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Avaliação da reprodutibilidade de testes funcionais na doença arterial periférica

Reproducibility of functional tests in peripheral arterial diseas

Resumos

Este estudo visou avaliar a reprodutibilidade de dois testes funcionais de membros inferiores em pacientes com doença arterial periférica. Os testes senta-levanta da cadeira (TSL) e da ponta do pé (TPP) foram aplicados duas vezes em 14 voluntários com doença arterial periférica por três examinadores, com intervalo de 1 minuto entre os testes e de 15 minutos entre teste e reteste. A maioria dos participantes apresentou dificuldades no TPP, sendo realizadas adaptações. Os dados foram analisados estatisticamente; o grau de concordância entre examinadores foi estimado pelo coeficiente de correlação intraclasse (CCI), sendo ±<5% considerado significativo. Todas as correlações foram estatisticamente significativas. O TSL apresentou alta reprodutibilidade tanto inter-examinador (CCI=0,904 no teste e 0,857 no reteste) quanto intra- examinador. O mesmo ocorreu com o TPP (CCI=0,824 no teste e 0,941 no reteste, na avaliação inter-examinador). A correlação de Pearson entre as médias dos três examinadores no TSL e no TPP foi 0,651 no teste e 0,609 no reteste. Ambos os testes são pois reprodutíveis e viáveis na prática clínica, mas é necessário avaliar se são sensíveis a alterações que ocorram durante o processo natural da doença ou se podem ser instrumentos viáveis para acompanhamento desses pacientes.

Claudicação intermitente; Doenças vasculares periféricas; Força muscular; Reprodutibilidade dos testes


This study aimed at evaluating the reproducibility of two lower-limb functional tests in patients with peripheral arterial disease. The chair-stand (CST) and tip-toe (TTT) tests were applied twice to 14 volunteers with peripheral arterial disease by three examiners with a one-minute interval between them and 15 minutes between test and retest. Most participants presented difficulties in TTT, which has then been slightly adjusted. Data were statistically analysed; inter-examiner degree of agreement was assessed by means of the intraclass correlation coefficient (ICC), with significance level set at ±<5%. All correlations were found to be statistically significant. CST showed high both inter-examiner reproducibility (test ICC=0.904, retest ICC=0.857) and intra-examiner. The same applies to TTT (inter examiner test ICC=0.824, retest ICC=0.941). The Pearson correlation between the mean of the three examiners in CST and the mean in TTT was 0.651 at test and 0.609 at retest. Both tests are thus reliable and viable for clinical practice. However, it is still to be assessed whether these tests are sensitive to changes that might arouse from the disease, hence being useful for patient follow-up.

Intermittent claudication; Muscle strength; Peripheral vascular diseases; Reproducibility of results


PESQUISA ORIGINAL ORIGINAL RESEARCH

Avaliação da reprodutibilidade de testes funcionais na doença arterial periférica

Reproducibility of functional tests in peripheral arterial disease

Danielle Aparecida Gomes PereiraI; Karen Lamana de OliveiraII; Jerusa Oliveira CruzII; Cristiane Gonçalves de SouzaII; Inácio Teixeira Cunha FilhoIII

IFisioterapeuta especialista Profa. do Curso de Fisioterapia do Uni-BH

IIFisioterapeutas

IIIProf. Dr. do Curso de Fisioterapia do Uni-BH

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Danielle A. Gomes Pereira R. João Gualberto Filho 1260 apto. 604 Sagrada Família 31035570 Belo Horizonte MG e-mail: d.fisio@ig.com.br; karenlamana@hotmail.com

RESUMO

Este estudo visou avaliar a reprodutibilidade de dois testes funcionais de membros inferiores em pacientes com doença arterial periférica. Os testes senta-levanta da cadeira (TSL) e da ponta do pé (TPP) foram aplicados duas vezes em 14 voluntários com doença arterial periférica por três examinadores, com intervalo de 1 minuto entre os testes e de 15 minutos entre teste e reteste. A maioria dos participantes apresentou dificuldades no TPP, sendo realizadas adaptações. Os dados foram analisados estatisticamente; o grau de concordância entre examinadores foi estimado pelo coeficiente de correlação intraclasse (CCI), sendo α<5% considerado significativo. Todas as correlações foram estatisticamente significativas. O TSL apresentou alta reprodutibilidade tanto inter-examinador (CCI=0,904 no teste e 0,857 no reteste) quanto intra- examinador. O mesmo ocorreu com o TPP (CCI=0,824 no teste e 0,941 no reteste, na avaliação inter-examinador). A correlação de Pearson entre as médias dos três examinadores no TSL e no TPP foi 0,651 no teste e 0,609 no reteste. Ambos os testes são pois reprodutíveis e viáveis na prática clínica, mas é necessário avaliar se são sensíveis a alterações que ocorram durante o processo natural da doença ou se podem ser instrumentos viáveis para acompanhamento desses pacientes.

Descritores: Claudicação intermitente; Doenças vasculares periféricas; Força muscular Reprodutibilidade dos testes

ABSTRACT

This study aimed at evaluating the reproducibility of two lower-limb functional tests in patients with peripheral arterial disease. The chair-stand (CST) and tip-toe (TTT) tests were applied twice to 14 volunteers with peripheral arterial disease by three examiners with a one-minute interval between them and 15 minutes between test and retest. Most participants presented difficulties in TTT, which has then been slightly adjusted. Data were statistically analysed; inter-examiner degree of agreement was assessed by means of the intraclass correlation coefficient (ICC), with significance level set at α<5%. All correlations were found to be statistically significant. CST showed high both inter-examiner reproducibility (test ICC=0.904, retest ICC=0.857) and intra-examiner. The same applies to TTT (inter examiner test ICC=0.824, retest ICC=0.941). The Pearson correlation between the mean of the three examiners in CST and the mean in TTT was 0.651 at test and 0.609 at retest. Both tests are thus reliable and viable for clinical practice. However, it is still to be assessed whether these tests are sensitive to changes that might arouse from the disease, hence being useful for patient follow-up.

Key words: Intermittent claudication; Muscle strength; Peripheral vascular diseases; Reproducibility of results

INTRODUÇÃO

A doença arterial periférica (DAP) é caracterizada pela redução do fluxo sangüíneo devido a uma obstrução arterial, sendo em 90% dos casos de origem aterosclerótica1,2,3. Ocorre em ambos os membros, é mais freqüente nos membros inferiores (MMII) e afeta mais de 20% da população idosa3,4,5. Quando sintomática, a claudicação intermitente (CI) é a manifestação clínica mais comum da DAP1,3,4. A CI caracteriza-se por dor, cãibra, sensação de formigamento ou queimação na região da musculatura isquêmica, principalmente durante a caminhada, cessando com o repouso1,4. Com a evolução da obstrução, pode ocorrer dor em repouso, ulceração isquêmica, gangrena ou mesmo amputação3,4.

A CI pode resultar em limitação significante na capacidade física dos pacientes1. Os portadores de DAP sintomáticos possuem passo encurtado, cadência lenta e deficit no equilíbrio, motivando a redução do desempenho, da velocidade de caminhar e da capacidade de percorrer longas distâncias2,5-12. Pacientes com DAP grave caminham com velocidades reduzidas para conseguir percorrer maiores distâncias13.

Vários autores demonstraram que os portadores de DAP têm pico de consumo de oxigênio 50% menor do que indivíduos normais, contribuindo para a redução do desempenho durante o exercício e a restrição na capacidade de realizar atividades domiciliares2,8,12,14. Os pacientes que apresentam CI têm suas atividades de vida diária reduzidas e baixa qualidade de vida1,2,6,10.

A DAP também está relacionada a mudanças crônicas na função e morfologia da musculatura afetada5,7,12,15,20. Estudos sobre as alterações crônicas na histologia e função muscular em pacientes com DAP demonstraram que, apesar de o diâmetro das fibras tipo I e tipo II nos MMII desses pacientes ser similar ao de indivíduos sem a doença, ocorre uma diminuição da área de fibras tipo II do membro inferior acometido, sugerindo que fibras tipo II são as mais afetadas pela isquemia do as do tipo I7,12. Outros autores relatam que há redução das fibras tipo I e II e da área do músculo gastrocnêmio desses pacientes5,15. Além das alterações anatômicas, ocorre denervação musculoesquelética provavelmente devido à isquemia dos nervos motores distais, contribuindo para a disfunção muscular nos pacientes com claudicação2,12.

A perda de força muscular nos indivíduos com DAP poderá ser conseqüência tanto do descondicionamento pelo desuso quanto da denervação e redução da área das fibras tipo II secundárias à isquemia5,12. Essa redução na força contribui para o prejuízo funcional durante a deambulação2,5-8,10,11,12,16 .

Como há redução de força muscular nos portadores de DAP, sua mensuração é importante para o acompanhamento de alterações que possam influenciar a capacidade funcional desses pacientes. Além disso, o treinamento de força pode ser uma opção terapêutica viável para aumento das distâncias caminhadas7-10,12,16. Para comparar tal mensuração, porém, é importante haver testes confiáveis, de modo a garantir que diferenças encontradas nos resultados sejam devidas a intervenções realizadas ou à evolução do quadro funcional, e não resultantes de oscilações devidas à variabilidade de testes não-reprodutíveis. A avaliação da força muscular por meio do dinamômetro isocinético, que avalia a força máxima de um determinado grupo muscular, é uma medida válida e confiável, mas inviável na prática clínica, uma vez que esse método é de alto custo, requer grande espaço, treinamento técnico especializado, além de limitar o número de grupos musculares que podem realmente ser testados2,6-8,12,13,17. O objetivo deste estudo é pois avaliar a reprodutibilidade de dois testes funcionais de MMII em pacientes com DAP: o teste senta-levanta da cadeira e o teste de ponta do pé.

METODOLOGIA

O estudo, do tipo transversal, foi realizado no Curso de Fisioterapia do Centro Universitário de Belo Horizonte. Todos os participantes assinaram um termo de consentimento esclarecido, concordando em participar após serem informados acerca dos objetivos e testes. Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição.

Previamente à coleta de dados, foi realizado um estudo piloto com teste e reteste (48 horas após o teste), para efeito de treinamento dos examinadores e para detectar possíveis problemas associados aos testes propostos, de senta-levanta da cadeira e de ponta do pé, descritos a seguir. Antes e após a realização de cada teste, a pressão arterial e freqüência cardíaca eram mensuradas para acompanhamento de dados hemodinâmicos dos voluntários.

Teste senta-levanta da cadeira: avalia força dos MMII e equilíbrio do indivíduo. Foi realizado em cadeira sem braço, com assento de altura aproximada de 43 cm18. O participante sentou no centro da cadeira, com a coluna ereta, pés separados numa distância equivalente à largura do ombro, pé não dominante à frente do outro e os braços cruzados sobre o tórax, sendo solicitado a levantar-se e sentar-se cinco vezes consecutivas o mais rápido possível, após demonstração pelo examinador, e após a realização de uma repetição para certificar a forma correta16,19. O examinador registrou o tempo em segundos gasto para levantar e sentar as cinco vezes. Foi dado comando verbal para início e final do teste e, durante a realização, não foi dada qualquer forma de incentivo.

Teste de ponta do pé: avalia força dos MMII e equilíbrio do indivíduo. Foi realizado no estudo piloto com o paciente de pé em apoio unipodálico e descalço. O dedo indicador da mão dominante permaneceu apoiado à frente na parede com extensão da interfalangeana distal e semiflexão de cotovelo. O membro inferior de apoio ficou em extensão de joelho e o membro contralateral a 45º em flexão de joelho. O membro superior não-dominante estava ao lado do corpo. O participante realizou cinco flexões plantares consecutivas o mais rápido possível até chegar ao ponto de apoio nas articulações metatarso-falangeanas. Durante todo o teste os membros inferiores não podiam tocar um no outro. Depois de ter feito o teste com um membro, o participante repousava por 1 minuto e retornava ao teste com o membro não testado. O examinador demonstrava o teste e cronometrava o tempo gasto em segundos para a realização das cinco flexões plantares. Foi dado comando verbal somente para determinar o início e o final do teste.

Estudo piloto

Participaram do estudo piloto 12 indivíduos com DAP bilateral. Destes, um voluntário não completou o reteste senta-levanta por apresentar perda urinária devido a incontinência urinária de esforço. A reprodutibilidade inter-examinador foi verificada avaliando-se três examinadores por meio do coeficiente de correlação intraclasse (CCI) e foi considerada alta (CCI=0,80 no teste, com p<0,05, e 0,79 no reteste, com p<0,05). O coeficiente de correlação de Pearson foi utilizado para avaliar a reprodutibilidade intra-examinador, demonstrando alto grau de estabilidade das medidas de cada examinador (0,73, 0,96 e 0,80 para os examinadores 1, 2 e 3 respectivamente, todos com p<0,05).

No teste de ponta do pé com o membro inferior direito (MID), dois indivíduos não conseguiram realizar teste-reteste devido à dificuldade de manutenção do equilíbrio. A reprodutibilidade inter-examinador foi moderada (CCI=0,57 no teste, com p<0,05, e 0,60, no reteste, com p<0,05). A correlação de Pearson teste-reteste dos examinadores não apresentou medidas estáveis entre eles (0,76, 0,70 os examinadores 1 e 2, com p<0,05, e 0,55 para o examinador 3). Com o membro inferior esquerdo (MIE) apoiado, três indivíduos não completaram o teste e dois o reteste, devido novamente à dificuldade de manutenção do equilíbrio para realização do movimento de flexão plantar. A reprodutibilidade inter-examinador no teste foi moderada, enquanto no reteste foi baixa (CCI=0,73 no teste com p<0,05 e 0,42 no reteste com p<0,05). A correlação teste-reteste dos examinadores não apresentou medidas estáveis (0,56, 0,55 e 0,91 para os examinadores 1, 2 e 3 respectivamente, apenas o 3 tendo apresentado p<0,05).

Durante a realização do teste piloto, foi pois observado que a maior parte dos participantes apresentou dificuldades no teste de ponta do pé, tais como perda de equilíbrio, manutenção do mesmo ângulo entre o solo e o ponto de apoio das articulações metatarso-falangeanas durante as cinco flexões plantares. Considerando esses problemas, foram realizadas adaptações no teste ponta do pé, que não alteraram o objetivo principal do estudo:

  • devido à dificuldade de manutenção de equilíbrio em apoio unipodálico, este passou a ser realizado em apoio bipodálico;

  • o apoio do membro superior, que era realizado com o dedo indicador da mão dominante, passou a ser com a região palmar do membro superior direito;

  • foi criado um instrumento (descrito abaixo) para que o indivíduo alcançasse a mesma altura durante as cinco flexões plantares completas;

  • o período entre teste e reteste, que era 48 horas, passou a ser 15 minutos, pois esse período foi analisado como suficiente para o repouso muscular do participante;

  • no estudo piloto, todos os participantes realizaram primeiro o teste senta-levanta da cadeira e posteriormente o teste de ponta do pé. Para minimizar os possíveis erros metodológicos, os indivíduos foram randomizados.

Coleta de dados

Após o estudo piloto, para a avaliação da reprodutibilidade dos testes, foram incluídos 14 indivíduos diferentes do piloto, com DAP confirmada pelo índice tornozelo-braço <0,9 no repouso, independente de idade, sexo, etnia e estilo de vida, que não apresentassem dor isquêmica em repouso, gangrena, úlceras, amputações, patologias ortopédicas ou neurológicas, nem processos inflamatórios agudos que impedissem a realização dos testes. Os 14 indivíduos foram randomizados: metade realizou primeiro o teste senta-levanta e depois o teste de ponta do pé e a outra metade realizou os testes na ordem inversa.

Os voluntários submeteram-se aos dois testes de força muscular nos MMII, por três examinadores, com intervalo de no mínimo 1 minuto entre eles em ambos os testes, e de no mínimo 15 minutos entre as medidas teste-reteste. Nenhum dos voluntários teve acesso ao tempo de cronometragem dos testes. O teste de sentar e levantar da cadeira foi realizado da mesma maneira como no estudo piloto, já descrito.

O teste de ponta do pé foi realizado com o paciente de pé e descalço. A mão direita permaneceu apoiada na parede à frente, com semiflexão de cotovelo, para auxílio na manutenção do equilíbrio. O participante realizou uma primeira flexão plantar até o ponto de apoio das articulações metatarso-falangeanas e a altura que sua cabeça alcançou foi marcada pelo examinador em uma haste de equipamento fixado na parede. Em seguida, o participante realizou cinco flexões plantares completas e consecutivas o mais rápido possível, devendo sempre encostar a cabeça na haste do equipamento. O examinador registrou o tempo em segundos gasto para a realização das cinco flexões plantares após a demonstração do mesmo e realização da primeira vez pelo participante. Foi dado comando verbal para início e final do teste e durante a realização não foi dada qualquer forma de incentivo.

Análise estatística

A estatística descritiva foi utilizada para caracterizar a população estudada. Os dados de tempo em segundos para realização dos testes são apresentados como média±desvio padrão. A reprodutibilidade teste-reteste (intra-examinador) foi avaliada pela correlação de Pearson; e o grau de concordância entre examinadores (inter-examinador) foi avaliado pelo coeficiente de correlação intraclasse CCI(2,1). Para classificar os resultados como estatisticamente significativos foi estabelecido a<5%. Foi utilizado o pacote estatístico SPSS versão 13.0 para análise dos dados.

RESULTADOS

Participaram do estudo 14 indivíduos, sendo 5 do sexo feminino e 9 do sexo masculino. A média de idade dos participantes foi de 60,86±14,47 anos. Entre os 14 participantes, 7 apresentavam acometimento bilateral, 4 do MIE e 3 do MID.

O teste senta-levanta alcançou alta reprodutibilidade inter-examinador, com CCI de 0,904 (p=0,005) no teste e 0,857 no reteste (p=0,005). No teste e no reteste, o tempo mensurado pelo examinador 1 foi 13,28±2,58 e 11,65±2,29 segundos, respectivamente; os tempos correspondentes do examinador 2 foram 13,31±2,29 e 11,59±2,10; e, pelo examinador 3, foi de 12,62±2,12 e 11,71±2,14. A reprodutibilidade teste-reteste apresentou correlações de Pearson superiores a 0,8 para os três examinadores (Figura 1).


O teste de ponta do pé também apresentou reprodutibilidade inter-examinador alta, sendo o CCI 0,824 (p=0,005) no teste e 0,941 (p=0,005) no reteste. O tempo médio em segundos medido pelo examinador 1 no teste e no reteste foi, respectivamente, 5,48±1,55 e 4,85±1,58; pelo examinador 2, 5,51±1,33 e 4,92±1,65; e, pelo terceiro examinador, 5,51±1,64 e 5,13±1,69. A reprodutibilidade do teste de ponta do pé para os três examinadores é ilustrada na Figura 2.


A correlação de Pearson entre a média dos três examinadores no teste senta-levanta da cadeira e a média dos três examinadores no teste ponta do pé foi 0,651 (p=0,012) no teste e 0,609 (p=0,021) no reteste. A variância compartilhada (r²) foi 0,42 no teste e 0,37 no reteste.

DISCUSSÃO

Os resultados mostraram que o teste senta-levanta da cadeira e o teste ponta do pé têm alta reprodutibilidade, tanto intra quanto inter-examinador. Quando comparados esses resultados com os do estudo piloto, pode-se observar que a reprodutibilidade do estudo piloto foi menor. Essa diferença pode estar relacionada ao fato de que os examinadores poderiam ainda não estar devidamente treinados para cronometrar o tempo gasto pelo indivíduo na realização de cada teste. Além disso, no teste-reteste de ponta do pé unipodálico realizado no piloto, com o MID apoiado no solo, dois indivíduos não completaram as cinco flexões plantares; e, com o MIE apoiado no solo, três indivíduos não completaram o teste e dois o reteste. Com esses resultados do piloto, supôs-se que os indivíduos que não conseguiram realizar o teste ponta do pé unipodálico podem ter apresentado deficit de equilíbrio, daí as alterações introduzidas no estudo oficial, passando o teste ponta do pé para bipodálico. Como o objetivo principal do teste não era comparar desempenho dos dois membros inferiores, essa mudança não deveria interferir nos resultados1,3,4,5,12.

Na coleta de dados oficial, dos 14 indivíduos com DAP que participaram do teste-reteste de sentar-e-levantar da cadeira, apenas um indivíduo relatou dor, de intensidade leve, no lado esquerdo do tórax; ele permaneceu sentado até o alívio do sintoma relatado, por aproximadamente 3 minutos, não havendo qualquer intercorrência.

O teste ponta do pé pode ter aplicação clínica direta na área da angiologia, já que avalia a principal musculatura acometida na DAP1,3,4,5,12. Assim, verificar a confiabilidade desse teste é uma das premissas que devem ser analisadas antes de iniciar a aplicação em uma população. Comparando os dados de reprodutibilidade teste-reteste do teste ponta do pé deste estudo com os da literatura, foram encontrados resultados semelhantes. Haber et al.22 encontraram alta reprodutibilidade (CCI=0,88) em indivíduos saudáveis. Neste estudo, as correlações variaram de 0,765 a 0,841, dependendo do examinador; porém, em todos a reprodutibilidade se manteve acima de 0,76, mesmo tendo os voluntários alteração de circulação periférica para a musculatura do tríceps sural.

Ainda quanto ao teste de ponta do pé, a reprodutibilidade inter-examinador do reteste (CCI=0,94) em relação ao teste (CCI=0,82) apresentou maior valor. Isso pode ser explicado pelo fato de, no momento do teste, o indivíduo ter apresentado insegurança ou incômodo com a presença da haste sobre a cabeça, levando maior tempo para realizar as cinco flexões plantares completas; e, no momento do reteste, o indivíduo já estaria familiarizado com a atividade a ser realizada. Pode-se excluir a hipótese de que no reteste os examinadores estariam mais treinados com a cronometragem do tempo gasto em relação ao teste, pois, se isso fosse verdadeiro, algo semelhante teria ocorrido com o teste senta-levanta (CCI=0,857), o que não ocorreu.

Quando se comparam os resultados obtidos neste estudo da reprodutibilidade do teste senta-levanta com dados da literatura, também se encontram resultados semelhantes, com achados de alta reprodutibilidade (correlações teste-reteste e inter-examinador acima de 0,8) em várias populações23-25. Pode-se afirmar que o teste senta-levanta demonstrou-se confiável também na avaliação de indivíduos com DAP.

Foi calculada a correlação entre o teste senta-levanta da cadeira e o teste ponta do pé, pelas médias dos examinadores em ambos os testes, com o objetivo de contrastar o grau de associação entre os dois testes. Com o resultado, foi possível observar que há associação significante e moderada (r>0,6, p<0,05) entre essas medidas e que elas medem aspectos semelhantes do desempenho relativo à força muscular dos membros inferiores nessa população. Entretanto, ao se observar a variância compartilhada entre essas duas medidas (r²=0,42 no teste, r²=0,37 no reteste), pode-se dizer que cerca de 60% do desempenho no teste senta-levanta não pode ser explicado pelo desempenho observado no teste ponta do pé e vice-versa. Esses resultados justificam a avaliação específica da força muscular em portadores de DAP quando membros inferiores são considerados, uma vez que o desempenho desses membros pode estar comprometido de forma distinta.

CONCLUSÃO

Após a aplicação dos testes senta-levanta da cadeira e de ponta do pé, pode-se concluir que ambos são reprodutíveis e viáveis na prática clínica na avaliação da força muscular dos MMII em portadores de DAP, uma vez que os testes avaliam musculaturas distintas. Embora tais testes tenham demonstrado ser confiáveis, ainda é necessário avaliar se são sensíveis a alterações que porventura venham a ocorrer durante o processo natural de evolução da patologia, ou se podem ser instrumentos viáveis para avaliação e acompanhamento do tratamento oferecido a esses pacientes. Portanto, futuros estudos são necessários para responder tais questões.

Apresentação: out. 2007

Aceito para publicação: ago. 2008

Estudo desenvolvido no Curso de Fisioterapia do Depto. de Ciências Biológicas, Ambientais e da Saúde do Uni-BH- Centro Universitário de Belo Horizonte, Belo Horizonte, MG, Brasil

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  • Endereço para correspondência:
    Danielle A. Gomes Pereira
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Abr 2012
    • Data do Fascículo
      Set 2008

    Histórico

    • Aceito
      Ago 2008
    • Recebido
      Out 2007
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