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Doença de Rosai-Dorfman como diagnóstico diferencial de lesão ulcerada de prega vocal

diagnóstico; distúrbios da voz; glote; histiocitose sinus; laringe

CASE REPORT

Doença de Rosai-Dorfman como diagnóstico diferencial de lesão ulcerada de prega vocal

Carlos Eduardo Coelho BarbalhoI; Déborah Nogueira VasconcelosII; João Aragão Ximenes FilhoIII; André Alencar AraripeIV; Francisco Valdeci de Almeida FerreiraV

IMédico Residente 2º ano de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará

IIMédica Residente 3º ano de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará

IIIMédico Otorrinolaringologista PhD, Prof. Adjunto de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará

IVMédico Otorrinolaringologista, Prof. Auxiliar de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará

VMédico Patologista PhD, Prof. Adjunto da Universidade Federal do Ceará

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Carlos Eduardo Coelho Barbalho R. Capitão Francisco Pedro 1290 Rodolfo Teófilo Fortaleza CE Brasil Tel. (55 85) 3366-8373 E-mail: cecbarbalho@hotmail.com

Palavras-chave: diagnóstico, distúrbios da voz, glote, histiocitose sinus, laringe.

INTRODUÇÃO

A Doença de Rosai-Dorfman (DRD) foi descrita em 1969 por Rosai e Dorfman1. É uma rara condição linfoproliferativa, benigna e caracteriza-se por linfadenopatia cervical indolor, febre, neutrofilia, elevação do VHS e hipergamaglobulinemia policlonal2. Na literatura há casos de envolvimento laríngeo associado à linfadenopatia ou doença em outros sítios3,5, no entanto, não há descrição de acometimento glótico isolado, como o apresentado. A DRD tem etiologia incerta. Apresentamos um caso diagnosticado e tratado em nosso serviço e uma pequena revisão da literatura.

APRESENTAÇÃO DO CASO

JFG, , 58 anos, com disfonia há 4 meses, sem outros sintomas otorrinolaringológicos ou sistêmicos. Tabagista 90 maços/ano, etilista social, sem história de tuberculose prévia ou co-morbidades. Exame físico normal. A videolaringoestroboscopia revelou ulceração, com redução da onda mucosa em prega vocal direita (PVD), com mobilidade laríngea normal (Figura A). A nasofibroscopia não mostrou alterações. A tomografia computadorizada (TC) da laringe revelou assimetria de pregas vocais, sem linfadenopatias. As hipóteses diagnósticas foram tuberculose laríngea e carcinoma espinocelular de PVD. Decidiu-se realizar biópsia excisional. O laudo histopatológico evidenciou processo inflamatório inespecífico. As colorações para fungos, BK, hanseníase (Grocott e Wade) foram negativas. Foi solicitado revisão de lâmina, a qual revelou exsudato mononuclear, histiócitos, células gigantes, quase todas exibindo emperipolese. A imunoistoquímica foi positiva para os marcadores CD68 e S100 em células gigantes e em histiócitos.


Os exames laboratoriais, incluindo sorologias para HIV, vírus B e C, eletroforese de proteínas, ANCA, FAN e fator reumatoide foram normais, exceto VHS = 22. Na ocasião PPD negativo, BAAR e fungos no escarro negativos. A TC dos seios paranasais não revelou lesões. A TC de tórax evidenciou bronquioloectasia de aspecto cicatricial no lobo superior esquerdo. Realizou-se broncoscopia, mostrando hiperemia de mucosa no lobo superior esquerdo, óstios pérvios, sem lesão endobrônquica. O lavado traqueobrônquico foi normal.

O paciente foi acompanhado com laringoscopia a cada 3 meses. Não foi utilizado nenhum tratamento adjuvante. O aspecto pós-operatório à videolaringoscopia, após um ano da cirurgia, mostra apenas pequena sinequia em comissura anterior glótica. (Figura B)

DISCUSSÃO

A DRD é uma rara causa de linfonodomegalia, tem certa predileção por homens e indivíduos negros3. Sua etiologia é incerta, tendo sido documentada associação com doenças imunológicas4. O quadro clínico clássico não precisa estar presente em todos os casos4. O dado histopatológico característico é a emperipolese, que é o englobamento de linfócitos ou células plasmáticas por células gigantes. Estas são positivas, à imunoistoquímica, para marcadores S100, a1fa1-antiquimiotripsina, CD682,4.

O acometimento extranodal está presente em 40% dos pacientes e tem diagnóstico desafiador já que, à microscopia, exibe mais fibrose e menor grau de emperipolese5. Além disso, no caso apresentado, o paciente não apresentava as características típicas da doença, tornando o diagnóstico mais difícil.

Tanto tuberculose quanto carcinoma espinocelular de laringe tem o tabagismo como fator de risco importante e pode apresentar-se sob três aspectos à laringoscopia: ulcerativo, infiltrativo e vegetante. Por isso foram hipóteses diagnósticas consideradas inicialmente. O diagnóstico diferencial da DRD inclui neoplasias malignas linforreticulares, SIDA e púrpura trombocitopênica idiopática que apresentam características histopatológicas semelhantes2,4.

A DRD, em geral, é autolimitada. Pulsone at al., em 2002, encontraram que 50% dos casos não necessitaram tratamento6. Nessa revisão, os autores concluíram que sempre que possível é aconselhável apenas observação clínica, a quimioterapia geralmente é ineficaz, a radioterapia tem eficácia limitada. O papel da cirurgia é para aliviar casos de obstrução5 e para biópsia da lesão. Uma possível eficácia da associação de metrotrexato e 6-mercaptopurina já foi demonstrada3.

COMENTÁRIOS FINAIS

A DRD é uma incomum proliferação atípica de histiócitos. É ainda mais raro o acometimento extranodal e de forma isolada, como no presente caso. Sua etiologia é incerta. O diagnóstico da DRD é histopatológico e imunoistoquímico. Possui curso variável, mas geralmente autolimitada. Novos métodos de tratamento estão em estudo.

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 12 de novembro de 2009. cod. 6781

Artigo aceito em 20 de março de 2010.

Hospital Universitário Walter Cantídio - Universidade Federal do Ceará.

  • 1. Rosai J, Dorfman RF. Sinus histiocytosis with massive lymphadenopathy - A newly recognized benign clinic-pathological entity. Arch Pathol. 1969; 87: 63-70.
  • 2. Pinto DCG, Vidigal TA, Castro B, Santos BH, Sousa NJA. Doença de Rosai-Dorfman como diagnóstico diferencial de linfadenopatia cervical. Braz J Otorhinolaryngol. 2008; 74: 632-5.
  • 3. Cossor F, Al-Khater AM, Doll DC. Laryngeal Obstruction and Hoarseness Associated With Rosai-Dorfman Disease. J Clin Oncol. 2006; 24: 1953-5.
  • 4. Gupta P, Babyn P. Sinus histiocytosis with massive lymphadenopathy (Rosai-Dorfman disease): a clinicoradiological profile of three cases including two with skeletal disease. Pediatr Radiol. 2008; 38: 721-8.
  • 5. Ünal ÖF, Koçanb EG, Sungurc A, Kayaa S. Rosai-Dorfman disease with multi-organ involvement in head and neck region. Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2004; 68: 581-4.
  • 6. Pulsoni A, Anghel G, Falcucci P, Matera, R Pescarmona, Ribersani M. Treatment of Sinus Histiocytosis Whit Massive Lynfadenopathy (Rosai-Dorfman Disease): Report of a case and literature Review. Am J Hematol. 2000; 69: 61-71.
  • Endereço para correspondência:

    Carlos Eduardo Coelho Barbalho
    R. Capitão Francisco Pedro 1290 Rodolfo Teófilo
    Fortaleza CE Brasil
    Tel. (55 85) 3366-8373
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Dez 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Recebido
      12 Nov 2009
    • Aceito
      20 Mar 2010
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