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Dimensões internas nasais reduzidas constituem fator de risco para síndrome da apneia obstrutiva do sono? Como citar este artigo: Trindade SH, Trindade IE, Silva AS, Araújo BM, Trindade-Suedam IK, Sampaio-Teixeira AC, et al. Are reduced internal nasal dimensions a risk factor for obstructive sleep apnea syndrome? Braz J Otorhinolaryngol. 2022;88:399-405.

Resumo

Introdução

A síndrome da apneia obstrutiva do sono é uma desordem de elevada prevalência na população. Estudos constataram possível associação entre obstrução nasal e síndrome da apneia obstrutiva do sono, porém a existência de uma relação entre a intensidade da obstrução nasal e a gravidade da síndrome da apneia obstrutiva do sono ainda não foi comprovada.

Objetivo

Avaliar as dimensões internas nasais de adultos com ronco primário e síndrome da apneia obstrutiva do sono por meio de rinometria acústica e correlacionar os achados com a gravidade da síndrome da apneia obstrutiva do sono.

Método

Foram avaliados 21 indivíduos com queixas de ronco e/ou pausas respiratórias durante o sono, gênero masculino, entre 18 e 60 anos, brancos. Após avaliação clínica, exame físico otorrinolaringológico e nasofaringolaringoscopia flexível, todos foram submetidos à polissonografia tipo III. Os participantes foram divididos em dois grupos de acordo com a gravidade dos sintomas: grupo 1, ronco primário e/ou síndrome da apneia obstrutiva do sono leve (n = 9) e grupo 2, síndrome da apneia obstrutiva do sono moderada/grave (n = 12). Dimensões internas nasais foram aferidas por rinometria acústica, foram consideradas para análise as áreas de secção transversa mínima e os volumes de três diferentes segmentos nasais.

Resultados

O índice de eventos respiratórios correspondeu a 8,1 ± 4,0 no grupo 1 e 47,5 ± 19,1 no grupo 2. No grupo 1, os valores de área de secção transversa, em cm2, corresponderam a: área de secção transversa 1 = 1,1 ± 0,4; área de secção transversa 2 = 2,1 ± 0,9; área de secção transversa 3 = 3,5 ± 1,8. No grupo 2: área de secção transversa 1 = 1,2 ± 0,3, área de secção transversa 2 = 2,0 ± 0,5; áre de secção transversa 3 = 2,8 ± 0,7. No grupo 1 os valores do volume, em cm3, corresponderam a: volume 1 = 3,5 ± 1,0; volume 2 = 9,3 ± 5,0; volume 3 = 40,2 ± 21,5 e no grupo 2 a: volume 1 = 3,6 ± 0,5; V2 = 7,6 ± 1,5; volume 3 = 31,5 ± 6,7. Os valores de área de secção transversa e volume não diferiram entre os grupos.

Conclusão

Não foram demonstradas diferenças significantes quanto às áreas seccionais transversas e os volumes nasais entre indivíduos com ronco primário e síndrome da apneia obstrutiva do sono leve e síndrome da apneia obstrutiva do sono moderada-grave. Contrariamente à hipótese levantada, os resultados sugerem não existir relação entre as dimensões internas nasais e o nível de gravidade da síndrome da apneia obstrutiva do sono.

Palavras-chave
Obstrução nasal; Rinometria acústica; Apneia do sono

Abstract

Introduction

Obstructive sleep apnea syndrome is a high-prevalence disorder found in the population. Studies have shown a possible association between nasal obstruction and obstructive sleep apnea syndrome, but the existence of a association between the degree of nasal obstruction and obstructive sleep apnea syndrome severity has not yet been proven.

Objective

To evaluate the internal nasal dimensions of adults with primary snoring and obstructive sleep apnea syndrome by acoustic rhinometry and to correlate the findings with obstructive sleep apnea severity.

Methods

Twenty-one male Caucasian subjects with complaints of snoring and/or respiratory pauses during sleep, aged between 18 and 60 years of age, were evaluated. After clinical evaluation, otorhinolaryngological examination and flexible nasopharyngolaryngoscopy, all patients underwent type III polysomnography. The participants were divided into two groups according to symptom severity: group 1, primary snoring and/or mild obstructive sleep apnea syndrome(n = 9) and group 2, moderate/severe obstructive sleep apnea syndrome (n = 12). Internal nasal dimensions were measured by acoustic rhinometry, analyzing minimum cross sectional area (CSA) and three nasal segment volumes.

Results

The respiratory event index corresponded to 8.1 ± 4.0 in group 1 and 47.5 ± 19.1 in group 2. In group 1, the cross-sectional areas values, in cm2, corresponded to: CSA 1 = 1.1 ± 0.4; CSA 2 = 2.1 ± 0.9; CSA 3 = 3.5 ± 1.8 and, in group 2: CSA 1 = 1.2 ± 0.3, CSA 2 = 2.0 ± 0.5; CSA 3 = 2.8 ± 0.7. In group 1, volumes (V), in cm3, corresponded to: V1 = 3.5 ± 1.0; V2 = 9.3 ± 5.0; V3 = 40.2 ± 21.5 and in group 2 a: V1 = 3.6 ± 0.5; V2 = 7.6 ± 1.5; V3 = 31.5 ± 6.7. Cross-sectional area and volume ​​did not differ between groups.

Conclusion

There were no significant differences in the cross-sectional areas and nasal volumes between individuals with primary snoring-mild obstructive sleep apnea syndrome and moderate-severe obstructive sleep apnea syndrome. Differently to the raised hypothesis, our results suggest that there is no association between internal nasal dimensions and severity of obstructive sleep apnea syndrome.

Keywords
Nasal obstruction; Acoustic rhinometry; Sleep apnea

Introdução

A síndrome da apneia obstrutiva do sono (SAOS) é uma desordem de elevada prevalência na população. Pesquisas como o Sleep Heart Health Study demonstraram que 24% dos homens e 9% das mulheres avaliadas apresentavam SAOS em sua forma moderada.11 Young T, Shahar E, Nieto FJ, Redline S, Newman AB, Gottlieb DJ, et al. Predictors of sleep-disordered breathing in communitydwelling adults: the Sleep Heart Health Study. Arch Intern Med. 2002;162:893-900. O Winsconsin Sleep Study Cohort demonstrou um aumento da prevalência da SAOS em diferentes faixas etárias: 10% dos homens e 3% das mulheres na faixa entre 30 e 49 anos, enquanto 17% dos homens e 9% das mulheres na faixa entre 50 e 70.22 Peppard PE, Young T, Barnet JH, Palta M, Hagen EW, Hla KM. Increased prevalence of sleep-disordered breathing in adults. Am J Epidemiol. 2013;177:1006-14. Mais recentemente, um estudo feito na Suíça demonstrou que 50% dos homens e 23% das mulheres avaliadas apresentaram SAOS em sua forma moderada.33 Heinzer R, Vat S, Marques-Vidal P, Marti-Soler H, Andries D, Tobback N, et al. Prevalence of sleep-disordered breathing in the general population: the Hypno Laus study. Lancet Respir Med. 2015;3:310-8. No Brasil, um estudo que avaliou a prevalência da SAOS na população da cidade de São Paulo verificou que 32,8% da população adulta apresentaram critérios polissonográficos compatíveis com o diagnóstico de SAOS.44 Tufik S, Santos-Silva R, Taddei JA, Bittentcourt LR. Obstructive sleep apnea syndrome in the São Paulo Epidemiologic Sleep Study. Sleep Med. 2010;11:441-6. Importante frisar que, apesar de grande prevalência, a SAOS ainda é subdiagnosticada. Nos Estados Unidos da América, estima-se que 82% dos homens e 93% das mulheres com SAOS não têm sua condição adequadamente diagnosticada.55 Young T, Evans L, Finn L, Palta M. Estimation of clinically diagnosed proportion of sleep apnea syndrome in middle-aged men and women. Sleep. 1997;20:705-6.

Pacientes com SAOS tipicamente apresentam sonolência diurna excessiva, queda do desempenho cognitivo, redução da qualidade de vida e maior risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares.66 Jenkinson C, Davies JR, Mullins R, Stradling JR. Comparison of therapeutic and subtherapeutic nasal positive airway positive pressure for obstructive sleep apnoea: a randomized prospective parallel trial. Lancet. 1999;353:2100-5.

7 Pepperell JC, Ramdassingh-Dow S, Crosthwaite N, Mullins R, Jenkinson C, Stradling JR, et al. Ambulatory blood pressure after therapeutic and subtherapeutic nasal positive airway positive pressure for obstructive sleep apnea: a randomized parallel trial. Lancet. 2002;359:204-10.
-88 Marin JM, Carrizzo SJ, Vicente E, Augusti AG. Long term cardiovascular outcomes in men with obstructive sleep apnoeahypopnoea with and without treatment with continuous positive airway pressure: an observational study. Lancet. 2005;365:1046-53. Idade superior a 60 anos, gênero masculino, obesidade, dismorfismos craniofaciais e hipotireoidismo são fatores de risco para SAOS já bem estabelecidos.11 Young T, Shahar E, Nieto FJ, Redline S, Newman AB, Gottlieb DJ, et al. Predictors of sleep-disordered breathing in communitydwelling adults: the Sleep Heart Health Study. Arch Intern Med. 2002;162:893-900.,55 Young T, Evans L, Finn L, Palta M. Estimation of clinically diagnosed proportion of sleep apnea syndrome in middle-aged men and women. Sleep. 1997;20:705-6.,99 Stradling JR, Crosby J. Predictors and prevalence of obstructive sleep apnea and snoring in 1001 middle-aged men. Thorax. 1991;46:85-90.,1010 Liistro G, Rombaux P, Belge C, Dury M, Aubert G, Rodenstein DO. High Mallampati score and nasal obstruction are associated risks factors for obstructive sleep apnea. Eur Respir J. 2003;21:248-51.

Estudos também sugerem uma possível associação entre obstrução nasal e SAOS, atribuindo ao fluxo de ar turbulento, resultante da obstrução nasal em diferentes segmentos, a gênese da SAOS. Como as cavidades nasais são a porta das vias aéreas superiores, obstruções decorrentes de patologias nasais, como o desvio septal e a hipertrofia das conchas nasais, podem, teoricamente, contribuir para a geração de fluxo de ar turbulento e, consequentemente, para o desencadeamento da SAOS.1111 Lofaso F, Coste A, d’Ortho MP, Zerah-Lancner F, Delclaux C, Goldenberg F, et al. Nasal obstruction as a risk factor for obstructive sleep apneoa syndrome. Eur Respir J. 2000;16:639-43.

12 Young T, Finn L, Kim H. Nasal obstructions as a risk factor for sleep-disordered breathing. The University of Winsconsin Sleep and Respiratory Research Group. J Allergy Clin Immunol. 1997;99:757-62.

13 Young T, Finn L, Palta M. Chronic nasal congestion at night is a risk factor for snoring in a population based cohort study. Arch Intern Med. 2001;161:1514-9.
-1414 Kohler M, Bloch KE, Stradling JR. The role of nose in the pathogenesis of obstructive sleep apnea. Curr Opin Otolaryngol Head Neck Surg. 2009;17:33-7. Do ponto de vista teórico, as vias aéreas superiores se comportam de modo semelhante a um resistor de Starling, onde o segmento colapsável é a faringe e as duas extremidades rígidas são as cavidades nasais e a laringe. Quanto maior a resistência ao fluxo aéreo nos segmentos fixos (cavidade nasal e laringe) e maior a flacidez do segmento flexível (faringe), maior o colabamento do segmento colápsável.1515 Schwartz AR, Smith PL, Wise RA, Gold AR, Permutt S. Induction of upper airway occlusion in sleeping individuals with subatmospheric nasal pressure. J Appl Physiol. 1988;64:535-42.,1616 Smith PL, Wise RA, Gold AR, Schwartz AR, Permutt S. Upper airway pressure-flow relationship in obstructive sleep apnea. J Appl Physiol. 1988;64:789-95. Desse modo, a associação entre obstrução nasal e SAOS ganha plausibilidade biológica.

Estudo demonstrou que indivíduos com obstrução nasal crônica apresentam maior sonolência diurna, resultante de uma maior fragmentação do sono, gerada por múltiplos microdespertares e que o tratamento da obstrução nasal melhorou de forma significante os índices de sonolência diurna.1717 Hughes K, Glass C, Ripchinski M, Gurevich F, Weaver TE, Lehman E, et al. Efficacy of the topical nasal steroid budesonide on improving sleep and time somnolence in patients with perennial allergic rhinitis. Allergy. 2003;58:380-5. Em princípio, esses achados reforçam as evidências de que o grau de permeabilidade nasal tem papel relevante na SAOS e em seus sintomas diurnos associados.

A avaliação da patência nasal tem se baseado, historicamente, em impressões clínicas, a partir de dados da anamnese e inspeção visual por rinoscopia e/ou nasofibroscopia. Nos últimos anos, porém, a rinometria acústica, introduzida por Sondhi e Gopinath,1818 Sondhi MM, Gopinath B. Determination of vocal tract shape from impulse response at the lips. J Acoust Soc Am. 1971;49:1867-73. tem sido usada como avaliação objetiva das dimensões internas nasais que, em última análise, refletem o grau de permeabilidade nasal. Resumidamente, os sinais sonoros emitidos pelo rinômetro são refletidos por estruturas intranasais e nasofaríngeas, são captados e analisados por meio de software que calcula diferentes variáveis, que correspondem a áreas seccionais transversas mínimas e volumes em diferentes segmentos. Atualmente, é amplamente reconhecida a importância da rinometria acústica como teste específico das dimensões internas nasais.1919 Roithmann R, Cole P. Objective assessment of nasal patency: why, when, how? Rev Bras Otorrinolaringol. 1995;61:104-9.

20 Hilberg O, Pedersen OF. Acoustic rhinometry: recommendations for technical specifications and standard operating procedures. Rhinol Suppl. 2000;16:3-17.

21 Hilberg O. Objective measurement of nasal airway dimensions using acoustic rhinometry: methodological and clinical aspects. Allergy. 2002;57:5-39.

22 Bertier CE, Trindade IEK. Deformidades nasais: avaliação e tratamento cirúrgico. In: Trindade IEK, Silva Filho OG, editors. Fissuras Labiopalatinas: uma abordagem interdisciplinar. São Paulo, SP: Santos; 2007. p. 87-107.

23 Trindade IE, Gomes AOC, Sampaio-Teixeira ACM, Trindade SHK. Adult nasal volumes assessed by acoustic rhinometry. Rev Bras Otorrinolaringol. 2007;73:32-9.

24 Roithmann R, Demeneghi P, Faggiano R, Cury A. Effects of posture change on nasal patency. Rev Bras Otorrinolaringol. 2005;71:478-84.

25 Roithmann R. Testes específicos da permeabilidade nasal. Rev Bras Otorrinolaringol. 2007;73:2.

26 Roithmann R, Cole P, Chapnik J, ShpirerI Hoffstein V, Zamel N. Acoustic rhinometry in the evaluation of nasal obstruction. Laryngoscope. 1995;105:275-81.
-2727 Nigro CE, Nigro JF, Voegels RL, Mion O, Mello Junior JF. Acoustic rhinometry: anatomic correlation of the first two notches found in nasal echogram. Rev Bras Otorrinolaringol. 2005;71:149-54. Em indivíduos com obstrução nasal de diferentes etiologias, valores subnormais foram observados.2828 Grymer LF, Hilberg O, Elbrond O, Pedersen OF. Acoustic rhinometry: evaluation of the cavity nasal with septal deviations, before and after septoplasty. Laryngoscope. 1989;99:1180-7.

29 Voegels RL, Goto EY, Lessa MM, Romano FR, Neves MC, Tavares R, et al. Pre and postoperative evaluation by acoustic rhinometry in patients submitted to septal and nasal turbinates surgery. Int Arch Otorhinolaryngol. 2002;6:169-72.

30 Trindade IE, Bertier CE, Sampaio-Teixeira AC. Objective assessment of internal nasal dimensions and speech resonance in individuals with repaired unilateral cleft lip and palate after rhinoseptoplasty. J Craniofac Surg. 2009;20:308-14.
-3131 Trindade IE, Conegliam PC, Trindade SH, Dias NH, Sampaio-Teixeira AC. Internal nasal dimensions of adults with nasal obstruction. Braz J Otorhinolaryngol. 2013;79:575-81.

Apesar de recentes trabalhos terem contribuído para a compreensão da relação entre obstrução nasal e a SAOS,1010 Liistro G, Rombaux P, Belge C, Dury M, Aubert G, Rodenstein DO. High Mallampati score and nasal obstruction are associated risks factors for obstructive sleep apnea. Eur Respir J. 2003;21:248-51.

11 Lofaso F, Coste A, d’Ortho MP, Zerah-Lancner F, Delclaux C, Goldenberg F, et al. Nasal obstruction as a risk factor for obstructive sleep apneoa syndrome. Eur Respir J. 2000;16:639-43.

12 Young T, Finn L, Kim H. Nasal obstructions as a risk factor for sleep-disordered breathing. The University of Winsconsin Sleep and Respiratory Research Group. J Allergy Clin Immunol. 1997;99:757-62.

13 Young T, Finn L, Palta M. Chronic nasal congestion at night is a risk factor for snoring in a population based cohort study. Arch Intern Med. 2001;161:1514-9.
-1414 Kohler M, Bloch KE, Stradling JR. The role of nose in the pathogenesis of obstructive sleep apnea. Curr Opin Otolaryngol Head Neck Surg. 2009;17:33-7. vários aspectos ainda permanecem controversos, particularmente porque limitações metodológicas impedem a comparação entre os estudos. Em suma, constata-se que a real influência da obstrução nasal sobre a SAOS não pode ser ainda comprovada com o nível de evidência científica disponível até o presente momento. Assim, o estudo teve por objetivo avaliar as dimensões internas nasais de adultos com ronco primário e SAOS leve, comparativamente a SAOS moderada e grave, por meio da rinometria acústica.

Método

O presente estudo é derivado de pesquisa de pós-doutorado e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Faculdade de Medicina de Botucatu (Unesp), sob número 4393-2012, e feito após a assinatura do termo de concordância livre e esclarecido pelo participante.

Como critérios de inclusão, foram selecionados indivíduos adultos, do gênero masculino, com de 18 a 60 anos, brancos, atendidos de forma regular no ambulatório de otorrinolaringologia do Hospital Estadual de Bauru (HEB), que apresentavam como queixa principal roncos ou pausas respiratórias durante o sono.

Como etapa inicial, todos os participantes foram avaliados clinicamente, perguntados a respeito de queixas compatíveis com a SAOS e submetidos ao exame físico com avaliação nasoendoscópica da anatomia nasal e faríngea, que teve como objetivo classificar os desvios septais e excluir lesões obstrutivas da via área superior, de difícil visualização ao exame físico otorrinolaringológico. O grau de hipertrofia dos cornetos inferiores e a classificação e intensidade dos desvios septais foram avaliados pelo investigador principal de forma visual. Os desvios septais foram categorizados da seguinte forma: presença ou ausência; lateralidade predominante (direita ou esquerda); localização predominante (anterior, quando acometia septo membranoso e/ou cartilaginoso, e, posterior, quando acometia predominantemente transição entre septo cartilaginoso e ósseo, lâmina perpendicular do etmoide e ou vômer). A intensidade de desvio septal foi classificada como grau 1, quando obstruía até 25% da fossa nasal acometida pelo desvio, grau 2, quando obstruía entre 25% − 50%, grau 3, entre 50% − 75% e grau 4, acima de 75% do lúmen da fossa nasal. As conchas inferiores foram classificadas quanto à presença ou ausência de hipertrofia e segmentos acometidos (cabeça, corpo ou cauda). O grau de obstrução dos cornetos seguiu o mesmo critério para os desvios septais.

Foram excluídos do estudo pacientes com histórico de cirurgia e fratura nasal prévia, presença de tumores nasais malignos ou benignos, pólipos nasais, malformação craniofacial, síndromes genéticas, cardiopatias, pneumopatias e outras condições clínicas e mentais que não permitissem a excecução de todas as etapas do estudo, além do não aceite em assinar o TCLE. Adicionalmente, pacientes em uso de medicações tópicas nasais, como corticosteroides, estabilizadores de membrana dos mastócitos, vasoconstrictores tópicos, bem como medicações sistêmicas, como corticosteroides, anti-histamínicos, antagonistas dos leucotrienos e antibióticos para tratamento de rinossinusopatias, um mês antes da análise rinométrica e polissonografia, não foram incluídos.

Após a avaliação clínica, os participantes foram encaminhados para a realização de poligrafia do sono, a qual foi feita com um polígrafo Star Dust® (PhilipsRespironics), que permite a polissonografia do tipo III, de acordo com a classificação da AASM de 2018.3232 Berry RB, Albertario CL, Harding SM, Lloyd RM, Plante DT, Quan SF, et al. The AASM manual for the scoring of sleep and associated events: rules, terminology and technical specifications, version 2.5. Darien, IL: American Academy of Sleep Medicine; 2018. Os exames foram feitos nas enfermarias do HEB. Os distúrbios respiratórios do sono, bem como os eventos respiratórios, foram classificados e marcados de acordo manual da American Academy of Sleep Medicine.3232 Berry RB, Albertario CL, Harding SM, Lloyd RM, Plante DT, Quan SF, et al. The AASM manual for the scoring of sleep and associated events: rules, terminology and technical specifications, version 2.5. Darien, IL: American Academy of Sleep Medicine; 2018. Após a análise das polissonografias, os participantes foram alocados em dois grupos: G1 − Grupo Ronco Primário ou SAOS leve, G2 − Grupo SAOS moderada ou grave.

Concluída essa etapa, os pacientes foram encaminhados para rinometria acústica no Laboratório de Fisiologia do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (USP), onde o exame foi feito na manhã do dia seguinte ao exame polissonográfico. Para a avaliação rinométrica foi usado o sistema Eccovision Acoustic Rhinometer (HOOD laboratories), de acordo com protocolos previamente descritos na literature. Foram avaliadas as áreas seccionais transversas (ASTs) e volumes (V) em três segmentos: a AST1 (área correspondente à válvula nasal), AST2 (área correspondente à porção anterior da concha nasal inferior) e AST3 (área correspondente à cauda da concha nasal inferior), V1 (volume do segmento interno nasal situado entre 10 a 32 mm da narina), V2 (volume do segmento situado entre 33 e 64 mm) e V3 (volume situado após 70 mm). O exame foi feito com o paciente na posição sentada, com o queixo e a testa apoiados em uma armação especialmente desenvolvida para esse fim, de modo a manter a cabeça estável durante o exame.

De modo a garantir reprodutibilidade das curvas rinométricas, o equipamento foi calibrado no início de cada período do dia, segundo instrução do fabricante, o tubo foi posicionado de forma a não provocar deformação da narina e, por consequência, da válvula nasal. As medidas foram feitas sempre na mesma sala, em ambiente com temperatura relativamente estável (entre 22° e 26 °C) e nível de ruído controlado (inferior à 60 dB), após um período de adaptação do paciente às condições ambientais de cerca de 30 minutos, no período da manhã. O vedamento entre o adaptador e a cavidade nasal foi feito com gel neutro para eletrocardiograma, com o objetivo de evitar perda sonora. O exame foi feito durante a suspensão voluntária da respiração nasal, no fim de uma expiração, o paciente foi orientado a permanecer com a boca fechada, sem deglutir ou movimentar a língua no momento da aquisição dos dados, que não supera 10 segundos, de modo a evitar interferências nas medidas e na qualidade dos rinogramas.2323 Trindade IE, Gomes AOC, Sampaio-Teixeira ACM, Trindade SHK. Adult nasal volumes assessed by acoustic rhinometry. Rev Bras Otorrinolaringol. 2007;73:32-9.,3030 Trindade IE, Bertier CE, Sampaio-Teixeira AC. Objective assessment of internal nasal dimensions and speech resonance in individuals with repaired unilateral cleft lip and palate after rhinoseptoplasty. J Craniofac Surg. 2009;20:308-14.,3131 Trindade IE, Conegliam PC, Trindade SH, Dias NH, Sampaio-Teixeira AC. Internal nasal dimensions of adults with nasal obstruction. Braz J Otorhinolaryngol. 2013;79:575-81.,3333 Gomes AO, Sampaio Teixeira AC, Trindade SH, Trindade IE. Nasal cavity geometry of healthy adults assessed using acoustic rhinometry. Braz J Otorhinolaryngol. 2008;74:746-54.

Cálculo do tamanho da amostra e análise estatística

Para o cálculo formal do tamanho da amostra (n) foi escolhida como variável de desfecho primário a área de secção transversa mínima da cavidade nasal (AST1 ou mínima) que corresponde à válvula nasal, foram usados os valores obtidos em adultos sem evidências de obstrução nasal, de faixa etária equivalente ao grupo selecionado no presente estudo, obtidos no Laboratório de Fisiologia do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (USP).3333 Gomes AO, Sampaio Teixeira AC, Trindade SH, Trindade IE. Nasal cavity geometry of healthy adults assessed using acoustic rhinometry. Braz J Otorhinolaryngol. 2008;74:746-54. Para a identificação de valores rinométricos indicativos de obstrução nasal, foram usados os resultados de Grymer et al.,2828 Grymer LF, Hilberg O, Elbrond O, Pedersen OF. Acoustic rhinometry: evaluation of the cavity nasal with septal deviations, before and after septoplasty. Laryngoscope. 1989;99:1180-7. que obtiveram, em um grupo com obstrução nasal, valores de AST1 ao redor de 0,27 cm2.

Para a variável contínua AST1, assumiu-se a possibilidade da hipótese alternativa bicaudal, com alfa de 5% e beta de 20% (poder de 80%). Considerando que o valor médio de AST1 encontrado por Gomes et al.3333 Gomes AO, Sampaio Teixeira AC, Trindade SH, Trindade IE. Nasal cavity geometry of healthy adults assessed using acoustic rhinometry. Braz J Otorhinolaryngol. 2008;74:746-54. foi de 0,54 ± 0,13 cm2 e assumindo uma magnitude de efeito clinicamente significante como uma redução em 40% do valor de AST1, com desvio-padrão dos valores de normalidade ao redor de 20%, chegou-se a uma magnitude padronizada de efeito igual a 2. Para essa magnitude e desvio-padrão de ± 0,13 cm2, o n recomendado foi de 8 indivíduos em cada grupo experimental.3434 Hulley SB, Cumming SR, Browner WS, Grady DG, Newman TB. Delineando a pesquisa clínica: uma abordagem epidemiológica. Artmed: Porto Alegre, RS; 2008.

Para a comparação de dados com distribuição normal usou-se o teste t para amostras independentes e para dados com distribuição não paramétrica, o teste de Mann Whitney. Foram considerados significativos os valores de p< 0,05.

Resultados

A tabela 1 mostra as características demográficas, idade, IMC (índice de massa corpórea) e os principais resultados por grupo analisado. Apesar da idade e do IMC mais elevados no grupo SAOS moderada/grave, essa diferença não foi estatisticamente significativa.

Tabela 1
Dados demográficos, polissonográficos e rinométricos de indivíduos com ronco primário/SAOS leve e SAOS moderada/grave. Os resultados estão expressos em média ± desvio-padrão

A tabela 1 mostra, adicionalmente, os principais resultados polissonográficos e rinométricos. Verificou-se que o índice de eventos respiratórios (IER)3232 Berry RB, Albertario CL, Harding SM, Lloyd RM, Plante DT, Quan SF, et al. The AASM manual for the scoring of sleep and associated events: rules, terminology and technical specifications, version 2.5. Darien, IL: American Academy of Sleep Medicine; 2018. do grupo ronco primário/SAOS leve (G1) foi de 8,1 ± 4 e no grupo SAOS moderada/grave (G2) de 47,5 ± 19 eventos por hora, a diferença foi estatisticamente significativa. O índice de apneia obstrutiva (IAO) foi de 2,0 ± 1,4 e de 32,8 ± 18 eventos por hora, respectivamente, a diferença também foi estatisticamente significativa. Já o índice de hipopneia (IH) não diferiu entre os grupos. A duração média das apneias obstrutivas foi significativamente menor no grupo G1 (19,7 ± 2,8s) do que no G2 (24,2 ± 4 s). A mesma tabela mostra, também, que a saturação de O2 média foi de 96% ± 1,4% no grupo ronco primário/SAOS leve e de 85% ± 10% no grupo SAOS moderada/grave e o índice de dessaturação foi de 9,4 ± 6,7 e de 45 ± 26 eventos por hora, respectivamente, as diferenças foram significativas entre os dois grupos. Os demais dados obtidos nos exames poligráficos foram de caráter exploratório e não foram considerados para análise no presente estudo.

Para análise dos dados rinométricos (áreas seccionais transversas e volumes) foram calculadas as médias dos valores de cada parâmetro obtidos na fossa nasal direita e esquerda, a fim de avaliar o nariz como um todo, e não cada fossa nasal separadamente. Assim, as diferenças nos valores médios de AST do grupo ronco primário/SAOS leve (AST1 = 1,1 ± 0,4; AST2 = 2,1 ± 0,9; AST3 = 3,5 ± 1,8 cm2) e do grupo SAOS moderada/grave (AST1 = 1,2 ± 0,3; AST2 = 2,0 ± 0,5; AST3 = 2,8 ± 0,7 cm2), apesar de apresentaram-se numericamente reduzidos, especialmente nas regiões anteriores e posteriores das conchas nasais inferiores no grupo SAOS moderada/grave, não foram estatisticamente significativas. O mesmo se verificou para os valores médios dos volumes nasais do Grupo G1 (V1 = 3,5 ± 1,0; V2 = 9,3 ± 5,0; V3 = 40,2 ± 21,5 cm3) e do Grupo G2 (V1 = 3,6 ± 0,5; V2 = 7,6 ± 1,5; V3 = 31,5 ± 6,7 cm3).

Discussão

O presente estudo teve por objetivo estabelecer uma relação entre dimensões internas nasais e gravidade da SAOS. Para esse fim, foram adotados critérios de inclusão e exclusão rígidos, com o intuito de obter uma amostra homogênea. Estudos prévios demonstraram que indivíduos negros apresentam dimensões internas nasais maiores do que os brancos.3535 Morgan NJ, MacGregor FB, Birchall MA, Lund VJ, Sittampalam Y. Racial differences in nasal fossa dimensions determined by acoustic rhinometry. Rhinology. 1995;33:224-8.,3636 Corey JP, Gungor A, Nelson R, Liu X, Fredberg J. Normative standards for nasal cross-sectional areas by race as measured by acoustic rhinometry. Otolaryngol Head Neck Surg. 1998;119:389-93. Indivíduos do gênero masculino apresentam dimensões nasais internas maiores do que os do gênero feminino3333 Gomes AO, Sampaio Teixeira AC, Trindade SH, Trindade IE. Nasal cavity geometry of healthy adults assessed using acoustic rhinometry. Braz J Otorhinolaryngol. 2008;74:746-54. e indivíduos adultos apresentam dimensões internas nasais maiores do que crianças e adolescentes.3737 Haavisto LE, Vahlberg TJ, Sipila JI. Reference values for acoustic rhinometry in children at baseline and after decongestion. Rhinology. 2011;49:243-7.,3838 Trindade IE, Gomes AO, Fernandes MB, Trindade SH, Silva Filho OG. Nasal Airway Dimensions of Children With Repaired Unilateral Cleft Lip and Palate. Cleft Palate Craniofac J. 2015;52:512-6. Dessa forma, a fim de evitar vieses de seleção e aumentar a validade interna do estudo, uma amostra de conveniência com indivíduos brancos, adultos e do gênero masculino foi selecionada e avaliada. Pacientes previamente submetidos a cirurgias nasais ou com fraturas nasais, pólipos, tumores e outras doenças nasofaríngeas não foram incluídos na amostra. Adicionalmente, indivíduos em uso de medicações tópicas nasais e sistêmicas que pudessem interferir nas dimensões internas nasais foram excluídos do estudo. Dessa forma, minimizou-se a possibilidade de inclusão de pacientes com doenças nasais inflamatórias. Corroborando a homogeneidade das duas amostras, não se constatou diferença significante quanto a idade e o IMC entre os grupos.

Em relação aos critérios de gravidade da SAOS, observou-se que o grupo SAOS moderada/grave apresentou consistentemente valores de IER, IAO e duração máxima das apneias, maiores do que o grupo ronco primário/SAOS leve. Em adição, os parâmetros relacionados à oximetria, como a saturação média, foram significativamente menores no grupo SAOS moderada/grave e o índice de dessaturação apresentou-se significantemente maior no grupo SAOS moderada/grave. Em suma, esses resultados reforçam a homogeneidade na seleção dos pacientes e mostram que os dois grupos representavam os extremos do espectro da doença. O uso de outros parâmetros, como Apnea-Hypopneia Desaturation Index (AHDI), que, segundo Otero et. al.,3939 Otero A, Félix P, Presedo J, Zamarrón C. An evaluation of indexes as support tools in the diagnosis of sleep apnea. Ann Biomed Eng. 2012;40:1825-34. apresenta melhor sensibilidade e especificidade para quantificação da intensidade da SAOS, deve ser o foco de futuros estudos. Como o IER não leva em consideração o tempo decorrido durante os eventos respiratórios, bem como a intensidade e a duração das dessaturações, o AHDI poderia representar melhor o espectro de gravidade da SAOS.3939 Otero A, Félix P, Presedo J, Zamarrón C. An evaluation of indexes as support tools in the diagnosis of sleep apnea. Ann Biomed Eng. 2012;40:1825-34. Do mesmo modo, Bosi M. et. al.4040 Bosi M, De Vito A, Kotecha B, Viglietta L, Braghiroli A, Steier J, et al. Phenotyping the pathophysiology of obstructive sleep apnea using polygraphy/polysomnography: a review of the literature. Sleep Breath. 2018;22:579-92. mostraram que dados polissonográficos distintos do IER podem indicar diferentes fenótipos da SAOS.4040 Bosi M, De Vito A, Kotecha B, Viglietta L, Braghiroli A, Steier J, et al. Phenotyping the pathophysiology of obstructive sleep apnea using polygraphy/polysomnography: a review of the literature. Sleep Breath. 2018;22:579-92. Face a essas constatações, novos estudos que correlacionem diferentes parâmetros polissonográficos com dados rinométricos poderiam fornecer informações adicionais valiosas sobre a fisiopatologia das vias áreas na SAOS e indicar os parâmetros clinicamente relevantes.

A rinometria acústica, método consagrado na literatura, foi usada no presente estudo para avaliar o papel do segmento proximal das vias aéreas superiores (cavidades nasais) na gênese da SAOS. Contrariamente à hipótese inicial, qual seja, “quanto maior a gravidade da SAOS menores as dimensões internas nasais”, não se observaram diferenças significativas entre o grupo com ronco primário/SAOS leve e grupo SAOS moderada/grave em todos os parâmetros avaliados (áreas seccionais transversas e volumes). Ressalta-se, contudo, que os dados referentes especialmente a AST3, V2 e V3 apontam uma tendência a menores dimensões no grupo SAOS moderada/grave, reduções essas da ordem de 20%, 18% e 22%, respectivamente, o que deve ser explorado em estudos futuros. Especula-se que, com o aumento da amostra, essas diferenças se tornem mais evidentes. Importante ressaltar, também, que as análises rinométricas foram feitas na posição sentada, usada de rotina nos exames do laboratório, inclusive em todos os estudos previamente desenvolvidos pelo grupo, o que possibilita a comparação com resultados previamente descritos.2323 Trindade IE, Gomes AOC, Sampaio-Teixeira ACM, Trindade SHK. Adult nasal volumes assessed by acoustic rhinometry. Rev Bras Otorrinolaringol. 2007;73:32-9.,3030 Trindade IE, Bertier CE, Sampaio-Teixeira AC. Objective assessment of internal nasal dimensions and speech resonance in individuals with repaired unilateral cleft lip and palate after rhinoseptoplasty. J Craniofac Surg. 2009;20:308-14.,3131 Trindade IE, Conegliam PC, Trindade SH, Dias NH, Sampaio-Teixeira AC. Internal nasal dimensions of adults with nasal obstruction. Braz J Otorhinolaryngol. 2013;79:575-81.,3333 Gomes AO, Sampaio Teixeira AC, Trindade SH, Trindade IE. Nasal cavity geometry of healthy adults assessed using acoustic rhinometry. Braz J Otorhinolaryngol. 2008;74:746-54.,3838 Trindade IE, Gomes AO, Fernandes MB, Trindade SH, Silva Filho OG. Nasal Airway Dimensions of Children With Repaired Unilateral Cleft Lip and Palate. Cleft Palate Craniofac J. 2015;52:512-6. A influência de outras posições, como o decúbito supino, será alvo de futuras investigações de nosso grupo.

Os estudos que avaliaram a resistência nasal, por meio de rinomanometria, como os de Blakely & Mohwald4141 Atkins M, Tashkar V, Clayton N, Stone P, Woodcock A. Nasal resistence in obstructive sleep apnea. Chest. 1994;105:1133-5. e Atkins et al.,4141 Atkins M, Tashkar V, Clayton N, Stone P, Woodcock A. Nasal resistence in obstructive sleep apnea. Chest. 1994;105:1133-5. em consonância com nossos achados, não identificaram correlação entre resistência ao fluxo nasal e gravidade da SAOS. Em contrapartida, Lofaso et al.1111 Lofaso F, Coste A, d’Ortho MP, Zerah-Lancner F, Delclaux C, Goldenberg F, et al. Nasal obstruction as a risk factor for obstructive sleep apneoa syndrome. Eur Respir J. 2000;16:639-43. identificaram em indivíduos com SAOS moderada/grave valores maiores da resistência nasal em comparação ao grupo com ronco primário. Por regressão logística, identificaram que o aumento da resistência nasal foi fator de risco isolado para gênese da SAOS. Essa divergência entre esses estudos e o presente trabalho pode residir no fato de que a resistência nasal é uma medida fluxo-dependente, ou seja, depende do esforço respiratório feito pelo paciente no momento da aferição. Na rinometria acústica esse problema não existe, já que se trata de uma medida estática. Assim, a comparação de nossos resultados com os estudos que empregaram a rinomanometria é limitada pelas diferenças entre os grupos estudados e as metodologias aplicadas.

Estudos recentes que avaliaram as dimensões internas nasais de pacientes apneicos por meio da rinometria acústica apresentaram resultados divergentes. Rocha et al.4242 Rocha JI, Lima AM, Silva HJ, Gomes AO, Vitorino PA, Clímaco DC, et al. Comparison of nasal geometry among adults with obstructive sleep apnea: a preliminar study. Rev CEFAC. 2019;21:e10719. identificaram menores áreas seccionais transversas na região da válvula nasal na narina direita em pacientes com SAOS moderada e grave, sem diferenças nos volumes nasais. Diferentemente do presente estudo, os autores analisaram as fossas nasais de maneira independente e o grupo de estudo é predominantemente composto por mulheres, o que dificulta a comparação com nossos resultados. Vidigal et al.,4343 Vidigal TA, Haddad FL, Gregório LC, Poyares D, Tufik S, Bittencourt LR. Subjective, anatomical, and function nasal evaluation of patients with obstructive sleep apnea syndrome. Sleep Breath. 2013;17:427-33. com desenho experimental semelhante ao nosso, à exceção do grupo de estudo que incluiu homens e mulheres, também não encontrou diferenças nas dimensões nasais internas entre os grupos com e sem SAOS, aferidas por rinometria acústica.

Face aos presentes achados, a influência das dimensões internas nasais na gênese da SAOS ainda permanece controversa. O presente estudo indica que dimensões internas nasais reduzidas não têm influência na intensidade da SAOS. Estudos futuros que analisem as diferenças entre gêneros, etnias e que incluam grupo controle sem sinais e sintomas de SAOS, confirmados por polissonografia, serão de grande valia. Adicionalmente, estudos em andamento no nosso laboratório, que avaliam o fluxo nasal por meio de análise de dinâmica computacional de fluidos e o impacto da resistência ao fluxo aéreo do segmento distal fixo da via área superior, o bloco laríngeo, que remete ao modelo do resistor de Starling, poderão colaborar na elucidação dessa complexa questão.

Conclusão

As análises feitas no presente estudo mostraram que roncadores primários e indivíduos com SAOS leve, em comparação a indivíduos com SAOS moderada-grave, apresentam dimensões internas nasais semelhantes. Os resultados apontam, portanto, para a ausência de uma associação entre as dimensões das áreas seccionais nasais reduzidas e maior gravidade da SAOS.

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  • Como citar este artigo: Trindade SH, Trindade IE, Silva AS, Araújo BM, Trindade-Suedam IK, Sampaio-Teixeira AC, et al. Are reduced internal nasal dimensions a risk factor for obstructive sleep apnea syndrome? Braz J Otorhinolaryngol. 2022;88:399-405.
  • A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    May-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    12 Fev 2020
  • Aceito
    28 Jun 2020
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