Acessibilidade / Reportar erro

Desuso gerado por colete de retificação de coluna: estudo experimental

Resumos

A coluna vertebral configura-se como o principal eixo de sustentação e movimentação do aparelho locomotor, sendo que inúmeras condições clínicas podem requerer que essa estrutura seja submetida à restrição funcional. Dentre os tratamentos não invasivos usados em lesões da coluna ou esqueleto apendicular, tem-se a imobilização da coluna enquanto estratégia de reabilitação. Frente às restrições funcionais geradas por dispositivos de contenção aplicados na coluna vertebral, a proposta desse estudo foi adaptar uma órtese na coluna de ratos, mimetizando a imobilização dos coletes corretivos e avaliar as condições energéticas dos músculos da caixa torácica após 12 semanas de aplicação. Foram utilizados ratos Wistar com 42 dias de vida (período pós-desmame), acompanhados por 12 semanas em 2 grupos denominados controle (C) e usuário de colete de retificação (R) confeccionado de PVC para imobilizar a coluna vertebral. Foram avaliadas as seguintes concentrações: glicogênio (GLI) da musculatura paravertebral e da caixa torácica; proteínas totais e DNA (PT/DNA) e interleucina 6 (IL-6). Na análise estatística foi utilizado o teste de normalidade Kolmogorov-Smirnov seguido do teste de Tukey. Em todos os cálculos foi fixado um nível crítico de 5%. Foi verificado que o grupo R apresentou 12% menos massa corporal e reservas de GLI em média 21% menores; a relação PT/DNA apresentou-se em média 6,6% menor; já as concentrações de IL-6 mostraram-se em média 25% maiores. O estudo mostra que a restrição de movimento da coluna vertebral promove crise energética e comprometimento no desenvolvimento muscular. Sugere-se que sejam realizados outros estudos, com este modelo, para gerar estratégias de ação fisioterapêutica que possam reduzir o comprometimento muscular quando da imobilização da coluna.

Sistema Musculoesquelético; Imobilização; Coluna Vertebral


The spine is the main support and movement axis of the locomotor system, and numberless clinical conditions may require that this structure be submitted to functional restriction. Among the non-invasive treatments used in spinal or appendicular skeleton injuries, the immobilization of the spine is used as a rehabilitation strategy. Because of the functional restrictions generated by restraining devices used on the spine, the proposal of this study was to adapt a spinal orthosis on rats, thus mimicking the immobilization of corrective vests and assessing the energetic conditions of thoracic muscles after 12 weeks of application. Wistar rats that were 42 days old were used in this study (post-weaning period), followed-up for 12 weeks in 2 groups called control (C) and rectification vests (R), which were made of PVC to immobilize the spine. The following concentrations were evaluated: glycogen (GLY) of the paravertebral muscle and the thorax; total proteins and DNA (TP/DNA) and interleukin-6 (IL-6). The normality Kolmogorov-Smirnov test was used for statistical analysis, followed by the Tukey test. A 5% level was established for all of the calculations. It was observed that group R presented 12% less body mass and GLY stores 21% lower; the ratio between TP/DNA was in average 6.6% lower; IL-6 concentrations were in average 25% higher. The study shows that the movement restriction in the spine leads to energetic crisis and compromised muscular development. More studies should be conducted with this model to generate physical therapy strategies that could reduce muscle compromise after spine immobilization.

Musculoskeletal System; Immobilization; Spine


La columna se presenta como el principal eje de sustentación y movimiento del sistema locomotor, siendo que innúmeras condiciones clínicas pueden requerir que esa estructura sea sometida a restricción funcional. Entre los tratamientos no invasivos usados ​​en lesiones de la columna o esqueleto apendicular, se inmoviliza a la columna como una estrategia de rehabilitación. Frente a restricciones funcionales generadas por los dispositivos de contención aplicados en la columna vertebral, el propósito de este estudio fue adaptar un aparato ortopédico en la columna de ratones, imitando la inmovilización de los corsés ortopédicos y evaluar las condiciones energéticas de los músculos de la caja torácica después de 12 semanas de aplicación. Fueron utilizados ratones Wistar con 42 días de edad (período pos destete), seguidos por 12 semanas en 2 grupos llamados "control (C)" y "usuario de corsé de rectificación (R)" hechos de PVC para inmovilizar la columna vertebral. Fueron evaluadas las concentraciones de: glucógeno (GLY) de músculos paravertebrales y de la caja torácica; proteínas totales y ADN (PT/ADN) y interleucina 6 (IL-6). En el análisis estadístico se utilizó el test de normalidad de Kolmogorov-Smirnov seguido del test de Tukey. En todos los cálculos se estableció un nivel crítico de 5%. Se verificó que el grupo R tuvo 12% menos masa corporal y un promedio de 21% de reservas GLY más escasas; la relación PT/ADN se mostró, en promedio, 6,6 % más pequeña, mientras que las concentraciones de IL-6 en promedio, se mostraron 25 % más grande. El estudio muestra que la restricción de movimiento de la columna promueve crisis energética y compromiso en el desarrollo muscular. Se sugiere que se lleven a cabo otros estudios, con este modelo, para generar estrategias de acción fisioterápica que puedan reducir la afectación de los músculos durante la inmovilización de la columna.

Sistema Muscoesquelético; Inmovilización; Columna Vertebral


INTRODUÇÃO

A coluna vertebral se configura como uma estrutura osteomioarticular, que de forma altamente estruturada forma o eixo de sustentação e mobilidade do aparelho locomotor. E por apresentar essa composição estruturada de grande magnitude funcional, está sujeita às mais variadas formas de comprometimento que podem levar à restrição funcional permanente ou temporária11. Morawietz C, Moffat F. Effects of locomotor training after incomplete spinal cord injury: a systematic review. Arch Phys Med Rehabil. 2013;94(11):2297-308..

Das condições mais comuns que induzem a restrição funcional da coluna destacam-se: fraturas vertebrais, das costelas, das cinturas escapular e pélvica, doenças degenerativas, escoliose, além de outras formas de comprometimento que variam em seu mecanismo causal e complexidade e corroboram a restrição e consequente desuso ou hipoatividade22. Rahimi-Movaghar V, Sayyah MK, Akbari H, Khorramirouz R, Rasouli MR, Moradi-Lakeh M, et al. Epidemiology of traumatic spinal cord injuryin developing countries: a systematic review. Neuroepidemiol. 2013;41(2):65-85.

3. Mordecai SC, Dabke HV. Efficacy of exercise therapy for the treatment of adolescent idiopathic scoliosis: a review of the literature. Eur Spine J. 2012;21(3):382-9.
- 44. Kalff R, Ewald C, Waschke A, Gobisch L, Hope C. Degenerative lumbar spinal stenosis in older people: current treatment options. Dtsch Arztebl Int. 2013;110(37): 613-24..

No que se refere à estabilidade estática e dinâmica da coluna vertebral, trata-se de um sistema inerentemente instável, que requer suporte muscular ativo para manutenção e mudanças de posturas33. Mordecai SC, Dabke HV. Efficacy of exercise therapy for the treatment of adolescent idiopathic scoliosis: a review of the literature. Eur Spine J. 2012;21(3):382-9. , 55. Flück M. Functional, structural and molecular plasticity of mammalian skeletal muscle in response to exercise stimuli. J Exp Biol. 2006;209(Pt 12):2239-48.. Haja vista que a estabilidade estática da coluna é assegurada por diferentes ligamentos, além dos discos intervertebrais, chama-se a atenção para a estabilização dinâmica, que é assegurada pela musculatura intrínseca e extrínseca da coluna, fato este que merece atenção para as diferentes condições que podem levar à restrição funcional da coluna vertebral, uma vez que o tecido muscular é considerado o de maior plasticidade no corpo humano66. Roso V, Bitu S de O, Zanoteli E, Beteta JT, de Castro RC, Fernandes AC. Surgical treatment of scoliosis in spinal muscular atrophy. Arq Neuropsiquiatr. 2003;61(3A):631-8. , 77. Haig AJ, London Z, Sandella DE. Symmetry of paraspinal muscle denervation in clinical lumbar spinal stenosis: support for a hypothesis of posterior primary ramus stretching? Muscle Nerve. 2013;48(2):198-203..

Entendendo que o tecido muscular é um tecido altamente adaptável a estímulos ou à falta deles, quaisquer alterações na dinâmica contrátil dos músculos motores primários e secundários da coluna vertebral, de forma direta, pode se refletir em alteração funcional, como as observadas nos casos de escoliose, onde se tem hipotonia, fraqueza muscular difusa e dor de intensidade variada33. Mordecai SC, Dabke HV. Efficacy of exercise therapy for the treatment of adolescent idiopathic scoliosis: a review of the literature. Eur Spine J. 2012;21(3):382-9. , 55. Flück M. Functional, structural and molecular plasticity of mammalian skeletal muscle in response to exercise stimuli. J Exp Biol. 2006;209(Pt 12):2239-48.. Estudos que investigaram a escoliose relatam que a restrição funcional da coluna impacta diretamente os músculos paravertebrais e respiratórios, uma vez que esses músculos estão intimamente ligados à funcionalidade do tronco66. Roso V, Bitu S de O, Zanoteli E, Beteta JT, de Castro RC, Fernandes AC. Surgical treatment of scoliosis in spinal muscular atrophy. Arq Neuropsiquiatr. 2003;61(3A):631-8. , 88. Tangsrud SE, Carlsen KC, Lund-Petersen I, Carlsen KH. Lung function measurements in young children with spinal muscle atrophy; a cross sectional survey on the effect of position and bracing. Arch Dis Child. 2001;84(6):521-4. , 99. Posadzki P, Ernst E. Spinal manipulation: an update of a systematic review of systematic reviews. N Z Med J. 2011;124(1340):55-71..

Tendo em vista que inúmeras condições podem levar à restrição funcional induzida por estados patológicos ou mesmo enquanto forma terapêutica, é importante que sejam investigados os efeitos dessa restrição funcional com foco na coluna vertebral. Nesse sentido, estudos em modelos animais, além de serem necessários, têm apresentado grande relevância do ponto de vista metodológico, pelo fato de que esse tipo de estudo oferece maior controle experimental. Ressalta-se ainda o fato de que a escoliose é uma condição que pode se manifestar em quadrúpedes, o que reforça o uso e a necessidade de pesquisas em animais1010. Ouellet J, Odent T. Animal models for scoliosis research: state of the art, current concepts and future perspective applications. Eur Spine J. 2013;22(Suppl 2):S81-95.

11. Gorman KF, Brenden F. Idiopathic-type scoliosis is not exclusive to bipedalism. Med Hypotheses. 2009;72(3):348-52.
- 1212. Jansen MM, de Wilde RF, Kouwenhoven JW, Castelein RM. Experimental animal models in scoliosis research: a review of the literature. Spine J. 2011;11(4):347-58..

Com base nas diferentes formas de restrições funcionais que diferentes doenças e tratamentos terapêuticos submetem à coluna vertebral, a proposta desse estudo foi adaptar uma órtese torácica em ratos, mimetizando a imobilização (restrição funcional) dos coletes terapêuticos, e avaliar as condições energéticas, bem como a relação síntese/degradação proteica dos músculos do tronco e da caixa torácica após 12 semanas de uso.

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo experimental, que utilizou de ratos machos albinos Wistar com 42 dias de vida (período pós-desmame), os quais foram acompanhados por 12 semanas de experimento. O peso dos animais foi de 90±10 g na 1ª semana e 230±10 g na 12ª semana (final) de estudo. Os animais (n=12) foram distribuídos em 2 grupos, distribuídos em 4 caixas com 3 animais cada, sendo os grupos controle (C) com 6 animais e o grupo portadores de colete de retificação (R) também com 6 animais. Os animais foram alimentados com ração e água ad libitum, submetidos a ciclo fotoperiódico de 12h claro/escuro. As órteses foram colocadas no 42º dia de vida, período esse já caracterizado como pós-desmame, sendo que para a colocação foram necessários dois pesquisadores, haja vista que os animais não foram sedados ou anestesiados. Da 1ª à 12ª semana de estudo, a cada 7 dias as órteses foram substituídas por outras de tamanho maior, de modo que essa substituição teve por objetivo acompanhar o crescimento do animal. A colocação da órtese permitiu que a coluna do animal fosse estabilizada em posição neutra no que concerne aos movimentos de flexão, extensão e inclinação de tronco. Essa estabilização em posição neutra se deu por meio da colocação de uma haste metálica de ligação entre a cinta anterior e posterior, de modo que inicialmente (1ª semana) o dispositivo foi colocado com 5 cm de comprimento, e a cada troca semanal essa haste era aumentada em aproximadamente 3 mm. O modelo de órtese utilizado é constituído de PVC, material que proporciona grande flexibilidade para o ajuste de uma cinta escapular e outra pélvica (Figura 1), similar a um modelo utilizado em estudos de escoliose1313. Silva CA, Guirro RR, Delfino GB, Arruda EJ. Proposal of non-invasive experimental model to induce scoliosis in rats. Rev Bras Fisioter. 2012;16(3):254-60.. Destaca-se que o diferencial do modelo utilizado no presente estudo foi a não indução da curvatura conforme pode se observar na Figura 1. Por se tratar de metodologia não invasiva, durante todo o período experimental não houve perda amostral. A fim de se acompanhar o desenvolvimento ponderal, semanalmente os animais foram pesados em balança semianalítica da marca Filizola (r). Para a coleta das amostras os ratos foram eutanasiados por meio de anestesia com pentobarbital sódico (50 mg/kg, i.p.) e as amostras dos músculos peitoral, paravertebral e intercostal dos lados direito e esquerdo foram coletadas e imediatamente submetidas à avaliação bioquímica do conteúdo de glicogênio (método do fenol sulfúrico1414. Lo S, Russell JC, Taylor AW. Determination of glycogen in small tissue samples. J Appl Physiol. 1970;28(2):234-6.); da concentração de proteínas totais (método do biutero) e da concentração de DNA (método da difenilamina). Para determinação da concentração sérica de interleucina 6 foi utilizado o método ELISA, seguindo as especificações do Kit (BioSource International)1515. Nishiyama A, Cavaglieri CR, Curi R, Calder PC. Arachidonic acid-containing phosphatidylcholine inhibits lymphocyte proliferation and decreases interleukin-2 and interferon-g production from Concanavalin A-stimulated rat lymphocytes. Biochim Biophys Acta. 2000;1487(1):50-60.. Na análise estatística foi utilizado o teste de normalidade de Shapiro-Wilk para verificar a distribuição dos dados. Constatada a não normalidade, foi empregada metodologia não paramétrica, com uso do teste Mann-Whitney para análise entre os dois grupos. Em todos os cálculos foi estabelecido o nível de significância de 5%.

Figura 1
Vista superior (A) e lateral (B) do animal do grupo retificado (R) durante uso da órtese e raio X após imobilização de 12 semanas (C)

RESULTADOS

Inicialmente foi avaliada a curva de massa corporal dos animais. Verificamos que após 12 semanas, o grupo que teve o colete acoplado ao corpo (Grupo R) apresentou massa 12% menor do que o grupo que não recebeu a órtese (Grupo C) (Figura 2).

Figura 2
Massa (g) dos animais dos grupos controle (•) e retificado (■) durante as 12 semanas experimentais (n=12)

Dentro dos aspectos indicadores do metabolismo foram avaliadas as reservas glicogênicas, que no grupo C não apresentaram diferenças entre as reservas musculares dos lados direito e esquerdo. Por outro lado, o grupo R apresentou reservas glicogênicas menores (28, 18, 21, 31, 20 e 18%, respectivamente, nos músculos peitoral direito e esquerdo, intercostal direito e esquerdo, paravertebral direito e esquerdo), quando comparado ao grupo C (Figura 3).

Figura 3
Concentração de glicogênio (mg/100 mg) dos músculos peitoral (P), intercostal (IC) e paravertebral (PV) do lado direito (D) e esquerdo (E) de animais controle (C) e retificado (R) (n=12)

Sequencialmente foi avaliada a razão da proteína total/DNA muscular, onde se verificou a redução no grupo R de 6; 7; 7; 6; 8,5 e 6%, respectivos aos músculos peitoral direito e esquerdo, intercostal direito e esquerdo, paravertebral direito e esquerdo quando comparado ao grupo C (Tabela 1).

Tabela 1
Razão proteína total/DNA (mg/100 mg) dos grupos controle e retificado. n=12

Por fim buscou-se uma avaliação molecular da concentração sérica de interleucina 6. Essa avaliação revelou que o grupo R apresentou valores 25% maiores (200±12 pg/mL no grupo C e 250±10 pg/mL no grupo R).

DISCUSSÃO

A literatura apresenta alguns modelos de restrição funcional da coluna vertebral em animais, a maioria em ratos. No entanto, apresenta metodologias invasivas e de difícil realização, fato este que dificulta uma padronização de análises1010. Ouellet J, Odent T. Animal models for scoliosis research: state of the art, current concepts and future perspective applications. Eur Spine J. 2013;22(Suppl 2):S81-95.

11. Gorman KF, Brenden F. Idiopathic-type scoliosis is not exclusive to bipedalism. Med Hypotheses. 2009;72(3):348-52.
- 1212. Jansen MM, de Wilde RF, Kouwenhoven JW, Castelein RM. Experimental animal models in scoliosis research: a review of the literature. Spine J. 2011;11(4):347-58.. No presente estudo foi implantado um modelo de restrição não invasiva da coluna, considerado de fácil realização, que se embasou no estudo de Silva et al.1313. Silva CA, Guirro RR, Delfino GB, Arruda EJ. Proposal of non-invasive experimental model to induce scoliosis in rats. Rev Bras Fisioter. 2012;16(3):254-60.. O diferencial é que no presente estudo a coluna do animal não foi inclinada para nenhum dos lados, haja vista que o objetivo foi avaliar os efeitos da restrição funcional em posição neutra da coluna.

O tempo de 12 semanas de contenção empregado no presente estudo foi baseado no clássico estudo de Sarwak et al.1616. Sarwark JF, Dabney KW, Salzman SK, Wakabayashi T, Kitadai HK, Beauchamp JT, et al. Experimental scoliosis in the rat. I. Methodology, anatomic features and neurologic characterization. Spine (Phila Pa 1976). 1988;13(5):466-71., que analisaram a escoliose em ratos e citam que na 12ª semana de estudo tem-se implantada curvatura que não regride após a indução. No mesmo sentido, Silva et al.1313. Silva CA, Guirro RR, Delfino GB, Arruda EJ. Proposal of non-invasive experimental model to induce scoliosis in rats. Rev Bras Fisioter. 2012;16(3):254-60. , 1717. Silva CA, Guirro RRJ, Fonseca W, Arruda EJ, Grasso DO. Assessment of rat behavior with induced scoliosis by polyvinil choride vest. J Chin Clinic Med. 2008;3(11):621-6. estudaram o tempo de 12 semanas de indução de escoliose em ratos, sendo que essa indução se deu por meio de restrição funcional similar à metodologia utilizada no presente estudo. Assim, tem-se duas metodologias de restrição funcional (invasiva e não invasiva) que utilizaram o tempo de 12 semanas, fato este que foi a base temporal do presente estudo.

O modelo de restrição funcional (contenção por órtese) utilizado no presente estudo refletiu alterações importantes. No que se refere à massa corporal, constatou-se que o grupo que fez uso do dispositivo (R) teve menor desenvolvimento. É importante ressaltar que esse comportamento não se trata de perda, haja vista que durante todo o período experimental os animais que usaram a órtese apresentaram esse padrão de menor massa.

Presume-se que o comportamento da massa corporal possa ser originário de alterações no trato gastroentérico ou na modulação das funções reguladoras dos processos envolvidos na absorção, isso considerando que a parte posterior do dispositivo exerce pressão na região abdominal, uma vez que é um sistema de cinto regulável. Nesse sentido, sabe-se que situações onde os processos intestinais de absorção e excreção sejam influenciados, poderá haver reflexo na massa corporal1818. Tsuchida T, Fukuda S, Aoyama H, Taniuchi N, Ishihara T, Ohashi N, et al. MGAT2 deficiency ameliorates high-fat diet-induced obesity and insulin resistance by inhibiting intestinal fat absorption in mice. Lipids Health Dis. 2012;14:11-75..

O equilíbrio energético da musculatura esquelética é dependente da integridade dos processos de captação e metabolização de substratos energéticos, com destaque para a glicose, bem como da população de receptores de insulina que modula tanto a formação de reservas quanto o metabolismo da hexose. Neste contexto, é consenso que a eficiência funcional da musculatura apresenta fortes relações com o conteúdo de glicogênio, reservatório que atinge valores mínimos quando o músculo entra em fadiga1919. Hargreaves M. Muscle glycogen and metabolic regulation. Proc Nutr Soc. 2004;63(2):217-20.. Assim, a hipoatividade, a restrição funcional ou o desuso também induzem a redução nos mecanismos de sinalização responsáveis pela manutenção ou aumento das reservas energéticas, fundamentais para a manutenção postural2020. Allen DG, Lamb GD, Westerblad H. Skeletal muscle fatigue: cellular mechanisms. Physiol Rev. 2008;88(1):287-332. , 2121. Ortenblad N, Nielsen J, Saltin B, Holmberg HC. Role of glycogen availability in sarcoplasmic reticulum Ca2+ kinetics in human skeletal muscle. J Physiol. 2011;589(Pt 3):711-25..

O desuso é alvo de estudos realizados em diversas condições clínicas, tais como: períodos longos no leito, fixações de membros, microgravidade ou frente à utilização de órteses, fatores que desencadeiam o estado catabólico nos músculos esqueléticos2222. Jackman RW, Kandarian SC. The molecular basis of skeletal muscle atrophy. Am J Physiol Cell Physiol. 2004;287(4):C834-43. , 2323. Silva CA, Petermann C, Cancelliero KM, Durigan JLQ, Polacow MLO. IGF-1 minimiza os efeitos deletérios do desuso no músculo sóleo de ratos. Acta Ortop Bras. 2011;19(3):137-40.. Estudos moleculares realizados em músculos esqueléticos submetidos ao desuso verificaram redução na transdução do sinal insulínico, sugerindo déficit na ativação do receptor de insulina e nas enzimas ativadas a partir deste, incluindo a fosforilação do IRS-1 (substrato 1 do receptor de insulina), ativação da PI3-K, diminuição na população dos transportadores GLUT4 e implantação do quadro de resistência à insulina2424. Durigan JLQ, Cancelliero KM, Bossi PL, Delfino GB, Montebello MIL, Guirro RRJ, et al. Metabolic and morphometric alterations inherent to neuromuscular electric stimulation in the antagonist muscle submitted to ankle joint immobilization. Braz Arch Biol Technol. 2009;52(1):85-91. , 1313. Silva CA, Guirro RR, Delfino GB, Arruda EJ. Proposal of non-invasive experimental model to induce scoliosis in rats. Rev Bras Fisioter. 2012;16(3):254-60..

Com base no exposto supracitado, os resultados contidos no presente estudo mostram uma expressiva redução nas reservas glicogênicas musculares mimetizando uma condição de desuso gerado por outros métodos de imobilização.

Segundo Halar e Kathleen2525. Halar EM, Kathleen RB. Imobilidade. In: De Lisa JA. Tratado de Medicina e Reabilitação: Princípios e práticas. 2 ed. São Paulo: Manole; 2002. v. 2, p.1067-87., a fraqueza muscular que ocorre em consequência do desuso é resultante da depleção dos níveis da reserva de glicogênio, redução de sarcômeros em série, redução da força e da resistência à fadiga decorrente da atrofia das fibras I e II e diminuição da função. A partir dos dados aqui apresentados é sugestivo o fato da órtese promover desuso, ao comprometer a homeostasia do processo contrátil da musculatura posicionada entre as cintas axilar e pélvica, podendo explicar a redução na relação proteína total/DNA.

Foi sugerido que o aumento na IL-6 sérica pode ter relação direta com a lesão muscular ou redução das reservas energéticas2626. Prestes J, Donato FF, Frolinni AB, Cavaglieri CR. Papel da interleucinas-6 como sinalizador em diferentes tecidos durante o exercício físico. Fit Perf J. 2006;5(6):348-53.. Neste aspecto, é sugestivo o fato de que possivelmente o desuso promovido pela órtese possa ter promovido catabolismo pela redução e limitação na capacidade contrátil. Sabe-se ainda que a elevação na concentração sérica de IL-6 também tem relação com o maior estresse mecânico muscular, que requer mecanismos de ajustes e adaptações a fim de estimular a plasticidade2727. Suzuki K, Nakaji S, Yamada M, Liu Q, Kurakake S, Okamura N, et al. Impact of a competitive marathon race on systemic cytokine and neutrophil responses. Med Sci Sports Exerc. 2003; 35(2):348-55., fato que pode ter ocorrido com a aplicação da órtese que mimetizou os coletes de retificação.

Keller et al. 2828. Keller C, Steensberg A, Pilegaard H, Osada T, Saltin B, Pedersen BK, et al. Transcriptional activation of the IL-6 gene in human contracting skeletal muscle: influence of muscle glycogen content. FASEB J. 2001;15(14):2748-50. demonstraram que músculos esqueléticos de humanos ativam a transcrição do gene de IL-6 quando as reservas glicogênicas tornam-se baixas. Neste sentido, o presente estudo reitera tal fato, pois foi observada a redução nas reservas glicogênicas na musculatura exposta à órtese de retificação.

Por fim, Pedersen et al. 2929. Pedersen BK, Steenberg A, Schjerling P. Muscle-derived interleukin-6: possible biological effects. J Physiol. 2001;536(Pt 2):329-37. sugeriram que a interleucina-6 é produzida setorizadamente pelo músculo esquelético e secretada na circulação em grandes quantidades, sendo sugestivo o fato que a IL-6 pode exercer um papel importante na manutenção da homeostasia energética, uma vez que, dentro de sua amplitude de ação, induz lipólise e glicogenólise, ajustando a disponibilidade de substratos à necessidade.

Ressalta-se ainda que, independente dos benefícios estruturais proporcionados pelos coletes de retificação, instala-se uma crise energética nos músculos do tronco, representada por baixas reservas glicogênicas e limitação no desenvolvimento estrutural, conforme apresentado pela menor massa do grupo submetido à contenção. Os achados no presente estudo evidenciam que a restrição funcional por meio do colete de retificação pode ser um importante indutor da fraqueza muscular, que pode interferir diretamente nos processos terapêuticos em que a restrição funcional seja necessária.

CONCLUSÃO

O estudo mostra que a restrição funcional da coluna vertebral em condição experimental promoveu redução nas reservas energéticas dos músculos do tronco, redução esta que foi acompanhada por redução na relação proteína total/DNA. Notou-se ainda elevação na concentração sérica de interleucina-6, que é um mecanismo de tentativa de reversão do catabolismo proteico frente à restrição funcional.

Com base na praticidade metodológica apresentada pelo modelo de restrição utilizado no presente estudo, bem como na constatação de estudos experimentais que se pautam na restrição funcional da coluna por meio de diferentes metodologias, sugere-se que futuros estudos sejam realizados no intuito de se estabelecer menor variação metodológica, para que se tenha melhores parâmetros de comparação no que se refere às alterações estruturais que podem comprometer a coluna vertebral em condições de restrição funcional.

REFERENCES

  • 1
    Morawietz C, Moffat F. Effects of locomotor training after incomplete spinal cord injury: a systematic review. Arch Phys Med Rehabil. 2013;94(11):2297-308.
  • 2
    Rahimi-Movaghar V, Sayyah MK, Akbari H, Khorramirouz R, Rasouli MR, Moradi-Lakeh M, et al. Epidemiology of traumatic spinal cord injuryin developing countries: a systematic review. Neuroepidemiol. 2013;41(2):65-85.
  • 3
    Mordecai SC, Dabke HV. Efficacy of exercise therapy for the treatment of adolescent idiopathic scoliosis: a review of the literature. Eur Spine J. 2012;21(3):382-9.
  • 4
    Kalff R, Ewald C, Waschke A, Gobisch L, Hope C. Degenerative lumbar spinal stenosis in older people: current treatment options. Dtsch Arztebl Int. 2013;110(37): 613-24.
  • 5
    Flück M. Functional, structural and molecular plasticity of mammalian skeletal muscle in response to exercise stimuli. J Exp Biol. 2006;209(Pt 12):2239-48.
  • 6
    Roso V, Bitu S de O, Zanoteli E, Beteta JT, de Castro RC, Fernandes AC. Surgical treatment of scoliosis in spinal muscular atrophy. Arq Neuropsiquiatr. 2003;61(3A):631-8.
  • 7
    Haig AJ, London Z, Sandella DE. Symmetry of paraspinal muscle denervation in clinical lumbar spinal stenosis: support for a hypothesis of posterior primary ramus stretching? Muscle Nerve. 2013;48(2):198-203.
  • 8
    Tangsrud SE, Carlsen KC, Lund-Petersen I, Carlsen KH. Lung function measurements in young children with spinal muscle atrophy; a cross sectional survey on the effect of position and bracing. Arch Dis Child. 2001;84(6):521-4.
  • 9
    Posadzki P, Ernst E. Spinal manipulation: an update of a systematic review of systematic reviews. N Z Med J. 2011;124(1340):55-71.
  • 10
    Ouellet J, Odent T. Animal models for scoliosis research: state of the art, current concepts and future perspective applications. Eur Spine J. 2013;22(Suppl 2):S81-95.
  • 11
    Gorman KF, Brenden F. Idiopathic-type scoliosis is not exclusive to bipedalism. Med Hypotheses. 2009;72(3):348-52.
  • 12
    Jansen MM, de Wilde RF, Kouwenhoven JW, Castelein RM. Experimental animal models in scoliosis research: a review of the literature. Spine J. 2011;11(4):347-58.
  • 13
    Silva CA, Guirro RR, Delfino GB, Arruda EJ. Proposal of non-invasive experimental model to induce scoliosis in rats. Rev Bras Fisioter. 2012;16(3):254-60.
  • 14
    Lo S, Russell JC, Taylor AW. Determination of glycogen in small tissue samples. J Appl Physiol. 1970;28(2):234-6.
  • 15
    Nishiyama A, Cavaglieri CR, Curi R, Calder PC. Arachidonic acid-containing phosphatidylcholine inhibits lymphocyte proliferation and decreases interleukin-2 and interferon-g production from Concanavalin A-stimulated rat lymphocytes. Biochim Biophys Acta. 2000;1487(1):50-60.
  • 16
    Sarwark JF, Dabney KW, Salzman SK, Wakabayashi T, Kitadai HK, Beauchamp JT, et al. Experimental scoliosis in the rat. I. Methodology, anatomic features and neurologic characterization. Spine (Phila Pa 1976). 1988;13(5):466-71.
  • 17
    Silva CA, Guirro RRJ, Fonseca W, Arruda EJ, Grasso DO. Assessment of rat behavior with induced scoliosis by polyvinil choride vest. J Chin Clinic Med. 2008;3(11):621-6.
  • 18
    Tsuchida T, Fukuda S, Aoyama H, Taniuchi N, Ishihara T, Ohashi N, et al. MGAT2 deficiency ameliorates high-fat diet-induced obesity and insulin resistance by inhibiting intestinal fat absorption in mice. Lipids Health Dis. 2012;14:11-75.
  • 19
    Hargreaves M. Muscle glycogen and metabolic regulation. Proc Nutr Soc. 2004;63(2):217-20.
  • 20
    Allen DG, Lamb GD, Westerblad H. Skeletal muscle fatigue: cellular mechanisms. Physiol Rev. 2008;88(1):287-332.
  • 21
    Ortenblad N, Nielsen J, Saltin B, Holmberg HC. Role of glycogen availability in sarcoplasmic reticulum Ca2+ kinetics in human skeletal muscle. J Physiol. 2011;589(Pt 3):711-25.
  • 22
    Jackman RW, Kandarian SC. The molecular basis of skeletal muscle atrophy. Am J Physiol Cell Physiol. 2004;287(4):C834-43.
  • 23
    Silva CA, Petermann C, Cancelliero KM, Durigan JLQ, Polacow MLO. IGF-1 minimiza os efeitos deletérios do desuso no músculo sóleo de ratos. Acta Ortop Bras. 2011;19(3):137-40.
  • 24
    Durigan JLQ, Cancelliero KM, Bossi PL, Delfino GB, Montebello MIL, Guirro RRJ, et al. Metabolic and morphometric alterations inherent to neuromuscular electric stimulation in the antagonist muscle submitted to ankle joint immobilization. Braz Arch Biol Technol. 2009;52(1):85-91.
  • 25
    Halar EM, Kathleen RB. Imobilidade. In: De Lisa JA. Tratado de Medicina e Reabilitação: Princípios e práticas. 2 ed. São Paulo: Manole; 2002. v. 2, p.1067-87.
  • 26
    Prestes J, Donato FF, Frolinni AB, Cavaglieri CR. Papel da interleucinas-6 como sinalizador em diferentes tecidos durante o exercício físico. Fit Perf J. 2006;5(6):348-53.
  • 27
    Suzuki K, Nakaji S, Yamada M, Liu Q, Kurakake S, Okamura N, et al. Impact of a competitive marathon race on systemic cytokine and neutrophil responses. Med Sci Sports Exerc. 2003; 35(2):348-55.
  • 28
    Keller C, Steensberg A, Pilegaard H, Osada T, Saltin B, Pedersen BK, et al. Transcriptional activation of the IL-6 gene in human contracting skeletal muscle: influence of muscle glycogen content. FASEB J. 2001;15(14):2748-50.
  • 29
    Pedersen BK, Steenberg A, Schjerling P. Muscle-derived interleukin-6: possible biological effects. J Physiol. 2001;536(Pt 2):329-37.
  • Parecer de aprovação no Comitê de Ética nº 024/2006 (adendo 2009).
  • Estudo desenvolvido na Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP) - Piracicaba (SP), Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2014

Histórico

  • Recebido
    Fev 2013
  • Aceito
    Fev 2014
Universidade de São Paulo Rua Ovídio Pires de Campos, 225 2° andar. , 05403-010 São Paulo SP / Brasil, Tel: 55 11 2661-7703, Fax 55 11 3743-7462 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revfisio@usp.br