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Difusão de ações antiéticas por partidos políticos brasileiros e as reações de usuários no Facebook

Difusión de acciones no éticas de partidos políticos en Brasil y reacciones de los usuarios de Facebook

Resumo

Mediante interatividade, formação de comunidades e influência ideológica, as mídias sociais se tornaram um espaço singular para as participações políticas. Dessa forma, este artigo tem por objetivo analisar a relação entre a difusão de informações antiéticas sobre política nas mídias sociais e as reações dos usuários. Por meio de análise categorial e estatística descritiva, foram analisados 2.517 comentários em 57 postagens dos cinco partidos políticos brasileiros com maior número de seguidores no Facebook. Os resultados indicam a existência de cinco categorias e 20 subcategorias de postagens dos partidos políticos. Os comentários mostraram três elementos importantes: fundamentação ideológica, agressividade e humor. Observou-se que não há reciprocidade na interação entre os partidos políticos e usuário e que a utilização do Facebook é apenas uma ferramenta utilizada para emissão de mensagens.

Palavras chave
Facebook; Ações antiéticas; Partidos políticos; Reações; Usuários

Resumen

Por medio de la interactividad, la formación de comunidades y la influencia ideológica, los medios sociales se han convertido en un espacio único para la participación política. Por lo tanto, este artículo tiene como objetivo analizar la relación entre la difusión de información sobre la política no ética en los medios sociales y las reacciones de sus usuarios. A través de análisis de categorías y estadísticas descriptivas se analizaron 2.517 comentarios en 57 posts de cinco partidos políticos de Brasil con el mayor número de seguidores en Facebook. Los resultados indican la existencia de cinco categorías de posts y 20 subcategorías de posts de los partidos políticos. Los comentarios mostraron tres elementos importantes: razones ideológicas, de agresión y de humor. Se observó que no hay reciprocidad en la interacción entre los partidos políticos y de los usuarios y que el uso de Facebook es sólo una herramienta que se utiliza para enviar mensajes.

Palabras clave
Facebook; Acciones no éticas; Partidos políticos; Reacciones; Usuarios

Abstract

Through interactivity, community formation and ideological influence, social media have become a unique space for political participation. Thus, this article aims to analyze the relationship between the dissemination of information about unethical policy on social media and the reactions of their users. Through category analysis and descriptive statistics were analyzed 2,517 comments in 57 posts of five Brazilian political parties with the largest number of followers on Facebook. The results indicate the existence of five post categories and 20 post subcategories of political parties. The comments showed three important elements: ideological reasons, aggression and mood. It was observed that there is no reciprocity in the interaction between political parties and users and that the use of Facebook is just a tool used for sending messages.

Keywords
Facebook; Unethical actions; Political parties; Reactions; Users

Introdução

A natureza das mídias sociais transcende a ideia de mediação comunicativa entre dois polos, emissor e receptor, ampliando esta perspectiva para múltiplos polos, indivíduos, comunidades e sociedade, constituindo novas formas de interação aos processos comunicacionais (PRATES, 2014PRATES, H. Crítica social e participação política na internet. Galáxia, São Paulo, n.27, p.254-257, jun. 2014.). Além disso, o próprio caráter interativo das mídias sociais ampliou o seu uso como ferramenta para estratégia de influência ideológica (GRAÇA, 2011GRAÇA, Sofia M. de M. Os social media e o marketing político em Portugal. 2011. 270f. Dissertação (mestrado em economia e gestão) - Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica Portuguesa, Porto.).

O desejo das pessoas por opinar e trocar experiências tem colaborado para que haja o estreitamento dos vínculos sociais, principalmente online, ultrapassando os limites geográficos ou institucionais e ampliando a convergência de interesses e sentidos por meio da identificação pessoal dos usuários nos discursos veiculados nos ambientes virtuais (DOMINGUES, 2014DOMINGUES, Ana S. de Oliveira. A rede social Facebook e a construção do ethos político por meio dos discursos. 2014. 98f.. Dissertação (mestrado em letras) – Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão.; CASTELLS, 2006CASTELLS, Manuel. Inovação, Liberdade e Poder na Era da Informação. MORAES, Denis (org.). Sociedade midiatizada. Rio de Janeiro: Mauad, 2006, p.225-231.).

A aproximação da comunicação e interatividade entre usuários depende de interpretações similares atribuídas aos sentidos das informações, proporcionando o sentimento de inserção e pertencimento, já que a virtualização possibilitada pela internet potencializa a disseminação da informação entre indivíduos (LÉVY, 2009LÉVY, P. O que é virtual? São Paulo: 34, 2009.).

Mediante interatividade, desejo pela troca de experiências, formação de comunidades e influência ideológica, as mídias sociais se tornaram um espaço singular para as participações políticas. Entre os anos de 2010 e 2015, protestos contra corrupção e de combate a grupos violentos como a Primavera Árabe, Jornadas de Junho, Ocupy Wall Street, India Against e A Million Voices Against FARC foram originados de novas formas interativas proporcionadas pelo auxílio das mídias sociais. Além disso, uma parte significativa de organizações públicas e privadas, com ou sem fins lucrativos, utilizam estes meios para comunicar suas ações, buscando atrair e engajar pessoas em suas causas.

Dentre as mídias sociais mais utilizadas para a difusão de informações no campo político, o Facebook se destaca. Temas relacionados a protestos (NEUMAYER; RAFFL, 2008NEUMAYER C.; RAFFL, C. Facebook for protest? The value of social software for political activism in the anti-FARC rallies. Digiactive Research Series, n.1, p.1-12, dez. 2008.), eleições (FERNANDES et al, 2010FERNANDES, J. et al. The writing on the wall: a content analysis of college students Facebook groups for the 2008 presidential election. Mass Communication and Society, n.13, p.653-675, 2010.; BISWAS; INGLE; ROY, 2014BISWAS, A.; INGLE, N.; ROY, M. Influence of social media on voting behavior. Journal of Power, Politics and Governance, v.2, n.2, p.127-155, 2014.; OKAN; TOPCU; AKYÜZ, 2014OKAN, E.; TOPCU, A.; AKYÜZ, S. The role of social media in political marketing: 2014 local elections of turkey. European Journal of business and Management, v.6, n.22, p.131-140, 2014.; RAVI; VASUNDARA, 2015RAVI, B. K.; VASUNDARA, P. M. Digital democracy social media in political campaigns the 2014 Lok Sabha experience in India. Academic research international, v.6, n.2, p.286-299, 2015.), movimentos sociais (MORAIS, 2013MORAIS, J. A. Quem são essas vadias?: uma análise teórico-empírica sobre o sujeito político da marcha das vadias do Rio de Janeiro. Seminário internacional Fazendo Gênero. 10, Florianópolis, 2013. Anais eletrônicos.; BRIGNOL, 2014BRIGNOL, L. #Vem pra rua: Santa Maria: movimentos sociais em rede, mobilização social e usos do Facebook em ações de protesto. Liinc em Revista, v.10, n.1, p.258-272, 2014.), propaganda política (GAD, 2015GAD, K. The impact of political advertising through social networking sites on Egyptians political orientations and choices. International Journal of Information, business and Management, v.7, n.1, p.1-18, 2015.), discurso político ideológico (LIMA NETO; NOBRE, 2014LIMA NETO, V.; NOBRE, K. Práticas discursivas político-ideológicas no Facebook: um estudo de emergência genérica. Linguagem & Ensino, v.17, n.3, p 951-972, 2014.; SILVA, 2014SILVA, S. B. Discurso político no Facebook da presidente Dilma Rousseff: um estudo de caso. Colóquio da ALED, 5, São Carlos, 2014. Anais eletrônicos.) e ativismo digital (MARICHAL, 2013MARICHAL, J. Political facebook groups: micro-activism and the digital stage. First Monday, v. 18, n.12, p.1-25, 2013.; ESPINO-SÁNCHEZ, 2014, CASTELLS, 2006CASTELLS, Manuel. Inovação, Liberdade e Poder na Era da Informação. MORAES, Denis (org.). Sociedade midiatizada. Rio de Janeiro: Mauad, 2006, p.225-231., MENÉNDEZ, 2014MENENDEZ, M. C. Is political communication changing between lawmakers and citizens? An analysis of ho internet is being used by politicians today. Temas y Debates, n.18, p.75-98, jan./jun., 2014., SMALL et al, 2014SMALL, T., et al. Online political activity in Canada: the hype and the facts. Canadian parliamentary review, Toronto, v.37, n.4 (winter), p.9-16, 2014., VROMEN; XENOS; LOADER, 2015VROMEN, A.; XENOS, M.; LOADER, B. Young people, social media and connective action: from organizational maintence to everyday political talk. Journal of Youth Studies, v.18, n.1, p.80-100, 2015.) associam o Facebook como a principal ou uma das principais mídias sociais de difusão político-informacional. Portanto, se torna importante compreender como a interatividade proporcionada por esta mídia influencia o comportamento e a percepção dos seus usuários, especialmente no campo político, tendo em vista a forma como os discursos são construídos, difundidos e analisados pela multiplicidade de atores envolvidos nos processos de comunicação.

No Brasil, o debate político nas mídias sociais, motivado por associações e identificações partidárias ou ideológicas, é notório. Temas relacionados à corrupção, por exemplo, são constantemente divulgados e geram debates, muitas vezes carregados de mensagens depreciativas e intolerância. Somam-se ao debate questões ligadas ao meio ambiente, maus tratos aos animais, relações de gênero e orientação sexual, educação e direitos humanos (MACHADO; PRADO, 2005MACHADO, F. V.; PRADO, Marco A. M.. Movimentos homossexuais: a constituição da identidade coletiva entre a economia e a cultura. O caso de dois grupos brasileiros. Interações, v.10, n.19, abr./jun., p.35-62, 2005., MORAIS, 2013MORAIS, J. A. Quem são essas vadias?: uma análise teórico-empírica sobre o sujeito político da marcha das vadias do Rio de Janeiro. Seminário internacional Fazendo Gênero. 10, Florianópolis, 2013. Anais eletrônicos., BRUGNAGO; CHAIA, 2014BRUGNAGO, F.; CHAIA, V. L. M., A nova polarização política nas eleições de 2014: radicalização ideológica da direita no mundo contemporâneo do Facebook. Aurora. Revista de Arte, Mídia e Política, v.7, n.21, p.99-129, 2014.).

A discussão desses temas se relaciona a ações antiéticas, que são aquelas nas quais o comportamento de um grupo ou pessoa resulta na falta de justiça com outros indivíduos, sejam elas amparadas pela lei ou não gerando perdas sociais e impactando negativamente a condição da sociedade (WELLS, SPINKS, 1998WELLS, B.; SPINKS, N. Ética, de cima para baixo. HSM Management, v.7, mar/abr, 1998.).

Instituições, como partidos políticos e organizações não governamentais (ONGs), utilizam espaços na rede para “bombardear” as mídias sociais com informações negativas sobre seus adversários ou opositores ideológicos divulgando ações antiéticas tendo por objetivo causar desconforto nos usuários. Todavia, não é possível depreender que todo tipo de difusão informacional de conteúdo antiético realmente tenham impacto negativo. Tendo em vista a multiplicidade de ideias propagadas nas mídias sociais, não há uma determinação de quais tipos de informações provocam reações específicas.

Portanto, questiona-se: quais as reações provocadas nos usuários das mídias sociais pela difusão de informações antiéticas realizadas pelos partidos políticos? A fim de responder esta problemática, o objetivo geral é analisar a relação entre a difusão de informações antiéticas dos partidos políticos brasileiros nas mídias sociais e as reações dos usuários. Os objetivos específicos são identificar os tipos de ações antiéticas divulgadas, avaliar o conteúdo das reações virtuais dos usuários por meio da visualização dos seus comentários e verificar a relação entre os tipos das ações antiéticas divulgadas e as reações dos usuários expressas em seus comentários. Para atender à problematização, o Facebook foi utilizado como unidade de análise, tendo em vista a sua grande quantidade de usuários, um bilhão e meio no mundo, suas ferramentas de criação e gerenciamento de perfis, assim como as ferramentas de compartilhamento e comentários interativos.

Fundamentação teórica – Mídias sociais online e política

As tecnologias digitais têm se configurado como elemento de ruptura entre a participação política de recepção de informações para a comunicação interativa (SMALL et al, 2014SMALL, T., et al. Online political activity in Canada: the hype and the facts. Canadian parliamentary review, Toronto, v.37, n.4 (winter), p.9-16, 2014.), destacando-se uma transição comportamental, na qual os indivíduos deixam de ter um comportamento eleitoral e passam a incorporar um comportamento político (RENNÓ; AMES, 2014RENNÓ, L.; AMES, B. PT no purgatório: ambivalência eleitoral no primeiro turno das eleições presidenciais de 2010. Opinião Pública, v.20, n.1, p.1-25, abril 2014.).

Após o ano 2000, os estudos sobre marketing político ampliaram suas perspectivas para a política como um espaço de compartilhamento de informações e críticas, tendo como um de seus elementos as mídias sociais online, como o Facebook, e a suas possibilidades de criar diálogos com diversos segmentos da sociedade, ao contrário dos veículos de comunicação de massa.

As redes sociais ligadas às estratégias de campanhas eleitorais tornaram-se meios de criar comunidades virtuais voltadas a disseminar informações sobre e para os candidatos, influenciando a arena política como na campanha de Barack Obama em 2008 (FERNANDES; GIURCANU; NEELY, 2010; BISWAS; INGLE; ROY, 2014).

As mídias sociais facilitaram a comunicação entre políticos e eleitores. O armazenamento de informações se mantém nestas redes, permitindo consulta a qualquer momento (RECUERO, 2013RECUERO, Raquel. Atos de ameaça à face e à conversação em redes sociais na internet. Interações em rede. Porto Alegre, Sulina, 2013.; OKAN; TOPCU; AKYÜZ, 2014). Organizadores de campanhas eleitorais podem analisar nestas mídias variáveis de controle como faixa etária (HENN, FOARD, 2014HENN, M.; FOARD, N. Social differentiation in young people’s political participation: the impact of social and educational factors on youth political engagement in Britain. Journal of Youth Studies, v.17, n.3, p.360-380, 2014.), gênero (MORAIS, 2013MORAIS, J. A. Quem são essas vadias?: uma análise teórico-empírica sobre o sujeito político da marcha das vadias do Rio de Janeiro. Seminário internacional Fazendo Gênero. 10, Florianópolis, 2013. Anais eletrônicos.; RENNÓ; AMES, 2014RENNÓ, L.; AMES, B. PT no purgatório: ambivalência eleitoral no primeiro turno das eleições presidenciais de 2010. Opinião Pública, v.20, n.1, p.1-25, abril 2014.), raça (BUENO, 2012BUENO, N. S. Raça e comportamento político: participação, ativismo e recursos em Belo Horizonte. Lua Nova, s/v, n.85, p.187-226, 2012.), orientação sexual (MACHADO; PRADO, 2005MACHADO, F. V.; PRADO, Marco A. M.. Movimentos homossexuais: a constituição da identidade coletiva entre a economia e a cultura. O caso de dois grupos brasileiros. Interações, v.10, n.19, abr./jun., p.35-62, 2005.) e outros elementos que influenciam a elaboração de críticas do eleitorado.

As ideologias propagadas se concretizam na construção de discursos, utilizando símbolos para retratar a realidade. Entretanto, um conjunto de símbolos pode não ser eficiente na comunicação para todos os públicos. No âmbito das mídias sociais, ideologias podem ser interpretadas de diferentes modos, produzindo efeitos distintos entre os que detiveram a mesma informação (SILVA, 2014SILVA, S. B. Discurso político no Facebook da presidente Dilma Rousseff: um estudo de caso. Colóquio da ALED, 5, São Carlos, 2014. Anais eletrônicos.). Assim, o Facebook pode tornar-se um ambiente opressor. Isto se dá quando opositores, conhecidos como haters, iniciam debates depreciativos de seus oponentes, divulgando informações contrárias e depreciativas. São comuns ofensas aos usuários que não compactuam com determinado posicionamento, o que não caracteriza uma atitude democrática (MARQUES, 2006MARQUES, F. P. J. A. Debates políticos na internet: a perspectiva da conversação civil. Opinião Pública, v.12, n.1, p.164-187, 2006.).

Tal comportamento foi demonstrado nas campanhas eleitorais no Brasil de 2014, na qual os principais candidatos, Dilma Rousseff e Aécio Neves, apresentavam dados estatísticos para fundamentar suas propostas. À medida que divulgavam subsídios nos seus perfis do Facebook, eleitores usuários do candidato adversário apresentavam outros índices que contrapunham a intenção inicial.

A natureza ideológica ainda fundamenta movimentos sociais nestas mídias. Entretanto, estes se constituem em ações coletivas que transcendem o ambiente virtual. Tais ações derivam de redes de relacionamentos baseadas em interesses comuns, que tem por objetivo a contraposição a paradigmas socioculturais e conjunturas políticas institucionalizadas (GOHN, 2011GOHN, M. G. Movimentos sociais na contemporaneidade. Revista brasileira de Educação, v.16, n.47, p.333-361, maio./ago., 2011.; BRIGNOL, 2014BRIGNOL, L. #Vem pra rua: Santa Maria: movimentos sociais em rede, mobilização social e usos do Facebook em ações de protesto. Liinc em Revista, v.10, n.1, p.258-272, 2014.). Cabe ressaltar que o caráter destes movimentos ultrapassa os limites de demandas sociais básicas. Alguns exemplos desses movimentos são a Marcha da Maconha e a Marcha das Vadias.

Os indivíduos percebem, por meio das informações negativas nestas mídias que suas demandas sociais deveriam ser melhoradas. Como exemplo, verifica-se o comportamento de internautas durante junho de 2013, em que usuários expunham problemas econômicos nacionais em comparação aos benefícios existentes em nações estrangeiras (GOHN, 2011GOHN, M. G. Movimentos sociais na contemporaneidade. Revista brasileira de Educação, v.16, n.47, p.333-361, maio./ago., 2011.; BRIGNOL, 2014BRIGNOL, L. #Vem pra rua: Santa Maria: movimentos sociais em rede, mobilização social e usos do Facebook em ações de protesto. Liinc em Revista, v.10, n.1, p.258-272, 2014.). Os protestos vinculados à política no mundo e no Brasil, desde 2010, têm algumas características em comum: uso da tecnologia da informação e mídias sociais para a construção da comunidade, inter-relação entre real e espaço virtual, influência da globalização sobre as comunidades locais e seu contributo para a esfera pública global, influência das desigualdades sociais como indutores de identidade entre os participantes e a descentralização da hierarquia (NEUMAYER; RAFFL, 2008NEUMAYER C.; RAFFL, C. Facebook for protest? The value of social software for political activism in the anti-FARC rallies. Digiactive Research Series, n.1, p.1-12, dez. 2008., BRIGNOL, 2014BRIGNOL, L. #Vem pra rua: Santa Maria: movimentos sociais em rede, mobilização social e usos do Facebook em ações de protesto. Liinc em Revista, v.10, n.1, p.258-272, 2014.).

Essas características em conjunto das ideologias propagadas na internet tornam as mídias sociais um instrumento relevante em discussões sobre marketing e comunicação, assim como as tornam em elementos que necessitam ser analisados em aspectos mais específicos, como a política.

Procedimentos metodológicos

Esta pesquisa se caracteriza pela abordagem qualitativa e descritiva. Seus procedimentos se dividem em conformidade aos objetivos específicos: identificação dos tipos de ações antiéticas divulgadas no Facebook, identificação do conteúdo das reações virtuais por meio dos comentários, verificação da relação entre os tipos de ações antiéticas divulgadas e reações dos usuários.

Para identificação das atitudes antiéticas divulgadas no Facebook, foram monitorados cinco perfis de partidos políticos entre 31 de maio de 2015 e nove de junho de 2015. Destaca-se que esses dias não estavam inseridos em período eleitoral. A escolha desses perfis ocorreu por terem o maior número de seguidores com páginas públicas e por serem reconhecidos pelo número de afiliados no Brasil. Os cinco partidos – Partidos dos Trabalhadores (PT), Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), Democratas (DEM) e Partido Socialista Brasileiro (PSB) – possuem, juntos, 2.743.504 seguidores e publicaram conjuntamente 57 postagens sobre ações antiéticas em suas timelines, sendo essas informações obtidas no primeiro e último dia de monitoramento.

A análise das ações antiéticas foi realizada mediante análise categorial (BARDIN, 1988BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1988.). Foram estabelecidas cinco categorias e 20 subcategorias conforme o aparecimento cronológico das postagens, classificadas por seus conteúdos.

A avaliação dos tipos de reações foi realizada mediante análise dos comentários dispostos nas postagens dos perfis monitorados, considerando que no Facebook é possível comentar em período posterior a postagem. Tal procedimento também teve como base a análise categorial, abrangendo não apenas o conteúdo, mas também o sentido e a ideologia presentes nos comentários. Este método possibilitou uma classificação dos comentários que considerasse, conforme Xue (2014)XUE, D. Online media use during 2013 Japanese upper-house election: a content analysis of comments on candidates’ Facebook pages. Keio Communication Review, Minato, v.36, n.65, p.53-69, 2014., o posicionamento contrário ou a favor dos usuários, objetivo do discurso em relação às postagens (questionamento, retroalimentação ou mensagem para outros usuários), bem como o disposto Fernandes et al (2011)FERNANDES, J. et al. The writing on the wall: a content analysis of college students Facebook groups for the 2008 presidential election. Mass Communication and Society, n.13, p.653-675, 2010., Lima Neto e Nobre (2014)LIMA NETO, V.; NOBRE, K. Práticas discursivas político-ideológicas no Facebook: um estudo de emergência genérica. Linguagem & Ensino, v.17, n.3, p 951-972, 2014. e Inocêncio e Lopes (2014)INOCÊNCIO, L.; LOPES, C. P. The zueiraneverends: interação, compartilhamento e potências virais das imagens meméticas em comentários no Facebook. XVI Congresso de Ciências da Comunicação na região Nordeste, João Pessoa, 2014. Anais eletrônicos., indicando expressão comportamental, como sarcasmo, ironia e humor. Foram verificados 2.517 comentários nas 57 postagens, totalizando uma média de 44,15 comentários por postagem. A fim de ilustrar os resultados, alguns comentários foram citados diretamente, no entanto, para não expor os usuários, apenas o conteúdo foi mostrado.

A verificação da relação entre os tipos de ações antiéticas divulgadas e as reações de usuários foi feita com o uso da estatística descritiva. Houve o cruzamento das frequências das reações postadas com as categorias de ações antiéticas identificadas, assim como o cálculo de coeficientes de correlação, possibilitando a análise relacional. Para estes procedimentos foram utilizados os aplicativos da Microsoft: Word e Excel.

Resultados

Identificação das ações antiéticas difundidas

Os resultados obtidos a partir da análise categorial indicaram a existência de cinco categorias (ressaltadas em negrito) e 20 subcategorias, conforme a Figura 1. As categorias e subcategorias, apesar de visualizadas em publicações de perfis públicos dos partidos políticos no Facebook, não foram classificadas por organização. Sua categorização ocorreu pelo conteúdo e fluxo de informação.

Figura 1
Categorias e subcategorias de ações antiéticas

A categoria Corrupção teve a maior quantidade de postagens e foi subdividida em cinco subcategorias: Desvio de verbas, Eleições, FIFA, Ligações partidárias e Mídia. O cerne deste grupo reside na divulgação das ações antiéticas ligadas à corrupção sobre partidos e organizações adversárias aos partidos que divulgam as informações. As trocas de acusações foram comuns no que diz respeito ao desvio de recursos públicos e às fraudes eleitorais. Todos os partidos utilizaram notícias da mídia relacionadas aos escândalos de corrupção na FIFA para prejudicar a imagem de seus adversários, indicando inclusive a influência de ligações partidárias em possíveis desvios ocorridos durante a copa do mundo de 2014. As fraudes na organização desportiva foram ligadas à imagem de Dilma Rousseff e Aécio Neves, incitando que ambos estavam envolvidos nas acusações. Este assunto foi abordado, pois no período de análise das postagens – maio e junho de 2015 – fraudes na FIFA (Federação Internacional de Futebol) estavam sendo divulgadas na mídia.

A subcategoria Mídia também se associa à corrupção, pois alguns partidos acusaram redes de comunicação a incitar o sentimento de ódio por meio da divulgação de informações distorcidas, sensacionalistas ou exageradas sobre possíveis atos fraudulentos. Verificou-se a existência de questões ligadas à linguagem, como o uso de humor, ironia e sarcasmo. Entretanto, estes elementos conhecidos como memes, estavam ligados à representação visual para chamar atenção dos usuários, não estando contidos no corpo do texto. Estes são definidos como imagens com edição criativa e replicação de textos usados repetidamente na internet, podendo receber um novo significado nesse processo (INOCÊNCIO; LOPES, 2014INOCÊNCIO, L.; LOPES, C. P. The zueiraneverends: interação, compartilhamento e potências virais das imagens meméticas em comentários no Facebook. XVI Congresso de Ciências da Comunicação na região Nordeste, João Pessoa, 2014. Anais eletrônicos.).

A categoria Direitos Humanos foi subdividida em quatro subcategorias: Redução da maioridade penal, Relações de gênero, Violência e Ditadura militar. Os direitos humanos foram expostos em relação à redução da maioridade penal por partidos de orientação progressista, apresentando dados com ausência de efeito positivo desta medida no mundo. Nenhum partido neoliberal apresentou postagens sobre este assunto. Os que o fizeram, mostraram a aprovação do Projeto de Emenda à Constituição 171/1993 como ação antiética. Distinto da categoria corrupção, neste grupo não foram utilizados elementos linguísticos como sarcasmo, ironia ou humor, exceto na subcategoria Ditadura Militar. Sobre redução da maioridade penal, no entanto, imagens de crianças chorando atrás de grades de presídios foram postadas para impactar usuários do Facebook.

A subcategoria Relações de Gênero teve representação fundamentada na promoção do fim da violência doméstica como forma de gerar igualdade entre os gêneros, incluindo a inserção das mulheres na política como meio para dirimir a violência. Atos violentos ainda foram associados ao exagero das ações militares com jovens.

A subcategoria Ditadura Militar foi apresentada por uma postagem compartilhada de um blog de política, não sendo diretamente oriunda de partidos. Para esta subcategoria, ironia e sarcasmo foram usados como elementos linguísticos. O regime militar foi disposto ironicamente como “ideal de nação” para veicular melhorias na sociedade. Esta afirmação derivou-se das manifestações populares de caráter oposicionista ocorridas em 2015, quando surgiram pontuais declarações de apoio à reinstaurarão do regime.

A categoria Economia foi subdividida em Privatizações e Concessões e Sonegação fiscal, que foram apresentadas por dois partidos de orientações distintas. Nestas postagens, os partidos sempre retratavam o outro como “vilão”. A sonegação é tratada como precursora dos principais problemas da má distribuição de serviços sociais e ao praticá-la o cidadão causa transtornos aos demais.

A Infraestrutura subdivide-se em Copa do mundo, Mobilidade urbana e Obras sociais. Todas essas subcategorias são expostas mediante a má atuação de algum partido ao gerenciar obras de infraestrutura. A copa do mundo foi abordada principalmente por meio das obras de infraestrutura que não foram finalizadas para o evento esportivo de junho de 2014. Estas obras não estavam associadas diretamente à copa, enquanto as ações sociais foram relacionadas aos programas do governo federal, como o Minha Casa Minha Vida. A execução das obras não foi exposta como um problema, mas a inadimplência dos beneficiados foi exaltada e principalmente, a inabilidade do atual governo em gerenciar este fenômeno.

A categoria Ingerência Governamental é dividida em seis partes: Endividamento, Impostos, Indústria, Juros, Orçamento familiar, Retração econômica. Os temas que fundamentam as subcategorias relacionam-se com a inabilidade dos governos em agir para promoção do desenvolvimento. Esta é a categoria que mais relaciona seus subtemas com outras categorias. Além disso, há uma associação dentro da própria categoria. O aumento de juros seria um meio de provocar endividamento, retração da indústria, ajustamento nos orçamentos familiares e recessão econômica. A alta taxa de impostos também foi abordada.

Todos os partidos apresentaram ações antiéticas, seja sobre a atuação dos adversários ou dos que compartilham a mesma orientação política, exceto o PSB. As acusações transcenderam a atuação do governo na esfera federal, abrangendo a gestão pública estadual.

Avaliação das reações dos usuários nos comentários

As reações dos usuários foram consideradas a partir de seu posicionamento político em relação às postagens, objetivo do discurso e traços de comportamento. A separação das reações configura-se como um meio de categorizá-las. Ainda é possível dizer que diversos comentários poderiam se enquadrar em mais de uma categoria, tendo mais de um objetivo ou traço comportamental em seu discurso. Além disso, comentários podem não apresentar posicionamento, mostrando-se alheios às postagens ao abordar temas que não se relacionam com o conteúdo postado. O Quadro 1 apresenta exemplos de comentários categorizados conforme posicionamento político em relação ao conteúdo de postagens.

Quadro 1
Exemplos de comentários por posicionamento político

O posicionamento político contrário aos das postagens mostra linguagem agressiva e é direcionado à natureza partidária. Entretanto, comentários com posicionamento a favor das postagens demonstram linguagem pacífica, apesar de direcionados à ação dos membros dos partidos. Não se notou nos comentários exaltados qualquer tipo de contra argumentação com dados ou referências que fundamentassem o posicionamento, independentemente do posicionamento.

Estes comentários baseiam-se em ideologia ou identificação com representantes partidários, apresentando pouco ou nenhum argumento que comprove a eficácia das ações governamentais, éticas ou antiéticas, como meio fundamentar os discursos. Alguns comentários utilizaram recursos visuais como imagens ou figuras meméticas para expressarem opinião. O Quadro 2 mostra exemplos de comentários categorizados pelo objetivo do discurso.

Quadro 2
Exemplos de comentários por objetivo do discurso

Já os objetivos dos discursos explícitos nos comentários podem ser categorizados em questionamentos, retroalimentação e mensagens para outros usuários (XUE, 2013XUE, D. Online media use during 2013 Japanese upper-house election: a content analysis of comments on candidates’ Facebook pages. Keio Communication Review, Minato, v.36, n.65, p.53-69, 2014.). Os resultados indicam que comentários com questionamento posicionam-se contrários às postagens. Estes têm em seus discursos a característica da pergunta retórica e não questões que promovam interação entre partidos e usuários. Estas indagações, no entanto, proporcionaram intercâmbio entre os seguidores por meio de provocações ou discussões acaloradas. Observou-se falta de interação de partidos, inclusive na ausência de resposta.

Quanto aos objetivos dos discursos explícitos nos comentários, estes podem ser categorizados em questionamentos, retroalimentação e mensagens para outros usuários (XUE, 2014XUE, D. Online media use during 2013 Japanese upper-house election: a content analysis of comments on candidates’ Facebook pages. Keio Communication Review, Minato, v.36, n.65, p.53-69, 2014.). Os resultados indicam que comentários com questionamento posicionam-se contrários às postagens. Estes têm em seus discursos a característica da pergunta retórica e não questões que promovam diretamente a interação entre partidos e usuários. Estas indagações, no entanto, proporcionaram intercâmbio entre os seguidores por meio de provocações ou discussões acaloradas. Observou-se falta de interação de partidos, inclusive na ausência de resposta aos questionamentos.

Comentários de retroalimentação são aqueles com objetivo de debate direto aos conteúdos das postagens. Dentre as categorias, estes apresentam maior potencial de argumentação e utilização de dados para corroborar ou afrontar informações dispostas em postagens partidárias. Observam-se tímidas utilizações de dados e referências nos argumentos, porém, sem indicação de fontes e sempre direcionados a partidos ou representantes. Também se verificou que estes comentários continham traços de pessoalidade, sendo direcionados a outros co-enunciadores, como respostas a questionamentos ou afronta ideológica, porém, com caráter individual, não sendo generalista. Outros aspectos foram discursos com elementos comportamentais, como ironia, sarcasmo, humor e revolta . Alguns destes são apresentados na Figura 2.

Figura 2
Exemplos de recursos visuais utilizados nos comentários

Apesar de os comentários que utilizam textos também expressarem aspectos comportamentais, o destaque para este discurso reside no uso de recursos visuais. Montagens e edições de imagens de representantes de partidos em relação a situações específicas, como corrupção na FIFA, impunidade e eleições estavam presentes em diversas postagens. Não se observaram aspectos comportamentais sendo utilizados em comentários com posicionamento a favor do conteúdo das postagens. O elemento mais analisado nesses comentários foi o humor, mesmo quando não havia uso de recursos visuais. Ironia, sarcasmo, revolta ou apoio mostrando um padrão no que diz respeito às reações dispostas nos comentários também foram verificados.

Análise relacional

Além dos aspectos qualitativos, curtidas, compartilhamentos e comentários descritos como reações às ferramentas de interatividade foram considerados sob perspectiva quantitativa. As frequências de cada reação em relação a cada categoria e subcategoria temática são mostradas na Tabela 1.

Tabela 1
Frequências por categorias

As médias de curtidas, compartilhamentos e comentários por postagens, de acordo com cada categoria, são mostradas pela Tabela 2. As categorias com maior quantidade de postagens analisadas foram as de Corrupção e Ingerência Governamental, enquanto Economia e Infraestrutura apresentam a menor quantidade de postagens analisadas sobre ações antiéticas.

Tabela 2
Média por postagem

A categoria com maior média de compartilhamentos foi Economia, seguida de Infraestrutura. As postagens sobre Direitos Humanos foram as menos compartilhadas. Quanto aos comentários, Ingerência Governamental e Economia tiveram maior média por postagem, enquanto Direitos Humanos novamente teve a menor média. A Tabela 3 apresenta coeficientes de correlação entre reações e ferramentas de interatividade.

Tabela 3
Coeficientes de correlação

Dentre os seis coeficientes calculados, a relação entre postagens e comentários demonstrou alto nível de correlação. Isso revela que os usuários comentam mais quando determinado tema é mais difundido pelo partido. Ou seja, quanto mais postagens de uma mesma categoria, maior será a quantidade de comentários. Essa relação proporcional positiva, no entanto, não se apresentou elevada nos outros cálculos de correlação, apesar de haver relevância significante na relação entre curtidas e comentários.

Discussão

A conexão em rede é uma das características comuns a diferentes movimentos sociais, originários como resposta a uma crise ou a um conflito de legitimidade das instituições e organizações políticas tradicionais (CASTELLS, 2006CASTELLS, Manuel. Inovação, Liberdade e Poder na Era da Informação. MORAES, Denis (org.). Sociedade midiatizada. Rio de Janeiro: Mauad, 2006, p.225-231.). Verifica-se que páginas dos partidos políticos no Facebook congregam uma área de realidade plural, ampliando os ambientes de informação entre os indivíduos. A internet, deste modo, garante a comunicação livre, transformando-se em um novo espaço de engajamento político, em que o conteúdo exposto depende de seus atores sociais (ESPINO-SANCHEZ, 2014ESPINO-SANCHEZ, G. La política en internet, de la mediatización a la convergencia digital? Convergência, v.21, n.65, p.39-63, maio/ago. 2014., VROMEN; XENOS; LOADER, 2015VROMEN, A.; XENOS, M.; LOADER, B. Young people, social media and connective action: from organizational maintence to everyday political talk. Journal of Youth Studies, v.18, n.1, p.80-100, 2015.).

Na análise realizada, verificamos a banalização do discurso de ódio, gerado pela falta de mediação e pela liberdade de expressão possibilitada por essas mídias (MARQUES, 2006MARQUES, F. P. J. A. Debates políticos na internet: a perspectiva da conversação civil. Opinião Pública, v.12, n.1, p.164-187, 2006.; MENENDÉZ, 2014MENENDEZ, M. C. Is political communication changing between lawmakers and citizens? An analysis of ho internet is being used by politicians today. Temas y Debates, n.18, p.75-98, jan./jun., 2014., LIMA NETO; NOBRE, 2014LIMA NETO, V.; NOBRE, K. Práticas discursivas político-ideológicas no Facebook: um estudo de emergência genérica. Linguagem & Ensino, v.17, n.3, p 951-972, 2014.). No Facebook, devido ao funcionamento de softwares que examinam o padrão comportamental do usuário, desenvolve-se impressão de que a maioria está ao seu lado e que virtualmente o outro, o de ideologia diferente, está distante (BRUGNAGO; CHAI, 2014BRUGNAGO, F.; CHAIA, V. L. M., A nova polarização política nas eleições de 2014: radicalização ideológica da direita no mundo contemporâneo do Facebook. Aurora. Revista de Arte, Mídia e Política, v.7, n.21, p.99-129, 2014.).

Deste modo, a radicalização é exacerbada, acalentando o discurso dos usuários e intensificando a polarização política estabelecida após as manifestações de 2013. A liberdade de expressão nestas redes abre espaço para troca de agressões (DOMINGUES, 2014DOMINGUES, Ana S. de Oliveira. A rede social Facebook e a construção do ethos político por meio dos discursos. 2014. 98f.. Dissertação (mestrado em letras) – Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão.). As mídias sociais, assim, transformaram-se em palco de discussão permanente para que eleitores, cidadãos e partidos defendam seu posicionamento ideológico (MENENDÉZ, 2014MENENDEZ, M. C. Is political communication changing between lawmakers and citizens? An analysis of ho internet is being used by politicians today. Temas y Debates, n.18, p.75-98, jan./jun., 2014.). A dicotomia, intensificada no ano eleitoral, permaneceu após o pleito em forma de provocações, compartilhamento de notícias e exposição de ideologias (BRUGNAGO; CHAIA, 2014BRUGNAGO, F.; CHAIA, V. L. M., A nova polarização política nas eleições de 2014: radicalização ideológica da direita no mundo contemporâneo do Facebook. Aurora. Revista de Arte, Mídia e Política, v.7, n.21, p.99-129, 2014.).

O teor dos diálogos do Facebook possui viés extremista, com foco em problemas de interesse social e na personificação de sujeitos ou partidos políticos. O excesso de clichês, citações descontextualizadas e infundadas, troca de ofensas, além de questionamentos provocativos foram comumente encontrados nestes espaços (LIMA NETO; NOBRE, 2014LIMA NETO, V.; NOBRE, K. Práticas discursivas político-ideológicas no Facebook: um estudo de emergência genérica. Linguagem & Ensino, v.17, n.3, p 951-972, 2014., MARQUES, 2006MARQUES, F. P. J. A. Debates políticos na internet: a perspectiva da conversação civil. Opinião Pública, v.12, n.1, p.164-187, 2006.).

A militância e o ciberativismo, antes presentes pontualmente na Web, principalmente nos períodos eleitorais, agora é uma constante nas mídias sociais (SMALL et al, 2014SMALL, T., et al. Online political activity in Canada: the hype and the facts. Canadian parliamentary review, Toronto, v.37, n.4 (winter), p.9-16, 2014.; VROMEN; XENOS; LOADER, 2015VROMEN, A.; XENOS, M.; LOADER, B. Young people, social media and connective action: from organizational maintence to everyday political talk. Journal of Youth Studies, v.18, n.1, p.80-100, 2015.). A agenda setting difundida na mídia tradicional serve como pauta para internautas, que se apropriam de temas “quentes” para ampliar o debate na virtual. Uma vez encontradas nesta esfera, informações são disseminadas pelo poder de potencialização da virtualidade (LÉVY, 2009LÉVY, P. O que é virtual? São Paulo: 34, 2009.). Estes conteúdos também se tornam mais fluídos, uma vez que o grau de liberdade permite maior transformação e manipulação. Um exemplo é a rápida disseminação de imagens com teor de sarcasmo e crítica com forte apelo humorístico, os memes, que se multiplicam por meio destas redes (INOCÊNCIO; LOPES, 2014INOCÊNCIO, L.; LOPES, C. P. The zueiraneverends: interação, compartilhamento e potências virais das imagens meméticas em comentários no Facebook. XVI Congresso de Ciências da Comunicação na região Nordeste, João Pessoa, 2014. Anais eletrônicos., SARAIVA; SILVA, 2012SARAIVA, C. L. C.; SILVA, M. D. B. Da transgressão e ethos forjado à câmara dos deputados: uma análise do discurso utilizado na campanha eleitoral de Tiririca 2010. Revele, n.4, p.50-68, maio 2012.).

Por meio de curtida, comentário e compartilhamento ocorrem interações estabelecidas entre cidadãos e seus representantes. Esses meios de interatividade, no entanto, não exploraram a principal característica da comunicação digital, a possibilidade de diálogo, em uma conversação horizontal e sem intermédios (RECUERO, 2013RECUERO, Raquel. Atos de ameaça à face e à conversação em redes sociais na internet. Interações em rede. Porto Alegre, Sulina, 2013., PRATES, 2014PRATES, H. Crítica social e participação política na internet. Galáxia, São Paulo, n.27, p.254-257, jun. 2014.). Verificou-se que grande parte dos comentários não demonstrava conteúdo fundamentado, não se baseando em dados, fatos ou pesquisas. Para os seguidores, o importante no ato de comentar era convencer aos pares e receber apoio da rede (BRUGNAGO; CHAIA, 2014BRUGNAGO, F.; CHAIA, V. L. M., A nova polarização política nas eleições de 2014: radicalização ideológica da direita no mundo contemporâneo do Facebook. Aurora. Revista de Arte, Mídia e Política, v.7, n.21, p.99-129, 2014.).

Sobre os compartilhamentos, notou-se a ação do coenunciador de identificar uma crítica a algum aspecto da situação política brasileira e a compartilhar para convergir com o posicionamento do enunciador, reconhecendo-se a si próprio como sujeito atuante nas questões políticas. A maioria destes usuários, a fim de não se reconhecerem como imersos num estado de alienação, reproduz e propaga mecanicamente temas em emergência, legitimando a ignorância de que eles fogem (LIMA NETO; NOBRE, 2014LIMA NETO, V.; NOBRE, K. Práticas discursivas político-ideológicas no Facebook: um estudo de emergência genérica. Linguagem & Ensino, v.17, n.3, p 951-972, 2014.).

Em relação à retroalimentação, observamos que a conversação por postagens funciona tanto como modo de expressar opinião, apoio e descontentamento, quanto como forma conversação e afirmação social (INOCÊNCIO; LOPES, 2014INOCÊNCIO, L.; LOPES, C. P. The zueiraneverends: interação, compartilhamento e potências virais das imagens meméticas em comentários no Facebook. XVI Congresso de Ciências da Comunicação na região Nordeste, João Pessoa, 2014. Anais eletrônicos., GRAÇA, 2011GRAÇA, Sofia M. de M. Os social media e o marketing político em Portugal. 2011. 270f. Dissertação (mestrado em economia e gestão) - Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica Portuguesa, Porto.).

Este cenário de permanente vigília é uma característica da democracia digital, na qual os cidadãos atuam como monitores e ativistas de seus direitos sociais, mas a falta de fundamento e de informação transforma o Facebook em um palco midiático responsável pela espetacularização do discurso (DOMINGUES, 2014DOMINGUES, Ana S. de Oliveira. A rede social Facebook e a construção do ethos político por meio dos discursos. 2014. 98f.. Dissertação (mestrado em letras) – Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão.). A política se vê beneficiada como um todo, uma vez que a participação política é atualmente recorrente na esfera pública, tanto online quanto offline, criando uma nova democracia participativa com maior atuação social (ESPINO-SANCHEZ, 2014ESPINO-SANCHEZ, G. La política en internet, de la mediatización a la convergencia digital? Convergência, v.21, n.65, p.39-63, maio/ago. 2014., MENENDÉZ, 2014MENENDEZ, M. C. Is political communication changing between lawmakers and citizens? An analysis of ho internet is being used by politicians today. Temas y Debates, n.18, p.75-98, jan./jun., 2014.).

O tradicional e partidário modelo de democracia brasileira, apesar de presente nos meios de comunicação digitais, não explora todo o potencial comunicacional disponível. Na atual conjuntura política, na qual crises e instabilidades encontram-se com o poder comunicacional e reivindicador da população, seria importante que os partidos políticos utilizassem uma comunicação digital mais sólida e participativa, com interação direta com seguidores e conteúdo de qualidade, rico em referências. Num momento que se questiona a atuação e a estrutura política partidária, uma atuação moderna, interativa, transparente e cidadã, de conteúdo de utilidade pública, com diálogo aberto com os eleitores/seguidores geraria mais credibilidade para estes partidos, beneficiando-os neste momento em que movimentos de perfil apartidário fortalecem-se dentro e fora da internet.

Conclusão

As reações expressas nos comentários apresentaram três padrões: agressividade, humor e convergência ou divergência ideológica. A convergência ou divergência ideológica se mostrou a principal causa de reações por fundamentar o posicionamento, objetivo e comportamento nos discursos dos comentários. A agressividade e o humor foram os aspectos comportamentais mais presentes nos discursos, principalmente naqueles contrários ao conteúdo das postagens dos partidos. Destaca-se também o uso de memes, recursos visuais com mensagens, como meio de expressar as reações.

Apartir da análise das mídias sociais dos cinco partidos selecionados, conferimos que os resultados indicaram o estabelecimento de cinco categorias de informações relacionadas a ações antiéticas divulgadas por partidos políticos no Facebook: Corrupção, Direitos humanos, Economia, Infraestrutura e Ingerência governamental. Estas categorias foram subdivididas em 20 subcategorias de acordo com seu conteúdo. As postagens dos partidos sempre apresentam conteúdo que deprecia a imagem de adversários políticos e ideológicos, deixando de convidar os usuários do Facebook a participar de debates, mesmo dentro da própria mídia social. Isso demonstra que os partidos ainda não utilizam todos os potenciais que as redes sociais disponibilizam, sem promover interatividade e diálogo com usuários, principais característica desta mídia.

A análise relacional mostrou que as ações antiéticas mais difundidas e comentadas pelos usuários foram sobre economia e ingerência governamental. Entretanto, os coeficientes de correlação apontam que não há proporcionalidade significativa na variação entre postagens e curtidas, postagens e compartilhamentos, bem como comentários e compartilhamentos. Ou seja, usuários não reagem compartilhando e curtindo de acordo com a quantidade de postagens, nem comentam de acordo com a quantidade de compartilhamentos. Porém, houve correlação positiva e relevante na relação entre postagens e comentários, indicando que usuários reagem com comentários na medida em que os partidos geram mais postagens, mesmo que isso seja mais evidente com assuntos relacionados à ingerência governamental e economia.

Justifica-se a relevância deste estudo sob a perspectiva empírica e gerencial. A difusão de informações relacionadas às ações antiéticas se apresentou alastrada, porém, com limitação na natureza das intenções, resumidas a ataques aos adversários políticos. De fato, não houve nos perfis analisados apresentação de ações antiéticas voltadas ao debate político apartidário, indicando a predileção destes partidos de impressionar e convidar os usuários para discussão, ao invés do diálogo, tendo em vista o caráter irônico, sarcástico e agressivo de algumas postagens. Recomenda-se que pesquisas futuras investiguem a difusão de ações antiéticas no ambiente virtual em outras organizações políticas de natureza apartidária, como organizações sem fins lucrativos ou grupos de movimentos sociais, mesmo que em outras mídias sociais.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    17 Maio 2016
  • Aceito
    17 Set 2016
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