Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação do risco ergonômico em trabalhadores da indústria têxtil por dois instrumentos: quick exposure check e job factors questionnaire

Evaluación del riesgo ergonómico en trabajadores de la industria textil con dos instrumentos: quick exposure check y job factors questionnaire

Resumos

A análise dos fatores de risco ergonômicos presentes em indústrias têxteis auxilia no planejamento de estratégias que contribuem para a melhora das condições de trabalho e redução dos distúrbios osteomusculares. Este estudo se propôs a mensurar os níveis de exposição aos fatores de risco ergonômicos em trabalhadores de dois setores de produção de uma indústria têxtil. Para tanto, os instrumentos Job Factors Questionnaire (JFQ) e o Quick Exposure Check (QEC) foram aplicados em 107 trabalhadores. Os resultados foram analisados por estatística descritiva. O teste de Mann-Whitney foi utilizado para comparação dos resultados obtidos entre os setores de produção. O diagnóstico do nível de exposição ao risco ergonômico, obtido por ambos os instrumentos, foi moderado. Os fatores de risco considerados pelo JFQ como mais criticos estão relacionados à temperatura ambiental; postura mantida em longos períodos de tempo; posturas inadequadas para coluna e continuar trabalhando quando está com alguma dor ou com alguma lesão. O QEC identificou as regiões de coluna lombar e punhos/mãos como expostas ao alto risco. Não houveram diferenças estatisticamente significante entre os setores.

avaliação de risco; ergonomia; questionário; indústria têxtil


El análisis de los factores de riesgo ergonómicos presentes en industrias textiles ayuda al planeamiento de estrategias que contribuyen a la mejora de las condiciones de trabajo y reducción de los trastornos osteomusculares. Este estudio se propuso medir los niveles de exposición a los factores de riesgo ergonómicos en trabajadores de dos sectores de producción de una industria textil. Para ello, los instrumentos Job Factors Questionnaire (JFQ) y el Quick Exposure Check (QEC) fueron aplicados en 107 trabajadores. Los resultados fueron analizados por estadística descriptiva. El test de Mann-Whitney fue utilizado para comparación de los resultados obtenidos entre los sectores de producción. El diagnóstico del nivel de exposición al riesgo ergonómico, obtenido por ambos instrumentos, fue moderado. Los factores de riesgo considerados por el JFQ como más críticos están relacionados a la temperatura ambiental; postura mantenida en largos períodos de tiempo; posturas inadecuadas para la columna y continuar trabajando cuando tiene algún dolor o con alguna lesión. El QEC identificó las regiones de columna lumbar y muñecas/manos como expuestas a alto riesgo. No hubo diferencias estadísticamente significativas entre los sectores.

evaluación de riesgo; ergonomía; cuestionario; industria textil


The analysis of ergonomic risk factors that are present in the textile industry helps to plan strategies that can contribute to the improvement of work conditions and the consequent reduction of musculoskeletal disorders. This study aimed at measuring levels of exposure to ergonomic risk factors among workers of two production sections in a textile factory. For this purpose, the instruments Job Factors Questionnaire (JFQ) and Quick Exposure Check (QEC) were applied in 107 workers. The results were analyzed through descriptive statistics. We used Mann-Whitney's test to compare the results between the production sections. The level of exposure to ergonomic risks, obtained through both instruments, was moderate. The risk factors considered as being critical by the JFQ are related to environmental temperature, posture maintained over long periods of time, inadequate spinal posture, and to working even when the worker feels pain or sustains injuries. The QEC identified regions of the lumbar spine and wrists/hands as being exposed to high risk. There were no statistically significant differences between the sections.

risk assessment; ergonomics; questionnaire; textile industry


PESQUISAS ORIGINAIS

Avaliação do risco ergonômico em trabalhadores da indústria têxtil por dois instrumentos: Quick Exposure Check e Job Factors Questionnaire

Evaluación del riesgo ergonómico en trabajadores de la industria textil con dos instrumentos: Quick Exposure Check y Job Factors Questionnaire

Maria Luiza Caires ComperI,II; Rosimeire Simprini PadulaI

IUniversidade Cidade de São Paulo (UNICID) – São Paulo (SP), Brasil

IIUnião Metropolitana de Ensino e Cultura – Itabuna (BA), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Maria Luiza Caires Comper Rua Cesário Galeno, 448 CEP: 03071-000 – São Paulo (SP), Brasil E-mail: marialuizacaires21@hotmail.com

RESUMO

A análise dos fatores de risco ergonômicos presentes em indústrias têxteis auxilia no planejamento de estratégias que contribuem para a melhora das condições de trabalho e redução dos distúrbios osteomusculares. Este estudo se propôs a mensurar os níveis de exposição aos fatores de risco ergonômicos em trabalhadores de dois setores de produção de uma indústria têxtil. Para tanto, os instrumentos Job Factors Questionnaire (JFQ) e o Quick Exposure Check (QEC) foram aplicados em 107 trabalhadores. Os resultados foram analisados por estatística descritiva. O teste de Mann-Whitney foi utilizado para comparação dos resultados obtidos entre os setores de produção. O diagnóstico do nível de exposição ao risco ergonômico, obtido por ambos os instrumentos, foi moderado. Os fatores de risco considerados pelo JFQ como mais criticos estão relacionados à temperatura ambiental; postura mantida em longos períodos de tempo; posturas inadequadas para coluna e continuar trabalhando quando está com alguma dor ou com alguma lesão. O QEC identificou as regiões de coluna lombar e punhos/mãos como expostas ao alto risco. Não houveram diferenças estatisticamente significante entre os setores.

Palavras-chave | avaliação de risco; ergonomia; questionário; indústria têxtil.

RESUMEN

El análisis de los factores de riesgo ergonómicos presentes en industrias textiles ayuda al planeamiento de estrategias que contribuyen a la mejora de las condiciones de trabajo y reducción de los trastornos osteomusculares. Este estudio se propuso medir los niveles de exposición a los factores de riesgo ergonómicos en trabajadores de dos sectores de producción de una industria textil. Para ello, los instrumentos Job Factors Questionnaire (JFQ) y el Quick Exposure Check (QEC) fueron aplicados en 107 trabajadores. Los resultados fueron analizados por estadística descriptiva. El test de Mann-Whitney fue utilizado para comparación de los resultados obtenidos entre los sectores de producción. El diagnóstico del nivel de exposición al riesgo ergonómico, obtenido por ambos instrumentos, fue moderado. Los factores de riesgo considerados por el JFQ como más críticos están relacionados a la temperatura ambiental; postura mantenida en largos períodos de tiempo; posturas inadecuadas para la columna y continuar trabajando cuando tiene algún dolor o con alguna lesión. El QEC identificó las regiones de columna lumbar y muñecas/manos como expuestas a alto riesgo. No hubo diferencias estadísticamente significativas entre los sectores.

Palabras clave: evaluación de riesgo; ergonomía; cuestionario, industria textil.

INTRODUÇÃO

A exposição aos fatores de risco presentes nas condições de trabalho tem contribuído para a ocorrência, cada vez mais frequente, de doenças físicas e mentais em trabalhadores de diferentes atividades econômicas1,2. Dentre elas, destacam-se os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT), que, em 2009, foram responsáveis pelo afastamento de 336.000 mil trabalhadores no mundo3.

No Brasil, a indústria têxtil ocupa a quinta posição em afastamentos por DORT4. Os trabalhadores apresentam elevada prevalência de dor na região da coluna e membros superiores, associada à frequente exposição aos diferentes fatores de risco físicos (força, repetição de movimentos e posturas inadequadas), organizacionais (trabalho excessivo e ausência de pausas) e psicossociais5-9. Diante deste cenário, a análise da exposição aos fatores de risco ergonômicos auxilia o planejamento de estratégias que contribuam para a melhoria das condições de trabalho e, consequentemente, para a redução dos distúrbios osteomusculares nesses trabalhadores.

Além de contribuir para a eficácia das ações de promoção em saúde do trabalhador, a utilização de métodos para análise das condições de trabalho possibilita a mensuração dos níveis de exposição aos fatores de risco ergonômicos, a identificação das prioridades de atuação e o direcionamento para as intervenções ergonômicas mais adequadas10,11. Contudo, a seleção do método e da ferramenta a serem utilizados nesta análise torna-se, muitas vezes, um obstáculo aos profissionais da área de saúde do trabalhador devido à grande variedade de técnicas e instrumentos disponíveis, às características do trabalho e aos recursos disponíveis para coleta e análise de dados12.

Neste sentido, alguns estudos foram realizados com o objetivo de comparar os resultados obtidos entre os métodos de mensuração direta, os protocolos observacionais e os questionários13-18. Estes últimos são os mais utilizados na prática clínica, pois além de terem baixo custo, possibilitam a avaliação de uma variedade de atividades ocupacionais e de um grande número de trabalhadores12.

No caso de profissionais brasileiros, outro obstáculo é a disponibilidade limitada de ferramentas de mensuração do risco ergonômico adaptadas culturalmente para o Português-brasileiro. Dentre as ferramentas disponíveis estão o "Job Factors Questionnaire" (JFQ)19 e o "Quick Exposure Check" (QEC)20, cujas características de mensuração e pontuação individuais são úteis para a análise do risco em trabalhadores brasileiros. O JFQ é um questionário que quantifica a percepção do trabalhador sobre o risco ao qual está exposto por meio de 15 questões relacionadas a fatores de risco que contribuem para o desenvolvimento de lesões osteomusculares. Este questionário, além de ser rápido e ter alta aceitação entre os trabalhadores, possibilita a indicação da necessidade e priorização de intervenções ergonômicas por meio do diagnóstico obtido por cada fator de risco ou pela classificação do risco total19,21. O QEC possui características de protocolo observacional e questionário, o que leva à avaliação mais objetiva dos fatores de risco, principalmente os biomecânicos. Além disso, a pontuação do QEC permite a análise do risco ergonômico total e por região corporal20. É importante destacar que a combinação de métodos observacionais e questionários para análise do risco tem sido recomendada pela literatura13,14,22.

Escolher de forma adequada um instrumento para avaliar o risco ocupacional implica em economizar tempo em análises posteriores, facilitando a organização e a interpretação das informações. O JFQ e o QEC são instrumentos de análise de risco traduzidos e adaptados, os quais podem contribuir muito para a tomada de decisão de profissionais que atuam na área de Saúde do Trabalhador no Brasil. Contudo, não encontramos nenhum estudo que discuta de forma comparativa a utilização desses instrumentos, suas características e limitações na prática profissional.

Diante do exposto e considerando a variedade de condições ocupacionais presentes na indústria têxtil, este estudo se propôs a mensurar os níveis de exposição aos fatores de risco ergonômicos em trabalhadores de dois setores de produção de uma indústria têxtil, por meio dos instrumentos JFQ e QEC, com vistas a discutir seu uso, características e limitações.

METODOLOGIA

Desenho e população do estudo

Trata-se de uma análise secundária dos dados obtidos a partir dos estudos de tradução e adaptação transcultural do QEC para o Português-brasileiro23 e do teste das propriedades clinimétricas desta versão24. Participaram do estudo 107 trabalhadores (média de idade de 27,6±7,5 anos) dos setores de costura e acabamento de uma indústria têxtil, sendo 102 mulheres e 5 homens. Todos os trabalhadores possuem mais de 18 anos e, no mínimo, o 2º grau completo. Trabalhadores com período de trabalho na mesma atividade inferior a seis meses foram excluídos do estudo.

Características das atividades

A seleção dos setores de confecção e acabamento, incluídos neste estudo, foi baseada em suas características de produção e nas diferentes solicitações biomecânicas. Ao todo, foram analisadas 13 atividades produtivas, sendo 38,3% delas realizadas na posição sentada; 35,5%, em pé; e 26,2%, em alternância postural. Em relação à natureza da atividade, a maior parte (91,6%) é classificada como repetitiva, sendo que 26,2% possuem ciclos muito curtos (menores que 10 segundos) e 65,4% consistem de ciclos maiores (entre 10 e 30 segundos). Apenas 8,4% são caracterizadas como manuseio de materiais. Deste modo, foi possível avaliar a exposição aos diferentes tipos de riscos ergonômicos, com exceção dos fatores de direção e vibração que, embora sejam considerados pelo instrumento QEC, não fazem parte da realidade desses setores.

Setor de confecção

O setor de confecção é responsável pela produção de meias, blusas e peças íntimas. Os postos de trabalho são compostos pelas máquinas de costura e corte, bancadas e assentos, e estão alocados em células ou individualmente, a depender do tipo de peça produzida. Durante a jornada de trabalho não há pausas pré-definidas para descanso, porém, os trabalhadores podem interromper as tarefas a qualquer momento.

A biomecânica ocupacional é caracterizada pela adoção predominante da postura sentada, por longos períodos de tempo, solicitação de movimentos repetitivos em região de punhos, mãos e dedos e sobrecarga muscular estática em coluna e ombros. Há exigência de rotação de tronco no momento em que as colaboradoras retiram as peças a serem cortadas ou costuradas da caixa, assim como quando as colocam em outra caixa. Fatores ambientais importantes, como calor e ruído, estão presentes neste setor.

Setor de acabamento

Os produtos finalizados no setor de confecção são encaminhados para o setor de acabamento, onde são preparados, separados, revisados e embalados. Os postos de trabalho são compostos apenas por máquinas ou bancadas, ou pela combinação de ambos, e podem ter assentos ou não. A demanda de produção é influenciada pela máquina ou pelo ritmo de trabalho estabelecido pelos demais trabalhadores da linha de produção. Assim, as pausas na jornada são mais difíceis de acontecer.

Neste setor, a postura em pé é a preferencialmente adotada, mesmo quando há possibilidade de alternância postural. Isso acontece porque a maior parte das atividades exige manuseio de materiais e deslocamentos, com realização frequente de flexão e rotação de tronco. Movimentos de membros superiores também são comuns, principalmente em ombros, punhos e mãos. Os fatores ambientais presentes são similares aos do setor confecção, e incluem calor e ruído.

Procedimentos

Este trabalho foi aprovado pelo comitê de ética da Universidade Cidade de São Paulo – UNICID, representado pelo processo nº 1.658/2010. Os trabalhadores foram abordados no próprio setor de trabalho e, após aceitarem participar do estudo e assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), foram orientados quanto ao preenchimento dos instrumentos: um questionário contendo questões sociodemográficas e ocupacionais, o JFQ19, e o QEC23. Este último também foi preenchido por um fisioterapeuta experiente, que observou, durante um período de 15–20 minutos, as posturas e os movimentos adotados por cada trabalhador na execução de suas tarefas laborais. Este profissional também avaliou ergonomicamente os dois setores de produção, com base no protocolo de análise ergonômica do trabalho25.

Instrumentos

Job Factors Questionnaire

O JFQ foi originalmente desenvolvido nos Estados Unidos, em 1993, para avaliar os fatores de risco ergonômicos em trabalhadores da construção civil. Suas propriedades psicométricas foram publicadas em 200221. Ele tem por objetivo avaliar os fatores de risco ergonômicos que podem contribuir para o desenvolvimento de sintomas osteomusculares por meio da percepção dos trabalhadores. Para tanto, apresenta uma lista descritiva de 15 fatores de risco a serem classificados, em uma escala Likert, de 0 a 10, na qual 0 significa "nenhum problema" e 10 indica "o maior problema possível". A pontuação do questionário poderá ser avaliada por meio da média de cada um dos 15 fatores de risco ou pela classificação do risco em três categorias, sendo a primeira de 0–1, que representa "ausência de problema"; a segunda de 2–5, que significa problema "mínimo a moderado"; e a última de 8–10, que indica presença de um "problema grave"19,21,26. A versão utilizada foi adaptada culturalmente para a língua brasileira e apresentou propriedades clinimétricas satisfatórias19.

Quick Exposure Check

O QEC é um instrumento que avalia os fatores de risco ergonômico, incluindo fatores físicos, organizacionais e psicossociais. Ele é composto por um formulário de avaliação que inclui 16 questões sobre posturas e movimentos realizados por coluna e membros superiores, assim como outros fatores de risco (quantidade de peso manuseado; tempo de realização da tarefa; força manual; demanda visual da atividade; presença de vibração e direção de veículos; ritmo de trabalho; e estresse) e um formulário de pontuação que possibilita a quantificação parcial (por região corporal) e total do risco. Esta pontuação resulta da combinação entre as respostas do avaliador e do trabalhador, por exemplo: postura versus força, duração versus força, postura versus duração e postura versus frequência. As faixas de pontuação podem ser classificadas em quatro categorias de exposição ao risco: baixo, moderado, elevado e muito alto (Tabela 1)11,20. A adaptação do QEC para o Português brasileiro cumpriu as diretrizes recomendadas para este tipo de estudo23 e as propriedades clinimétricas apresentaram resultados satisfatórios24.

Análise dos dados

Para a análise das características sociodemográficas da população e níveis de exposição aos fatores de risco, utilizou-se estatística descritiva (frequências, médias, desvio padrão, erro padrão, intervalo de confiança). O teste Shapiro-Wilk foi usado para avaliar a normalidade dos dados sob análise e, detectando distribuição assimétrica, optou-se pelo uso de testes não paramétricos. Para comparar os resultados obtidos em cada um dos itens de avaliação e a pontuação total do JFQ e do QEC entre os setores de produção utilizou-se o teste de –Mann-Whitney. O nível de significância adotado foi de 5%. O programa estatístico SPSS (versão 17.0) foi usado para todas as análises.

RESULTADOS

A percepção dos trabalhadores, obtida por meio do JFQ, revelou que os fatores de risco considerados mais críticos (médias ≥6,0 pontos) foram: trabalhar em ambiente quente, frio, úmido ou molhado; trabalhar na mesma posição por longos períodos de tempo; curvar ou torcer as costas de maneira desconfortável; e continuar trabalhando na presença de alguma dor ou lesão. Apesar de o setor de acabamento apresentar pontuações ligeiramente mais altas, de modo geral as variações foram mínimas e não apresentaram diferenças estatisticamente significantes. Apenas a questão referente a "receber treinamento sobre como fazer o trabalho" apresentou diferença significante (Tabela 2).

Os resultados obtidos pelas pontuações parciais do QEC para o risco biomecânico mostraram que as regiões de coluna cervical (pescoço) e ombros/braços estão expostas a riscos moderados, enquanto as regiões de coluna lombar e punhos/mãos estão expostas a alto risco. A percepção dos trabalhadores em relação ao estresse no trabalho mostrou-se ligeiramente maior para os trabalhadores do setor de acabamento. Não houve diferença estatisticamente significante entre os setores (p>0,05) (Tabela 3).

Ambos os instrumentos classificaram o nível de exposição ao risco ergonômico como moderado, e não apresentaram diferenças significativas entre os dois setores.

DISCUSSÃO

Os resultados deste estudo demonstraram que os instrumentos JFQ e QEC diagnosticaram o nível de exposição ao risco ergonômico em trabalhadores de uma indústria têxtil como moderado. Neste sentido, pode-se dizer que os dois instrumentos podem ser utilizados quando o objetivo da análise for classificar tarefas por prioridade de intervenção ergonômica19,20. Caso este objetivo seja mais específico, como implantar melhorias ergonômicas e treinamentos sobre posturas e movimentos, ou avaliar a organização do trabalho, ferramentas e conforto, é preciso analisar as características e recomendações de uso de cada instrumento.

O estudo dos dados obtidos pelo JFQ revelou que os fatores de risco percebidos pelos trabalhadores como sendo mais críticos estão relacionados ao conforto ambiental, à adoção de posturas inadequadas e prolongadas e à continuidade do trabalho quando o indivíduo está com dor. Este resultado demostra que o JFQ consegue reter informações compatíveis com a realidade ergonômica dos setores, uma vez que as atividades avaliadas requerem a manutenção de posturas prolongadas e/ou repetitivas em ambientes com ruído e calor. No entanto, apesar de o instrumento identificar que existem posturas inadequadas ou repetitivas, sua limitação é não indicar a região do corpo onde elas acontecem.

Ao utilizar um instrumento de análise de risco ergonômico, espera-se que este consiga ser sensível e diferenciar os riscos. Neste estudo, isso foi possível pelo JFQ, o qual identificou que trabalhadores do setor de acabamento percebem os fatores de risco como sendo mais críticos que os trabalhadores do setor de confecção, apesar de a maior parte das questões não terem apresentado diferenças estatisticamente significantes. Este achado pode estar relacionado à organização do trabalho adotada nesses setores. No de confecção, o ritmo de produção é estabelecido pelo próprio trabalhador, o que facilita a interrupção a qualquer momento. Por outro lado, no setor de acabamento a demanda de produção é influenciada pela máquina ou pelo ritmo de trabalho estabelecido pelos demais trabalhadores da linha de produção. Isto interfere na velocidade e na frequência dos movimentos realizados e, ainda, dificulta a adoção de pausas na jornada de trabalho, –tornando-a mais extenuante. A única diferença entre os setores refere-se ao treinamento sobre como fazer o trabalho, cuja média foi maior no setor de confecção. O fato de as atividades deste setor exigirem mais especialização e treino pode explicar tal resultado.

Deste modo, verifica-se que o JFQ possui a grande vantagem de mensurar a percepção do trabalhador frente ao risco ao qual está exposto, considerando, para tanto, a avaliação simultânea de uma variedade de fatores de risco ergonômicos27-29. A pontuação parcial, obtida por meio da análise de cada fator de risco, possibilita a identificação dos fatores de risco mais críticos e a priorização de intervenções ergonômicas para implantar melhorias. Além disso, é um instrumento rápido, de alta aceitação entre os trabalhadores e que não exige treinamento técnico para ser aplicado19,21. Uma limitação do JFQ está relacionada ao fato de este instrumento ser um questionário, o que não permite uma avaliação detalhada da exposição biomecânica por região corporal.

Os resultados obtidos pelas pontuações parciais do QEC são compatíveis com as solicitações biomecânicas das atividades avaliadas em ambos os setores de produção ao revelar que as regiões de coluna e membros superiores estão expostas a moderado e alto risco biomecânico. Isso mostra que o QEC pode ser uma boa opção para as situações em que, além das condições gerais, deseje-se avaliar a exposição biomecânica por região corporal. Isso porque o sistema de pontuação deste instrumento permite analisar a exposição ao risco por meio da combinação dos fatores de risco biomecânicos, identificados pelo observador para cada área do corpo, e a resposta subjetiva do trabalhador (por exemplo: postura versus força, duração versus força; e postura versus duração da exposição).

Assim, o QEC favorece que o profissional identifique a região corporal mais exposta ao risco e os fatores de risco que contribuem para tal11,20, sendo indicado em situações de monitoramento das melhorias ergonômicas, principalmente daquelas que envolvem mudanças posturais.

Diante dos resultados obtidos por este estudo, verificamos tanto o JFQ quanto o QEC foram úteis para a análise do risco ergonômico na indústria têxtil, uma vez que refletem a realidade dos setores avaliados. As características de mensuração e pontuação de cada instrumento possibilitaram o diagnóstico do risco de modo mais amplo, incluindo aspectos relacionados à biomecânica corporal e às condições físicas, organizacionais e psicossociais do trabalho. No entanto, os dois instrumentos possuem limitações quando se pretende avaliar riscos específicos, pois cada um considera diferentes fatores de risco para compor a análise.

Assim, considerando os objetivos do estudo no tocante à utilização do JFQ e do QEC para análise do risco diagnóstico em uma indústria têxtil, tem-se que ambos os instrumentos conseguem diagnosticar o nível de exposição ao risco ergonômico, sendo recomendados para situações em que se faz necessária uma avaliação rápida para definir prioridades de intervenção ergonômica. Os instrumentos podem ser utilizados isoladamente ou combinados, a depender da necessidade dos profissionais diante do objetivo da avaliação e de como seus resultados serão utilizados para as estratégias de redução do risco ergonômico12. Contudo, algumas recomendações são necessárias. No caso do JFQ, por ser um questionário, recomenda-se a seleção de uma amostra apropriada que possa assegurar a confiabilidade das respostas. Por outro lado, o QEC, enquanto instrumento observacional, exige mais treinamento dos profissionais para sua utilização e análise.

Os resultados do presente estudo são limitados aos trabalhadores da indústria têxtil e, portanto, não podem ser generalizados para outras populações de trabalhadores. Os autores recomendam a realização de mais estudos, os quais analisem um maior número de trabalhadores e atividades ocupacionais mais diversificadas

CONCLUSÃO

Com base em nossos resultados, o nível de exposição ao risco ergonômico em trabalhadores da indústria têxtil foi diagnosticado como moderado pelos instrumentos JFQ e QEC. Os dois instrumentos apresentaram vantagens e desvantagens, mas ambos são recomendados para situações em que se faz necessária uma avaliação rápida para definir prioridades de intervenção ergonômica. Contudo, se o foco da intervenção for posturas e movimentos, o QEC é mais recomendado, e se o objetivo for intervir na organização do trabalho embasado pela opinião do trabalhador, o JFQ é o mais indicado.

Apresentação: set. 2012

Aceito para publicação: jul. 2013

Fonte de financiamento: nenhuma

Conflito de interesses: nada a declarar

Parecer de aprovação no Comitê de Ética nº 1.658/2010.

Estudo desenvolvido em uma indústria têxtil – Itabuna (BA), Brasil.

  • 1. Forde MS, Punnett L, Wegman DH. Pathomechanisms of work-related musculoskeletal disorders: conceptual issues. Ergonomics. 2002;45(9):619-30.
  • 2. Westgaard RH, Winkel J. Guidelines for occupational musculoskeletal load as a basis for intervention: a critical review. Appl Ergon. 1996;27(2):79-88.
  • 3
    Bureau of Labor Statistics. Workplace Injuries and Illnesses – 2009. U.S. Department of Labor's Occupational Safety and Health Administration 2010. Available from: http://www.bls.gov/news.release/archives/osh_10212010.pdf
  • 4
    Brasil. Ministério da Saúde. Lesões por Esforços Repetitivos (LER) e Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT). Brasília: 2001.
  • 5. Kaergaard A, Andersen JH. Musculoskeletal disorders of the neck and shoulders in female sewing machine operators: prevalence, incidence, and prognosis. Occup Environ Med. 2000;57(8):528-34.
  • 6. Westgaard RH, Jansen T. Individual and work related factors associated with symptoms of musculoskeletal complaints. II. Different risk factors among sewing machine operators. Br J Ind Med. 1992;49(3):154-62.
  • 7. Franco G, Fusetti L. Bernardino Ramazzini's early observations of the link between musculoskeletal disorders and ergonomic factors. Appl Ergon. 2004;35(1):67-70.
  • 8. Punnett L, Wegman DH. Work-related musculoskeletal disorders: the epidemiologic evidence and the debate. J Electromyogr Kinesiol. 2004;14(1):13-23.
  • 9. da Costa BR, Vieira ER. Risk factors for work-related musculoskeletal disorders: A systematic review of recent longitudinal studies. Am J Ind Med. 2010;53(3):285-323.
  • 10. Li G, Buckle P. Current techniques for assessing physical exposure to work-related musculoskeletal risks, with emphasis on posture-based methods. Ergonomics. 1999;42(5):674-95.
  • 11. David G, Woods V, Buckle P. Further Development of the Usability and Validity of the Quick Exposure Check. Sudbury, Suffolk: HSE Books; 2005. Available from: http://www.hse.gov.uk/research/rrpdf/rr211.pdf
  • 12. Takala EP, Pehkonen I, Forsman M, Hansson GA, Mathiassen SE, Neumann WP, et al. Systematic evaluation of observational methods assessing biomechanical exposures at work. Scand J Work Environ Health. 2010;36(1):3-24.
  • 13. Barriera-Viruet H, Sobeih TM, Daraiseha N, Salem S. Questionnaires vs observational and direct measurements: a systematic review. Theor Issues Ergon Sci. 2006;7(3):261-84.
  • 14. Spielholz P, Silverstein B, Morgan M, Checkoway H, Kaufman J. Comparison of self-report, video observation and direct measurement methods for upper extremity musculoskeletal disorder physical risk factors. Ergonomics. 2001;44(6):588-613.
  • 15. Hansson GA, Balogh I, Byström JU, Ohlsson K, Nordander C, Asterland P, et al. Questionnaire versus direct technical measurements in assessing postures and movements of the head, upper back, arms and hands. Scand J Work Environ Health. 2001;27(1):30-40.
  • 16. Coyle A. Comparison of the Rapid Entire Body Assessment and the New Zealand Manual Handling "Hazard Control Record", for assessment of manual handling hazards in the supermarket industry. Work. 2005;24(2):111-6.
  • 17. Motamedzade M, Ashuri MR, Golmohammadi R, Mahjub H. Comparison of ergonomic risk assessment outputs from rapid entire body assessment and quick exposure check in an engine oil company. J Res Health Sci. 2011;11(1):26-32.
  • 18. Joseph C, Imbeau D, Nastasia I. Measurement consistency among observational job analysis methods during an intervention study. Int J Occup Saf Ergon. 2011;17(2):139-46.
  • 19. Coluci M, Alexandre NM, Rosecrance J. Reliability and validity of an ergonomics-related Job Factors Questionnaire. Int J Ind Ergon. 2009;39(6):995-1001.
  • 20. David G, Woods V, Li G, Buckle P. The development of the Quick Exposure Check (QEC) for assessing exposure to risk factors for work-related musculoskeletal disorders. Appl Ergon. 2008;39(1):57-69.
  • 21. Rosecrance JC, Ketchen KJ, Merlino LA, Anton DC, Cook TM. Test-retest reliability of a self-administered musculoskeletal symptoms and job factors questionnaire used in ergonomics research. Appl Occup Environ Hyg. 2002;17(9):613-21.
  • 22. Stock SR, Fernandes R, Delisle A, Vézina N. Reproducibility and validity of workers' self-reports of physical work demands. Scand J Work Environ Health. 2005;31(6):409-37.
  • 23. Comper ML, Costa LO, Padula RS. Quick Exposure Check (QEC): a cross-cultural adaptation into Brazilian-Portuguese. Work. 2012;41(Suppl 1):2056-9.
  • 24. Comper ML, Costa LO, Padula RS. Clinimetric properties of the Brazilian-Portuguese version of the Quick Exposure Check (QEC). Rev Bras Fisioter. 2012;16(6):487-94.
  • 25
    Ministério do Trabalho. Norma Regulamentadora N° 17 – Ergonomia. 1978.
  • 26. Merlino LA, Rosecrance JC, Anton D, Cook TM. Symptoms of musculoskeletal disorders among apprentice construction workers. Appl Occup Environ Hyg. 2003;18(1):57-64.
  • 27. Balogh I, Orbaek P, Winkel J, Nordander C, Ohlsson K, Ektor-Andersen J. Questionnaire-based mechanical exposure indices for large population studies-reliability, internal consistency and predictive validity. Scand J Work Environ Health. 2001;27(1):41-8.
  • 28. Burdorf A, van der Beek AJ. In musculoskeletal epidemiology are we asking the unanswerable in questionnaires on physical load? Scand J Work Environ Health. 1999;25(2):81-3.
  • 29. Barrero LH, Katz JN, Dennerlein JT. Validity of self-reported mechanical demands for occupational epidemiologic research of musculoskeletal disorders. Scand J Work Environ Health. 2009;35(4):245-60.
  • Endereço para correspondência:

    Maria Luiza Caires Comper
    Rua Cesário Galeno, 448
    CEP: 03071-000 – São Paulo (SP), Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Nov 2013
    • Data do Fascículo
      Set 2013

    Histórico

    • Recebido
      Set 2012
    • Aceito
      Jul 2013
    Universidade de São Paulo Rua Ovídio Pires de Campos, 225 2° andar. , 05403-010 São Paulo SP / Brasil, Tel: 55 11 2661-7703, Fax 55 11 3743-7462 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revfisio@usp.br