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Diagnóstico da doença do enxerto versus hospedeiro através de biópsia de lesões na mucosa oral

CASE REPORT

Diagnóstico da doença do enxerto versus hospedeiro através de biópsia de lesões na mucosa oral

Alexandre Pinto MaiaI; Pollianna Muniz AlvesII; Roberto Tiago Alves PinheiroIII; Kátia Maria Gonçalves MarquesIV; Hébel Cavalcanti GalvãoV

IMestrado em Periodontia/ UFRN, Doutorando em Patologia Oral/UFRN, bolsista CAPES

IIMestrado em Diagnóstico Oral/UFPB, Doutoranda em Patologia Oral/UFRN - bolsista CAPES

IIICirurgião-dentista, Residente em Cirurgia Buco-Maxilo-Facial do Hospital da Restauração, Recife, PE

IVCirurgiã-dentista, Cirurgiã-dentista do HEMOPE, Recife/PE

VDoutora em Patologia Oral, Professora do Programa de Pós-graduação em Patologia Oral/ UFRN

Palavras-chave: biópsia, doença enxerto-hospedeiro, mucosa oral.

INTRODUÇÃO

O transplante de medula óssea (TMO) é uma modalidade terapêutica que promove chance de cura ou prognóstico melhor para pacientes com doenças hematológicas malignas ou não-neoplásicas, como talassemia e anemia falciforme, além de tumores como carcinoma de células renais1-2.

Dentre as complicações do TMO, a principal é a Doença do Enxerto Versus Hospedeiro (DEVH), que é uma reação imunológica resultante do enxerto de células imunocompetentes de um doador para um hospedeiro imunocomprometido. A DEVH ocorre entre 50% e 80% dos pacientes submetidos à TMO, e é a principal causa de morbi-mortalidade a longo prazo3.

Embora a fisiopatologia do DEVH não esteja totalmente esclarecida, acredita-se ser primariamente mediada por células T reconhecendo os tecidos do paciente como antígeno, devido a diferenças de histocompatibilidade4-5.

As manifestações clínicas do DEVH afetam mais frequentemente a pele, fígado, trato gastrintestinal e mucosa oral6. As manifestações orais da DEVH incluem lesões liquenoides, ulcerações da mucosa, glossite atrófica, eritema difuso, distúrbios do paladar e hipofunção das glândulas salivares, levando à xerostomia3-4.

Diante do exposto, o presente trabalho tem por objetivo relatar um caso com diagnóstico de DEVH, obtido através de biópsia de mucosa oral, bem como discutir aspectos relevantes desta patologia.

APRESENTAÇÃO DO CASO

Paciente do gênero masculino, 15 anos, procurou serviço odontológico aproximadamente 30 dias após o aparecimento de lesões na mucosa oral, de coloração esbranquiçada e difusa, referindo não ser tabagista ou etilista. O paciente descreveu história de anemia aplástica severa, submetido ao TMO há aproximadamente dois anos.

Ao exame oroscópico, observaram-se lesões de coloração esbranquiçada, de aspecto liquenoide na região de mucosa jugal, palato e língua, sem sintomatologia dolorosa associada (Figura 1). Não apresentava nenhuma alteração sugestiva de tal condição na pele e outros órgãos, com função hepática e renal preservadas e radiografia de tórax normal.


O início das lesões coincidiu após a suspensão do imunossupressor Ciclosporina, usado para evitar o desenvolvimento da DEVH. Como o paciente era pós-TMO e os achados clínicos de lesões brancas com aspecto liquenoide eram compatível com DEVH, foi realizada biópsia incisional da lesão na língua.

Histologicamente pôde-se observar a presença de fragmento de mucosa oral, revestida por epitélio pavimentoso estratificado hiperparaceratinizado, exibindo áreas com perda de nitidez da camada basal. O tecido conjuntivo subjacente era do tipo fibroso denso, apresentando intenso infiltrado inflamatório predominantemente linfocitário, localizado em sua maior parte justaepitelial em forma de faixa (Figura 1). Portanto, associando-se a história clínica anterior com estes achados histopatológicos o diagnóstico de DEVH pôde ser confirmado.

Foi reinstituída a Ciclosporina em dose baixa associada a bochechos com Betametasona 0,1mg/ml, três vezes ao dia durante 15 dias, passando para uma vez ao dia por tempo indeterminado. O paciente segue em acompanhamento, sem recidiva das lesões.

DISCUSSÃO

A DEVH pode ser limitada, afetando apenas a pele ou mucosa oral, ou pode ser disseminada, afetando dois ou mais órgãos5-6. O caso relatado trata-se da forma limitada da DEVH, em que apenas a mucosa oral estava afetada, sem que qualquer outra manifestação clínica tenha sido observada.

As lesões liquenoides são as mais comumente observadas, e estão distribuídas na mucosa jugal, gengival e lingual. O diagnóstico diferencial inclui líquen plano, eritema multiforme, lúpus eritematoso e lesões associadas à quimioterapia1-4.

As lesões observadas na mucosa oral deste paciente apresentavam-se com aspecto liquenoide, sendo eliminado as hipóteses de doenças autoimune pela história do paciente, bem como de lesões associadas à quimioterapia em virtude do intervalo de tempo entre a mesma e o surgimento das lesões, que era de 2 anos.

Assim, pela história prévia de TMO e pelos achados histológicos, o diagnóstico conclusivo foi de DEVH.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em virtude da alta incidência do acometimento da mucosa oral e da facilidade da realização de biópsia, tal procedimento pode ser adotado para o diagnóstico definitivo da DEVH em pacientes pós-TMO, contribuindo para um melhor prognóstico e qualidade de vida desses pacientes.

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 11 de setembro de 2007. cod. 4783

Artigo aceito em 4 de novembro de 2007

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jul 2010
  • Data do Fascículo
    Jun 2010
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