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Papiloma invertido nasossinusal com envolvimento da orelha média e mastoide

CASE REPORT

Papiloma invertido nasossinusal com envolvimento da orelha média e mastoide

Jônatas Lopes BarbosaI; Sebastião Diógenes PinheiroII; Marcos Rabelo de FreitasIII; André Alencar Araripe NunesIV; Elias Bezerra LeiteV

IGraduado em Medicina pela Universidade Federal do Ceará (Médico Residente do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Walter Cantídio da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará)

IIDoutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Professor Adjunto da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará)

IIIDoutor em Medicina pela Universidade Federal do Ceará (Coordenador da Residência Médica e Professor Assistente do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Walter Cantídio da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará)

IVTítulo de especialista em Otorrinolaringologia pela Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (Professor Auxiliar e chefe do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Walter Cantídio da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará)

VTítulo de especialista em Otorrinolaringologia pela Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (Médico Assistente do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Walter Cantídio da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará)

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Jônatas Lopes Barbosa Rua Marcondes Pereira, nº 987, Dionísio Torres Fortaleza - CE. CEP: 60130-060

Palavras-chave: orelha média, osso temporal, papiloma invertido.

INTRODUÇÃO

Papiloma invertido (PI) é uma rara neoplasia benigna com forte tendência a recorrência e agressividade local, representando 0,5%-4% dos tumores nasais1-3. Algumas etiologias têm sido propostas, incluindo rinite alérgica, inflamação crônica e tabagismo. Há possível associação com o papiloma vírus humano (HPV)1. Os subtipos 6, 11, 16 e 18 do HPV são os mais encontrados e há preponderância dos dois primeiros4. O envolvimento da orelha média e/ou mastoide é raro, tendo sido descritos apenas 19 casos na literatura científica de língua inglesa até junho de 20101.

RELATO DE CASO

F.M.A., masculino, 46 anos, foi atendido em agosto de 2008 com obstrução nasal, rinorreia e episódios de epistaxe leve à direita de quatro meses de evolução. Já tinha o diagnóstico de PI, confirmado por histopatológico. À tomografia computadorizada (TC) de nariz e seios da face, tratava-se de um PI com estadiamento T2 de Krouse (tumor envolvia cavidade nasal, seio etmoidal e porção medial do seio maxilar)3. Realizou-se a ressecção endoscópica da lesão e o paciente passou a ser acompanhado ambulatorialmente.

Nove meses depois, os sintomas retornaram. A nasofibroscopia evidenciou recidiva da lesão e a TC mostrava tratar-se agora de um T3 de Krouse (tumor envolvia cavidade nasal, seios etmoidal, esfenoidal e porção lateral do seio maxilar)3. Desta vez, a ressecção foi feita por técnica combinada: via endoscópica associada ao degloving médio-facial.

Houve recidiva em mais três ocasiões. Na última, em setembro de 2010, a lesão exteriorizava-se por ambas as narinas, havia abaulamento e dor em maxila direita, hipoacusia, otalgia e otorreia purulenta ipsilateral. A otoscopia mostrava lesão de aspecto papilomatoso ocluindo o conduto auditivo externo, recoberta por secreção purulenta.

A TC evidenciava lesão tumoral ocupando toda a fossa nasal e invadindo a mastoide direita, com intensa destruição óssea (Figura 1A-B).



Foi submetido à exérese da lesão nasal e, uma semana depois, à mastoidectomia radical. Os histopatológicos confirmaram tratar-se de PI, sem transformação maligna (Figura 1C-D).

Evoluiu com rápida recidiva da lesão em cavidade nasal, orelha média e mastoide direitas. Foi encaminhado à radioterapia e programada uma dose total de 5000 cGy, dividida em 20 frações. Houve rápida regressão da lesão, mas o paciente abandonou o tratamento e veio a falecer 2 meses depois de causa desconhecida.

DISCUSSÃO

O sítio primário do PI quase sempre é a parede lateral do nariz e pode estender-se aos seios paranasais, órbita e base anterior do crânio5. O envolvimento da orelha média e mastoide é raro1,2,5,6. Atualmente, há duas teorias principais que procuram explicar tal acometimento: uma delas defende a ideia de ser uma extensão da lesão da cavidade nasossinusal, via tuba auditiva; a outra apoia a hipótese de uma migração embriológica da mucosa schneideriana para a orelha média. Esse tecido ectópico submetido a agressões, como as otites crônicas, seria um fator estimulante para o aparecimento dessas lesões5,6.

Os sinais e sintomas da doença nasossinusal são inespecíficos. Pode haver obstrução nasal unilateral, epistaxe, hiposmia, rinorreia e rinossinusites de repetição1. O acometimento da orelha média pode manifestar-se por hipoacusia, plenitude auricular e otorreia. Em alguns casos, há visualização de lesões papilomatosas no conduto auditivo externo.

O PI nasossinusal ocorre predominantemente nos homens, em uma razão de 4:1 (homem:mulher)5, mas a revisão dos relatos mostra que entre os casos envolvendo o osso temporal esta razão é de 1:1,8. O comportamento agressivo é semelhante ao envolvimento nasossinusal, com intensa destruição óssea. A taxa de transformação maligna (5%-15% nos casos de PI nasossinusal)1,2,5 é maior nos casos com acometimento do osso temporal (33%).

O diagnóstico diferencial inclui paragangliomas, adenomas de orelha média e adenocarcinoma do saco endolinfático6.

O tratamento de eleição é a ressecção cirúrgica com margens livres de doença. No caso de acometimento do osso temporal, a timpanomastoidectomia é uma excelente escolha como tratamento inicial6. Outra alternativa seria a ressecção radical do osso temporal, mas a agressividade do procedimento não justifica seu uso, principalmente se não houver evidência de malignidade1,6.

A radioterapia (RT) pós-operatória não é indicada de rotina, pelo risco de malignização e osteorradionecrose1,2. Ela deve ser levada em consideração nos casos em que há focos de transformação maligna do PI. A RT também pode ser usada quando há impossibilidade de ressecção completa do tumor ou múltiplas recorrências, mesmo sem malignidade. Essas indicações podem ser extrapoladas para os casos com envolvimento do osso temporal1.

COMENTÁRIOS FINAIS

A importância desse relato reside na raridade do caso e que, apesar disso, o PI deve ser incluído no diagnóstico diferencial de tumores da orelha média. A ocorrência de otite média em paciente com história de PI nasossinusal deve alertar para a possibilidade de envolvimento do osso temporal1. O tratamento preferido é o cirúrgico, mas a RT pode ser considerada em casos selecionados.

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da BJORL em 17 de outubro de 2011. cod. 8846.

Artigo aceito em 1 de julho de 2012.

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  • Endereço para correspondência:

    Jônatas Lopes Barbosa
    Rua Marcondes Pereira, nº 987, Dionísio Torres
    Fortaleza - CE. CEP: 60130-060
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012
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