Acessibilidade / Reportar erro

Pacientes com doença de Parkinson sob assistência fisioterapêutica apresentam parâmetros pulmonares melhores do que controles sedentários

Pacientes con enfermedad de Parkinson bajo cuidados fisioterapéuticos presentan parámetros pulmonares mejores que los de controles sedentarios

RESUMO

Este estudo teve como objetivo investigar os parâmetros pulmonares (espirometria e oscilometria de impulso) de pacientes com doença de Parkinson (DP) e controles eutróficos, comparando os valores dos sujeitos participantes e os não participantes de um programa de assistência fisioterapêutica. Trinta e sete sujeitos foram divididos em quatro grupos independentes: dois grupos formados por pacientes com DP (praticantes e não praticantes de um protocolo de exercícios fisioterapêuticos realizados com frequência de dois atendimentos semanais durante 6 meses) e dois grupos compostos por sujeitos controles eutróficos (praticantes e não praticantes do mesmo programa terapêutico). Os sujeitos foram submetidos à avaliação de cirtometria torácica, espirometria e oscilometria de impulso, sendo os pacientes com DP avaliados na fase off da medicação. A análise dos dados ocorreu por meio do teste não paramétrico de Kruskal-Wallis, sendo a comparação aos pares realizada pelo pós-teste de Dunett T3. A significância foi estipulada em 5%. Sobre os resultados, com similaridade entre grupos para mobilidade da caixa torácica, os pacientes com DP que realizaram atendimento fisioterapêutico apresentaram parâmetros pulmonares melhores do que os pacientes sedentários. A comparação com os sujeitos eutróficos vislumbra melhores resultados dos participantes com DP em relação a controles sedentários. Não houve diferença significativa entre os sujeitos com DP e controles submetidos ao mesmo protocolo terapêutico. Em conclusão, os achados delimitam resultados promissores do tratamento fisioterapêutico sobre parâmetros pulmonares na DP, e sentenciam a necessidade de novos estudos longitudinais do tipo ensaio clínico para comprovação da relação causa e efeito das variáveis em questão.

Descritores:
Doença de Parkinson; Testes de Função Respiratória; Medidas de Volume Pulmonar

RESUMEN

En este artículo se propone a investigar los parámetros pulmonares (espirometría y oscilometría de impulso) en pacientes con enfermedad de Parkinson (EP) y controles eutróficos, y comparar las puntuaciones de los sujetos participantes y de los no participantes de un programa de cuidados fisioterapéuticos. Se han divididos 37 participantes en cuatro grupos independientes: dos grupos conformados por personas con EP (practicantes y no practicantes de un protocolo de ejercicios fisioterapéuticos realizados frecuentemente en dos atenciones semanales durante seis meses), y dos grupos controles eutróficos (practicantes y no practicantes del mismo programa terapéutico). A los participantes les sometieron a evaluación de cirtometría torácica, espirometría y oscilometría de impulso, siendo los pacientes con EP evaluados en la etapa en off de medicación. Para el análisis se empleó la prueba no paramétrica de Kruskal-Wallis, siendo aplicada para la comparación con pares la pos-prueba de Dunett T3. Se empleó el nivel de significación del 5%. Acerca de los resultados, igual que entre grupos para movilidad de la caja torácica, los pacientes con EP, que realizaron atención fisioterapéutica presentaron parámetros pulmonares mejores que los sujetos sedentarios. La comparación con los participantes eutróficos vislumbra mejores resultados de los participantes con EP con relación a los controles sedentarios. No hubo diferencias significativas entre los sujetos con EP y los controles sometidos al mismo protocolo terapéutico. Se concluye que los hallazgos delimitan resultados prometedores del tratamiento fisioterapéutico sobre los parámetros pulmonares de la EP, y llaman la atención para la necesidad de hacer nuevos estudios longitudinales del tipo ensayo clínico para comprobar la relación de causa y efecto de las variables estudiadas.

Palabras clave:
Enfermedad de Parkinson; Pruebas de Función Respiratoria; Mediciones del Volumen Pulmonar

ABSTRACT

The aim of this study was to investigate the pulmonary parameters (spirometry and impulse oscillometry) of patients with Parkinson disease (PD) and healthy control peers, comparing the values of the subjects that were participating or not on a physiotherapeutic assistance program. Thirty-seven subjects were divided into four groups: two were formed by patients with PD (practitioners and non-practitioners of a physiotherapeutic protocol performed twice a week during 6 months) and the other two groups were formed by control peers (practitioners and non-practitioners of the same therapeutic protocol). The subjects underwent evaluation of chest cirtometry, spirometry and impulse oscillometry, being all the PD patients evaluated on the "off" state of their anti-PD medication. Data analysis occurred through the use of the non-parametric test of Kruskal-Wallis, with pairwise comparisons being done with Dunett T3 tests. Significance was set at 5%. Regarding the results, with a statistical similarity between groups for chest mobility, patients with PD who underwent the physiotherapeutic protocol showed better pulmonary parameters than sedentary patients. Comparison with control peers indicates better results of the PD group submitted to physiotherapy than sedentary controls. There were no differences in pulmonary parameters of both PD and control groups submitted to physiotherapy. In conclusion, the findings delimit promising results promoted by physiotherapy on pulmonary parameters in subjects with PD, and emphasize the need for more longitudinal studies of the clinical trial type for proof of cause and effect relationships.

Keywords:
Parkinson Disease; Respiratory Function Tests; Lung Volume Measurements

INTRODUÇÃO

O sistema respiratório humano sofre alterações estruturais de capacidade, fluxo e volume durante o envelhecimento. Tal processo é consequência da perda elástica, associada à dilatação alveolar e diminuição da transmissão dos estímulos na musculatura respiratória11. Lalley PM. The aging respiratory system: pulmonary structure, function and neural control. Respir Physiol Neurobiol. 2013;187(3):199-210.), (22. Sanches SS, Santos FM, Fernandes JM, Santos MLM, Müller PT, Christofoletti G. Neurodegenerative disorders increase decline in respiratory muscle strength in older adults. Respir Care. 2014;59(12):1838-45.. Quando associado a condições crônico-neurodegenerativas, como é o caso da doença de Parkinson (DP), o declínio físico e funcional é potencializado, deixando o paciente vulnerável na realização de atividades básicas e instrumentais da vida diária22. Sanches SS, Santos FM, Fernandes JM, Santos MLM, Müller PT, Christofoletti G. Neurodegenerative disorders increase decline in respiratory muscle strength in older adults. Respir Care. 2014;59(12):1838-45..

A DP é uma afecção extrapiramidal progressiva que se caracteriza por sinais clínicos de bradicinesia, rigidez, tremor em repouso e instabilidade postural33. Sathyaprabha TN, Kapavarapu PK,.Pal PK, Thennarasu K, Raju TR. Pulmonary Functions in Parkinson's Disease. Indian J Chest Dis Allied Sci. 2005; 47(4):251-7.. O comprometimento da função pulmonar muitas vezes encontra-se presente nos primeiros sintomas motores da doença44. Pal PK, Shathyaprabha TN, Tuhina P, Thennarasu K. Pattern of subclinical pulmonary dysfunction in Parkinson's disease and the effect of levodopa. Mov Disord. 2007;22(3):420-4.), (55. Silverman EP, Sapienza CM, Saleem A, Carmichael C, Davenport PW, Hoffma-Ruddy B et al. Tutorial on maximum inspiratory and expiratory mouth pressures in individuals with idiopathic Parkinson disease (IPD) and the preliminary results of an expiratory muscle strength training program. NeuroRehabilitation. 2006;21(1):71-9.. A disfunção pulmonar é agravada pela rigidez progressiva da parede torácica, com limitações de flexibilidade, comprometimento de vias aéreas e fraqueza muscular - gerando dificuldades na fala e na deglutição66. Huber JE, Darling M, Francis EJ, Zhang D. Impact of typical aging and Parkinson's disease on the relationship among breath pausing, syntax, and punctuation. Am J Speech Lang Pathol. 2012;21(4):368-79.), (77. Monteiro L, Souza-Machado, Pinho P, Sampaio M, Nóbrega AC, Melo A. Swallowing impairment and pulmonary dysfunction in Parkinson's disease: the silent threats. J Neurol Sci. 2014;339(1-2):149-52.. As alterações posturais também influenciam na limitação da capacidade respiratória do paciente, resultando no aumento na resistência ao fluxo aéreo e na diminuição da complacência pulmonar88. Polatli M, Akyol A, Coldag O, Bayülkem K. Pulmonary function tests in Parkinson's disease. Eur J Neurol. 2001;8(4):341-5..

Apesar das alterações neuro-fisiopatológicas já estarem bem elucidadas na DP, ainda há dúvidas sobre o padrão pulmonar de pacientes se concentrar mais em condições obstrutivas ou restritivas22. Sanches SS, Santos FM, Fernandes JM, Santos MLM, Müller PT, Christofoletti G. Neurodegenerative disorders increase decline in respiratory muscle strength in older adults. Respir Care. 2014;59(12):1838-45.. Além disso, a revisão sistemática realizada por Reyes, Ziman e Nosaka99. Reyes A, Ziman M, Nosaka K. Respiratory muscle training for respiratory deficits in neurodegenerative disorders: a systematic review. Chest. 2013;143(5):1386-94. reporta que os resultados ainda são insuficientes no que se refere ao estudo das capacidades respiratórias na DP, sobretudo quando vinculado a efeitos gerados pela prática do exercício.

Diante de tal quadro, realizamos este estudo que teve como objetivo investigar os parâmetros pulmonares (espirometria e oscilometria de impulso) de pacientes com DP e sujeitos eutróficos, participantes ou não de um programa de assistência fisioterapêutica. No desenho metodológico apresentado, em que se observa provável interferência dos fatores "condição clínica" (DP versus controle) e "fisioterapia" (praticantes versus não praticantes), delimitamos as seguintes hipóteses: Pacientes com DP que realizam assistência fisioterapêutica apresentam parâmetros pulmonares melhores do que pacientes sedentários; Pacientes com DP que realizam assistência fisioterapêutica apresentam parâmetros pulmonares melhores do que controles sedentários, e próximos ao de sujeitos controles ativos.

METODOLOGIA

Trata-se de estudo experimental misto, com acompanhamento longitudinal e análises transversais, formado por 37 sujeitos de ambos os gêneros, divididos em quatro grupos independentes: G1 (composto por pacientes diagnosticados com DP1010. Hughes AJ, Daniel SE, Kilford L, Lees AJ. Accuracy of clinical diagnosis of idiopathic Parkinson's disease: a clinico-pathological study of 100 cases. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 1992;55(3):181-4. em estadiamento moderado1111. Hoehn MM, Yahr MD. Parkinsonism: onset, progression and mortality. Neurology. 1967;17(5):427-42. e praticantes de um programa de fisioterapia de 6 meses de duração); G2 (formado por pacientes com DP1010. Hughes AJ, Daniel SE, Kilford L, Lees AJ. Accuracy of clinical diagnosis of idiopathic Parkinson's disease: a clinico-pathological study of 100 cases. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 1992;55(3):181-4. em estágio moderado1111. Hoehn MM, Yahr MD. Parkinsonism: onset, progression and mortality. Neurology. 1967;17(5):427-42. não praticantes do programa de fisioterapia); G3 (formado por participantes sem doenças crônico-degenerativas e praticantes do programa de fisioterapia em questão) e G4 (composto por sujeitos controles em relação à doença e em relação ao programa de fisioterapia). As diretrizes estipuladas pelo STROBE1212. von Elm E, Altman DG, Egger M, Pocock SJ, Gøtzsche PC, Vandenbroucke JP. The Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) statement: guidelines for reporting observational studies. J Clin Epidemiol. 2008;61(4):344-9. e pelo CONSORT1313. Moher D. Consolidated Standards of Reporting Trials. JAMA. 1998;279(18):1489-91. foram utilizadas para caracterização dos aspectos transversais e longitudinais desta pesquisa, tendo respaldo ético sido obtido no comitê de ética institucional (protocolo no 438.277).

Sobre os critérios de inclusão, foram admitidos participantes (com e sem DP) que apresentavam independência funcional para ortostatismo e bipedestação. Como critérios de exclusão estipularam-se hábitos tabágicos pregressos, afecções respiratórias prévias, deformidades torácicas e declínio cognitivo (avaliado pelo Miniexame do Estado Mental1414. Folstein MF, Folstein SE, McHugh PR. Mini-Mental State: a practical method for grading the cognitive state of patients for clinician. J Psychiatr Res. 1975;12(3):189-98. e referenciado por notas de corte estipuladas por Brucki et al.1515. Brucki SMD, Nitrini R, Caramelli P, Bertolucci PHF, Okamoto IH. Suggestions for utilization of the mini-mental state examination in Brazil. Arq Neuropsiquiatr. 2003;61(3B):777-81.)). Além disso, foram excluídos deste estudo aqueles sujeitos que realizavam qualquer atividade física regular além do protocolo fisioterapêutico proposto neste estudo.

O cálculo do tamanho amostral se deu a partir dos escores dos sujeitos obtidos na relação do volume expiratório forçado do 1º segundo com a capacidade vital. Por meio dele, identificamos um efeito de 0,771 que delimitou uma amostra mínima de 32 sujeitos, diante de análises provenientes de 4 grupos independentes, sob erro tipo 1 em 5% (α=0,05) e erro tipo 2 em 10% (1-β=0,90).

Protocolo proposto

O protocolo metodológico envolveu 4 grupos independentes, sendo 2 submetidos a um programa de exercícios fisioterapêuticos e 2 mantiveram-se inativos. Dentro dos grupos fisicamente ativos e sedentários, houve a divisão de sujeitos com e sem DP, para investigar o efeito da condição clínica e da prática de exercício sobre os parâmetros pulmonares.

O mesmo protocolo terapêutico foi aplicado nos participantes com e sem DP, durante seis meses. Nas sessões foram delimitadas, como estratégias terapêuticas, a idealização de exercícios que promovessem estímulos respiratórios e motores dos sujeitos - enfatizando atividades de rotação de tronco, dissociação de cinturas, e mobilidade de membros superiores e inferiores. Todos os dias a sessão foi iniciada com alongamentos gerais, realizados de forma ativa e ativo-assistida. Ao final de cada sessão, realizavam-se atividades lúdicas, com estímulos à motricidade.

A parte principal das sessões envolviam atividades com os sujeitos sentados e em pé, promovendo estímulos de força muscular, coordenação e marcha. Os exercícios foram realizados mediante feedback respiratório, enfatizando estímulos pulmonares expansivos (como inspiração profunda, respiração fracionada em tempos, expiração abreviada e inspiração sustentada) e mobilidade torácica. Nenhum incentivador respiratório (inspirômetro a volume ou fluxo) foi utilizado pelos participantes. Os materiais utilizados na terapia consistiram em bolas suíças de vários tamanhos, rolos, pranchas de equilíbrio, bastões, fitas elásticas e colchonetes.

A intensidade dos exercícios foi calibrada por meio da escala de Borg, devendo as atividades estar graduadas entre os escores 11 (relativamente fácil) e 14 (ligeiramente cansativo)1616. Wilson RC, Jones PW. A comparison of the visual analogue scale and modified Borg scale for the measurement of dyspnea during exercise. Clin Sci. 1989;76(3):277-82.. O limite de quatro faltas foi delimitado como parâmetro de permanência neste estudo, tendo em vista a interferência da ausência do tratamento sobre os resultados.

Procedimentos avaliativos

Os procedimentos avaliativos envolveram a mensuração da cirtometria torácica, padronizada nos pontos axilares direito e esquerdo do paciente. Mediante esse procedimento foi possível analisar a mobilidade do tórax nas situações de respiração normal, inspiração e expiração máxima sustentadas.

As coletas espirométricas e oscilométricas de impulso foram realizadas no Ambulatório de Pneumologia do Complexo Hospitalar da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Para espirometria utilizamos o equipamento Viasys Healthcare Vmax 229(r) (Viasys Heathcare, Yorba Linda, USA), na qual foi possível investigar os parâmetros de capacidade vital (CV), volume expiratório forçado no 1º segundo (VEF1), capacidade vital forçada (CVF), relações VEF1/CVF e VEF1/VC, pico de fluxo expiratório (PFE) e fluxo expiratório entre 25-75% do volume total expirado (FEF25-75%). Para oscilometria de impulso utilizamos o aparelho IOS Care Fusion Jaegar(r), que tornou possível análise dos parâmetros de volume total (VT), resistência central das vias aéreas (R5), resistência periférica das vias aéreas (R20) e reactância pulmonar (X5).

Quanto à dinâmica das avaliações, todos os procedimentos foram realizados no período matutino, sendo os pacientes com DP avaliados na fase off da medicação. A técnica oscilométrica foi aplicada anterior à espirométrica, pelo fato da primeira envolver uma atividade passiva, sem esforço do paciente.

Sobre a oscilometria de impulso, os participantes foram orientados a respirar calmamente através de um bocal (volume corrente e de forma espontânea). Durante as manobras fez-se uso de um clipe nasal e as bochechas dos sujeitos foram apoiadas pelas mãos do avaliador para minimizar a perda de pressão oscilatória oriunda da musculatura da face e das vias aéreas superiores. No que se refere à espirometria, as recomendações normativas da American Thoracic Society1717. American Thoracic Society Statement: guidelines for the six-minute walk test. Am J Respir Crit Care Med. 2002;166(1):111-7. foram contempladas e os valores preditos foram calculados de acordo com a referências de normalidade estabelecidos por Pereira et al.1818. Pereira CAC, Sato T, Rodrigues SC. Novos valores de referência para espirometria forçada em brasileiros adultos de raça branca. J Bras Pneumol. 2007;33(4):397-406.. Um avaliador externo especialista na área pneumofuncional ficou responsável pela realização dos laudos espirométricos de cada participante, classificando-os como "padrão normal", "distúrbio ventilatório obstrutivo" ou "distúrbio ventilatório restritivo".

Procedimentos estatísticos

Em relação à análise estatística, os dados descritivos foram detalhados por meio de média, erro-padrão e intervalo de confiança, estipulado em 95%. Os preceitos de normalidade e homogeneidade das variâncias foram verificados pelos testes de Shapiro-Wilk e Levenne, que alertaram para necessidade de estatística não paramétrica na análise inferencial.

Assim sendo, aplicamos o teste qui-quadrado para analisar a proporção de pessoas e a classificação do laudo espirométrico em cada grupo. Ainda que este estudo tenha consistido em uma pesquisa longitudinal de 6 meses de acompanhamento, concentramos as análises estatísticas nos pontos finais pós-intervenção, entendendo que a investigação das interações provenientes das relações de 4 grupos independentes e 2 momentos distintos requereriam repetidas análises dos fatores "interação", "grupos" e "momentos" que tenderiam a aumentar o erro tipo 1 dos testes. Assim, o teste de Kruskal-Wallis foi utilizado para analisar as variáveis antropométricas, espirométricas e oscilométricas finais dos grupos - apresentando o pós-teste Dunnett T3 para realizar comparação aos pares no caso de diferenças significativas. Para todas as análises foi adotado um nível de significância de 5% (p<0,05).

RESULTADOS

Este estudou abordou inicialmente 40 participantes, sendo 20 com DP (G1=13 e G2=7) e 20 controles (G3=12 e G4=8). Entretanto, três sujeitos foram excluídos (2 com DP e 1 controle) por apresentarem valores cognitivos abaixo dos escores referenciados por Brucki et al.1515. Brucki SMD, Nitrini R, Caramelli P, Bertolucci PHF, Okamoto IH. Suggestions for utilization of the mini-mental state examination in Brazil. Arq Neuropsiquiatr. 2003;61(3B):777-81.. Dos 37 sujeitos que iniciaram o estudo, ocorreram 5 perdas amostrais (13,51%), permanecendo 17 pacientes com DP e 15 controles na avaliação final. Os motivos relacionados às perdas amostrais envolveram mudança de residência (n=2), diagnóstico de quadro demencial durante o período de acompanhamento (n=1) e motivos particulares (n=2). Nenhum sujeito foi excluído por intolerância ao tratamento proposto.

Permaneceram no final do estudo 32 idosos, sendo 15 homens (46,87%) e 17 mulheres (53,13%), com idade média de 69,77±1,66 anos (95% IC: 63,37 a 73,17). A Tabela 1 demonstra as características gerais dos grupos. Conforme observado, os grupos são homogêneos para tamanho amostral, peso, índice de massa corpórea, cognição, nível de escolaridade e cirtometria torácica. A única diferença observada na caracterização inicial refere-se à altura dos participantes, tendo a comparação aos pares evidenciada diferença significativa entre os grupos G1 e G4.

Tabela 1
Características antropométricas dos grupos

Espirometria e oscilometria de impulso

A Tabela 2 detalha os valores obtidos na espirometria e oscilometria de impulso dos participantes. Os laudos espirométricos apontam para 30 sujeitos com respostas ventilatórias condizentes a parâmetros de normalidade e 2 com distúrbio obstrutivo leve. Estes dois participantes estavam alocados no grupo G2 (DP sedentários), tendo o teste qui-quadrado apontado diferença significativa para essa condição (p=0,026).

Tabela 2
Valores da espirometria e oscilometria de impulso por grupo

A análise individualizada de cada fator espirométrico evidenciou diferença significativa entre grupos para VC, VEF1 e CVF. A comparação aos pares apontou que, para as variáveis em questão, os participantes com DP que realizaram a assistência fisioterapêutica encontraram-se com melhores valores pulmonares do que os participantes com DP sedentários (não praticantes do referido programa). Quando comparados aos sujeitos eutróficos controles, os participantes fisicamente ativos com DP apresentaram melhores resultados espirométricos do que os controles sedentários (não praticantes do programa de fisioterapia), e resultados similares ao de controles ativos (praticantes do programa).

Os resultados obtidos pela oscilometria de impulso apontaram similaridade de valores dos grupos para resistências aéreas central e periférica, e para reactância pulmonar. Foi observada diferença significativa entre grupos para a variável VT, na qual delimitou diferença apenas na comparação entre os grupos G1 e G2 (formado por participantes com DP ativos e sedentários). As demais comparações não apresentaram significância estatística.

DISCUSSÃO

Na literatura ainda não há um consenso sobre o tipo de disfunção pulmonar predominante na DP, sendo possível observar deficiência ventilatória tanto obstrutiva quanto restritiva44. Pal PK, Shathyaprabha TN, Tuhina P, Thennarasu K. Pattern of subclinical pulmonary dysfunction in Parkinson's disease and the effect of levodopa. Mov Disord. 2007;22(3):420-4.), (1919. Li CH, Chen WC, Liao WC, Tu CY, Lin CL, Sung FC et al.. The association between chronic obstructive pulmonary disease and Parkinson's disease: a nationwide population-based retrospective cohort study. QJM. 2015;108(1):39-45.. Por tal motivo utilizamos a espirometria e a oscilometria de impulso para investigar a disfunção pulmonar característica e comparar escores entre grupos.

Ao analisar os valores espirométricos dos sujeitos constatamos que dois participantes apresentavam padrão de distúrbio obstrutivo leve e 30 apresentavam padrões normais de função pulmonar. O fato dos dois sujeitos com distúrbios obstrutivos se encontrarem no grupo G2, formado por sujeitos com DP e fisicamente sedentários, vislumbra que ambos os fatores podem estar atrelados ao aparecimento do processo obstrutivo. Tendo em vista que esse padrão não foi observado no grupo de pacientes com DP fisicamente ativos e tampouco no grupo de sujeitos eutróficos inativos, é possível afirmar que a resposta encontrada esteja vinculada a essas duas condições, nas quais quanto maior for a gravidade da DP, maior tende a ser a inatividade física do paciente, predispondo-o ao aparecimento de distúrbios ventilatórios. Reforçando tais resultados está a Tabela 2, que indica resultados sensivelmente menores dos sujeitos do G2 em relação aos demais. Esse achado corrobora os encontrados por Seccombe et al.2020. Seccombe LM, Giddings HL, Rogers PG, Corbett AJ, Hayes MW, Peters MJ et al. Abnormal ventilatory control in Parkinson's disease--further evidence for non-motor dysfunction. Respir Physiol Neurobiol. 2011;179(2-3):300-4. e reforça os laudos espirométricos, que predizem a uma associação do declínio das funções pulmonares com a DP e a inatividade física.

A oscilometria de impulso é o exame responsável por medir volume total, resistência e reactância pulmonar. Essa técnica é de grande utilidade, pois, quando aplicada de forma complementar à espirometria, possibilita um diagnóstico mais preciso da função pulmonar dos sujeitos. Nos participantes deste estudo foi possível observar um menor volume pulmonar total do G2 em relação aos demais grupos. Sobre isso, cabe refletir que o volume total é caracterizado pelo equilíbrio das forças de expansão e retração pulmonar2121. Polatli M, Akyol A, Cildag O, Bayülkem K. Pulmonary function tests in Parkinson's disease. Eur J Neurol. 2001;8(4):341-5.. Os parâmetros de volume total observados no grupo de pacientes com DP fisicamente ativos evidenciam padrões semelhantes em relação aos sujeitos eutróficos - remetendo a benefícios gerados pelo programa fisioterapêutico na população em questão.

Outro achado que merece reflexão envolve a reactância pulmonar, que é medida a 5Hz e representa a capacitância periférica que reproduz a elasticidade pulmonar diante de alterações de volumes pulmonares. Neste estudo não encontramos diferença entre grupos para essa variável, estando os escores compatíveis à faixa de normalidade identificada por Schultz et al.2222. Schulz H, Flexeder C, Behr J, Heier M, Holle R, Huber RM et al. Reference values of impulse oscillometric lung function indices in adults of advanced age. PLoS One. 2013;8(5):e63366.. Ainda, o laudo oscilométrico individual reforça os parâmetros de normalidade dos participantes - com traçados de resistência e reactância próximos à linha de referência e valor de ressonância2323. Assumpção MS, Gonçalves RM, Ferreira LG, Schivinski CIS. Sistema de oscilometria de impulso em pediatria: revisão de literatura. Medicina. 2014;47(2):131-42..

A mobilidade da caixa torácica pode representar um viés dos estudos que abordam as características pneumofuncionais dos sujeitos, uma vez que ela exerce influência direta na força muscular respiratória dos pacientes2424. Lanza Fde C, de Camargo AA, Archija LR, Selman JP, Malaguti C, Dal Corso S. Chest wall mobility is related to respiratory muscle strength and lung volumes in healthy subjects. Respir Care. 2013;58(12):2107-12.. Ao realizarmos a avaliação cirtométrica de todos os participantes e constatarmos semelhança estatística entre os grupos nas comparações da amplitude torácica, comprovamos que tal fator não exerceu qualquer influência sobre os valores da espirometria e da oscilometria de impulso dos sujeitos. Além disso, a exclusão de pacientes com possível alteração na dinâmica torácica (comumente presente nos casos de deformidades estruturais) nos possibilitou isolar esse viés na seleção amostral.

É importante destacar que todos os pacientes com DP foram avaliados na fase off da medicação. A nossa delimitação a essa condição se deu pela intenção de investigarmos os parâmetros pulmonares reais dos participantes, sem a influência da medicação antiparkinsoniana2525. Monteiro L, Souza-Machado A, Valderramas S, Melo A. The effect of levodopa on pulmonary function in Parkinson's disease: a systematic review and meta-analysis. Clin Ther. 34(5):1049-55.. Contudo, sugerimos novos estudos que comparem as avaliações pulmonares dos sujeitos com e sem o efeito da medicação, para analisar os parâmetros pulmonares de sujeitos fisicamente ativos e sedentários durante as fases on e off da administração medicamentosa.

Limitações

Ainda que identifiquemos méritos e qualidades na pesquisa em questão, as suas limitações não devem ser negligenciadas. Em primeiro lugar, é importante destacar que os resultados foram baseados em pacientes que se encontravam em grau moderado de acometimento da doença. A exclusão de sujeitos em estágios iniciais e avançados se deu pela intenção dos autores em padronizar a amostra, evitando os casos nos quais os sintomas da doença estivessem pouco expressivos e outros em que o grau de debilidade física estivesse altamente incapacitante.

Em segundo lugar, é importante destacar fragilidades em relação ao desenho metodológico apresentado. Ainda que entendamos que estudos longitudinais do tipo ensaio clínico sejam mais fiéis para a identificação de relações de causas e efeitos, justificamos a realização de análises transversais sob um acompanhamento de seis meses com o objetivo de controlar os erros estatísticos. A realização de análises mistas provenientes da investigação de 4 grupos independentes e 2 momentos distintos requereria 6 combinações de interação grupo x momento (G1 vs G2; G1 vs G3; G1 vs G4; G2 vs G3; G2 vs G4 e G3 vs G4), fato que poderia aumentar o erro tipo 1 para 26,49% (acima dos 5% aceitos). Assim, optamos por restringir a análise final a uma visão transversal controlada por pós-testes que, de um lado, impossibilita comparação pré e pós-tratamento, por outro, nos dá a certeza de que os dados não estão sob a influência de "falsos positivos" e "falsos negativos".

CONCLUSÃO

Pacientes com DP que realizaram assistência fisioterapêutica apresentam resultados notórios de função pulmonar em relação a participantes sedentários (com e sem DP). A inatividade física associada à DP pode estar vinculada ao aparecimento de distúrbios ventilatórios obstrutivos, potencializado pela piora clínica do paciente. Ainda que os resultados encontrados sejam promissores, recomendamos o desenvolvimento de novos estudos que abordem a mesma temática deste trabalho, a fim de corroborar ou não os achados e aprimorar discussões sobre o tema.

AGRADECIMENTOS

Agrademos o apoio e suporte promovido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Processo nº 441886/2014-0).

REFERÊNCIAS

  • 1
    Lalley PM. The aging respiratory system: pulmonary structure, function and neural control. Respir Physiol Neurobiol. 2013;187(3):199-210.
  • 2
    Sanches SS, Santos FM, Fernandes JM, Santos MLM, Müller PT, Christofoletti G. Neurodegenerative disorders increase decline in respiratory muscle strength in older adults. Respir Care. 2014;59(12):1838-45.
  • 3
    Sathyaprabha TN, Kapavarapu PK,.Pal PK, Thennarasu K, Raju TR. Pulmonary Functions in Parkinson's Disease. Indian J Chest Dis Allied Sci. 2005; 47(4):251-7.
  • 4
    Pal PK, Shathyaprabha TN, Tuhina P, Thennarasu K. Pattern of subclinical pulmonary dysfunction in Parkinson's disease and the effect of levodopa. Mov Disord. 2007;22(3):420-4.
  • 5
    Silverman EP, Sapienza CM, Saleem A, Carmichael C, Davenport PW, Hoffma-Ruddy B et al. Tutorial on maximum inspiratory and expiratory mouth pressures in individuals with idiopathic Parkinson disease (IPD) and the preliminary results of an expiratory muscle strength training program. NeuroRehabilitation. 2006;21(1):71-9.
  • 6
    Huber JE, Darling M, Francis EJ, Zhang D. Impact of typical aging and Parkinson's disease on the relationship among breath pausing, syntax, and punctuation. Am J Speech Lang Pathol. 2012;21(4):368-79.
  • 7
    Monteiro L, Souza-Machado, Pinho P, Sampaio M, Nóbrega AC, Melo A. Swallowing impairment and pulmonary dysfunction in Parkinson's disease: the silent threats. J Neurol Sci. 2014;339(1-2):149-52.
  • 8
    Polatli M, Akyol A, Coldag O, Bayülkem K. Pulmonary function tests in Parkinson's disease. Eur J Neurol. 2001;8(4):341-5.
  • 9
    Reyes A, Ziman M, Nosaka K. Respiratory muscle training for respiratory deficits in neurodegenerative disorders: a systematic review. Chest. 2013;143(5):1386-94.
  • 10
    Hughes AJ, Daniel SE, Kilford L, Lees AJ. Accuracy of clinical diagnosis of idiopathic Parkinson's disease: a clinico-pathological study of 100 cases. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 1992;55(3):181-4.
  • 11
    Hoehn MM, Yahr MD. Parkinsonism: onset, progression and mortality. Neurology. 1967;17(5):427-42.
  • 12
    von Elm E, Altman DG, Egger M, Pocock SJ, Gøtzsche PC, Vandenbroucke JP. The Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) statement: guidelines for reporting observational studies. J Clin Epidemiol. 2008;61(4):344-9.
  • 13
    Moher D. Consolidated Standards of Reporting Trials. JAMA. 1998;279(18):1489-91.
  • 14
    Folstein MF, Folstein SE, McHugh PR. Mini-Mental State: a practical method for grading the cognitive state of patients for clinician. J Psychiatr Res. 1975;12(3):189-98.
  • 15
    Brucki SMD, Nitrini R, Caramelli P, Bertolucci PHF, Okamoto IH. Suggestions for utilization of the mini-mental state examination in Brazil. Arq Neuropsiquiatr. 2003;61(3B):777-81.
  • 16
    Wilson RC, Jones PW. A comparison of the visual analogue scale and modified Borg scale for the measurement of dyspnea during exercise. Clin Sci. 1989;76(3):277-82.
  • 17
    American Thoracic Society Statement: guidelines for the six-minute walk test. Am J Respir Crit Care Med. 2002;166(1):111-7.
  • 18
    Pereira CAC, Sato T, Rodrigues SC. Novos valores de referência para espirometria forçada em brasileiros adultos de raça branca. J Bras Pneumol. 2007;33(4):397-406.
  • 19
    Li CH, Chen WC, Liao WC, Tu CY, Lin CL, Sung FC et al.. The association between chronic obstructive pulmonary disease and Parkinson's disease: a nationwide population-based retrospective cohort study. QJM. 2015;108(1):39-45.
  • 20
    Seccombe LM, Giddings HL, Rogers PG, Corbett AJ, Hayes MW, Peters MJ et al. Abnormal ventilatory control in Parkinson's disease--further evidence for non-motor dysfunction. Respir Physiol Neurobiol. 2011;179(2-3):300-4.
  • 21
    Polatli M, Akyol A, Cildag O, Bayülkem K. Pulmonary function tests in Parkinson's disease. Eur J Neurol. 2001;8(4):341-5.
  • 22
    Schulz H, Flexeder C, Behr J, Heier M, Holle R, Huber RM et al. Reference values of impulse oscillometric lung function indices in adults of advanced age. PLoS One. 2013;8(5):e63366.
  • 23
    Assumpção MS, Gonçalves RM, Ferreira LG, Schivinski CIS. Sistema de oscilometria de impulso em pediatria: revisão de literatura. Medicina. 2014;47(2):131-42.
  • 24
    Lanza Fde C, de Camargo AA, Archija LR, Selman JP, Malaguti C, Dal Corso S. Chest wall mobility is related to respiratory muscle strength and lung volumes in healthy subjects. Respir Care. 2013;58(12):2107-12.
  • 25
    Monteiro L, Souza-Machado A, Valderramas S, Melo A. The effect of levodopa on pulmonary function in Parkinson's disease: a systematic review and meta-analysis. Clin Ther. 34(5):1049-55.
  • 1
    Estudo realizado na Clínica Escola Integrada e no Ambulatório de Pneumologia, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) - Campo Grande (MS), Brasil.
  • 2
    Fonte de financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
  • 4
    Aprovado pelo Comitê de Ética: Protocolo nº 438.277.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    Dez 2015
  • Aceito
    Jan 2016
Universidade de São Paulo Rua Ovídio Pires de Campos, 225 2° andar. , 05403-010 São Paulo SP / Brasil, Tel: 55 11 2661-7703, Fax 55 11 3743-7462 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revfisio@usp.br