de Incidência da Compensação Financeira por Exploração de Recursos Minerais",
    in Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 1998. v. 29, pp. 10-25.
  • 33
    Também defendem a natureza tributária: Roque Antonio Carraza.
    Natureza jurídica da compensação financeira pela exploração de recursos minerais. Sua manifesta inconstitucionalidade. São Paulo: Max Limonad, 1995; e Adriano Daleffe. "Ilegalidade da compensação financeira pela exploração de recursos minerais",
    in Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 1998. v. 33, pp. 7-15.
  • 34
    O Ministro Eros Grau, em seu voto condutor na ADI 3237-9 DF, especificamente em relação ao petróleo, já assentou tratar-se de bem público dominial, superando a controvérsia levantada ao longo do julgamento pelo Ministro Carlos Britto de que seria um bem público de uso comum em relação à União e de uso especial em relação às empresas concessionárias. No mesmo sentido, confira: TORRES. Ricardo Lobo.
    Curso de Direito Financeiro e Tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 188; e ARAGÃO. Alexandre Santos de. "As Concessões e Autorizações Petrolíferas e o Poder Normativo da ANP",
    in Revista de Direito da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro. Marcos Juruena Villela Souto (coord.), Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, pp. 33-63.
  • 35
    ARAGÃO, Alexandre dos Santos de. "O Contrato de Concessão de Exploração de Petróleo e Gás",
    in Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 430.
  • 36
    Como afirma José Marcos Domingues de Oliveira, em ensaio profundo sobre o tema: "basta à descaracterização da
    compulsoriedade tributária a possibilidade de mínima manifestação da vontade particular. Se ela assim existe (como mera adesão) em matéria de contratos de prestação de serviços públicos, cuja retribuição sequer é fixada pelas partes, mas pela Administração (órgãos administrativos ou agências reguladoras) através das chamadas
    cláusulas regulamentares, o que dizer do contrato de concessão em que, primeiro há livre licitação e depois há o direito a exigir a adjudicação do contrato?"
    In "Aspectos tributários do direito do petróleo - natureza jurídica das participações governamentais
    - government take",
    in Estudos e pareceres - direito do petróleo e gás. Marilda Rosado de Sá Ribeiro (org.). Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 499.
  • 37
    In: Uma Introdução à Ciência das Finanças. Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 122-123.
  • 38
    Na palavras de Kiyoshi Harada, "entre a União, proprietária dos bens, e os concessionários de recursos hídricos ou minerais não há uma relação de
    poder a legitimar a imposição tributária".
    In Direito Financeiro e Tributário. São Paulo: Atlas, 2006, pp. 79-80. (grifos originais).
  • 39
    Cf. RIBEIRO, Marilda Rosado de Sá.
    Direito do Petróleo. As joint ventures na indústria do petróleo. Rio de Janeiro: Renovar, 2ª ed., 2003, p.184. TORRES, Ricardo Lobo.
    Curso de Direito Financeiro e Tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 12ª ed., p. 191. SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga.
    Natureza Jurídica da Compensação Financeira por Exploração de Recursos Minerais, in Grandes Questões Atuais do Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 1998, v. 2, p. 35. OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. "Aspectos tributários do direito do petróleo - natureza jurídica das participações governamentais - government take",
    in Estudos e pareceres - direito do petróleo e gás. Marilda Rosado de Sá Ribeiro (org.). Rio de Janeiro: Renovar, 2005. MANEZELLO, Maria D´Assunção Costa.
    Comentários à Lei do Petróleo. São Paulo: Atlas, 2000. GUTMAN. José.
    Tributação e Outras Obrigações na Indústria do Petróleo. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2007. OLIVEIRA. Régis Fernandes de.
    Curso de Direito Financeiro. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2006. SANTOS. Sérgio Honorato dos.
    Royalties do Petróleo à luz do Direito Positivo. Rio de Janeiro: Esplanada, 2002. HARADA, Kiyoshi.
    Direito Financeiro e Tributário. São Paulo: Atlas, 2006. SCAFF. Fernando Facury. "Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM): Natureza Jurídica, Competência Normativa e Prescrição",
    in Revista de Direito do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, vol. 3. TAVEIRA. Heleno Torres. "A Compensação financeira devida pela utilização de recursos hídricos, exploração de recursos minerais ou produção de petróleo, xisto betuminoso e gás natural (art. 20, § 1º, CF) - sua natureza jurídica",
    in Grandes questões atuais do direito tributário. Valdir de Oliveira Rocha (coord.). São Paulo: Dialética, 1998. ROSA JR. Luiz Emygdio da.
    Curso de Direito Financeiro e Tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.
  • 40
    A própria literalidade do texto legal distingue as participações governamentais dos tributos, como se verifica no artigo 26 da Lei nº 9.478/97: "A concessão implica, para o concessionário, a obrigação de explorar, por sua conta e risco e, em caso de êxito, produzir petróleo ou gás natural em determinado bloco, conferindo-lhe a propriedade desses bens, após extraídos, com os encargos relativos ao pagamento dos tributos incidentes e das participações legais ou contratuais correspondentes" (grifos nossos).
  • 41
    A natureza de preço das compensações financeiras foi defendida pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 2.586/DF, rel. Min. Carlos Velloso, DJ 01.08.2003. Em sentido contrário, entendendo que não há qualquer relação jurídica consensual que permita à contraprestação ser qualificada como preço público, posiciona-se Heleno Taveira Torres (
    in op.
    cit. p. 77). Apesar do profundo estudo realizado pelo prof. Heleno Torres, não nos parece ser a melhor posição, visto que, apesar de haver, como visto no item II, inserções de normas de direito público, o contrato de concessão é regido essencialmente por normas de direito privado, havendo, portanto, manifestação de vontade na formação da relação jurídica contratual.
  • 42
    Op. cit. p. 191.
  • 43
    Cf.: SOUZA. Rubens Gomes de. "Normas gerais de direito financeiro",
    in Revista Forense. Rio de Janeiro: Forense, 1954, v. 155, p. 21.
  • 44
    In: Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, tomo I, 2001, pp. 107-108.
  • 45
    Cf.: COUTO E SILVA. Sandra Maria do; OLIVEIRA. Jorge Rubem Folena de. "Dos royalties do petróleo: o princípio federativo e a competência dos estados editarem leis para sua cobrança e fiscalização". Artigo ainda não publicado, gentilmente cedido pelos autores.
  • 46
    "Ora se Estados e Municípios podem efetuar registros das concessões concedidas pela União, a quem cabe efetuar outorga, pode fiscalizar tais atos. (...) Seria inadmissível que ente federativo fosse credor de determinada receita não tributária e não pudesse fiscalizar seu recolhimento ou a produção mineral ou geração de energia elétrica, na preservação de seu interesse. Os órgãos da administração direta da União nenhum interesse terão, uma vez que integram uma só pessoa jurídica. No entanto, Estados e Municípios são entes federativos, dotados de personalidade jurídica de direito público. Logo, aptos a exercerem seus direitos no mundo do direito."
    In: Curso de Direito Financeiro. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2006, pp. 221-222.
  • 47
    Expressão utilizada pela Min. Ellen Gracie, no julgamento do RE 253.906-6/MG.
  • 48
    Cf.: OLIVEIRA. Régis Fernandes de.
    op. cit. p. 223.
  • 49
    "Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;"
  • 50
    A partir da Lei Estadual nº 6.710, de 14 de janeiro de 2005, do Estado do Pará, foram editadas a Lei Estadual nº 6.095, de 14 de dezembro de 2006, do Estado de Sergipe, a Lei Estadual nº 8.501, de 10 de maio de 2007, do Estado do Espírito Santo e a Lei Estadual nº 5.139, de 29 de novembro de 2007, do Estado do Rio de Janeiro, a qual tivemos a honra de elaborar o anteprojeto e cuja justificativa ressalta justamente o fato de que essas receitas são originárias do Estado, nos seguintes termos: "Por se tratar de receita originária do Estado, que lhe é confiada diretamente pela Constituição, e não mero repasse de verbas da União, tem o Estado-membro a prerrogativa constitucionalmente consagrada de fiscalizar e de controlar as receitas não-tributárias oriundas das compensações financeiras e das participações governamentais decorrentes da exploração de recursos hídricos e minerais, inclusive petróleo e gás natural, efetuada em seu território (art. 23, XI da CRFB)".
  • 51
    GUTMAN. José.
    op.
    cit. pp. 10-11.
  • 52
    A estrutura e atribuições da ANP decorrem de lei, nos termos do inciso III do artigo 177 da Constituição. Como afirma o Min. Eros Grau, em voto condutor no julgamento da ADI nº 3273-9/DF, "a ANP não pode ser, e efetivamente não é, senão uma autarquia" e, como tal, tem sua criação e atuação dependente de lei específica.
  • 53
    Como afirma Pedro Dutra, "a Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, que criou a Agência Nacional de Petróleo - ANP - dispõe que '
    a ANP terá como finalidade promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo...'. Em verdade, esta é a finalidade da Lei nº 9.478/97 - a regulação do mercado de petróleo em território brasileiro - e não da ANP, órgão administrativo especialmente criado ao qual a lei atribui competência para aplicá-la".
    In "Concorrência em Mercado regulado: a ação da ANP",
    in Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar. 2002. 229. p. 348). A ampliação pela referida via interpretativa equivocada não visa a suprir omissão legal. Pelo contrário, desvirtua totalmente o ambiente regulatório da atividade econômica, aumentando, sem lastro constitucional ou legal, o âmbito de atuação do órgão regulador.
  • 54
    OLIVEIRA. Regis Fernandes de.
    op.
    cit. p. 223.
  • 55
    O Ministro Marco Aurélio, ao proferir seu voto no julgamento do MS nº 24.312-1/DF, inclusive, manifestou-se expressamente no sentido de que o produto da arrecadação das participações governamentais pertence ao Estado-membro, destacando a autonomia governamental, nos seguintes termos: "Acompanho Sua Excelência porque estabeleço uma distinção entre o repasse de que cogita o inciso VI do artigo 71 da Constituição Federal, a pressupor sempre recurso federal, e o assegurado aos Estados como direito próprio, em termos de participação. Portanto, o numerário pertence ao Estado, que participa, tem um aporte de recursos, considerado o § 1º do artigo 20 da Constituição Federal. A óptica, sem dúvida, homenageia a autonomia governamental, tão pertinente quando se vive em uma federação."
  • 56
    In: "Agências Reguladoras e Democracia: Existe um Déficit Democrático na 'Regulação Independente'?",
    in O Poder Normativo das Agências Reguladoras. Alexandre Santos de Aragão (coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2006, pp. 301-332.
  • 57
    Marcos Juruena Villela Souto, a respeito da legitimidade democrática das agências reguladoras, com base em Ruy Santacruz, afirma que três foram as teorias que "buscaram fundamentar essa função, a saber, a teoria da transmissão democrática (
    transmission belt model), teoria dos burocratas técnicos (
    expertise model), teoria do procedimento
    (procedural model). A primeira aceita tal delegação às agências pelo fato de ser o legislador, legitimado constitucionalmente, que cria o ente e lhe transfere balizas de atuação. A segunda teoria justifica a transferência por estarem estas agências formadas por técnicos especializados em matérias as quais o Congresso não teria condições de regular. Já a teoria do procedimento legitima a atuação das agências por garantir aos interessados a participação no seu processo de tomada de decisões. Esta parece ser a que mais se ajusta à teoria da Democracia, a ser abordada um pouco adiante."
    In Direito Administrativo Regulatório. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2002 p. 235.
  • 58
    Como afirma Marçal Justen Filho, a respeito da forma de superação do aparente
    déficit democrático na regulação independente: "a existência de agências independentes apenas pode ser admitida, num Estado Democrático, na medida em que sua estruturação assegure a ampliação do nível de democracia do sistema em seu conjunto. Quando se identifica a agência independente como um mecanismo de suprimento do
    déficit democrático externo, presume-se uma organização institucional que assegure a realização dos fins democráticos buscados. Uma agência independente organizada de forma não democrática agrava o
    déficit democrático geral do sistema político examinado e propicia males maiores do que benefícios."
    Op. cit. p. 314.
  • 59
    Alexandre Santos de Aragão afirma, a respeito da legitimação do processo decisório das agências reguladoras: "(...) um dos mecanismos de legitimação da Administração Pública que mais vem sendo institucionalizado em nosso direito positivo é o da participação dos titulares e defensores dos interesses individuais, coletivos e difusos no processo de tomada das decisões que lhes afetarão."
    In Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2004. Já Paulo Todescan Lessa Mattos, em profundo estudo dedicado ao tema, conclui que: "A tensão entre a criação de burocracias tecnicamente especializadas dotadas de autonomia decisória e a exigência de legitimação poderia, contudo, ser tomada em outra perspectiva, que levasse em consideração a atuação de grupos de interesse sobre as
    agências reguladoras e as possibilidades de legitimação a partir dos canais de participação institucionalizados e a partir das condições efetivas de participação passariam a importar dentro do debate sobre teorias da democracia."
    In "Autonomia decisória, discricionariedade administrativa e legitimidade da função reguladora do Estado no debate jurídico brasileiro",
    in O Poder Normativo das Agências Reguladoras. Alexandre Santos de Aragão (coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 361.
  • 60
    Cf.: OLIVEIRA. Regis Fernandes de.
    op. cit. p. 223.
  • Endereço para correspondência:
    Rua da Alfandega, 42, 1º andar
    Centro
    Rio de Janeiro - RJ - Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Abr 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2009

    Histórico

    • Recebido
      15 Maio 2009
    • Aceito
      12 Nov 2009
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