Acessibilidade / Reportar erro

Impacto das condições clínicas e funcionais na qualidade de vida de idosas com obesidade

Resumos

A obesidade está associada a incapacidades funcionais e aos prejuízos à qualidade de vida, e muitos fatores interferem nesta associação. Este estudo teve por objetivo caracterizar e identificar o impacto de condições clínicas e funcionais na qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) em idosas obesas. A QVRS foi avaliada pelos questionários "Outcomes Study Short Form-36 Health Survey" (SF-36) e "Impact of Weight on Quality of Life - Lite" (IWQOL-Lite), aplicados a 63 mulheres com índice de massa corporal ≥30 kg/m2. Foram desenvolvidos modelos de regressão para QVRS geral (SF-36) e específica (IWQOL-Lite). Os fatores associados investigados foram: idade, número de medicamentos, número de doenças, sintomas depressivos, índice de massa corporal, força de preensão, nível de atividade física e desempenho funcional. As idosas apresentaram baixo nível de força e atividade física. O desempenho funcional foi de bom a moderado, mas um terço da amostra apresentou déficit de mobilidade. Nível de atividade física e desempenho funcional impactaram de maneira positiva a QVRS geral e número de medicamentos, negativa (R2=0,44). Sintomas depressivos e índice de massa corporal impactaram negativamente a QVRS específica (R2=0,57). O estudo concluiu que idosas obesas com sintomas depressivos, baixos níveis de atividade física e desempenho funcional, fazendo uso de grande número de medicamentos, são mais vulneráveis a apresentarem baixa QVRS. Todos os fatores associados à QVRS são potencialmente modificáveis com medidas de prevenção e promoção de saúde.


Obesity is associated with functional disabilities and impairments of quality of life, and many factors affect this relationship. This study aimed at characterizing and identifying the impact of clinical and functional conditions on health-related quality of life (HRQoL) in obese old women. The HRQoL was assessed by the questionnaires "Outcomes Study Short Form-36 Health Survey" (SF-36) and "Impact of Weight on Quality of Life - Lite" (IWQOL - Lite), which were applied to 63 women with body mass index ≥30 kg/m2. Regression models were developed for general (SF-36) and specific (IWQOL-Lite) HRQoL. The associated factors investigated were: age, number of medicines, number of diseases, depressive symptoms, body mass index, grip strength, level of physical activity, and functional performance. The old women had a low level of strength and physical activity. Their functional performance was good to moderate, but a third of the sample presented deficit of mobility. The level of physical activity and functional performance had a positive impact on the general HRQoL and number of drugs had a negative one (R2=0.44). Depressive symptoms and body mass index negatively affected the specific HRQoL (R2=0.57). The study concluded that obese old women with depressive symptoms, low levels of physical activity, and functional performance, making use of a great number of drugs, are more vulnerable to experiencing poor HRQoL. All the factors associated with the HRQoL in this study are potentially modifiable with interventions of health prevention and promotion.

Obesity; Aging; Quality of Life


La obesidad está asociada a incapacidades funcionales y prejuicios a la cualidad de vida, y muchos factores interfieren en esa asociación. Eso estudio tuvo por objetivo caracterizar e identificar el impacto de las condiciones clínicas y funcionales en la cualidad de vida relacionada a la salud (CVRS) en ancianas obesas. La CVRS fue evaluada por los cuestionarios "Outcomes Study Short Form-36 Health Survey" (SF-36) e "Impact of Weight on Quality of Life - Lite" (IWQOL-Lite), aplicados a 63 mujeres con índice de masa corporal ≥30 kg/m2. Fueron desarrollados modelos de regresión para la CVRS general (SF-36) y específica (IWQOL-Lite). Los factores asociados investigados fueron: edad, número de medicamentos, número de enfermedades, síntomas depresivos, índice de masa corporal, fuerza de preensión, nivel de actividad física y desempeño funcional. Las ancianas presentaron un bajo nivel de fuerza y actividad física. El desempeño funcional varió del bueno al moderado, pero un tercio de la muestra presentó déficit de movilidad. Lo nivel de actividad física y desempeño funcional tuvieron un impacto positivo en la CVRS general y el número de medicamentos, negativo (R2=0,44). Síntomas depresivos e índice de masa corporal impactaron negativamente en la CVRS específica (R2=0,57). El estudio concluso que ancianas obesas con síntomas depresivos, bajos niveles de actividad física y desempeño funcional, utilizando una gran cuantía de medicamentos, son más vulnerables a presentaren baja CVRS. Todos los factores asociados a la CVRS son potencialmente modificables con medidas de prevención y promoción a la salud.

Obesidad; Envejecimiento; Calidad de Vida


INTRODUÇÃO

A obesidade é considerada uma epidemia global, afetando, principalmente, as mulheres11. World Health Organization. Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report Series 894; 2000.. Mudanças no metabolismo e na composição corporal que ocorrem com o envelhecimento predispõem tal condição22. Han TS, Tajar A, Lean ME. Obesity and weight management in the elderly. Br Med Bull. 2011;97:169-96..

Entre idosos, essa condição está associada a morbidades, incapacidades funcionais e prejuízos à qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS)22. Han TS, Tajar A, Lean ME. Obesity and weight management in the elderly. Br Med Bull. 2011;97:169-96. , 33. Villareal D, Apovian C, Kushner R, Klein S. Obesity in older adults:technical review and position statement of the American Society for Nutrition and NAASO, The Obesity Society. Am J Clin Nutr. 2005;82:923-34.. Idosos com obesidade apresentam pior QVRS comparado aos adultos obesos44. Zabelina DL, Erickson AL, Kolotkin RL, Crosby RD. The effect of age on weight-related quality of life in overweight and obese individuals. Obesity (Silver Spring). 2009;17(7):1410-3. , 55. Sirtori A, Brunani A, Villa V, Berselli ME, Croci M, Leonardi M, et al. Obesity is a marker of reduction in QoL and disability. Scientific World J. 2012;2012:167520., sendo que as mulheres têm os piores escores44. Zabelina DL, Erickson AL, Kolotkin RL, Crosby RD. The effect of age on weight-related quality of life in overweight and obese individuals. Obesity (Silver Spring). 2009;17(7):1410-3.

5. Sirtori A, Brunani A, Villa V, Berselli ME, Croci M, Leonardi M, et al. Obesity is a marker of reduction in QoL and disability. Scientific World J. 2012;2012:167520.

6. Mannucci E, Petroni ML, Villanova N, Rotella CM, Apolone G, Marchesini G; QUOVADIS Study Group. Clinical and psychological correlates of health-related quality of life in obese patients. Health Qual Life Outcomes. 2010;8:90.
- 77. Mond JM, Baune BT. Overweight, medical comorbidity and health-related quality of life in a community sample of women and men. Obesity (Silver Spring). 2009;17(8):1627-34..

Em geral, a obesidade está mais associada a maiores prejuízos nos componentes físicos da QVRS do que nos componentes mental e emocional66. Mannucci E, Petroni ML, Villanova N, Rotella CM, Apolone G, Marchesini G; QUOVADIS Study Group. Clinical and psychological correlates of health-related quality of life in obese patients. Health Qual Life Outcomes. 2010;8:90. , 88. Bentley TG, Palta M, Paulsen AJ, Cherepanov D, Dunham NC, Feeny D, et al. Race and gender associations between obesity and nine health-related quality-of-life measures. Qual Life Res. 2011;20(5):665-74.

9. Buckley J, Tucker G, Hugo G, Wittert G, Adams RJ, Wilson DH. The Australian Baby Boomer Population--Factors Influencing Changes to Health-Related Quality of Life Over Time. J Aging Health. 2013;25(1):29-55.
- 1010. Yan LL, Daviglus ML, Liu K, Pirzada A, Garside DB, Schiffer L, et al. BMI and health-related quality of life in adults 65 years and older. Obes Res. 2004;12(1):69-76.. Porém, indivíduos obesos que apresentam comorbidades podem demonstrar prejuízos nos três componentes1111. Banegas JR, Lopez-Garcia E, Graciani A, Guallar-Castillon P, Gutierrez-Fisac JL, Alonso J, et al. Relationship between obesity, hypertension and diabetes, and health-related quality of life among the elderly. Eur J Cardiovasc Prev Rehabil. 2007;14(3):456-62. , 1212. Doll HA, Petersen SE, Stewart-Brown SL. Obesity and physical and emotional well-being: associations between body mass index, chronic illness, and the physical and mental components of the SF-36 questionnaire. Obes Res. 2000;8(2):160-70.. É possível que a presença de limitações físicas ou funcionais também interfira nesta relação. No entanto, a maioria dos estudos sobre obesidade e QVRS não controla os efeitos associados de condições clínicas e funcionais.

Considerando a importância da QVRS enquanto alvo das intervenções de saúde, é essencial identificar os fatores agravantes ou atenuantes da relação entre obesidade e QVRS. Desta forma, os objetivos deste estudo foram caracterizar e analisar a relação entre as condições clínicas e funcionais e a QVRS em idosas obesas.

METODOLOGIA

Delineamento do estudo

Estudo transversal observacional, aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), parecer ETIC0172.0.203.000-11. As participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido e receberam orientação quanto à sua participação.

Amostra

O tamanho da amostra foi calculado pelo G*Power31313. Faul F, Erdfelder E, Lang AG, Buchner A. G*Power 3: a flexible statistical power analysis program for the social, behavioral, and biomedical sciences. Behav Res Methods. 2007;39(2):175-91.. Para um modelo de regressão linear com oito preditores, considerou-se nível de significância (α) igual a 0,05, poder (β) de 0,80 e tamanho de efeito de 0,30. Desta forma, o cálculo amostral foi de 60 idosas, com um acréscimo de 5% para possíveis perdas.

A amostra constitui-se de mulheres com idades ≥65 anos, capazes de deambular sem auxílio à marcha e com índice de massa corporal (IMC) ≥30 kg/m2. Foram excluídas participantes com déficit cognitivo (pontuação ≤17 pontos no Miniexame do Estado Mental)1414. Bertolucci P, Brucki S, Campacci S, Juliano Y. Impacto do Mini-exame do estado mental em uma população geral. Impacto da escolaridade. Arq Neuropsiquiatr. 1994;52(1):1-7.; com deficiências físicas ou sensoriais que impedissem a realização dos testes; fraturas e/ou intervenções cirúrgicas nos membros inferiores no último ano e doenças em fase aguda ou descompensada.

Procedimentos

As condições clínicas foram obtidas por meio de entrevista e exame físico. O número de doenças foi obtido a partir das condições médicas autorrelatadas pelas idosas. Para o número de medicamentos, foram considerados aqueles de uso regular e sistemático. O IMC foi calculado em kg/m2, mensurando o peso e a altura em balança com altímetro (Fillizola, São Paulo, Brasil). A presença de sintomas depressivos foi avaliada pela Escala de Depressão Geriátrica reduzida (GDS-10)1515. Almeida OP, Almeida SA. Short versions of the geriatric depression scale: a study of their validity for the diagnosis of a major depressive episode according to ICD-10 and DSM-IV. Int J Geriatr Psychiatry. 1999;14(10):858-65..

As condições funcionais foram obtidas por três instrumentos. A força de preensão palmar (FPP) foi registrada como a média de três tentativas de seis segundos na mão dominante, com dinamômetro manual do tipo Jamar(r) (Sammons Preston, Illinois). Valores abaixo de 21 Kgf foram considerados como indicativos de sarcopenia1616. Fried LP, Tangen CM, Walston J, Newman AB, Hirsch C, Gottdiener J, et al. Frailty in older adults: evidence for a phenotype. J Gerontol. 2001;56A(3):M146-56.. O nível de atividade física foi avaliado pelo perfil de atividade humana (PAH), classificando a idosa como inativa, moderadamente ativa e ativa. Esta classificação é obtida a partir do escore ajustado de atividade (EAA), que é calculado subtraindo-se os itens respondidos como "parei de fazer" do valor do escore máximo de atividade, sendo inativa aquela com EAA<53, moderadamente ativa de 53 a 74 e ativa >741717. Souza A, Magalhães L, Teixeira-Salmela L. Adaptação transcultural e análise das propriedades psicométricas da versão brasileira do perfil de atividade humana. Cad Saúde Pública. 2006;22:2623-36.. O desempenho funcional foi alcançado por meio do "Short Physical Performance Battery" (SPPB)1818. Freire AN, Guerra RO, Alvarado B, Guralnik JM, Zunzunegui MV. Validity and Reliability of the short physical performance battery in two diverse older adult populations in Quebec and Brazil. J Aging Health. 2012;24(2):1-16.. Valores abaixo de 1,0 m/s para velocidade marcha (VM) foram considerados como déficit de mobilidade1919. Abellan van KG, Rolland Y, Andrieu S, Bauer J, Beauchet O, Bonnefoy M, et al. Gait speed at usual pace as a predictor of adverse outcomes in community-dwelling older people an International Academy on Nutrition and Aging (IANA) Task Force. J Nutr Health Aging. 2009;13(10):881-9..

A QVRS foi mensurada por dois questionários traduzidos e validados para a população brasileira, aplicados por um único examinador treinado. A QVRS geral foi analisada por meio do "Outcomes Study Short Form-36 Health Survey" (SF-36)2020. Ciconelli RM. Tradução para o português e validação do questionário genérico da avaliação de qualidade de vida "Medical outcomes study 36-item short-form health survey (SF-36)" [tese]. São Paulo: Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo; 1997., com escores de 0 (pior) a 100 (melhor) em cada domínio. Enquanto a específica foi avaliada pelo "Impact of Weight on Quality of Life - Lite" (IWQOL-Lite)2121. de A Mariano MH, Kolotkin RL, Petribú K, de N L Ferreira M, Dutra RF, Barros MV, et al. Psychometric evaluation of a Brazilian version of the impact of weight on quality of life (IWQOL-Lite) instrument. Eur Eat Disord Rev. 2010;18(1):58-66., com escores transformados em 0 (melhor) a 100 (pior) para cada domínio.

Análise estatística

Para caracterizar a amostra, foram utilizadas medidas de tendência central e dispersão para as variáveis contínuas e distribuições de frequência para as categóricas.

Foram construídos dois modelos de regressão linear multivariada para analisar a relação das condições clínicas e funcionais com a QVRS. No primeiro, a variável dependente foi o escore final do domínio de capacidade funcional do SF-36 (QVRS geral) e, no segundo, o domínio de saúde física do IWQOL-Lite (QVRS específica). Para cada um, foram determinados oito preditores como variáveis independentes: idade, número de doenças, número de medicamentos, sintomas depressivos, IMC, FPP, nível de atividade e desempenho funcional.

Nas análises univariadas, foram utilizados testes de correlação de Spearman e de comparação de médias (Teste t de Student e análise de variância - ANOVA). Foram incluídas nos modelos de regressão as variáveis independentes que apresentaram correlação significativa com a dependente (p≤0,20). Para os modelos multivariados, levou-se em conta o nível de significância de α≤0,05. Foi utilizado o programa Statistical Package for the Social Sciences - SPSS (SPSS Inc., Chicago, DE, USA), versão 15.0 para Windows.

RESULTADOS

A Tabela 1 apresenta as condições clínicas e funcionais da amostra. Das 63 voluntárias, 23 (36,5%) demonstraram sintomas depressivos. O número de doenças foi de 4,9, sendo hipertensão arterial, osteoartrite de joelho, hipercolesterolemia e diabetes mellitus as mais frequentes. Essas participantes apresentaram baixo nível de FPP, sendo que 71% eram sarcopênicas. O nível médio de atividade física foi moderado, sendo 33% inativas, 64% moderadamente ativas e 3% ativas. No SPPB, 30% apresentaram bom desempenho (10 a 12 pontos) e 70%, moderado (de nove a sete pontos). Apesar do valor médio adequado, 18 idosas (29%) apresentaram VM<1,0 m/s.

Tabela 1.
Condições clínicas e funcionais de idosas com obesidade (n=63)

Na Tabela 2, observa-se que os domínios de limitação por aspectos sociais e limitação por aspectos físicos apresentaram os piores escores na QVRS geral e os de capacidade funcional e limitação por aspectos emocionais, os melhores. A função física foi o domínio de pior escore na QVRS específica. Os domínios de QVRS geral e específica apresentaram correlações negativas e moderadas entre si.

Tabela 2.
Escores da qualidade de vida relacionada à saúde e correlações entre os domínios de cada instrumento

As condições clínicas apresentaram impacto nos dois modelos de QVRS, enquanto as funcionais apresentaram impacto apenas na QVRS geral (Tabela 3). As equações finais de cada modelo foram:

Tabela 3.
Modelos de regressão para a qualidade de vida relacionada à saúde
  • QVRS geral = -6,44 -2,42 (número de medicamentos) + 14,38 (nível de atividade) + 3,75 (desempenho funcional);

  • QVRS específica = -96,88 + 12,75 (sintomas depressivos) + 4,01 (IMC).

DISCUSSÃO

A obesidade pode afetar negativamente a capacidade funcional dos idosos, especialmente para a locomoção2222. Alley D, Chang V. The Changing relationship of obesity and disability, 1988-2004. JAMA. 2007;298(17):2020-7.. Neste estudo, apesar de nenhuma idosa ter apresentado baixo desempenho funcional no SPPB, um terço da amostra mostrou valores insuficientes de VM. Lentidão da marcha é um fator preditor de eventos adversos entre idosos, tais como quedas, institucionalização e mortalidade1919. Abellan van KG, Rolland Y, Andrieu S, Bauer J, Beauchet O, Bonnefoy M, et al. Gait speed at usual pace as a predictor of adverse outcomes in community-dwelling older people an International Academy on Nutrition and Aging (IANA) Task Force. J Nutr Health Aging. 2009;13(10):881-9..

Esperava-se observar valores inferiores nos domínios físicos da QVRS, o que não foi observado na QVRS geral. Neste estudo, as idosas obesas apresentaram maiores prejuízos na limitação por aspectos sociais e físicos, com baixos valores também para vitalidade e saúde mental. Por outro lado, a QVRS específica para obesidade demonstrou maior impacto no domínio função física, que teve correlações significativas com vários domínios do SF-36. Esta associação provavelmente reflete as limitações funcionais de tal população.

Sabe-se que indivíduos ativos tendem a apresentar melhores níveis de QVRS2323. Alexandre TS, Cordeiro RC, Ramos LR. Factors associated to quality of life in active elderly. Rev Saúde Pública. 2009;43(4):613-21. , 2424. Pimenta F, Simil F, Torres H, Amaral C, Rezende C, Coelho T, et al. Avaliação da qualidade de vida de aposentados com a utilização do questionário SF-36. Rev Assoc Med Bras. 2008;54(1):55-60. e estudos longitudinais já demonstraram que a obesidade e o sedentarismo podem ter efeitos negativos a longo prazo na QVRS2525. Buckley J, Tucker G, Hugo G, Wittert G, Adams RJ, Wilson DH. The Australian Baby boomer population--factors influencing changes to health-related quality of life over time. J Aging Health. 2013;25(1):29-55. , 2626. Jia H, Lubetkin EI. Obesity-related quality-adjusted life years lost in the U.S. from 1993 to 2008. Am J Prev Med. 2010;39(3):220-7.. A inatividade física também explica parte da associação entre doenças crônicas e baixa QVRS em idosos2727. Sawatzky R, Liu-Ambrose T, Miller WC, Marra CA. Physical activity as a mediator of the impact of chronic conditions on quality of life in older adults. Health Qual Life Outcomes. 2007;5:68.. Neste estudo, desempenho funcional e nível de atividade tiveram uma associação positiva com o domínio de capacidade funcional do SF-36. Isso implica que idosas mais ativas e com melhor desempenho funcional têm melhor QVRS geral.

O IMC apresentou impacto negativo na QVRS, como demonstrado com o IWQOL-Lite2828. Sirtori A, Brunani A, Villa V, Berselli ME, Croci M, Leonardi M, et al. Obesity is a marker of reduction in QoL and disability. Scientific World J. 2012;2012:167520. e o SF-3666. Mannucci E, Petroni ML, Villanova N, Rotella CM, Apolone G, Marchesini G; QUOVADIS Study Group. Clinical and psychological correlates of health-related quality of life in obese patients. Health Qual Life Outcomes. 2010;8:90.. A associação permaneceu significativa apenas no modelo de QVRS específica, provavelmente pela interação de outros fatores na QVRS geral. Além disso, o IWQOL-Lite é mais sensível para mensurar o impacto do IMC na QVRS do que o SF-36, em função do uso da expressão "por causa do meu peso" no instrumento2929. Kolotkin RL, Crosby RD. Psychometric evaluation of the impact of weight on quality of life-lite questionnaire (IWQOL-lite) in a community sample. Qual Life Res. 2002;11(2):157-71..

Banegas et al.1111. Banegas JR, Lopez-Garcia E, Graciani A, Guallar-Castillon P, Gutierrez-Fisac JL, Alonso J, et al. Relationship between obesity, hypertension and diabetes, and health-related quality of life among the elderly. Eur J Cardiovasc Prev Rehabil. 2007;14(3):456-62. observaram que a associação de hipertensão arterial e diabetes mellitus potencializa os efeitos negativos da obesidade na QVRS em idosos, especialmente entre as mulheres. No entanto, alguns autores concluíram que as diferenças de gênero no impacto da obesidade na QVRS independem do número de doenças77. Mond JM, Baune BT. Overweight, medical comorbidity and health-related quality of life in a community sample of women and men. Obesity (Silver Spring). 2009;17(8):1627-34. , 1010. Yan LL, Daviglus ML, Liu K, Pirzada A, Garside DB, Schiffer L, et al. BMI and health-related quality of life in adults 65 years and older. Obes Res. 2004;12(1):69-76.. Mond e Baune77. Mond JM, Baune BT. Overweight, medical comorbidity and health-related quality of life in a community sample of women and men. Obesity (Silver Spring). 2009;17(8):1627-34. apontaram a provável influência de fatores psíquicos e emocionais que podem mediar a relação entre obesidade e QVRS. Nossos achados corroboram esta hipótese, uma vez que a presença de sintomas depressivos apresentou impacto negativo na QVRS específica. Outros autores observaram o efeito negativo de distúrbios psicológicos na QVRS, em especial a depressão66. Mannucci E, Petroni ML, Villanova N, Rotella CM, Apolone G, Marchesini G; QUOVADIS Study Group. Clinical and psychological correlates of health-related quality of life in obese patients. Health Qual Life Outcomes. 2010;8:90. , 2323. Alexandre TS, Cordeiro RC, Ramos LR. Factors associated to quality of life in active elderly. Rev Saúde Pública. 2009;43(4):613-21. , 2424. Pimenta F, Simil F, Torres H, Amaral C, Rezende C, Coelho T, et al. Avaliação da qualidade de vida de aposentados com a utilização do questionário SF-36. Rev Assoc Med Bras. 2008;54(1):55-60.. Todas essas evidências confirmam a importância de se avaliar os aspectos psíquicos de idosos com obesidade e a necessidade de se implementarem medidas terapêuticas para a depressão nesta população.

Neste estudo, o número de doenças não mostrou associação com a QVRS nos modelos mutivariados. No entanto, o número de medicamentos manteve associação negativa com a QVRS geral. Isso pode ter ocorrido devido às duas variáveis estarem relacionadas entre si, refletindo o estado de saúde da idosa. Thompson et al.3030. Thompson WW, Zack MM, Krahn GL, Andresen EM, Barile JP. Health-related quality of life among older adults with and without functional limitations. Am J Public Health. 2012;102(3):496-502. utilizaram uma medida do estado de saúde mais ampla do que o número de doenças ou medicamentos em idosos, demonstrando associação negativa entre os custos com cuidados médicos e a QVRS3030. Thompson WW, Zack MM, Krahn GL, Andresen EM, Barile JP. Health-related quality of life among older adults with and without functional limitations. Am J Public Health. 2012;102(3):496-502..

A fraqueza muscular foi comum entre as idosas, o que caracteriza obesidade sarcopênica. Essa condição está mais fortemente associada a prejuízos funcionais e de qualidade de vida do que obesidade ou sarcopenia isoladamente, podendo maximizar os efeitos da inatividade física e gerar morbidades3131. Zamboni M, Mazzali G, Fantin F, Rossi A, Di Francesco V. Sarcopenic obesity: a new category of obesity among the elderly. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2008;18(5):388-95.. Silva Neto et al. demonstraram que a FPP pode apresentar associação positiva com todos os domínios do SF-36, com exceção da vitalidade e saúde mental3232. Silva Neto L, Karnikowiski M, Tavares A, Lima R. Associação entre sarcopenia, obesidade sarcopênica e força muscular com variáveis relacionadas de qualidade de vida em idosas. Rev Bras Fisioterap. 2012;16(5):360-7.. Porém, o mesmo não foi observado neste estudo. Uma possível explicação pode ser a homogeneidade da amostra quanto a esta variável. Além disso, Silva Neto et al. utilizaram a proporção entre massa gorda e magra para definir obesidade, mas não o IMC3232. Silva Neto L, Karnikowiski M, Tavares A, Lima R. Associação entre sarcopenia, obesidade sarcopênica e força muscular com variáveis relacionadas de qualidade de vida em idosas. Rev Bras Fisioterap. 2012;16(5):360-7..

A idade não influenciou a QVRS nos modelos finais. Provavelmente, parte do seu efeito se deve a outros fatores de confusão, como condições clínicas e funcionais. Estudos longitudinais poderiam analisar melhor se há um efeito independente do envelhecimento sobre a QVRS.

Os resultados deste estudo limitam-se a mulheres idosas e apresentam associações transversais. Os fatores associados aos domínios psíquicos e sociais da QVRS não foram explorados nesta análise. No entanto, esta investigação é uma das poucas que estudou a relação entre obesidade e QVRS em idosos, considerando aspectos físicos, funcionais e psíquicos.

CONCLUSÃO

Idosas obesas que utilizam um grande número de medicamentos e apresentam elevados níveis de IMC, sintomas depressivos e baixos níveis de atividade física e desempenho funcional são mais vulneráveis a apresentarem baixa QVRS. Todos esses fatores são passíveis de modificação com abordagens de prevenção e promoção de saúde. Atividade física orientada, em especial, pode trazer vários benefícios a esta população e impactar diretamente na QVRS.

REFERENCES

  • 1
    World Health Organization. Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report Series 894; 2000.
  • 2
    Han TS, Tajar A, Lean ME. Obesity and weight management in the elderly. Br Med Bull. 2011;97:169-96.
  • 3
    Villareal D, Apovian C, Kushner R, Klein S. Obesity in older adults:technical review and position statement of the American Society for Nutrition and NAASO, The Obesity Society. Am J Clin Nutr. 2005;82:923-34.
  • 4
    Zabelina DL, Erickson AL, Kolotkin RL, Crosby RD. The effect of age on weight-related quality of life in overweight and obese individuals. Obesity (Silver Spring). 2009;17(7):1410-3.
  • 5
    Sirtori A, Brunani A, Villa V, Berselli ME, Croci M, Leonardi M, et al. Obesity is a marker of reduction in QoL and disability. Scientific World J. 2012;2012:167520.
  • 6
    Mannucci E, Petroni ML, Villanova N, Rotella CM, Apolone G, Marchesini G; QUOVADIS Study Group. Clinical and psychological correlates of health-related quality of life in obese patients. Health Qual Life Outcomes. 2010;8:90.
  • 7
    Mond JM, Baune BT. Overweight, medical comorbidity and health-related quality of life in a community sample of women and men. Obesity (Silver Spring). 2009;17(8):1627-34.
  • 8
    Bentley TG, Palta M, Paulsen AJ, Cherepanov D, Dunham NC, Feeny D, et al. Race and gender associations between obesity and nine health-related quality-of-life measures. Qual Life Res. 2011;20(5):665-74.
  • 9
    Buckley J, Tucker G, Hugo G, Wittert G, Adams RJ, Wilson DH. The Australian Baby Boomer Population--Factors Influencing Changes to Health-Related Quality of Life Over Time. J Aging Health. 2013;25(1):29-55.
  • 10
    Yan LL, Daviglus ML, Liu K, Pirzada A, Garside DB, Schiffer L, et al. BMI and health-related quality of life in adults 65 years and older. Obes Res. 2004;12(1):69-76.
  • 11
    Banegas JR, Lopez-Garcia E, Graciani A, Guallar-Castillon P, Gutierrez-Fisac JL, Alonso J, et al. Relationship between obesity, hypertension and diabetes, and health-related quality of life among the elderly. Eur J Cardiovasc Prev Rehabil. 2007;14(3):456-62.
  • 12
    Doll HA, Petersen SE, Stewart-Brown SL. Obesity and physical and emotional well-being: associations between body mass index, chronic illness, and the physical and mental components of the SF-36 questionnaire. Obes Res. 2000;8(2):160-70.
  • 13
    Faul F, Erdfelder E, Lang AG, Buchner A. G*Power 3: a flexible statistical power analysis program for the social, behavioral, and biomedical sciences. Behav Res Methods. 2007;39(2):175-91.
  • 14
    Bertolucci P, Brucki S, Campacci S, Juliano Y. Impacto do Mini-exame do estado mental em uma população geral. Impacto da escolaridade. Arq Neuropsiquiatr. 1994;52(1):1-7.
  • 15
    Almeida OP, Almeida SA. Short versions of the geriatric depression scale: a study of their validity for the diagnosis of a major depressive episode according to ICD-10 and DSM-IV. Int J Geriatr Psychiatry. 1999;14(10):858-65.
  • 16
    Fried LP, Tangen CM, Walston J, Newman AB, Hirsch C, Gottdiener J, et al. Frailty in older adults: evidence for a phenotype. J Gerontol. 2001;56A(3):M146-56.
  • 17
    Souza A, Magalhães L, Teixeira-Salmela L. Adaptação transcultural e análise das propriedades psicométricas da versão brasileira do perfil de atividade humana. Cad Saúde Pública. 2006;22:2623-36.
  • 18
    Freire AN, Guerra RO, Alvarado B, Guralnik JM, Zunzunegui MV. Validity and Reliability of the short physical performance battery in two diverse older adult populations in Quebec and Brazil. J Aging Health. 2012;24(2):1-16.
  • 19
    Abellan van KG, Rolland Y, Andrieu S, Bauer J, Beauchet O, Bonnefoy M, et al. Gait speed at usual pace as a predictor of adverse outcomes in community-dwelling older people an International Academy on Nutrition and Aging (IANA) Task Force. J Nutr Health Aging. 2009;13(10):881-9.
  • 20
    Ciconelli RM. Tradução para o português e validação do questionário genérico da avaliação de qualidade de vida "Medical outcomes study 36-item short-form health survey (SF-36)" [tese]. São Paulo: Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo; 1997.
  • 21
    de A Mariano MH, Kolotkin RL, Petribú K, de N L Ferreira M, Dutra RF, Barros MV, et al. Psychometric evaluation of a Brazilian version of the impact of weight on quality of life (IWQOL-Lite) instrument. Eur Eat Disord Rev. 2010;18(1):58-66.
  • 22
    Alley D, Chang V. The Changing relationship of obesity and disability, 1988-2004. JAMA. 2007;298(17):2020-7.
  • 23
    Alexandre TS, Cordeiro RC, Ramos LR. Factors associated to quality of life in active elderly. Rev Saúde Pública. 2009;43(4):613-21.
  • 24
    Pimenta F, Simil F, Torres H, Amaral C, Rezende C, Coelho T, et al. Avaliação da qualidade de vida de aposentados com a utilização do questionário SF-36. Rev Assoc Med Bras. 2008;54(1):55-60.
  • 25
    Buckley J, Tucker G, Hugo G, Wittert G, Adams RJ, Wilson DH. The Australian Baby boomer population--factors influencing changes to health-related quality of life over time. J Aging Health. 2013;25(1):29-55.
  • 26
    Jia H, Lubetkin EI. Obesity-related quality-adjusted life years lost in the U.S. from 1993 to 2008. Am J Prev Med. 2010;39(3):220-7.
  • 27
    Sawatzky R, Liu-Ambrose T, Miller WC, Marra CA. Physical activity as a mediator of the impact of chronic conditions on quality of life in older adults. Health Qual Life Outcomes. 2007;5:68.
  • 28
    Sirtori A, Brunani A, Villa V, Berselli ME, Croci M, Leonardi M, et al. Obesity is a marker of reduction in QoL and disability. Scientific World J. 2012;2012:167520.
  • 29
    Kolotkin RL, Crosby RD. Psychometric evaluation of the impact of weight on quality of life-lite questionnaire (IWQOL-lite) in a community sample. Qual Life Res. 2002;11(2):157-71.
  • 30
    Thompson WW, Zack MM, Krahn GL, Andresen EM, Barile JP. Health-related quality of life among older adults with and without functional limitations. Am J Public Health. 2012;102(3):496-502.
  • 31
    Zamboni M, Mazzali G, Fantin F, Rossi A, Di Francesco V. Sarcopenic obesity: a new category of obesity among the elderly. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2008;18(5):388-95.
  • 32
    Silva Neto L, Karnikowiski M, Tavares A, Lima R. Associação entre sarcopenia, obesidade sarcopênica e força muscular com variáveis relacionadas de qualidade de vida em idosas. Rev Bras Fisioterap. 2012;16(5):360-7.
  • Estudo desenvolvido no Laboratório de Desempenho Motor e Funcional Humano, Departamento de Fisioterapia, Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) - Belo Horizonte (MG), Brasil.
  • Fonte de financiamento: nenhuma
  • Parecer de aprovação no Comitê de Ética nº ETIC0172.0.203.000-11.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    Mar 2014
  • Aceito
    Set 2014
Universidade de São Paulo Rua Ovídio Pires de Campos, 225 2° andar. , 05403-010 São Paulo SP / Brasil, Tel: 55 11 2661-7703, Fax 55 11 3743-7462 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revfisio@usp.br