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Influência da estimulação aquática no desenvolvimento de crianças de 0 a 18 meses: um estudo piloto

Influence of aquatic stimulation on 0 to 18-month child development: a pilot study

Resumos

O desenvolvimento humano envolve fatores biológicos e ambientais que interagem de forma dinâmica e complexa ao longo da vida. Para alguns autores, o meio aquático pode oferecer diversos benefícios ao desenvolvimento infantil; no entanto, estudos sobre estimulação aquática e desenvolvimento típico são escassos. O objetivo deste estudo foi verificar a influência de um programa de estimulação aquática no desenvolvimento de crianças de 0 a 18 meses, com ênfase no desenvolvimento motor. Participaram do estudo 12 crianças de classe média com nível de escolaridade materna igual ou superior a ensino médio completo. As crianças foram submetidas a uma avaliação antes e após um programa de estimulação aquática de 50 minutos por semana, durante quatro a oito semanas. A avaliação consistiu na aplicação de dois testes: Denver II, para avaliar desenvolvimento global, e a escala motora infantil de Alberta (Aims), para avaliar desenvolvimento motor amplo. Os dados foram tratados estatisticamente. Não foram encontradas diferenças significativas entre os resultados dos testes antes e após o programa. Portanto, o programa de estimulação aquática infantil não teve influência nas áreas de desenvolvimento avaliadas. Embora o ambiente aquático forneça muitos benefícios para a criança, este estudo não permite afirmar que o estímulo precoce nesse meio favoreça o desenvolvimento infantil. Requerem-se novos estudos, com maior tempo de intervenção, grupo controle e maior número de participantes.

Ambiente; Desenvolvimento infantil; Natação


Human development involves biological and environment factors that interact in a dynamic and complex way throughout life. For some authors, the aquatic environment may offer several benefits to infantile development, but studies on the relationship between aquatic stimulation and typical development are scarce. The purpose of this study was to assess the influence of a program of aquatic stimulation (a 50-minute session once a week during four to eight weeks) on the development of 12 children aged 0 to 18 months, with emphasis on motor development. Children were from middle class families, their mothers having high school or higher educational background. They were assessed before and after the program by two tests: Denver II, to assess global development, and the Alberta infant motor scale, to evaluate gross motor development. Data were statistically analysed. Results showed no significant score differences between tests applied before and after the program. Hence the program had no influence on children's development areas assessed. Although the aquatic environment offers the child many benefits, this study does not allow asserting that it favours infant development. Further studies must include a greater sample, longer lasting programs, and a control group.

Child development; Environment; Swimming


PESQUISA ORIGINAL ORIGINAL RESEARCH

Influência da estimulação aquática no desenvolvimento de crianças de 0 a 18 meses: um estudo piloto

Influence of aquatic stimulation on 0 to 18-month child development: a pilot study

Jaqueline de Oliveira SilvaI; Júlia Caetano MartinsI; Rosane Luzia de Souza MoraisII; Wellington Fabiano GomesII

IGraduandas em Fisioterapia na UFVJM

IIProfs. Ms. assistentes do Depto. de Fisioterapia da UFVJM

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rosane L. S. Morais R. Grupiara 147 A, Bairro Purquéria 39100-000 Diamantina MG e-mail: rosanesmorais@gmail.com

RESUMO

O desenvolvimento humano envolve fatores biológicos e ambientais que interagem de forma dinâmica e complexa ao longo da vida. Para alguns autores, o meio aquático pode oferecer diversos benefícios ao desenvolvimento infantil; no entanto, estudos sobre estimulação aquática e desenvolvimento típico são escassos. O objetivo deste estudo foi verificar a influência de um programa de estimulação aquática no desenvolvimento de crianças de 0 a 18 meses, com ênfase no desenvolvimento motor. Participaram do estudo 12 crianças de classe média com nível de escolaridade materna igual ou superior a ensino médio completo. As crianças foram submetidas a uma avaliação antes e após um programa de estimulação aquática de 50 minutos por semana, durante quatro a oito semanas. A avaliação consistiu na aplicação de dois testes: Denver II, para avaliar desenvolvimento global, e a escala motora infantil de Alberta (Aims), para avaliar desenvolvimento motor amplo. Os dados foram tratados estatisticamente. Não foram encontradas diferenças significativas entre os resultados dos testes antes e após o programa. Portanto, o programa de estimulação aquática infantil não teve influência nas áreas de desenvolvimento avaliadas. Embora o ambiente aquático forneça muitos benefícios para a criança, este estudo não permite afirmar que o estímulo precoce nesse meio favoreça o desenvolvimento infantil. Requerem-se novos estudos, com maior tempo de intervenção, grupo controle e maior número de participantes.

Descritores: Ambiente; Desenvolvimento infantil; Natação

ABSTRACT

Human development involves biological and environment factors that interact in a dynamic and complex way throughout life. For some authors, the aquatic environment may offer several benefits to infantile development, but studies on the relationship between aquatic stimulation and typical development are scarce. The purpose of this study was to assess the influence of a program of aquatic stimulation (a 50-minute session once a week during four to eight weeks) on the development of 12 children aged 0 to 18 months, with emphasis on motor development. Children were from middle class families, their mothers having high school or higher educational background. They were assessed before and after the program by two tests: Denver II, to assess global development, and the Alberta infant motor scale, to evaluate gross motor development. Data were statistically analysed. Results showed no significant score differences between tests applied before and after the program. Hence the program had no influence on children's development areas assessed. Although the aquatic environment offers the child many benefits, this study does not allow asserting that it favours infant development. Further studies must include a greater sample, longer lasting programs, and a control group.

Key words: Child development; Environment; Swimming

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento do ser humano ocorre de forma integrada, envolvendo aspectos cognitivos, afetivos, sociais e motores, que vão se transformando ao longo dos anos1,2. A quantidade e a qualidade das experiências vivenciadas tem grande influência no desenvolvimento da criança e do adolescente até a idade adulta1,3.

Desenvolvimento motor (DM) é o processo de mudança no comportamento motor, relacionado à idade do indivíduo4. Tradicionalmente o DM foi associado à maturação do sistema nervoso central, porém teorias contemporâneas defendem que outros fatores, como os sistemas musculoesquelético, cardiorrespiratório e o ambiente também estejam envolvidos no desenvolvimento das habilidades motoras. Esses fatores interagem de forma complexa ao longo da vida, proporcionando as várias mudanças no organismo humano2,4.

Estudos mostraram que o modo de criar o lactente desde o nascimento influi na velocidade de seu desenvolvimento motor, especialmente durante os primeiros 12 ou 18 meses de vida3,5-7. Abbott et al.8, em estudo sobre a relação entre os aspectos do ambiente domiciliar e o desenvolvimento motor infantil, defendem a contribuição de múltiplos subsistemas na aquisição de habilidades motoras na infância e sugerem que um ambiente com maior suporte e mais estímulos está associado a níveis mais elevados de DM infantil.

Fernandes e Costa9 descrevem o meio líquido como um ambiente com várias possibilidades de ação e movimento. Para esses autores, a água é mais que uma superfície de apoio e uma dimensão, é um espaço para emoções, aprendizados e relacionamentos com o outro, consigo e com a natureza. Esse meio fornece ao indivíduo experiências e vivências novas e variadas, favorecendo a percepção sensorial e a ação motora10.

Há na literatura relatos de programas de atividade aquática com bebês que visam estimular a adaptação da criança ao meio líquido, incentivar sua interação com os pais e educadores, enriquecer suas experiências sensoriais e motoras, além de fornecer uma atividade recreativa e agradável11,12. Entretanto, embora amplamente indicada, não foram encontrados na literatura pesquisada estudos experimentais investigando a influência da estimulação aquática nos diferentes aspectos do desenvolvimento humano.

Acreditando que o meio aquático possa criar oportunidades para a criança explorar o ambiente, adquirir novas habilidades e desenvolver-se nos aspectos motor, cognitivo, afetivo e social, o objetivo deste trabalho foi verificar a influência da estimulação aquática no desenvolvimento global de crianças de 0 a 18 meses, com ênfase no DM.

METODOLOGIA

Este é um estudo piloto do tipo antes-depois, aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da UFVJM - Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri.

Participaram do estudo crianças do Projeto de Extensão Cubo d'Água do Curso de Fisioterapia da UFVJM, que se enquadravam nos seguintes critérios de inclusão: idade de 0 a 18 meses, com desenvolvimento típico; qualquer sexo ou raça; pertencer às classes sociais B e C13; e apresentar nível de escolaridade materna igual ou superior ao ensino médio completo; o responsável ter interesse na participação da criança e assinar o termo de consentimento livre e esclarecido.

Como o nível de escolaridade materna e o nível socioeconômico podem influenciar no desenvolvimento da criança14-17, para obter uma amostra homogênea padronizou-se a seleção de crianças de classe média, classificadas de acordo com o questionário socioeconômico da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa13 e mães com escolaridade de nível médio completo ou superior.

Foram critérios de exclusão do estudo: crianças com doenças infecto-contagiosas ou outras doenças que impedisem o contato com o ambiente aquático; crianças com desenvolvimento neuropsicomotor atípico; e freqüência a número de sessões de estimulação aquática inferior a quatro.

Procedimentos

Os instrumentos utilizados no estudo foram o inventário Denver II18, para avaliar o desenvolvimento pessoal-social, motor fino adaptativo, motor grosso e linguagem, e a escala motora infantil de Alberta Aims (Alberta Infant Motor Scale)19, para avaliar o desenvolvimento motor grosso.

O Denver II18 é um instrumento padronizado bastante utilizado pelos profissionais da área da saúde para triagem de crianças com risco de atraso no desenvolvimento global, pois é de fácil execução e rápida administração. O teste é composto por 125 itens, subdivididos em quatro domínios de funções: pessoal-social, motor fino adaptativo, linguagem e motor grosso. Cada item contém uma barra representando faixas da idade em que 25%, 50%, 75% e 90% das crianças estudadas apresentam as habilidades sugeridas. Para responder alguns itens o examinador questiona a/o responsável. Cada item avaliado é classificado em: normal, quando a criança executa atividade prevista para a idade; cautela, quando a criança não executa ou recusa-se a realizar atividade prevista para 75 a 90% das crianças de sua idade; atraso, quando a criança não executa ou recusa-se a realizar atividade prevista para mais de 90% dos que têm sua idade7,20,21.

A Aims19 é um instrumento observacional que foi desenvolvido para avaliar aquisições motoras grossas de crianças de até 18 meses. Trata-se de uma escala com propriedades psicométricas consideradas satisfatórias, de rápida e fácil aplicação. O teste consiste em 58 itens agrupados em quatro sub-escalas que descrevem desenvolvimento de movimentação espontânea e de habilidades motoras em posições básicas, incluindo prono (21 itens), supino (9 itens), sentado (12 itens) e de pé (16 itens)21,22. Durante a avaliação, o examinador deve observar aspectos do desempenho motor tais como descarga de peso, postura e movimentos antigravitacionais23. A marcação do escore consiste na escolha dicotomizada, em cada item, que deve ser marcado como "observado", recebendo escore um, ou "não observado", recebendo escore zero. Os itens "observados" são somados, dando o escore total, que é convertido em percentis de desempenho motor estabelecidos com base na amostra normativa do teste, variando em intervalos: menor que 5, 5 a 10, 10 a 25, 25 a 50, 50 a 75, 75 a 90, e acima de 90% 24.

As crianças do Projeto de Extensão Cubo d'Água que se apresentavam dentro dos critérios de inclusão do estudo foram submetidas a uma avaliação por meio dos instrumentos Denver II e Aims antes e após a participação no programa de estimulação aquática.

Os testes Denver II e Aims foram aplicados sempre por duas pesquisadoras previamente treinadas, sendo cada uma responsável pela aplicação de um dos testes. No teste Aims foi utilizada vídeo-gravação digital, para maior exatidão na análise dos movimentos realizados pela criança em cada uma das posições básicas do teste. O fechamento da Aims foi feito por uma terceira pesquisadora, experiente na análise do teste, com base na visualização das filmagens.

O programa de estimulação aquática foi desenvolvido por estagiários dos cursos de Fisioterapia e Educação Física da UFVJM, que participam do Projeto de Extensão Universitária Cubo d'Água, sob a coordenação de um professor experiente na área. Cada estagiário ficou responsável por uma criança dentro da piscina durante toda a intervenção, e as atividades foram realizadas uma vez por semana, durante oito semanas, com duração de cinqüenta minutos.

As atividades realizadas no programa de estimulação aquática consistiram em: adaptação ao meio líquido; incentivo à movimentação de membros superiores e inferiores; realização de pequenos deslocamentos; bloqueio da respiração por curtos períodos durante a imersão controlada; interação social da criança com os estagiários e com as demais crianças do programa. Todas as atividades foram realizadas em associação a brincadeiras, canções infantis e brinquedos adequados à idade da criança.

Análise dos dados

Para análise dos dados foi utilizado o programa estatístico SPSS (v.15.0). As variáveis idade e número de sessões são apresentadas em média e desvio padrão; as variáveis sexo, escolaridade materna e nível socioeconômico, em porcentagem.

O escore final do Denver II foi distribuído em uma escala ordinal de seis pontos, sendo atribuído valor 1 (dois ou mais atrasos), 2 (um atraso e uma cautela), 3 (um atraso), 4 (duas ou mais cautelas), 5 (uma cautela) e 6 (ausência de cautelas e atrasos). Para o Aims, foi utilizada uma escala ordinal de sete pontos para os intervalos de percentil do teste: 1 (percentil menor que 5), 2 (5< percentil <9,9), 3 (10< percentil <24,9), 4 (25< percentil <49,9), 5 (50< percentil <74,9), 6 (75< percentil <89,9) e 7 (percentil >90). Para comparação dessas escalas ordinais dos dois testes antes e após intervenção foi utilizado o teste não-paramétrico de Wilcoxon.

RESULTADOS

Inicialmente foram avaliadas 29 crianças; no entanto, 11 não tiveram a freqüência mínima de quatro sessões e outras 6 abandonaram o Projeto. Portanto, participaram do presente estudo 12 crianças, sendo nove do sexo masculino e três, do feminino, com idades variando de 53 a 452 dias (média 222±123) antes do início do programa de estimulação aquática, e idades variando de 125 a 535 dias (média 288,2±137,9) ao fim do programa (Tabela 1). A média de sessões freqüentadas por essas crianças foi de 6,1 (±1,38). O nível de escolaridade das mães variou de superior completo (50%) a médio completo (50%), e o nível socioeconômico das famílias distribuiu-se nas classes B1 (33,3%), B2 (50%) e C1 (16,7%).

O desenvolvimento global foi avaliado por meio do teste Denver II e o Aims foi aplicado para verificar, mais especificamente, o desenvolvimento motor grosso das crianças. Os resultados das crianças, antes do início do programa, nas escalas atribuídas aos escores no teste Denver (escala de 1 a 6) variaram de 2 a 6 em todos os domínios; e, no teste Aims (escala de 1 a 7), de 3 a 6. Após o programa, os resultados variaram, respectivamente, de 4 a 6 e de 3 a 7. Quando comparados estatisticamente, não foram encontradas diferenças significativas entre os valores antes e após o programa de estimulação aquática: os valores de p foram, no Aims, p=0,299; e, nos domínios do Denver II pessoal-social p=0,157, motor fino adaptativo p=0,705, motor grosso p=0,317 e linguagem, p=0,914).

DISCUSSÃO

Atualmente é grande o interesse em estudos sobre a influência do ambiente no desenvolvimento infantil14. O ambiente que o lactente vive pode dar diferentes formatos ou moldar distintos aspectos de seu comportamento motor. O ambiente positivo, que possibilita a exploração e interação com o meio, age como facilitador do desenvolvimento normal. Um ambiente desfavorável diminui o ritmo de desenvolvimento e restringe as possibilidades de aprendizado da criança5,25. Diversos estudos abordam os fatores ambientais influentes no desenvolvimento da criança14,17,23,26, tais como valores culturais e práticas maternas, nível socioeconômico (NSE), escolaridade materna, nutrição, entre outros7,23,25,27. Embora não haja consenso quanto a alguns fatores, o NSE e o grau de escolaridade materna são freqüentemente citados como influentes no processo de desenvolvimento infantil15,16. Segundo Andrade et al.28, a escolaridade materna acima de cinco anos de estudo, associou-se positivamente à melhor organização do ambiente físico e temporal, maior variação na estimulação diária e maior envolvimento emocional e verbal entre mãe e filho. A boa escolaridade materna seria, assim, um fator de proteção ao desenvolvimento saudável da criança17. No presente estudo, as mães tinham ensino médio ou superior completo, o que pode ter contribuído para seu interesse na participação dos filhos no programa de estimulação aquática. Segundo Martins et al.14, as mães com maior escolaridade têm maior acesso a informações sobre desenvolvimento infantil e, com isso, interagem melhor com seus filhos, respondendo adequadamente às suas solicitações, podendo então promover melhores condições físicas e emocionais para seu desenvolvimento.

O cuidado prestado à criança também é influenciado pelo nível socioeconômico dos pais3,14, ou seja, o poder aquisitivo de uma família e suas relações familiares podem influenciar os desfechos do desenvolvimento infantil26. Programas de estimulação psicossocial em famílias de baixo nível socioeconômico mostraram melhora no desenvolvimento cognitivo e motor das crianças, comparado ao de famílias que não receberam esse tipo de intervenção6. Segundo Grantham-McGregor et al.5, a pobreza e seus problemas associados (alimentação inadequada, condições sanitárias e de higiene insatisfatórias, limitada educação dos pais e inadequada estimulação no lar) são os mais importantes fatores de risco ao desenvolvimento da criança. No presente estudo, as famílias eram de classe média, ou seja, apresentavam condições econômicas para fornecer às suas crianças uma boa qualidade de vida, disponibilizando-lhes espaço físico adequado e bens materiais para brincar e explorar, favorecendo um bom desenvolvimento. Pela seleção da amostra, então este estudo buscou padronizar alguns dos principais fatores ambientais apontados na literatura como influentes no desenvolvimento da criança.

Segundo Moreno e De Paula29 o ambiente aquático estimula o desenvolvimento corporal ao provocar movimentos de intensidades e amplitudes diferentes, que muitas vezes não podem ser efetuados no solo; atua também no âmbito psicológico, pelo controle do medo à água; contribui para a distinção de diferentes objetos, espaços e pessoas. Além disso, pelas brincadeiras, são fornecidos estímulos externos que contribuem para o desenvolvimento motor e cognitivo do bebê. Segundo os mesmos autores, a prática aquática auxilia a aquisição da independência e personalidade, podendo influenciar o processo de aquisição da linguagem. Pinto12 realça que a atividade aquática infantil promove melhoria na qualidade de vida associada a um melhor desenvolvimento da cognição, comunicação, socialização e da motricidade grossa e fina.

Embora vários estudos descrevam os benefícios do meio aquático para crianças9,11,12,29, não foram encontrados estudos experimentais verificando o impacto da estimulação aquática no desenvolvimento de crianças típicas. Essa escassez de estudos sobre a importância da estimulação aquática no desenvolvimento de crianças típicas talvez se justifique pela dificuldade de se estabelecer um desenho de pesquisa envolvendo os vários fatores que podem influenciar o desenvolvimento da criança.

No presente estudo procurou-se avaliar e comparar o desenvolvimento das crianças nas áreas de motor grosso, motor fino adaptativo, pessoal-social e linguagem antes e após participação em um programa de estimulação aquática, porém, não foram encontradas diferenças nos resultados de antes e após o programa.

Estes resultados podem se justificar pelas limitações do presente estudo. Em primeiro lugar, o pequeno tamanho da amostra limita a força dos resultados. Segundo, o número de sessões de estimulação aquática pode ter sido insuficiente para proporcionar a aquisição de novas habilidades. McManus e Kotelchuck29 utilizaram 36 semanas de intervenção em seu estudo sobre o efeito da terapia aquática como coadjuvante na intervenção precoce de crianças com desenvolvimento atípico, acreditando que este seria um tempo suficiente para influenciar novas habilidades motoras. No presente estudo, as crianças foram estimuladas uma vez na semana, durante quatro a oito semanas. No entanto, como não há estudos com crianças típicas, não há parâmetros para estabelecimento de um tempo ideal. Mais estudos são necessários para definir o número ideal de sessões e o tempo adequado de um programa aquático para estimular o desenvolvimento de crianças típicas. Em terceiro lugar, a presença de um grupo controle poderia favorecer a comparação dos resultados, mostrando diferenças que não puderam ser visualizadas no presente estudo. Apesar das limitações, este estudo piloto pode ser útil para estudos subseqüentes, que poderão adicionar informações e consolidar evidências, considerando não haver outros publicados sobre o tema proposto.

É importante ressaltar que, mesmo atendendo aos quesitos grupo controle, tempo de intervenção e tamanho de amostra adequados, ainda persiste a hipótese de que um programa de estimulação aquática não tenha efeitos sobre os diferentes domínios do desenvolvimento infantil. Estudos relatam que crianças submetidas à estimulação aquática apresentam melhores habilidades relacionadas à tarefa e ambiente aquático, como movimentação dos diversos segmentos corporais, pequenos deslocamentos no meio líquido, aquisição de equilíbrio e estabilidade postural30,31. Mas, considerando a especificidade das tarefas treinadas e o ambiente em que se desenvolveram, é possível que a transferência de tais habilidades para o contexto ambiental fora da água não ocorra.

CONCLUSÃO

O ambiente aquático fornece muitos benefícios para a criança, porém, não se pode afirmar que o estímulo precoce nesse meio favoreça o desenvolvimento infantil em seus diversos aspectos. Neste estudo, de um programa de quatro a oito semanas de estimulação aquática de crianças típicas, não foram verificadas alterações nas áreas de desenvolvimento avaliadas. São necessários novos estudos, com maior tempo de intervenção, amostra maior e grupo controle para verificar se a estimulação aquática interfere, de fato, no desenvolvimento de crianças típicas.

Apresentação: jun. 2009

Aceito para publicação: out. 2009

O estudo contou com apoio do Proext-2008 da Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação

Estudo desenvolvido no Depto. de Fisioterapia da UFVJM - Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Diamantina, MG, Brasil

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  • Endereço para correspondência:
    Rosane L. S. Morais
    R. Grupiara 147 A, Bairro Purquéria
    39100-000 Diamantina MG
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Abr 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2009

    Histórico

    • Aceito
      Out 2009
    • Recebido
      Jun 2009
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