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Estimulação elétrica nervosa transcutânea nas modalidades convencional e acupuntura na dor induzida pelo frio

Conventional and acupuncture-like transcutaneous electrical nerve stimulation on cold-induced pain

Resumos

A estimulação elétrica nervosa transcutânea (TENS) é um recurso não-farmacológico já consagrado na modulação de dores agudas e crônicas. O objetivo deste estudo foi verificar o efeito da TENS convencional e na modalidade TENS-acupuntura na dor induzida pelo frio. Trinta indivíduos saudáveis com idade entre 18 e 40 anos foram distribuídos ao acaso em três grupos: placebo, TENS convencional e TENS-acupuntura. Foi utilizado um protocolo de indução de dor pelo frio composto por seis ciclos: dois pré-tratamento, dois durante e dois após o tratamento. A TENS foi aplicada por 20 minutos por dois canais, sendo a modalidade convencional, no nível sensorial, na freqüência de 80 Hz e a modalidade acupuntura, no nível motor, a 4 Hz. Foram medidos limiar de dor, tolerância à dor e intensidade da dor. Não foi encontrada diferença estatisticamente significante nos valores medidos durante a após o tratamento quando comparados aos dos ciclos pré-tratamento, em todas as variáveis. Nas duas modalidades estudadas pois, a TENS, nos parâmetros de aplicação utilizados, não modificou a dor induzida por frio, sugerindo-se novos estudos com maior tempo de aplicação da TENS e diferentes modelos de dor experimental.

Dor; Estimulação elétrica nervosa transcutânea; Limiar da dor


Transcutaneous electrical nerve stimulation (TENS) is a non-pharmacological method already established in the modulation of acute and chronic pain. The purpose of this study was to assess the effect of conventional TENS and acupuncture-like TENS on cold-induced pain. Thirty healthy subjects aged 18 to 40 years old were randomized into in three groups: placebo, conventional TENS, and acupuncture-like TENS. A cold-induced pain protocol was used, in six cycles (two pre-treatment, two during, and two after treatment); TENS was applied for 20 minutes through 2 channels, the conventional modality at sensory level at 80 Hz, and the acupuncture modality at motor level at 4 Hz. Variables analysed were pain threshold, tolerance to pain, and pain intensity. No statistically significant differences were found in any variable between post and pre-treatment measures in all groups. Hence neither conventional or acupuncture-like TENS had any effect on cold-induced pain. Further studies are suggested, with different experimental pain models, and with longer time of TENS application.

Pain; Pain threshold; Transcutaneous electric nerve stimulation


PESQUISA ORIGINAL ORIGINAL RESEARCH

Estimulação elétrica nervosa transcutânea nas modalidades convencional e acupuntura na dor induzida pelo frio

Conventional and acupuncture-like transcutaneous electrical nerve stimulation on cold-induced pain

Hisa Costa MorimotoI; Márcia Yumi YonekuraI; Richard Eloin LiebanoII

IFisioterapeutas

IIProf. Dr. do Curso de Mestrado em Fisioterapia da Unicid

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Richard E. Liebano Setor de Pós-Graduação /Unicid R. Cesário Galeno 448 03071-000 São Paulo SP e-mail: liebano@gmail.com

RESUMO

A estimulação elétrica nervosa transcutânea (TENS) é um recurso não-farmacológico já consagrado na modulação de dores agudas e crônicas. O objetivo deste estudo foi verificar o efeito da TENS convencional e na modalidade TENS-acupuntura na dor induzida pelo frio. Trinta indivíduos saudáveis com idade entre 18 e 40 anos foram distribuídos ao acaso em três grupos: placebo, TENS convencional e TENS-acupuntura. Foi utilizado um protocolo de indução de dor pelo frio composto por seis ciclos: dois pré-tratamento, dois durante e dois após o tratamento. A TENS foi aplicada por 20 minutos por dois canais, sendo a modalidade convencional, no nível sensorial, na freqüência de 80 Hz e a modalidade acupuntura, no nível motor, a 4 Hz. Foram medidos limiar de dor, tolerância à dor e intensidade da dor. Não foi encontrada diferença estatisticamente significante nos valores medidos durante a após o tratamento quando comparados aos dos ciclos pré-tratamento, em todas as variáveis. Nas duas modalidades estudadas pois, a TENS, nos parâmetros de aplicação utilizados, não modificou a dor induzida por frio, sugerindo-se novos estudos com maior tempo de aplicação da TENS e diferentes modelos de dor experimental.

Descritores: Dor; Estimulação elétrica nervosa transcutânea/métodos; Limiar da dor

ABSTRACT

Transcutaneous electrical nerve stimulation (TENS) is a non-pharmacological method already established in the modulation of acute and chronic pain. The purpose of this study was to assess the effect of conventional TENS and acupuncture-like TENS on cold-induced pain. Thirty healthy subjects aged 18 to 40 years old were randomized into in three groups: placebo, conventional TENS, and acupuncture-like TENS. A cold-induced pain protocol was used, in six cycles (two pre-treatment, two during, and two after treatment); TENS was applied for 20 minutes through 2 channels, the conventional modality at sensory level at 80 Hz, and the acupuncture modality at motor level at 4 Hz. Variables analysed were pain threshold, tolerance to pain, and pain intensity. No statistically significant differences were found in any variable between post and pre-treatment measures in all groups. Hence neither conventional or acupuncture-like TENS had any effect on cold-induced pain. Further studies are suggested, with different experimental pain models, and with longer time of TENS application.

Key words: Pain; Pain threshold; Transcutaneous electric nerve stimulation/methods

INTRODUÇÃO

A estimulação elétrica é usada regularmente por fisioterapeutas, sendo indicada para o controle da dor, reeducação muscular, fortalecimento e diminuição de edema. Entre esses, o controle da dor é o uso mais comum1,2.

A estimulação elétrica nervosa transcutânea (TENS) envolve a transmissão de energia elétrica de um estimulador externo para o sistema nervoso periférico, através de eletrodos de superfície conectados na pele3. É uma técnica simples e eficiente, muito utilizada para o alívio da dor4. Apesar disso, os estudos que investigam o efeito de diferentes parâmetros da TENS na modulação da dor apresentam resultados divergentes5,6.

A TENS pode ser classificada em quatro modalidades: convencional, acupuntura, em rajadas (burst) e breve-intensa. A convencional tem baixa intensidade e alta freqüência (10 a 200 Hz) e é comumente utilizada em dores agudas; a acupuntura tem alta intensidade e baixa freqüência (2 a 4 Hz) e é mais usada em dores crônicas3.

A produção de analgesia ocorre por diferentes mecanismos. Na modalidade convencional estimulam-se preferencialmente as fibras de maior diâmetro (A-beta), fazendo com que a maior parte da modulação da dor ocorra em nível medular; na modalidade acupuntura estimulam-se fibras de menor diâmetro (A-delta), onde se acredita que ocorra analgesia principalmente no nível supraespinal (liberação de neuromediadores endógenos e opióides), por supressão da transmissão e da percepção de estímulos nocivos da periferia3,7.

A eficácia da TENS pode variar de acordo com o tempo de duração de pulso, freqüência, polaridade e forma de onda5,8,9. Modelos experimentais de dor são usados para representar clinicamente essa sensação e tornam possível o controle de variáveis, como intensidade e duração. Esses modelos utilizam diferentes tipos de estímulos: frio, mecânico, elétrico e isquemia10. O modelo de dor induzida pelo frio é um método simples que envolve um risco mínimo de lesão tecidual e a dor cessa após a remoção do estímulo. Durante esse teste, uma sensação dolorosa é gerada pelos receptores de temperatura, que começam a enviar estímulos de um possível dano tecidual pelas vias periférica (fibras C e A-delta) e central (espinotalâmica e espinoreticular), resultando na sensação de dor induzida pelo frio11.

Muitos estudos já foram realizados para investigar os diferentes parâmetros da TENS na dor induzida experimentalmente12-16, mas até o presente não existe um consenso sobre a melhor freqüência a ser utilizada no tratamento da dor aguda. Walsh et al.17 investigaram o efeito da TENS de baixa freqüência (4 Hz) e de alta freqüência (110 Hz) na dor isquêmica, encontrando que a TENS de baixa freqüência teve melhor efeito analgésico que a de alta freqüência. Porém o mesmo grupo de pesquisadores, em outro estudo18, verificaram o efeito da TENS em diferentes freqüências e durações de pulso durante a dor mecânica e constataram que a TENS de alta freqüência (110 Hz) proporcionou maior analgesia.

A literatura tem se mostrado escassa em relação ao uso de diferentes modalidades de TENS na dor aguda, e os estudos disponíveis apresentam resultados conflitantes. Ashton et al.19 compararam o efeito de duas freqüências da TENS (8 Hz e 100 Hz) na dor induzida pelo frio, encontrando que a TENS de 8 Hz produz maior analgesia, comparada com a de 100 Hz e ao grupo placebo. Em contrapartida, Johnson et al.12 relataram que a TENS com freqüências entre 20 Hz e 80 Hz produz maior analgesia.

Além disso, o posicionamento de eletrodos adotado em estudos semelhantes pode levar a um viés, uma vez que pressupõe a estimulação do nervo mediano - e, no modelo experimental de indução da dor pelo frio, toda a mão é submetida ao estímulo nociceptivo. Desse modo, seria interessante verificar o uso da TENS na dor induzida pelo frio adotando um posicionamento de eletrodos que priorizasse a estimulação de dermátomos e miótomos relacionados às regiões anteriores e posteriores do punho e da mão. Assim, o objetivo deste estudo foi verificar o efeito da TENS convencional (na freqüência de 80 Hz) e da TENS acupuntura (freqüência 4 Hz) sobre a dor induzida pelo frio, adotando o posicionamento de eletrodos acima mencionado.

METODOLOGIA

O estudo foi desenvolvido na Universidade Cidade de São Paulo e aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da instituição. Trinta voluntários saudáveis foram recrutados, com idades entre 18 e 40 anos, de ambos os sexos (15 homens e 15 mulheres), tendo todos assinado um termo de consentimento livre e esclarecido. Os critérios de exclusão foram: apresentar na mão não-dominante algum problema ortopédico, neurológico, doença circulatória, hipersensibilidade ao frio ou lesões de pele na área em que são colocados os eletrodos (superfície ventral e dorsal do antebraço); e, ainda, tolerar a imersão na água a 0ºC por mais de 5 minutos. Os voluntários foram distribuídos em três grupos: placebo (n=10), TENS convencional (n=10) e TENS acupuntura (n=10).

O protocolo de indução da dor pelo frio foi constituído de seis ciclos idênticos, cada um com a duração de dez minutos, totalizando uma hora de teste. Cada ciclo (Figura 1) começava com o sujeito colocando a mão não-dominante (até parte distal do punho) na água morna (37ºC). Após cinco minutos o sujeito transferia a mão para a água fria (0ºC). O voluntário foi instruído a se concentrar na sensação da mão imersa até o ponto em que essa sensação se tornasse dolorosa - e, depois, retirar a mão da água quando não suportasse mais a dor. O tempo decorrido (em segundos) até o momento em que relatou a sensação de dor foi cronometrado e considerado a variável limiar de dor. O tempo decorrido desde o limiar de dor até o momento em que o sujeito retirou a mão da água foi considerado a variável tolerância à dor. Na seqüência, o voluntário marcou em uma escala visual analógica (EVA) a intensidade da dor numa reta de 0 a 10 cm, onde 0 significa ausência de dor e 10 significa a pior dor imaginável. A partir disso, o sujeito permaneceu em repouso até se completarem os dez minutos do ciclo. O ciclo seguinte recomeçou com a reimersão da mão na água morna13.


Para a manutenção da água morna (37ºC) elaborou-se um instrumento constituído de um recipiente de aço inox (10x25x15 cm), uma resistência elétrica e um termostato digital, revestidos por material isolante térmico. A resistência elétrica foi instalada sob o recipiente de inox para evitar qualquer risco de queimaduras ou choques aos voluntários. Para a manutenção da temperatura da água foi utilizado um termômetro específico para o meio aquático (Incoterm). Para a avaliação do limiar de dor e tolerância à dor foi utilizado um cronômetro (Oregon, modelo SL210).

A estimulação elétrica foi aplicada apenas em seguida aos ciclos 3 e 4 (20 minutos de tratamento sem interrupção). Dois ciclos adicionais (ciclos 5 e 6) finalizaram o protocolo após a utilização da estimulação elétrica. Assim, duas medidas pré-intervenção, duas medidas durante a intervenção e duas medidas pós-intervenção foram obtidas20.

O equipamento utilizado no experimento foi Dualpex (961 Quark). A TENS foi aplicada através de dois canais: dois eletrodos na superfície ventral e dois eletrodos na superfície dorsal do antebraço. O primeiro eletrodo foi colocado três cm a partir da primeira prega do punho e o segundo eletrodo foi disposto a dois cm do primeiro. Foram utilizados eletrodos não-adesivos (borracha siliconada com carbono) de 6x5 cm, juntamente com um meio condutivo (gel hipoalergênico à base de água).

A TENS convencional foi utilizada com freqüência de 80 Hz (T=200μs) e a TENS acupuntura com uma freqüência de 4 Hz (T=200μs). No grupo submetido a TENS convencional foi mantido um nível de intensidade forte, porém confortável, e no grupo submetido a TENS acupuntura, o nível de intensidade mantido foi no momento em que houve contrações musculares fortes, porém confortáveis. Os sujeitos do grupo placebo foram submetidos ao protocolo com o aparelho desligado.

A análise dos dados foi feita com o pacote estatístico SPSS (Statistical Package for Social Sciences for Windows v.11.5). Todos os testes foram realizados considerando hipóteses bilaterais e assumindo o nível de significância α=5%. O período pré-tratamento foi considerado a média dos ciclos 1 e 2, e foi utilizado como base para a comparação com os ciclos 3 e 4 (tratamento) e 5 e 6 (pós-tratamento). A comparação das médias das variáveis limiar de dor, tolerância à dor e intensidade da dor entre o período pré-tratamento e os ciclos 3, 4, 5 e 6 (separadas pelos grupos convencional, acupuntura e placebo) foram feitas pela análise de variância (ANOVA) com medidas repetidas21.

RESULTADOS

A comparação da média das variáveis limiar de dor, tolerância à dor e intensidade da dor nos ciclos 1 e 2 (pré-tratamento) não detectou diferenças significativas entre os ciclos (p=0,702; 0,507; 0,319, respectivamente). Assim, pode-se considerar que nesses ciclos, os três grupos (placebo, acupuntura e convencional) eram homogêneos entre si. Os valores medidos de limiar de dor, tolerância à dor e intensidade da dor são apresentados na Tabela 1.

Na Figura 2 são apresentados os valores da variável limiar de dor para cada grupo, em cada ciclo. Nenhuma diferença estatisticamente significante foi encontrada entre os ciclos nos grupos. Os intervalos demarcados pelas barras indicam os erros-padrão de cada ciclo.


Quando avaliada a tolerância à dor, dois sujeitos dos grupos acupuntura e placebo foram excluídos da pesquisa, pois tiveram tolerância ao frio que ultrapassou os 5 minutos do protocolo. Na Figura 3 são apresentados os valores da variável tolerância à dor para cada grupo, em cada ciclo. Nenhuma diferença estatisticamente significante foi encontrada entre os grupos nem entre os ciclos.


Na Figura 4 são apresentados os valores da variável intensidade da dor avaliada pela EVA para cada grupo, em cada um dos ciclos considerados no estudo. Nenhuma diferença estatisticamente significante foi encontrada entre os grupos ou ciclos.


DISCUSSÃO

A estimulação elétrica nervosa transcutânea é um recurso já consagrado na modulação de dores agudas e crônicas, sendo utilizada diariamente como parte do arsenal de recursos disponíveis ao fisioterapeuta22-24. Seu mecanismo de ação passou a ser melhor compreendido após a postulação da teoria das comportas por Melzack e Wall25, sendo determinado que a estimulação de fibras nervosas aferentes de grosso calibre (mielinizadas) e rápida velocidade de condução (A-beta) poderia inibir a passagem de estímulos nociceptivos que estariam sendo transmitidas pelas fibras lentas do tipo A-delta e tipo C.

Uma das modalidades da TENS é a chamada acupuntura, que produz contrações musculares por alta intensidade e baixa freqüência (2 a 4 Hz). Essa modalidade produz analgesia preferencialmente pela ativação das fibras de pequeno diâmetro e liberação de opióides no sistema nervoso central3,26.

Johnson26, em um estudo que avaliou os efeitos das diferentes freqüências da TENS na dor induzida pelo frio, observou que não há diferença significante entre homens e mulheres na reação à dor experimental. Foi com base nesses resultados que, no presente trabalho, os voluntários foram igualmente distribuídos entre os sexos (quinze homens e quinze mulheres).

A escolha do protocolo de indução da dor pelo frio no presente estudo - composto por 6 ciclos de 10 minutos cada (2 ciclos pré-tratamento, 2 ciclos tratamento e 2 ciclos pós-tratamento) - deve-se a sua ampla utilização na literatura27-35.

Alguns autores optaram por adotar protocolos com tempo de tratamento maior. Johnson26, Johnson et al.27 e Stephenson e Walker36 utilizaram um protocolo composto por 6 ciclos (2 ciclos pré-tratamento e 4 ciclos tratamento), onde cada ciclo tinha duração de 15 minutos, totalizando 60 minutos de tratamento. Johnson et al.13 adotaram um protocolo com 8 ciclos (2 pré-tratamento, 3 tratamento e 3 pós-tratamento), onde cada ciclo tinha a duração de 10 minutos, totalizando 30 minutos de tratamento.

Vários estudos28-32,35 utilizaram um protocolo onde o ponto de tolerância à dor é pré-determinado (30 s). Porém, durante um teste piloto realizado para este estudo, verificou-se que muitos voluntários não toleravam esse tempo imposto, de modo que este seria um fator de exclusão no estudo. Adotou-se assim um protocolo no qual a tolerância à dor é determinada pelo próprio voluntário - o que já havia sido utilizado em alguns estudos26,27,36.

Para quantificar a intensidade da dor de maneira fidedigna, foi utilizada a escala visual analógica (EVA), que é uma escala amplamente utilizada pela literatura em geral e, também, pelos estudos que adotaram o protocolo de dor induzida pelo frio26-31,33-36.

A tolerância à dor, outra variável aqui avaliada, é pouco relatada pelos autores, tendo sido analisada apenas por Johnson26 e Johnson et al.27, em trabalhos que observaram os efeitos analgésicos nas diferentes freqüências e durações de pulso da TENS na dor induzida pelo frio em sujeitos normais.

Nos estudos que utilizaram o protocolo de indução da dor pelo frio, os autores não relatam como, e com que instrumento, ocorre a manutenção da água morna durante todo o ciclo (60 minutos). Na falta dessa informação, para este estudo foi elaborado um instrumento onde a água foi aquecida a 37ºC e essa temperatura foi mantida durante todo o protocolo. Essa informação é de grande importância para estudos que venham adotar esse protocolo, pois permite que futuros pesquisadores utilizem o mesmo instrumento aqui utilizado.

Vários autores13,26,28,29,33 preconizaram um posicionamento de eletrodos apenas na superfície ventral do antebraço, visando estimular o nervo mediano. O presente trabalho adotou um posicionamento de eletrodos tal que envolve os dermátomos e miótomos correspondentes ao sítio doloroso, uma vez que o estímulo doloroso ocorrerá em toda a mão, e não somente nas áreas inervadas pelo nervo mediano. Além disso, esse posicionamento visa uma melhor eficácia do mecanismo de ação de ambas as modalidades (TENS convencional e TENS acupuntura).

Os parâmetros utilizados na TENS convencional e TENS acupuntura foram selecionados conforme o que a literatura tem mostrado. Johnson et al.6 observaram que a freqüência de 80 Hz produziu maior elevação no limiar de dor. Sluka et al.37 e Walsh et al.17 utilizaram a freqüência de 4 Hz para a TENS acupuntura, sendo que este último estudo observou que a freqüência de 4 Hz foi a única a demonstrar um efeito analgésico significante. A duração de pulso utilizada no presente estudo foi selecionada devido à sua ampla utilização em estudos semelhantes13,26,27,33.

O presente estudo não apresentou diferenças estatisticamente significantes entre os ciclos nos grupos (placebo, convencional e acupuntura). É provável que esses resultados tenham sido decorrentes da vasta variabilidade do limiar de dor na população, como citam Johnson e Tabasam31.

Johnson38 preconiza o tempo de tratamento para a TENS convencional de pelo menos 30 minutos e, para a TENS acupuntura, de em média 20 minutos. Portanto, outro fator determinante dos resultados encontrados pode ter sido a escolha do protocolo com tempo de tratamento de 20 minutos. Johnson e Tabasam31 adotaram esse mesmo protocolo e também não encontraram diferenças estatisticamente significantes em seus resultados. Em contrapartida, Shanahan et al.33 utilizaram um protocolo semelhante ao do presente estudo para comparar a TENS e terapia interferencial, tendo como resultado uma maior efetividade da TENS no aumento do limiar de dor. Ward e Oliver34 e Aaskorg et al.39 também realizaram um estudo com 20 minutos de eletroestimulação e obtiveram resultados positivos quanto ao limiar de dor. Outros estudos que utilizaram um tempo de tratamento superior a 20 minutos obtiveram dados significantes em relação ao aumento do limiar de dor12,13,27,29,30.

Considerando os mecanismos de ação da TENS convencional e da TENS acupuntura, sugere-se que o tempo de tratamento de 20 minutos talvez não seja suficiente para produzir um efeito analgésico eficaz no limiar, na tolerância e na intensidade da dor induzida pelo frio, principalmente na modalidade convencional.

A TENS acupuntura tem uma particularidade no efeito pós-tratamento devido à liberação de opióides no sistema nervoso central, que ocorre de maneira progressiva e lenta. A eficácia da TENS acupuntura foi observada no estudo de Johnson et al.13, que usaram um modelo experimental com tempo de tratamento de 30 minutos. O comportamento do limiar de dor no pós-tratamento mostrou-se mais eficaz na TENS acupuntura quando comparado às outras modalidades da TENS, o que não foi verificado no presente estudo, com menor tempo de tratamento.

Para realização de estudos futuros que comparem a TENS convencional com a TENS acupuntura na dor induzida pelo frio, é interessante utilizar um protocolo com tempo de tratamento superior a 20 minutos, como fizeram Johnson et al.13, objetivando-se melhor eficácia no mecanismo de ação dessas modalidades.

Além disso, sugere-se um aumento da amostra na tentativa de diminuir o valor de desvio-padrão, e que seja realizado um estudo cruzado, de modo a minimizar a interferência da variabilidade do limiar de dor de cada sujeito. Ward e Oliver34 realizaram um estudo cruzado com 19 sujeitos, no qual cada voluntário participou de todos os grupos do estudo, sendo possível avaliar o limiar de dor do mesmo sujeito em diferentes tratamentos.

CONCLUSÃO

Como não houve diferença no limiar, intensidade ou tolerância à dor induzida pelo frio entre os ciclos nos grupos investigados, pode-se dizer que a estimulação elétrica nervosa transcutânea, nas modalidades convencional e acupuntura, não surtiu efeito analgésico, nos parâmetros de aplicação utilizados, sugerindo-se novos estudos com diferentes modelos de dor experimental e permitindo maiores tempos de aplicação da TENS.

5 Rao VR, Wolf SL, Gersh MR. Examination of electrode placements and stimulating parameters in treating chronic pain with conventional transcutaneous electrical nerve stimulation (TENS). Pain. 1981;11(1):37-47.

Apresentação: dez. 2008

Aceito para publicação: maio 2009

Estudo desenvolvido no Curso de Fisioterapia da Unicid - Universidade Cidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

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  • Endereço para correspondência:

    Richard E. Liebano
    Setor de Pós-Graduação /Unicid
    R. Cesário Galeno 448
    03071-000 São Paulo SP
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Abr 2012
    • Data do Fascículo
      Jun 2009

    Histórico

    • Recebido
      Dez 2008
    • Aceito
      Maio 2009
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