Estimulação Elétrica Neuromuscular no Envelhecimento Facial: uma Revisão Integrativa da Literatura

RESUMO

Embora seja um processo fisiológico natural, o envelhecimento é considerado degenerativo. Seus efeitos são evidentes na pele envelhecida, que apresenta redução de elasticidade, gordura e tônus muscular, assim como rugas, flacidez, alteração de contornos e sarcopenia. Tais mudanças podem gerar um estigma social e desconforto psicológico para o seu portador. Nesse contexto, objetivou-se avaliar a eficácia do uso da estimulação elétrica neuromuscular (EENM), uma técnica utilizada na Fisioterapia para o treinamento muscular, visando à atenuação dos sinais do envelhecimento facial. Para isso, foi realizado um levantamento de publicações indexadas nas plataformas MEDLINE (PubMed), CINAHL, Embase, PEDro, LILACS, ERIC, Scopus, Web of Science e Google Scholar e, a partir de critérios preestabelecidos, foram selecionadas duas publicações relevantes sobre o tema. A literatura científica sobre o uso da EENM na atenuação dos sinais do envelhecimento ainda é escassa. O levantamento revelou a necessidade de uma discussão a respeito do estado atual do conhecimento. Os resultados desta revisão sugerem que a EENM pode ser um método promissor de treinamento muscular quando aplicado à atenuação dos sinais de envelhecimento. Contudo, ainda há poucas evidências quanto à eficácia da EENM na musculatura da face, visto que poucos estudos relacionam a EENM ao rejuvenescimento facial. São necessários estudos com maior rigor metodológico, a fim de minimizar vieses, e utilização de técnicas precisas de avaliação, permitindo a elucidação do mecanismo fisiológico do estímulo muscular e sua inter-relação com o sistema tegumentar e possibilitando a comprovação da eficácia da EENM na melhoria da aparência da pele facial.

Descritores:
Estimulação Elétrica Neuromuscular; Treinamento Muscular; Envelhecimento da Pele; Fisioterapia

ABSTRACT

Despite of being a natural physiological process, aging is considered a degenerative process with evident effects on aging skin, such as reduced elasticity, wrinkles, reduced facial fat and muscle tone, sagging, changes in facial contour, and sarcopenia on the face. These changes can generate social stigma, suffering, and psychological discomfort for the patient. Thus, this study aimed to evaluate the effectiveness of Neuromuscular Electrical Stimulation (NMES), a technique used in physical therapy for muscle training, in attenuating the signs of facial aging. For this purpose, a scientific survey of publications indexed on the Medline (PubMed), CINAHL, Embase, PEDro, Lilacs, ERIC, Scopus, Web of Science, and Google Scholar databases was conducted and, based on pre-established criteria, two relevant publications for the topic were selected for discussion. The scientific literature regarding the use of NMES to attenuate the signs of aging is still very scarce. The survey showed the need to discuss the current state of knowledge. Our results suggest that, theoretically, NMES could be a promising method to attenuate the signs of aging; however, there are still no conclusive results regarding the clinical effectiveness of using NMES in the facial muscles since few studies relate NMES to facial rejuvenation. More studies are needed, with greater methodological rigor and low level of bias, using precise techniques in the evaluation and allowing to interpret with greater scientific commitment of the physiological mechanism of the muscular stimulus and its interrelation with the integumentary system, proving its effectiveness in the improvement of skin appearance.

Keywords:
Neuromuscular Electrostimulation; Muscle Training; Skin Aging; Physical Therapy

RESUMEN

El envejecimiento es un proceso fisiológico natural, aunque se considera un proceso degenerativo. Sus efectos son evidentes en la piel envejecida, que presenta disminución de la elasticidad, grasa y tono muscular, así como arrugas, flacidez, cambios de contorno y sarcopenia. Estos cambios pueden generar un estigma social y malestar psicológico para el portador. En ese contexto, el objetivo de este estudio fue evaluar la efectividad del uso de la estimulación eléctrica neuromuscular (NMES), una técnica utilizada en Fisioterapia de entrenamiento muscular para atenuar los signos del envejecimiento facial. Para ello, se realizó un relevamiento de las publicaciones indexadas en las plataformas MEDLINE (PubMed), CINAHL, Embase, PEDro, LILACS, ERIC, Scopus, Web of Science y Google Scholar, y, con base en criterios preestablecidos, se seleccionaron dos publicaciones relevantes sobre el tema. La literatura científica sobre el uso de NMES en la atenuación de los signos del envejecimiento es aún escasa. La búsqueda reveló la necesidad de una discusión sobre el estado actual del conocimiento. Los resultados de esta revisión sugieren que la NMES puede ser un método prometedor de entrenamiento muscular cuando se aplica para atenuar los signos del envejecimiento. Sin embargo, todavía hay poca evidencia con respecto a la efectividad de NMES en los músculos faciales, ya que pocos estudios relacionan NMES con el rejuvenecimiento facial. Son necesarios estudios con mayor rigor metodológico para minimizar sesgos y el uso de técnicas de evaluación precisas, que permitan dilucidar el mecanismo fisiológico del estímulo muscular y su interrelación con el sistema tegumentario y que permitan probar la eficacia de la NMES en la mejora del aspecto de la piel del rostro.

Palabras clave:
Electroestimulación Neuromuscular; Entrenamiento Muscular; Envejecimiento de la Piel; Fisioterapia

INTRODUÇÃO

O envelhecimento é um processo de enfraquecimento estrutural biologicamente programado, gradativo, complexo, irreversível e que gera diversas alterações no organismo, aumentando o risco de doenças e modificando funcionalmente células e tecidos. Seus efeitos costumam aparecem a partir da terceira década de vida e progridem ao longo dos anos^{1), (2}.

Na pele, o envelhecimento é o resultado combinado de dois tipos de fatores: intrínsecos e extrínsecos. Os fatores intrínsecos estão relacionados às mudanças fisiológicas naturais que ocorrem devido ao envelhecimento geneticamente programado, regulado majoritariamente por hormônios. Já os fatores extrínsecos estão relacionados aos hábitos de vida do indivíduo e às condições ambientais que o influenciam. Alguns fatores que podem acelerar o processo de envelhecimento são: o consumo de álcool e cigarros, a posição ao dormir, expressões faciais repetitivas e estresse emocional, bem como a ação da gravidade e a exposição aos raios solares e à poluição^{1)- (4}. Além disso, com a idade, ocorre a decadência funcional da pele, o que diminui a capacidade de renovação celular e de resposta a lesões e cicatrização, além de reduzir sua função de barreira, proteção mecânica, capacidade de reparo de DNA, percepção sensorial, responsividade imunológica e vascular, termorregulação e, finalmente, produção de suor, sebo e vitamina D^{2), (5}.

O envelhecimento facial

A face é a região do corpo que se relaciona mais diretamente com o mundo exterior e, devido ao aumento da expectativa de vida mundial e consequente aumento da população idosa, intensificou-se a preocupação com a perda das características que compõem a imagem do que é considerado como “boa aparência”, visto que muitos indivíduos reagem às mudanças causadas pelo envelhecimento com profundo sentimento de dor, medo e inaceitação, desenvolvendo distúrbios psicológicos como ansiedade e depressão⁶.

O envelhecimento facial é o resultado cumulativo das alterações ocorridas na pele, nos tecidos moles e no arcabouço osteocartilaginoso ao longo dos anos. Sua análise pode ser embasada na definição de pele como estrutura sustentada por um arcabouço subjacente, um sistema de suporte e um envelope externo⁷. O arcabouço é o esqueleto ósseo e, dentre as estruturas de suporte, podem-se citar as cartilagens nasal e auricular e o tarso das pálpebras inferiores, que, por sua vez, são complementadas pelo sistema músculo-fascial. Já o sistema músculo-aponeurótico superficial (SMAS) ⁽⁸ está diretamente conectado ao envelope externo da pele por meio dos septos fibrosos interlobulares da gordura; e o envelope é representado pela pele e o tecido subcutâneo⁹.

Descrito em 1974 por Mitz e Peyronie, o SMAS é uma unidade morfológica complexa que divide o tecido subcutâneo em duas partes e consiste em uma camada fibromuscular que conecta os músculos miméticos da face entre si e com a pele, sendo contínua com o platisma. O SMAS se estende desde a região malar até o terço superior da face, juntando-se à gálea aponeurótica; para o terço inferior, torna-se parte do platisma e, lateralmente, no terço médio, se interdigita à fáscia da parótida (sobre a glândula parótida). Sua função é amplificar as contrações dos músculos nas expressões faciais, irradiando-as da face para a pele^{8)- (11}. Para melhor visualização, foram desenvolvidas duas ilustrações mostrando os músculos superficiais da face (Figura 1) e a descrição da posição do SMAS (Figura 2).

Figura 1
Meia face: comparação da camada exterior com a musculatura superficial da face

Figura 2
Representação do sistema músculo-aponeurótico superficial

A estabilidade da estrutura facial também é sustentada por elementos conectivos especializados que garantem a posição de estruturas específicas do arcabouço, como os tendões medial e lateral dos cantos dos olhos, que estabilizam e ligam o tarso às várias estruturas fibrosas que interconectam as cartilagens nasais⁷. A redução da elasticidade intrínseca da pele pode levar à atenuação do sistema de suporte, que pode ser observada no ectrópio palpebral, causado pelo estiramento do tendão do canto lateral do olho, e na ptose nasal, provocada pela alteração do suporte fibroso de suas cartilagens. O sistema músculo-fibroso também se atenua, rearranjando a pele em pregas, conhecidas como rugas¹². Existem dois tipos de rugas observáveis durante a vida: as gravitacionais, decorrentes das atrofias associadas à própria gravidade e que, normalmente, levam a ptoses do tecido; e as dinâmicas, decorrentes dos movimentos gerados nas expressões faciais e que seguem as linhas de tração da pele^{13), (14}.

Adicionalmente, com a idade, há a redução da gordura facial, do tônus muscular e da elasticidade, além da reabsorção óssea, levando à perda da plenitude facial e alteração do contorno associados à flacidez e a um relativo excesso de pele facial, provocando um processo de quadralização facial^{15), (16}.

A restauração das características que conferem volume é o objetivo de muitos procedimentos de rejuvenescimento facial que consideram a face como um todo e conferem importância à manutenção da tridimensionalidade facial, e não apenas ao tratamento das rugas¹⁶. A redução da massa e da força muscular esquelética (sarcopenia) também faz parte do processo normal de envelhecimento; no entanto, como as fibras musculares esqueléticas retêm considerável plasticidade na velhice, a sarcopenia pode ser parcialmente recuperada de acordo com a demanda funcional¹⁵.

Contudo, os efeitos do envelhecimento na pele podem ser tanto postergados - com a prevenção do envelhecimento precoce e a melhora da qualidade de vida - quanto mitigados por meio de intervenções e estratégias de amenização destes efeitos¹³. Dentre as metodologias não invasivas de atenuação dos sinais do envelhecimento da pele, podem-se citar a massagem facial para relaxamento e diminuição da tensão muscular, exercícios faciais para melhora do tônus muscular e firmeza da pele^{17), (18} e a estimulação elétrica neuromuscular (EENM) ⁽¹⁹.

As aplicações da estimulação elétrica neuromuscular

O primeiro estudo relacionado à contração muscular a partir de corrente elétrica foi realizado em 1790 por Luigi Galvani²⁰. A terapia clínica por EENM produz espasmos (tetania) e consequente contração muscular, sendo utilizada para fins “funcionais”. Sua conceituação é encontrada na literatura desde 1964²¹, e a técnica se baseia nos princípios fisiológicos da excitabilidade dos nervos e fibras musculares, tendo mostrado resultados positivos em diversos tipos de tratamentos clínicos^{21)- (25}. Hoje, a aplicação da EENM vem sendo implementada também no segmento estético para o fortalecimento da musculatura facial, principalmente de mulheres, almejando o aumento da massa muscular e, consequentemente, a atenuação da aparência envelhecida, amparados no uso consagrado pela Fisioterapia no que concerne ao fortalecimento muscular em processos de reabilitação^{15), (19), (26)- (28}.

A EENM pode provocar mudanças a longo prazo nos nervos e nos músculos devido à indução da atividade elétrica, que pode determinar as propriedades das fibras musculares, ativando uma sequência de vias de sinalização que alteram a expressão gênica do músculo²⁴. O procedimento consiste na estimulação elétrica dos músculos por meio de eletrodos específicos aderidos à superfície da pele, junto ao nervo motor - relacionado à musculatura que se pretende estimular -, o que leva à contração do músculo por despolarização das fibras nervosas. Essa contração influencia positivamente a ativação muscular e se mostra eficaz no fortalecimento da musculatura e na prevenção da atrofia²⁹.

A EENM é considerada um método de treinamento muscular para reabilitação física e um treinamento de força por meio da indução de contrações musculares sequenciadas, sustentadas pelo estímulo elétrico. O treino contínuo de resistência pode promover a hipertrofia muscular em indivíduos de todas as idades³⁰. Sua vantagem é que, além de ser uma técnica versátil, a EENM não apresenta efeitos sistêmicos, não gera dependência nem apresenta efeitos colaterais ou intercorrências indesejáveis²². A EENM vem sendo usada clinicamente para diferentes propósitos, mostrando resultados positivos para o tratamento de paralisia muscular, redução de edema, melhora da força muscular corporal, aumento da amplitude de movimentos, cicatrização de tecidos, tratamento da atrofia muscular e recuperação de pacientes em unidades de terapia intensiva e/ou afetados por doenças crônicas cardíacas e respiratórias^{21), (23)- (25}.

Diante do aumento da demanda por procedimentos estéticos e tecnologias capazes de minimizar os efeitos causados pelo envelhecimento com uma intervenção não invasiva, e considerando que a saúde não diz respeito apenas à ausência de doença, mas ao bem-estar físico, psicológico e emocional, este trabalho justifica-se pela necessidade de investigação da eficácia da técnica de EENM na atenuação dos sinais de envelhecimento na pele da face, por ser uma prática já conhecida da Fisioterapia, de baixo custo, fácil acesso e que já tem sido aplicada nas clínicas de estética no país.

Objetivo

O objetivo deste estudo é investigar a eficácia da EENM na minimização dos efeitos do envelhecimento facial por meio de uma revisão integrativa da literatura.

METODOLOGIA

A fim de investigar a relação entre o uso da EENM e o rejuvenescimento facial, foi realizado um levantamento de publicações indexadas nas plataformas MEDLINE (PubMed), CINAHL, Embase, PEDro, LILACS, ERIC, Scopus, Web of Science e Google Scholar. Na seleção de publicações utilizaram-se as palavras-chave: “electrostimulation”; “neuromuscular electrostimulation”; “muscle stimulation”; ou “NMES”, e estas foram relacionadas às seguintes palavras: “facial”; e “face muscles”, e depois associadas às seguintes finalidades: “aging”; “rejuvenation” ou “aesthetic”. A pesquisa foi realizada em um único dia e foram incluídos nesta revisão os estudos disponíveis em free full text e que se encaixaram nos critérios de inclusão, sendo estes: estudos clínicos realizados em seres humanos; que utilizaram a EENM como intervenção; tendo a face como região-alvo; como estratégia de rejuvenescimento ou com finalidade estética. Todos os estudos que não se encaixavam nesses critérios foram excluídos.

RESULTADOS

A busca de palavras-chave nas bases de dados encontrou, no total, 24 estudos e, destes, 22 foram excluídos (Figura 3)

Figura 3
Estratégia de seleção dos estudos segundo os critérios de inclusão e exclusão

Os artigos excluídos fizeram uso da EENM, mas não contemplaram o objetivo desta investigação, estando relacionados a outras finalidades e regiões de intervenção. Temas como a recuperação da mobilidade corporal e facial em casos de paralisias musculares, recuperação de mobilidade facial pós-procedimentos estéticos, procedimentos odontológicos e/ou fonoaudiológicos e uso da musculatura facial na expressão das emoções foram os mais contemplados, sendo ainda muito escassos os estudos que abordam o emprego da EENM para atenuação dos sinais do envelhecimento facial.

Portanto, para esta revisão, foram selecionados dois estudos em que o rejuvenescimento facial foi associado à EENM, os quais foram comparados quanto a delineamento, procedimentos e resultados obtidos (Tabela 1) e, também, quanto à sua qualidade, segundo a escala PEDro (Tabela 2).

Tabela 1
Caracterização dos estudos identificados

Autor/Ano	Categoria	População	Procedimentos	Instrumentos de intervenção e análise	Principais resultados
Kavanagh et al., 201215	Estudo clínico randomizado, controlado e parcialmente cego.	108 mulheres saudáveis, com idade entre 32 e 55 anos e com sinais visíveis de envelhecimento da face foram divididas aleatoriamente em dois grupos: intervenção e controle.	O grupo intervenção foi treinado no uso do dispositivo, sendo que a primeira sessão de tratamento foi realizada sob supervisão e as demais foram autoadministradas em casa. Foi selecionada uma intensidade de estimulação que fornecesse uma contração muscular visível mínima. O tratamento foi realizado por 12 semanas com o dispositivo facial EENM, por 20min/dia, cinco dias por semana. O grupo-controle não recebeu nenhuma intervenção.	Foi utilizado um dispositivo facial EENM a 70Hz; foram aplicados questionários psicométricos para percepção da condição e aparência facial, incluindo tom, firmeza, sustentação, brilho e tez; e foi realizada ultrassonografia do músculo zigomático maior usando um scanner com um transdutor linear de 7,5-9,0MHz.	O grupo intervenção apresentou aumento da espessura do músculo zigomático maior e melhorias subjetivas nos atributos faciais, como firmeza, tônus e sustentação, enquanto o grupo-controle não apresentou melhorias. As diferenças entre os grupos intervenção e controle foram estatisticamente significativas em 6 e 12 semanas.
Nakaya et al., 202228	Estudo clínico. Não há menção de todos os critérios do estudo, como a presença ou não de um grupo controle ou se o estudo foi cego em alguma instância.	10 mulheres saudáveis, na faixa etária de 21 a 22 anos. Não há descrição dos critérios de inclusão e exclusão das participantes.	As participantes foram treinadas no uso do dispositivo e autoadministraram oito procedimentos de EENM, por 20min/dia, dois dias por semana.	Foi utilizado o dispositivo Pearl Face Esthe Sonic EX (ITO CO. LTD., Saitama, Japão). Os músculos masseter e bucinadores foram avaliados por ressonância magnética, por meio do scanner ECHELON 1.5T (Hitachi, Ltd., Ibaraki, Japão), antes do início do primeiro procedimento e 2 ou 3 dias após o último dia do procedimento.	Não houve diferença significativa no volume dos músculos bucinadores direito e esquerdo antes e após o uso do aparelho facial EMS. Houve diminuição significativa do volume dos músculos masseteres direito e esquerdo após o uso do aparelho facial EMS, sugerindo que o dispositivo pode gerar um efeito benéfico sobre o músculo masseter em um curto espaço de tempo.

• EMS: electrical muscle stimulation.

Tabela 2
Avaliação da qualidade dos estudos segundo os critérios estabelecidos da escala PEDro

Critérios avaliativos	Kavanagh et al., 201215	Nakaya et al., 202228
1. Os critérios de elegibilidade foram especificados	Sim	Sim
2. Os sujeitos foram aleatoriamente distribuídos por grupos (num estudo crossover, os sujeitos foram colocados em grupos de forma aleatória de acordo com o tratamento recebido)	Sim	Não
3. A distribuição dos sujeitos foi cega	Sim	Não
4. Inicialmente, os grupos eram semelhantes no que diz respeito aos indicadores de prognóstico mais importantes	Sim	Sim
5. Todos os sujeitos participaram de forma cega no estudo	Não	Não
6. Todos os fisioterapeutas que administraram a terapia fizeram-no de forma cega	Não	Não
7. Todos os avaliadores que mediram pelo menos um resultado-chave fizeram-no de forma cega	Sim	Não
8. Medições de pelo menos um resultado-chave foram obtidas em mais de 85% dos sujeitos inicialmente distribuídos pelos grupos	Sim	Sim
9. Todos os sujeitos a partir dos quais se apresentaram medições de resultados receberam o tratamento ou a condição de controle conforme a distribuição ou, quando não foi esse o caso, fez-se a análise dos dados para pelo menos um dos resultados-chave por “intenção de tratamento”	Sim	Sim
10. Os resultados das comparações estatísticas intergrupos foram descritos para pelo menos um resultado-chave	Sim	Sim
11. O estudo apresenta tanto medidas de precisão como medidas de variabilidade para pelo menos um resultado-chave	Sim	Sim
Escore*	8	5

• *Escore: a pontuação máxima possível é 10, sendo que o primeiro critério não vale pontos. Só foram atribuídas pontuações para os critérios cuja resposta foi “sim”; para todos os que não foram completamente satisfeitos ou em que a informação não foi mencionada foi atribuída a resposta “não”.

DISCUSSÃO

A literatura científica a respeito do uso da eletroestimulação neuromuscular para amenização dos sinais do envelhecimento facial ainda é escassa, revelando a necessidade de uma discussão a respeito do estado atual do conhecimento.

A eficácia da estimulação elétrica neuromuscular na atenuação dos sinais do envelhecimento facial

Considerando os conceitos relacionados ao envelhecimento facial, às mudanças que ocorrem no arcabouço facial e às aplicações da EENM no treinamento muscular facial, alguns parâmetros são importantes para a elucidação da real eficácia da técnica para este objetivo.

Assim como acontece na prática de uma atividade física, especialmente nos exercícios voluntários, há uma relação entre a intensidade da contração muscular eletricamente induzida e os benefícios neuromusculares gerados³¹. Um dos principais fatores limitantes da estimulação elétrica poderia ser o desconforto causado pela passagem da corrente, pois a face é um local que possui muitos receptores sensoriais e terminações nervosas. Investigando isso, um estudo conduzido por Safi³² demonstrou que indivíduos saudáveis foram capazes de tolerar o estímulo neuromuscular para contração muscular, com nível aceitável de desconforto, em intensidades máximas de 60mA, aproximadamente. Com relação aos parâmetros utilizados nos estudos selecionados, não houve um consenso³².

Na dissertação de mestrado conduzida por Annala³³, em que dois dispositivos de EENM foram avaliados quanto à experiência dos usuários, a metodologia utilizada para a seleção de parâmetros aplicados aos dispositivos que tiveram sua usabilidade comparada não foi totalmente esclarecida. Foram utilizados os equipamentos Ageless Wonder, com uma frequência de 70Hz, e o equipamento Lift Plus a uma frequência de 40Hz. Antes dos experimentos, os testes da estimulação muscular e seus programas foram alinhados com relação ao nível de intensidade máxima tolerada. Cada participante ajustou o seu próprio dispositivo para uma intensidade tolerável em que fosse possível obter uma contração muscular visível³³. Provavelmente, como o principal intuito era avaliar a experiência da estimulação elétrica com relação à funcionalidade do dispositivo e à satisfação do voluntário, não se privilegiou a intenção terapêutica no estudo.

Kavanagh et al. ⁽¹⁵ empregaram a EENM em seu grupo experimental durante 12 semanas, cinco vezes por semana, durante 20 minutos. Utilizaram uma frequência de 70Hz, com uma largura de pulso de 100µs e intensidade máxima de 35mA. O procedimento foi bem tolerado, com o aparecimento de um leve eritema no local, que desapareceu espontaneamente. É válido ressaltar que esta é uma ocorrência comum em procedimentos similares da prática clínica fisioterapêutica; mas foi relatado como evento adverso persistente a fasciculação palpebral de um voluntário em um episódio esparso e que não se repetiu¹⁵.

Nakaya et al. ⁽²⁸ propuseram um estudo clínico envolvendo 10 sujeitos que foram submetidos a uma avaliação por ressonância magnética dos músculos masseter e bucinador pré e pós-intervenção por EENM. Esses músculos foram selecionados por estarem envolvidos na expressão facial. O músculo bucinador não apresentou resposta satisfatória ao procedimento, o que foi atribuído a uma falha no contato do probe com a região, visto que o operador do equipamento era o próprio usuário. Em contrapartida, o músculo masseter apresentou um resultado favorável de diminuição de volume, que não foi considerado como perda muscular, e sim como efeito de afinação do rosto²⁸.

Para avaliação da qualidade dos estudos, foi utilizada como parâmetro a escala PEDro, disponível online e em diversos idiomas no site: https://pedro.org.au/. A escala PEDro é baseada na lista de Delphi, desenvolvida por Verhagen et al. ⁽³⁴ no Departamento de Epidemiologia da Universidade de Maastricht. Os itens 8 e 10 da escala PEDro não constam na lista de Delphi e foram adicionadas posteriormente. Seu objetivo é avaliar a qualidade de estudos clínicos em Fisioterapia para facilitar a busca e aplicação de intervenções fisioterapêuticas eficazes e com evidências científicas.

Os estudos foram avaliados conforme os 11 critérios estabelecidos e pontuados de 0 a 10 de acordo com a satisfação dos critérios. Não foi atribuída pontuação ao critério 1 nem aos critérios cuja resposta foi “não”. Quanto à pontuação final atribuída aos estudos, foram considerados de alta qualidade aqueles que obtiveram escores de 6-10; média qualidade, de 4-5; e baixa qualidade, de 0-3. Sendo assim, o estudo de Kavanagh et al. foi considerado de alta qualidade e o de Nakaya et al., de média qualidade.

Ambos os estudos apresentaram vieses de condução, visto que ambos tiveram respostas não satisfeitas e/ou parcialmente satisfeitas. Alguns dos problemas levantados foram:

O procedimento de EENM foi realizado pelos próprios participantes, o que pode gerar diferenças na forma de aplicação do dispositivo, dificuldade de localização dos músculos-alvo e falta de controle e supervisão na realização do procedimento em casa;

O estudo conduzido por Kavanagh et al.¹⁵ não menciona o nome ou a marca dos dispositivos. Por sua vez, Nakaya et al.²⁸ não mencionam todas as informações a respeito da condução do estudo, como critérios de seleção dos participantes, aleatorização, presença ou não de um grupo-controle e se o estudo foi cego em alguma instância, seja por parte dos participantes, seja por parte dos pesquisadores que realizaram as análises.

Os estudos também diferem entre si quanto à metodologia de análise da musculatura estimulada, tendo sido utilizadas ultrassonografia, por Kavanagh et al. ⁽¹⁵, e ressonância magnética por Nakaya et al. ⁽²⁸. Adicionalmente, no estudo de Kavanagh et al. ⁽¹⁵ foram realizados estudos psicométricos para percepção da condição e aparência facial, incluindo tom, firmeza, sustentação, brilho e tez, medidas consideradas importantes para estudos de caráter estético, e que não foram avaliadas no estudo de Nakaya et al. ⁽²⁸.

Quanto ao mecanismo de ação da EENM para o rejuvenescimento facial, apesar de utilizada pela fisioterapia dermatofuncional, pouco se tem na literatura científica a respeito do rejuvenescimento facial a partir do ganho de trofismo da musculatura da face; porém, entende-se que o processo de sarcopenia pode ser atenuado com o treinamento muscular, tanto por meio de exercícios voluntários como por indução por eletroestimulação muscular^{26), (35}.

Sugere-se que a EENM destinada ao rejuvenescimento facial poderia atuar na otimização da circulação sanguínea local, na ativação de fibroblastos sintetizadores de colágeno e elastina e na tonificação dos músculos faciais, que, devido à ação da gravidade, tornam-se flácidos, dando a impressão de uma face envelhecida²⁴.

Outras associações poderiam ser sugeridas, visto que é de conhecimento comum que o envelhecimento vem associado a uma deterioração da pele, verificável tanto na perda de efetividade de sua função como barreira como no aumento da suscetibilidade a doenças. Aventa-se a hipótese de que uma debilidade mitocondrial seja a responsável pela alteração do metabolismo e homeostasia da pele, promovendo a instalação dos sinais do envelhecimento. A contração muscular pode induzir a secreção de interleucina-15 e funcionar como um regulador da função mitocondrial, atenuando o envelhecimento da pele³⁶.

Abundantes, as células musculares esqueléticas são metabolicamente ativas e conhecidas por sinalizar suas demandas de energia a outros órgãos por meio da secreção ativa de miocinas, que são excretadas em resposta à contração muscular ou ao treinamento de força. As miocinas são produzidas predominantemente no músculo esquelético e liberadas na pele por vasos sanguíneos. Em quadros de sarcopenia, em que existe uma diminuição de massa muscular, também há diminuição de algumas miocinas no sangue. O músculo, então, pode se tornar um fascinante “jogador-chave antienvelhecimento”, modulando a senescência do corpo todo, incluindo a pele²⁷.

A aplicação da EENM na face de indivíduos saudáveis possui base teórica, fundamentada na sua utilização em práticas da Fisioterapia de aumento da força muscular e da espessura da musculatura com atrofia - seja por hipertrofia da fibra muscular, seja por encurtamento do comprimento de repouso do músculo²⁰. Contudo, tanto a eficácia da EENM quanto o mecanismo de ação nos músculos faciais para atenuação dos sinais do envelhecimento ainda precisam ser estudados e elucidados.

Sugere-se que estudos futuros sejam delineados com maior rigor científico, controle e padronização dos parâmetros de análise para que haja possibilidade não só de comparar as metodologias, mas também de reproduzir protocolos terapêuticos. Sugere-se, também, que a maneira mais conveniente de aplicar a EENM seja por meio de pequenas unidades portáteis, cujos recursos são modificáveis, permitindo que os profissionais possam definir parâmetros e criar programas personalizados de acordo com o objetivo desejado^{20), (33}.

CONCLUSÃO

A estimulação elétrica neuromuscular apresenta-se como um procedimento não invasivo promissor para atenuação dos sinais de envelhecimento facial. Contudo, ainda há poucas evidências científicas sobre o assunto, tornando-se clara a necessidade de realizar estudos com maior rigor metodológico, a fim de minimizar o nível de vieses, e utilização de técnicas precisas de avaliação que permitam a elucidação do mecanismo fisiológico do estímulo muscular e a sua inter-relação com o sistema tegumentar, tornando possível a comprovação da eficácia da EENM na melhoria da aparência da pele facial.

AGRADECIMENTOS

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) - código 0001 - e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) - Processo nº 2020/08516-0.

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• Fonte de financiamento: Capes (Código 0001) e Fapesp (2020/08516-0)

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  15 Maio 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  19 Abr 2021
• Aceito
  31 Jan 2023