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Effects of diabetes mellitus and systemic arterial hypertension on elderly patients' hearing Como citar este artigo: Rolim LP, Samelli AG, Moreira RR, Matas CG, Santos IS, Bensenor IM, et al. Effects of diabetes mellitus and systemic arterial hypertension on elderly patients' hearing. Braz J Otorhinolaryngol. 2018;84:762-71.s ,☆☆ ☆☆ Trabalho feito no Curso de Fonoaudiologia, Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP, Brasil.

Resumo:

Introdução:

Doenças crônicas podem atuar como fator de aceleração na degeneração do sistema auditivo. Os estudos sobre a associação da presbiacusia com o diabetes mellitus e com a hipertensão arterial sistêmica mostraram conclusões controversas.

Objetivo:

Comparar a audiometria inicial (A1) com uma audiometria sequencial (A2) feita com um intervalo de três a quatro anos em uma população de idosos portadores de diabetes mellitus e/ou hipertensão arterial sistêmica, a fim de saber se a perda de acuidade auditiva nesses grupos é mais acelerada comparados com controles sem essas condições clínicas.

Método:

Participaram deste estudo 100 idosos. Para a análise dos limiares auditivos, foram usadas: uma avaliação audiológica completa feita anteriormente (A1) e uma nova avaliação audiológica (A2) feita após três a quatro anos da primeira. Os participantes foram distribuídos em quatro grupos: 20 indivíduos no grupo com diabetes mellitus, 20 no grupo hipertensão arterial sistêmica, 20 no grupo diabetes mellitus/hipertensão arterial sistêmica e 40 indivíduos no grupo controle, foram pareados com cada grupo de estudo, de acordo com as características referentes a idade e sexo. Foram usados os testes estatísticos Anova e Kruskal-Wallis, com nível de significância de 0,05.

Resultados:

Na comparação da média de aumento anual dos limiares auditivos da avaliação A1 com a avaliação A2, considerando cada grupo estudo e seu respectivo controle, pode-se observar que para o grupo diabetes mellitus não houve diferença estatisticamente significante para qualquer das frequências; para o grupo hipertensão arterial sistêmica foram observadas diferenças significantes a partir de 4 kHz. Já para o grupo diabetes mellitus/hipertensão arterial sistêmica foram observadas diferenças significantes nas frequências de 500, 2k, 3k e 8 kHz.

Conclusão:

Verificou-se que o grupo hipertensão arterial sistêmica foi o que apresentou maior queda dos limiares auditivos no segmento estudado, quando comparado com os outros grupos, sugeriu que entre as três condições estudadas a hipertensão parece ser a que teve maior influência sobre a audição.

PALAVRAS-CHAVE
Audição; Diabetes mellitus; Hipertensão arterial sistêmica; Perda auditiva; Idoso

Abstract

Introduction:

Chronic diseases can act as an accelerating factor in the auditory system degeneration. Studies on the association between presbycusis and diabetes mellitus and systemic arterial hypertension have shown controversial conclusions.

Objective:

To compare the initial audiometry (A1) with a subsequent audiometry (A2) performed after a 3 to 4-year interval in a population of elderly patients with diabetes mellitus and/or systemic arterial hypertension, to verify whether hearing loss in these groups is more accelerated when compared to controls without these clinical conditions.

Methods:

100 elderly individuals participated in this study. For the auditory threshold assessment, a previous complete audiological evaluation (A1) and a new audiological evaluation (A2) performed 3-4 years after the first one was utilized. The participants were divided into four groups: 20 individuals in the diabetes mellitus group, 20 individuals in the systemic arterial hypertension group, 20 individuals in the diabetes mellitus/systemic arterial hypertension group and 40 individuals in the control group, matching them with each study group, according to age and gender. ANOVA and Kruskal-Wallis statistical tests were used, with a significance level set at 0.05.

Results:

When comparing the mean annual increase in the auditory thresholds of the A1 with the A2 assessment, considering each study group and its respective control, it can be observed that there was no statistically significant difference for any of the frequencies for the diabetes mellitus group; for the systemic arterial hypertension group, significant differences were observed after 4 kHz. For the diabetes mellitus and systemic arterial hypertension group, significant differences were observed at the frequencies of 500, 2 kHz, 3 kHz and 8 kHz.

Conclusion:

It was observed that the systemic arterial hypertension group showed the greatest decrease in auditory thresholds in the studied segment when compared to the other groups, suggesting that among the three studied conditions, hypertension seems to have the greatest influence on hearing.

KEYWORDS
Hearing; Diabetes mellitus; Systemic arterial hypertension; Hearing loss; Elderly

Introdução

O envelhecimento populacional é hoje um fenômeno universal. O envelhecimento está relacionado ao processo de degeneração progressivo e morte celular, o que leva à diminuição da capacidade funcional do organismo.11 Paskulin LMG, Valer DB, Vianna LAC. Utilização e acesso de idosos a serviços de atenção básica em Porto Alegre (RS, Brasil). Cien Saude Colet. 2011;16:2935-44.,22 Fontaine R. Psicologia do envelhecimento, vol. 1. Climepsi Editores; 2000. p. 1-200.

A perda auditiva decorrente dos processos degenerativos do envelhecimento é conhecida como presbiacusia.33 Gacek MR, Schuknecht HF. Pathology of presbycusis. Int J Audiol. 1969;8:199-209. É, atualmente, o comprometimento sensorial mais frequente entre idosos, com prevalência de 25% na faixa de 70-74 anos, 50% em idosos até 85 anos e maior do que 80% em pessoas acima de 85 anos.44 Koopmann CF. Problemas otolaringológicos no idoso. Med Clin N Am. 1991;6:1411-27.,55 Zhang M, Gomaa N, Ho A. Presbycusis: a critical issue in our community. Int J Otorhinolaryngol Head Neck Surg. 2013;2:111-20.

A presbiacusia pode causar uma redução na percepção da fala, alterações psicológicas (como depressão, por exemplo), isolamento social, problemas relacionados ao alerta e à defesa (capacidade de ouvir buzinas, a campainha do telefone, som de alarmes etc.), bem como as funções cognitivas.55 Zhang M, Gomaa N, Ho A. Presbycusis: a critical issue in our community. Int J Otorhinolaryngol Head Neck Surg. 2013;2:111-20.,66 Kricos PB, Lesner AS. Hearing care for older adult audiologic rehabilitation, vol. 1. Butterworth-Heinemann; 1995. p. 1-282. Todos esses fatores refletem negativamente na qualidade de vida do idoso.55 Zhang M, Gomaa N, Ho A. Presbycusis: a critical issue in our community. Int J Otorhinolaryngol Head Neck Surg. 2013;2:111-20.

6 Kricos PB, Lesner AS. Hearing care for older adult audiologic rehabilitation, vol. 1. Butterworth-Heinemann; 1995. p. 1-282.
-77 Viude A. Fatores associados a presbiacusia em idosos [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Saúde Pública; 2002.

Não obstante a alta prevalência da presbiacusia, alguns autores têm demonstrado que doenças crônicas que mais frequentemente acometem o idoso, como a hipertensão arterial sistêmica (HAS)88 Marková M. The cocheovestibular syndrome in hypertension. Cesk Otolaryngol. 1990;39:89-97.

9 Brohen VM, Caovilla HH, Ganança MM. Dos sintomas e achados audiológicos e vestibulares em indivíduos com hipertensão arterial. Acta Awho. 1996;15:4-10.

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11 Esparza CM, Jáuregui-Renaud K, Morelos CMC, Muhl GEA, Mendez MN, Carillo NS, et al. Systemic high blood pressure and inner ear dysfunction: a preliminary study. Clin Otolaryngol. 2007;32:173-8.
-1212 Rolim LP, Rabelo CM, Lobo IFN, Moreira RR, Samelli AG. Interaction between diabetes mellitus and hypertension on hearing of elderly. Codas. 2015;27:428-32. e o diabetes mellitus (DM)1313 Maia CAS, Campos CAH. Diabetes Mellitus como causa de perda auditiva. Braz J Otorhinolaryngol. 2005;71:208-14.

14 Bainbridge KE, Hoffman HJ, Cowie CC. Diabetes and hearing impairment in the United States: audiometric evidence from the National Health and Nutrition Examination Surveys, 1999 to 2004. Ann Intern Med. 2008;149:1-10.

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16 Agarwal A, Balakrishnan R, Pujary K, Ganapathy K, Nayak D, Hasan F. Pure tone audiometry and otoacoustic emissions for the assessment of hearing loss in diabetic patients. Indian J Otolaryngol. 2013;19:13-7.

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18 Oh I-H, Lee JH, Park DC, Kim M, Chung JH, Kim SH, et al. Hearing loss as a function of aging and diabetes mellitus: a cross sectional study. PLOS ONE. 2014;9:e116161.
-1919 Sunkum JK, Pingile S. A clinical study of audiological profile in diabetes mellitus patients. Eur Arch Otorhinolaryngol. 2013;270:875-79. podem ter relação com alterações auditivas.

O diabetes mellitus (DM) é uma doença metabólica que produz complicações vasculares e mau funcionamento neurológico em pacientes com essa alteração. O número de adultos com diabetes no mundo aumentou de 108 milhões em 1980 para 422 milhões em 2014.2020 NCD Risk Factor Collaboration (NCD-RisC). Worldwide trends in diabetes since 1980: a pooled analysis of 751 population-based studies with 4.4 million participants. Lancet. 2016;387:1513-30. O ELSA-Brasil, estudo de coorte de 15.105 servidores civis de 35-74 anos, verificou prevalência de 19,7% de diabetes.2121 Schmidt MI, Hoffmann JF, Diniz MFS, Lotufo PA, Griep RH, Bensenor IM, et al. High prevalence of diabetes and intermediate hyperglycemia - the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). Diabetol Metab Syndr. 2014;6:1-9. A perda auditiva em indivíduos com DM pode estar relacionada com a angiopatia diabética, que interfere no suprimento de nutrientes e oxigênio para a cóclea, conduz à morte das células e dos tecidos.1313 Maia CAS, Campos CAH. Diabetes Mellitus como causa de perda auditiva. Braz J Otorhinolaryngol. 2005;71:208-14.,2222 Jorgensen MB, Buch NH. Studies on inner-ear and cranial nerves in diabetes. Acta Otolaryngol. 1961;107:179-82.

23 Makishima K, Tanaka AK. Pathological changes of the inner ear and central auditory pathway in diabetes. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1971;80:218-28.
-2424 Fukushima H, Cureoglu S, Schachern PA, Kusunoki T, Oktay MF, Fukushima N, et al. Cochlear changes in patients with type 1 diabetes mellitus. Otolaryngol Head Neck Surg. 2005;133:100-6. Além das alterações cocleares, acredita-se que a DM pode causar degeneração secundária do oitavo nervo craniano e provocar perdas auditivas neurais.1313 Maia CAS, Campos CAH. Diabetes Mellitus como causa de perda auditiva. Braz J Otorhinolaryngol. 2005;71:208-14.,2323 Makishima K, Tanaka AK. Pathological changes of the inner ear and central auditory pathway in diabetes. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1971;80:218-28.,2525 Friedman SA, Schulman RH, Weiss S. Hearing and diabetic neuropathy. Arch Intern Med. 1975;135:573-6.

Já a hipertensão arterial sistêmica (HAS) é uma condição clínica multifatorial, conceituada como síndrome, caracterizada pela presença de níveis tensionais elevados, associados a alterações metabólicas e hormonais e a fenômenos tróficos (hipertrofias cardíaca e vascular).2626 Andrade JP, Nobre F, Tavares A, Brandão AA, Sanjuliani AF, Nogueira AR, et al. Sociedade Brasileira de Cardiologia/Sociedade Brasileira de Hipertensão/Sociedade Brasileira de Nefrologia. VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arq Bras Cardiol. 2010;95(Suppl. 1):1-51. Segundo estudo da World Health Organization, feito em 2013, a prevalência da HAS em adultos acima de 25 anos está em torno de 35% nas Américas.2727 World Health Organization. A global brief on hypertension. Silent killer, global public health crisis: World Health Day, vol. 1; 2013. p. 1-40. O já mencionado estudo ELSA-Brasil, feito em 2015, identificou prevalência de 35,8% entre os 15.103 indivíduos avaliados.2828 Chor D, Ribeiro AL, Carvalho MS, Duncan BB, Lotufo PA, Nobre AA, et al. Prevalence, awareness, treatment and influence of socioeconomic variables on control of high blood pressure: results of the ELSA-Brasil study. PLOS ONE. 2015;10:e0127382. Entre os mecanismos patogênicos da HAS que podem estar envolvidos na perda auditiva podemos citar o prejuízo à integridade do transporte de oxigênio e nutrientes para as células, devido à diminuição do fluxo sanguíneo capilar.2929 Chen YL, Ding YP. Relationship between hypertension and hearing disorders in the elderly. East Afr Med J. 1999;76:344-7.,3030 Kearney PM, Whelton M, Reynolds K, Muntner P, Whelton PK, He J. Global burden of hypertension: analysis of worldwide data. Lancet. 2005;365:217-23. A pressão elevada no sistema vascular ainda pode resultar em hemorragias na orelha interna, pode levar a alterações auditivas permanentes.3131 Bachor E, Selig YK, Jahnke K, Rettinger G, Kaemody CS. Vascular variations of inner ear. Acta Otolaryngol. 2001;121:35-41. A HAS também pode provocar perdas auditivas em virtude das modificações iônicas dos potenciais celulares.99 Brohen VM, Caovilla HH, Ganança MM. Dos sintomas e achados audiológicos e vestibulares em indivíduos com hipertensão arterial. Acta Awho. 1996;15:4-10.

Dessa forma, apesar dos vários estudos feitos nesse sentido, tanto com relação à DM como a HAS, ainda não há um consenso na literatura sobre a associação entre essas alterações e a perda auditiva, especialmente em indivíduos idosos. A hipótese deste estudo é de que idosos hipertensos e/ou diabéticos apresentem perda auditiva progressiva (durante um seguimento de três a quatro anos) mais acentuada quando comparados com indivíduos sem essas condições clínicas.

Métodos

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da instituição, sob o número 458.284.

Casuística

O Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil) é uma investigação multicêntrica de coorte composta por 15 mil funcionários de seis instituições públicas de ensino superior e pesquisa das regiões Nordeste, Sul e Sudeste. A pesquisa tem o propósito de investigar a incidência e os fatores de risco para doenças crônicas, em particular as cardiovasculares e o diabetes. Todos os funcionários e docentes, ativos ou aposentados, entre 35 e 74 anos, foram elegíveis para o estudo.3232 Aquino EML, Barreto SM, Bensenor IM, Carvalho MS, Chor D, Duncan BB, et al. Brazilian Longitudinal Study of Adult health (ELSA-Brasil): objectives and design. Am J Epidemiol. 2012;175:315-24.,3333 Schmidt MI, Duncan BB, Mill JG, Lotufo PA, Chor D, Barreto SM, et al. Cohort profile: Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). Int J Epidemiol. 2015;44:68-75.

Este é um recorte do estudo longitudinal de acompanhamento da audição dos participantes do Elsa-Brasil3434 Samelli AG, Santos IS, Moreira RR, Rabelo CM, Rolim LP, Bensenõr IJ, et al. Diabetes mellitus and sensorineural hearing loss: is there an association? Baseline of the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). Clinics. 2017;72:5-10. (fig. 1). Participaram do estudo 100 indivíduos. Para a análise dos limiares auditivos, foram usadas: uma avaliação audiológica completa feita anteriormente (A1) e uma nova avaliação audiológica (A2) feita após três a quatro anos da primeira. As avaliações audiológicas completas foram compostas por: anamnese; meatoscopia, imitânciometria; audiometria tonal e audiometria vocal.

Figura 1
Fluxograma das etapas de seleção. Elsa, Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto; HA, hipertensão arterial; DM, diabetes mellitus; DMHA, diabetes mellitus e hipertensão arterial. Entre os 40 indivíduos sem HAS ou DM, para cada pareamento (com o grupo HA ou com grupo DM ou com o grupo DMHA), 20 participantes "saudáveis" eram escolhidos, conforme descrito no item Análise dos Dados.

Como critérios de inclusão para o presente estudo, foram estabelecidos: ter 60 anos ou mais; ausência de obstrução do meato acústico externo (MAE) em ambas as orelhas; ausência de alteração de orelha média evidenciada pela imitânciometria; não ter histórico de exposição ocupacional a ruído; ter avaliação audiológica inicial completa (A1), apresentar diabetes mellitus para inclusão no grupo DM; hipertensão arterial sistêmica para inclusão no grupo HA; e DM associada à HAS para inclusão no grupo DM + HA.

Para inclusão em cada um dos grupos, nos baseamos nos exames médicos feitos anteriormente no mesmo hospital. O diabetes foi definido como: uso de medicação para tratamento de diabetes; glicemia em jejum ≥ 126 mg/dL, níveis de hemoglobina glicada (HbA1c) ≥ 6,5% e/ou o teste de tolerância oral à glicose de 2 h ≥ 200 mg/dL. A hipertensão foi definida como: uso de medicação para tratamento da hipertensão; pressão arterial sistólica ≥ 140 mmHg ou pressão arterial diastólica ≥ 90 mmHg.

Assim, de acordo com esses critérios, os participantes compuseram quatro grupos: 20 indivíduos portadores de DM (Grupo DM), 20 de HAS (Grupo HA), 20 de DM e HAS (Grupo DMHA) e 40 não portadores de DM nem de HAS (Grupo Controle [GC]).

Material e procedimentos

Após a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, foram feitos os seguintes procedimentos que compuseram a avaliação audiológica A2: anamnese audiológica, meatoscopia, timpanometria com pesquisa do reflexo acústico ipsilateral (essa última foi feita apenas para verificar a presença de alteração de orelha média) e audiometria tonal, nas frequências de 250-8000 Hz e, se necessário, por via óssea, nas frequências de 500-4000 Hz (quando os limiares auditivos por via aérea estivessem piores do que 20 dBNA). Ressalta-se que a avaliação audiológica A2 foi feita três a quatro anos após a avaliação audiológica A1, acompanhou a periodicidade das ondas do estudo Elsa-Brasil.3232 Aquino EML, Barreto SM, Bensenor IM, Carvalho MS, Chor D, Duncan BB, et al. Brazilian Longitudinal Study of Adult health (ELSA-Brasil): objectives and design. Am J Epidemiol. 2012;175:315-24.,3333 Schmidt MI, Duncan BB, Mill JG, Lotufo PA, Chor D, Barreto SM, et al. Cohort profile: Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). Int J Epidemiol. 2015;44:68-75.

Análise dos dados

Para o estudo da influência da presença de diabetes, hipertensão ou diabetes associada à hipertensão na evolução dos limiares auditivos durante o seguimento (3-4 anos), os participantes com essas condições clínicas foram pareados na proporção 1:1 com participantes de mesmo sexo e idade, nos quais essas condições clínicas estavam ausentes. Em cada pareamento, 20 participantes "saudáveis" eram escolhidos dentre os 40 indivíduos sem HAS ou DM, descritos anteriormente como "grupo controle", com o uso da função Match do pacote Matching do software estatístico R. Foi fixado que o pareamento por sexo deveria ser exato, para cada participante, e que o pareamento por idade fosse escolhido pela melhor aproximação possível para o grupo. Como resultado, obtivemos um pareamento perfeito para a distribuição por sexo e médias bastante semelhantes para a idade em cada um dos grupos comparados com o seu controle (máxima diferença - 0,25 ano), permitiu ser assim um pareamento adequado.

Para a comparação dos limiares auditivos, como não foram observadas diferenças estatisticamente significantes entre as orelhas para qualquer dos grupos estudados, essas foram agrupadas. Para a comparação dos limiares auditivos da primeira avaliação A1 com a segunda avaliação A2 entre os grupos estudo e seu respectivo controle, foi considerado o aumento médio dos limiares auditivos por ano (levou-se em conta o intervalo de três ou quatro anos, dependeu da data da reavaliação de cada indivíduo).

Na análise estatística, além das medidas descritivas, foram usados os testes Anova e Kruskal-Wallis, com nível de significância de 0,05.

Resultados

Na tabela 1, foram apresentados os valores referentes à média de idade dos participantes de cada grupo. Pode-se observar que não houve diferença estatisticamente significante. A diferença na média das idades para cada grupo e seu respectivo controle foi muito pequena (0,25 ano no pior caso). Os grupos também foram pareados em relação ao sexo de maneira exata.

Tabela 1
Estatística descritiva e comparação da idade (em anos) entre os grupos

Em relação à idade no diagnóstico de HAS e DM, no grupo DM a média de idade foi de 61,75 anos. Já no grupo HA, foi de 52,65 anos e no grupo DMHA, foi de 58 anos para DM e para a HAS de 53,15 anos. Em relação ao tempo do diagnóstico das patologias, no grupo DM a média de anos foi de 6,1. Já no grupo HA, a média foi de 16,6 anos e no grupo DMHA, foi de 10,05 anos para DM e para a HAS de 14,09 anos.

Na comparação da média dos limiares auditivos da primeira avaliação A1 com a segunda avaliação A2 entre os grupos, considerando-se a média de aumento dos limiares auditivos por ano, pode-se observar que para o grupo DM não houve diferença estatisticamente significante em qualquer frequência quando comparado com o seu respectivo controle (fig. 2); para o grupo HA foram observadas diferenças significantes em 4 kHz (p= 0,016); 6 kHz (p= 0,013) e 8 kHz (p= 0,037), quando esse foi comparado com seu GC, bem como tendência à diferença significante em 3 kHz (p= 0,060) (fig. 3); já para o grupo DMHA, foram observadas diferenças significantes nas frequências de 500 Hz (p= 0,017), 2 kHz (p= 0,021) e 3 kHz (p< 0,001) entre ele e seu controle, além de tendência à diferença estatisticamente significante em 4 kHz (p= 0,058) e 6 kHz (p= 0,066) (fig. 4).

Figura 2
Comparação da média de aumento anual dos limiares auditivos (em dBNA) das frequências de 250 Hz a 8000 Hz entre as avaliações A1 e A2, para o grupo DM e seu respectivo controle.

Figura 3
Comparação da média de aumento anual dos limiares auditivos (em dBNA) das frequências de 250 Hz a 8000 Hz entre as avaliações A1 e A2, para o grupo HA e seu respectivo controle.

Figura 4
Comparação da média de aumento anual dos limiares auditivos (em dBNA) das frequências de 250 Hz a 8000 Hz entre as avaliações A1 e A2, para o grupo DMHA e seu respectivo controle.

Discussão

Estudar condições que potencialmente podem influenciar a evolução da função auditiva é importante, uma vez que as chances de reabilitação auditiva serão maiores quanto mais cedo tais alterações forem detectadas. Assim, o objetivo do presente estudo foi comparar a audiometria inicial (A1) com uma audiometria (A2) feita com um intervalo de 3-4 anos em uma população de idosos portadores de DM e/ou HAS, a fim de saber se a perda de acuidade auditiva nesses grupos é mais acelerada comparada com controles sem essas condições clínicas. Os participantes foram pareados para idade e sexo para minimizar o efeito dessas variáveis sobre essa associação. Nossos achados indicaram que o grupo HA foi o que apresentou maior queda dos limiares no segmento de três a quatro anos, seguido pelo grupo DMHA, quando comparados com seus grupos controle. Já o grupo DM não mostrou diferenças significantes em relação a seu grupo controle.

Alguns estudos prévios sobre o assunto,1111 Esparza CM, Jáuregui-Renaud K, Morelos CMC, Muhl GEA, Mendez MN, Carillo NS, et al. Systemic high blood pressure and inner ear dysfunction: a preliminary study. Clin Otolaryngol. 2007;32:173-8.,1616 Agarwal A, Balakrishnan R, Pujary K, Ganapathy K, Nayak D, Hasan F. Pure tone audiometry and otoacoustic emissions for the assessment of hearing loss in diabetic patients. Indian J Otolaryngol. 2013;19:13-7. da mesma forma que o presente, buscaram minimizar a influência das variáveis idade e sexo sobre os resultados da avaliação audiológica, uma vez que é sabido que essas variáveis (principalmente a idade) podem determinar comprometimento maior ou menor dos limiares auditivos.3535 Akinpelu OV, Mujica-Mota M, Daniel SJ. Is type 2 diabetes mellitus associated with alterations in hearing? A systematic review and metaanalysis. Laryngoscope. 2014;124:767-76. Um estudo feito no Irã avaliou a audição de 50 pacientes diabéticos e 50 indivíduos saudáveis, pareados por sexo e idade, verificou a perda auditiva foi mais acentuada no grupo com diabetes, enquanto a discriminação de fala foi melhor nos indivíduos normais. Já Esparza et al.1111 Esparza CM, Jáuregui-Renaud K, Morelos CMC, Muhl GEA, Mendez MN, Carillo NS, et al. Systemic high blood pressure and inner ear dysfunction: a preliminary study. Clin Otolaryngol. 2007;32:173-8. compararam a audição de indivíduos hipertensos e não hipertensos, entre 30-62 anos, subdivididos em dois grupos: com e sem HAS, pareados por sexo e idade; os autores observaram disfunções cocleares mais evidentes nos indivíduos com HAS e sugeriram que este fato pode estar relacionado com a doença vascular decorrente da HAS.

Para a comparação dos limiares auditivos da primeira avaliação A1 com a segunda avaliação A2 entre os grupos estudo e seu respectivo controle, considerando o aumento médio dos limiares auditivos por ano, no que se refere ao grupo DM, não houve diferença estatisticamente significante para qualquer frequência avaliada, quando comparado com o seu respectivo controle pareado de acordo com o sexo e a idade.

Diversos autores encontraram associação positiva entre a presença da diabetes e comprometimento auditivo,1313 Maia CAS, Campos CAH. Diabetes Mellitus como causa de perda auditiva. Braz J Otorhinolaryngol. 2005;71:208-14.,1616 Agarwal A, Balakrishnan R, Pujary K, Ganapathy K, Nayak D, Hasan F. Pure tone audiometry and otoacoustic emissions for the assessment of hearing loss in diabetic patients. Indian J Otolaryngol. 2013;19:13-7.,3636 España AR, Birrun O, Lorente J, Trassera J. Hearing and diabetes. ORL J Otorhinolaryngol Relat Spec. 1995;57:325-7. enquanto outros não verificaram essa associação.3737 Dalton DS, Cruickshanks KJ, Klein R, Klein BE, Wiley TL. Association of NIDDM and hearing loss. Diabetes Care. 1998;21:1540-4.,3838 Asma A, Azmi MN, Mazita A, Marina MB, Salina H, Norlaila M. A Single blinded randomized controlled study of the effect of conventional oral hypoglycemic agents versus intensive short-term insulin therapy on pure tone audiometry in type II diabetes mellitus. Indian J Otolaryngol Head Neck Surg. 2011;63:114-8. Alguns autores sugeriram que essa controvérsia pode estar relacionada à presença de muitas variáveis de confusão, bem como à complexidade do sistema auditivo.3434 Samelli AG, Santos IS, Moreira RR, Rabelo CM, Rolim LP, Bensenõr IJ, et al. Diabetes mellitus and sensorineural hearing loss: is there an association? Baseline of the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). Clinics. 2017;72:5-10.,3939 Horikawa C, Kodama S, Tanaka S, Fujihara K, Hirasawa R, Yachi Y, et al. Diabetes and risk of hearing impairment in adults: a meta-analysis. J Clin Endocrinol Metab. 2013;98:51-8.,4040 Vignesh SS, Jaya V, Moses A, Muraleedharan A. Identifying early onset of hearing loss in young adults with diabetes mellitus type 2 using high frequency audiometry. Indian J Otolaryngol Head Neck Surg. 2015;67:234-7.

Observamos que alguns estudos que pesquisaram o efeito do diabetes sobre a audição não excluíram alguns dos fatores de confusão, como, por exemplo: sexo,4040 Vignesh SS, Jaya V, Moses A, Muraleedharan A. Identifying early onset of hearing loss in young adults with diabetes mellitus type 2 using high frequency audiometry. Indian J Otolaryngol Head Neck Surg. 2015;67:234-7.

41 Özel HE, Özkiri M, Gencer ZK, Saydam L. Audiovestibular functions in noninsulin-dependent diabetes mellitus. Acta Otolaryngol. 2014;134:51-7.
-4242 Kakarlapudi V, Sawyer R, Staecker H. The effect of diabetes on sensorineural hearing loss. Otol Neurotol. 2003;24:382-6. idade4141 Özel HE, Özkiri M, Gencer ZK, Saydam L. Audiovestibular functions in noninsulin-dependent diabetes mellitus. Acta Otolaryngol. 2014;134:51-7. e presença de hipertensão arterial,3535 Akinpelu OV, Mujica-Mota M, Daniel SJ. Is type 2 diabetes mellitus associated with alterations in hearing? A systematic review and metaanalysis. Laryngoscope. 2014;124:767-76.,3939 Horikawa C, Kodama S, Tanaka S, Fujihara K, Hirasawa R, Yachi Y, et al. Diabetes and risk of hearing impairment in adults: a meta-analysis. J Clin Endocrinol Metab. 2013;98:51-8. o que pode ter influenciado nos resultados observados. Samelli et al.3434 Samelli AG, Santos IS, Moreira RR, Rabelo CM, Rolim LP, Bensenõr IJ, et al. Diabetes mellitus and sensorineural hearing loss: is there an association? Baseline of the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). Clinics. 2017;72:5-10. avaliaram a audição de 191 diabéticos e de 710 indivíduos sem diabetes, adultos e idosos do Elsa-Brasil (São Paulo); os autores não verificaram diferenças estatisticamente significantes entre os limiares auditivos dos dois grupos, após os ajustes para idade, sexo e presença de hipertensão, sugeriu que esses fatores devem ser considerados em pesquisas dessa natureza. Vale ressaltar que o referido estudo avaliou dados transversais, enquanto o presente usou dados longitudinais.

No que diz respeito ao grupo HA, considerando o aumento médio dos limiares auditivos por ano, foram observadas diferenças significantes a partir de 4 kHz, quando esse foi comparado com o seu GC, bem como tendência à diferença estatisticamente significante em 3 kHz. Dessa forma, verificamos que o Grupo HA apresentou limiares auditivos significantemente piores em comparação com indivíduos sem HAS pareados por sexo e idade.

Esses achados estão de acordo com estudos pregressos, que também verificaram limiares auditivos mais comprometidos em indivíduos com HAS, quando comparados com controles sem essa doença,88 Marková M. The cocheovestibular syndrome in hypertension. Cesk Otolaryngol. 1990;39:89-97.,99 Brohen VM, Caovilla HH, Ganança MM. Dos sintomas e achados audiológicos e vestibulares em indivíduos com hipertensão arterial. Acta Awho. 1996;15:4-10.,1212 Rolim LP, Rabelo CM, Lobo IFN, Moreira RR, Samelli AG. Interaction between diabetes mellitus and hypertension on hearing of elderly. Codas. 2015;27:428-32. e discordam dos estudos de Rey et al.4343 Rey JF, Morello-Castro G, Curto JLB. Factores de riesco involucrados em la presbiacusia. Acta Otorrinolaringol Esp. 2002;53:572-7. e Baraldi et al.,4444 Baraldi GS, Almeida LC, Borges ACLC. Perda auditiva e hipertensão: achados em um grupo de idosos. Braz J Otorhinolaryngol. 2004;70:640-4. que não observaram tal associação.

Em relação ao grupo DMHA, foram observadas diferenças significantes nas frequências de 500, 2 k e 3 kHz, quando comparados com seu controle, além de tendência à diferença estatisticamente significante em 4 k e 6 kHz, indicou um aumento anual dos limiares auditivos nessas frequências significantemente maior no grupo com DMHA. Estudos que avaliaram a audição em indivíduos diabéticos e hipertensos obtiveram resultados controversos: Jorgensen e Buch2222 Jorgensen MB, Buch NH. Studies on inner-ear and cranial nerves in diabetes. Acta Otolaryngol. 1961;107:179-82. não observaram influência dessas variáveis sobre a audição, enquanto Duck et al.4545 Duck SW, Prazma J, Bennett PS, Pillsbury HC. Interaction between hypertension and diabetes mellitus in the pathogenesis of sensorineural hearing loss. Laryngoscope. 1997;107:1596-605. verificaram tal associação. Oron et al.4646 Oron Y, Elgart K, Marom T, Roth Y. Cardiovascular risk factors as causes for hearing impairment. Audiol Neurootol. 2014;19:256-60. também observaram que fatores de risco cardiovasculares (inclusive diabetes e hipertensão) parecem ter efeito sobre a audição, embora não exista uma correlação direta e causal.

Se analisarmos o aumento dos limiares auditivos durante o intervalo de estudo nos três grupos, podemos observar que o Grupo DM comparado com seu controle não mostrou pioria dos limiares; o Grupo HA, comparado com seu controle, apresentou limiares maiores nas frequências altas e o Grupo DMHA, comparado com seu controle, apresentou limiares piores para frequências baixas, médias e altas. Além disso, na comparação da evolução dos três grupos de estudo (DM, HA e DMHA), observou-se que o aumento médio anual é maior no grupo HA, seguido pelo DMHA e, por fim, pelo DM.

Uma das hipóteses para esse achado poderia estar relacionada ao maior tempo da doença no Grupo HA. No entanto, é importante ressaltar que a DM e a HAS são doenças que podem ser assintomáticas e, portanto, o tempo de início da doença pode ser maior do que o referido pelos indivíduos.4747 Schmidt MI, Duncan BB, HoffmannI JF, Moura L, Malta DC, Carvalho RMAV. Prevalência de diabetes e hipertensão no Brasil. Rev Saude Publica. 2009;43:74-82.

Alguns estudos investigaram a influência da duração da doença sobre a pioria dos limiares auditivos. No que se refere à hipertensão arterial, Esparza et al.1111 Esparza CM, Jáuregui-Renaud K, Morelos CMC, Muhl GEA, Mendez MN, Carillo NS, et al. Systemic high blood pressure and inner ear dysfunction: a preliminary study. Clin Otolaryngol. 2007;32:173-8. estudaram um grupo com média de diagnóstico da doença de quatro anos e, mesmo com o pouco tempo de instalação da doença, se comparado com presente estudo, verificaram disfunção coclear nos indivíduos com HAS. Já Agarwal et al.4848 Agarwarl S, Mishra A, Jagade M, Kasbekar V, Nagle SK. Effects of hypertension on hearing. Indian J Otolaryngol Head Neck Surg. 2013;65:614-8. avaliaram diferentes grupos, divididos em três diferentes graus de hipertensão (pelo nível pressórico); a média de duração da doença foi de 3,7 anos para o Grupo Grau 1; 5,4 anos para o Grupo Grau 2 e 9 anos para o Grupo Grau 3, o último grupo apresentou piores limiares auditivos. Deve-se ressaltar que a diferença de tempo de ocorrência da hipertensão observada nos diferentes estudos poderia influenciar nos resultados audiológicos, se considerarmos que essa patologia pode causar insuficiência microcirculatória que pode determinar uma maior ou menor deterioração do sistema auditivo periférico.4949 Carrasco VN, Prazma J, Faber JE. Cochlear microcirculation effect of adrenergic agonists on arteriole diameter. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 1990;116:411-7.,5050 Soares MA. Perfil audiológico de adultos com e sem hipertensãoarterial [dissertação]. São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Medicina; 2014.

Em relação ao DM, Sunkum e Pingile1919 Sunkum JK, Pingile S. A clinical study of audiological profile in diabetes mellitus patients. Eur Arch Otorhinolaryngol. 2013;270:875-79. e Özel et al.4141 Özel HE, Özkiri M, Gencer ZK, Saydam L. Audiovestibular functions in noninsulin-dependent diabetes mellitus. Acta Otolaryngol. 2014;134:51-7. encontraram uma associação positiva entre a duração do diabetes e a perda auditiva, enquanto Akinpelu et al.3535 Akinpelu OV, Mujica-Mota M, Daniel SJ. Is type 2 diabetes mellitus associated with alterations in hearing? A systematic review and metaanalysis. Laryngoscope. 2014;124:767-76. não verificaram relação estatisticamente significante entre a duração do diabetes e a progressão da doença. No entanto, a população estudada, os métodos empregados e a duração da doença variaram muito entre os diversos estudos, o que pode influenciar os resultados encontrados e explicar esses achados controversos. Assim, essa relação entre perda auditiva e duração do diabetes ainda permanece controversa.4141 Özel HE, Özkiri M, Gencer ZK, Saydam L. Audiovestibular functions in noninsulin-dependent diabetes mellitus. Acta Otolaryngol. 2014;134:51-7.

Conforme já mencionado, os grupos estudados na presente investigação diferiram no que se refere ao tempo de diagnóstico da doença (HA, DM e DMHA). Contudo, nosso objetivo não foi fazer uma correlação entre o tempo de duração da doença com a pioria da acuidade auditiva, mas sim verificar, no período de seguimento do estudo, qual a patologia que apresentaria maior influência nos limiares auditivos. Cabe ressaltar que, para que uma correlação entre tempo de diagnóstico e pioria de limiares auditivos pudesse ser estabelecida, seria necessário outro desenho de estudo, comparar, por exemplo, os limiares auditivos de grupos com diferentes períodos de duração da doença e analisar se a pioria dos limiares auditivos ocorreria de forma não linear.

No entanto, não podemos ignorar a possível influência do tempo de duração da doença, uma vez que, no presente estudo, verificamos que no grupo estudo com maior duração da doença a pioria dos limiares auditivos foi mais evidente durante o seguimento e que os limiares auditivos continuaram a aumentar nos indivíduos hipertensos em velocidade maior do que no grupo controle, mesmo após 16 anos do diagnóstico da patologia.

Limitações e potencialidades do estudo

É importante considerar que a amostra de cada grupo estudo é pequena e, talvez, se as comparações fossem feitas com grupos maiores, as diferenças entre os limiares auditivos poderiam ser mais evidentes. No entanto, devemos mencionar que, na faixa etária estudada, é difícil encontrar indivíduos que tenham apenas as condições clínicas estudadas (DM e/ou HAS).

Além disso, é importante ressaltar que a progressão dos limiares auditivos foi mensurada de forma linear, dentro de um período determinado, sem correlacionar a perda auditiva com o tempo da doença, o que também exigiria uma amostra maior.

Vale enfatizar que o estudo em questão fez a avaliação auditiva completa, bem como exames clínicos e de sangue, o que confere aos achados uma maior precisão, no que se refere à inclusão dos indivíduos com HA e/ou DM.

Conclusão

Verificou-se que, na comparação das avaliações audiológicas inicial e final, o aumento médio anual dos limiares auditivos foi maior no grupo HA, seguido pelo DMHA e, por fim, pelo DM, sugeriu que entre as condições estudadas a hipertensão arterial parece ser a que teve maior influência sobre a audição. Em relação às frequências mais acometidas, observou-se que para o grupo HA foram as frequências mais altas, enquanto para o grupo DMHA foram frequências médias e altas.

  • Como citar este artigo: Rolim LP, Samelli AG, Moreira RR, Matas CG, Santos IS, Bensenor IM, et al. Effects of diabetes mellitus and systemic arterial hypertension on elderly patients' hearing. Braz J Otorhinolaryngol. 2018;84:762-71.s
  • A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial.
  • ☆☆
    Trabalho feito no Curso de Fonoaudiologia, Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP, Brasil.
  • Financiamento
    Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), processo nº 2013/05589-2.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    4 Maio 2017
  • Aceito
    30 Ago 2017
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