Introdução
As forrageiras tropicais, devido ao seu potencial produtivo, são capazes de sustentar altas produções de leite por área, porém, devido ao valor nutricional, não são capazes de sustentar, sozinhas, altas produções individuais. Isso faz com que haja a necessidade do uso de fontes energéticas que possam melhorar a qualidade da dieta. É crescente a utilização de alimentos nutritivos para valorização das forrageiras no Brasil. Um desses é a polpa cítrica desidratada, que compreende o resíduo composto por cascas, sementes e polpa obtidas durante a extração do suco de laranja e limão. Ao ser seca e peletizada, ela pode ser armazenada por um período de até quatro meses(1).
A polpa cítrica possui em torno de 80% de nutrientes digestíveis totais (NDT)(2). Como sua parede celular é altamente degradável e com grande proporção de pectina, o produto final da fermentação é o ácido acético. Além do alto teor de carboidratos solúveis e da parede celular altamente digestível, a polpa cítrica apresenta em sua composição 25% de pectina, um carboidrato estrutural quase totalmente (90-100%) degradável no rúmen(3).
A degradação de alimentos ricos em pectina, comparada à de alimentos ricos em amido, promove maior proporção da relação dos ácidos acético:propiônico e mínima produção de ácido lático, além de manter o pH em níveis mais estáveis(3). Segundo Porcionato et al.(4), a polpa de citrus aumenta os coeficientes de digestibilidade dos nutrientes.
O objetivo deste trabalho foi avaliar a utilização de carboidratos não fibrosos na alimentação de vacas leiteiras e seus reflexos sobre o consumo e a digestibilidade, parâmetros de fermentação ruminal, produção e composição do leite.
Material e Métodos
O experimento foi desenvolvido no Departamento de Zootecnia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás), em Goiânia-GO, e no Laboratório de Bromatologia da Escola de Veterinária da UFMG entre os meses de julho e setembro 2005.
Para ensilagem, a forragem de sorgo híbrido forrageiro Agroceres Volumax® foi picada em partículas com 2,5 cm. O resíduo da indústria de milho verde, utilizado como parte do volumoso, consistiu de resíduo do aproveitamento do grão do milho verde para consumo humano, constituído pelas sobras de palha, sabugo e grãos refugados, após pré-cozimento para debulha dos grãos, na proporção de 0,10 kg de milho em grão para 100 kg de palha e sabugo, sem trituração, e imediatamente ensilado.
Como volumoso, utilizaram-se silagem de sorgo (65%) e silagem de resíduo de milho (35%). Utilizaram-se sementes do sorgo híbrido forrageiro Agroceres Volumax®, plantadas numa área de 3,5 hectares, com espaçamento de 0,5 m entre linhas, com 14 sementes por metro linear. O material foi picado em picadeira, calibrada para tamanhos de partícula de 2,5 cm. O resíduo da indústria de milho verde utilizado como parte do volumoso foi adquirido junto à firma Kero Alimentos®. O mesmo foi armazenado em silos tipo superfície, como recebido da indústria, e cobertos com lona de polietileno de 400 micras (400 ().
Foram utilizadas nove vacas da raça Holandês, pluríparas, com 80 ± 24 dias de lactação e produção média diária de 20 ± 0,58 kg de leite/vaca/dia, no início do experimento. Três destas vacas eram canuladas no rúmen. Os animais foram mantidos em confinamento tipo tie stall, com cocho para alimentação e bebedouro individualizados. Adotou-se o delineamento em quadrado latino 3 x 3, sendo três animais, três dietas e três períodos experimentais. Os períodos experimentais tiveram duração de 21 dias, sendo 14 dias de adaptação e sete de coleta.
As médias obtidas para consumo, digestibilidade, produção e composição do leite foram avaliadas em quadrado latino. As médias obtidas para AGV (ácidos graxos voláteis) e N-NH3 foram analisadas por quadrado latino com parcelas subdivididas.
Forneceu-se silagem de sorgo e silagem de resíduo da indústria de milho como alimento volumoso, com suplementação de concentrados, ajustados semanalmente de acordo com o peso vivo e a produção individual. A relação volumoso:concentrado da dieta foi mantida em 59:41 (Tabela 1). Os animais tiveram acesso à suplementação mineral e água ad libitum(2). As dietas, isoproteicas, consistiram na substituição do grão de milho pela polpa cítrica triturada, sendo: volumoso mais concentrado à base de grão de milho (MG); volumoso mais concentrado à base de grão de milho e de polpa cítrica, em proporções iguais (MP); volumoso mais concentrado à base de polpa cítrica (PC) (Tabela 1). Os alimentos foram homogeneizados manualmente, nos cochos, antes do fornecimento aos animais. As rações foram fornecidas em duas refeições, às 8 e às 18 horas, em quantidade suficiente para restar 10% de sobras.
Tabela 1 Proporção e composição química dos ingredientes e das dietas experimentais
Ingredientes (%MS) | MG1 | MP | PC |
---|---|---|---|
Silagem de sorgo | 31,7 | 32,0 | 31,7 |
Silagem de resíduo de milho | 20,9 | 20,6 | 20,9 |
Milho em grão | 22,54 | 11,33 | - |
Polpa cítrica | - | 11,28 | 21,33 |
Farelo de soja | 22,54 | 22,61 | 24,14 |
Fosbovi 20®2 | - | 0,56 | 0,56 |
Bovigold®3 | 0,61 | - | - |
Bicarbonato de sódio | 0,56 | 0,56 | 0,56 |
Sal branco comum | 0,32 | 0,28 | 0,28 |
Calcário calcítico | 0,33 | - | - |
Nutriente (%MS) | Dieta 1 | Dieta 2 | Dieta 3 |
MS | 33,38 | 33,15 | 34,88 |
PB | 16,7 | 16,9 | 16,8 |
EE | 2,30 | 2,34 | 2,20 |
FDN | 46 | 45 | 45 |
FDA | 26 | 26 | 26 |
CNF | 43,39 | 44,29 | 44,53 |
Ca | 1,27 | 1,27 | 1,21 |
P | 0,34 | 0,27 | 0,26 |
1MG = grão de milho (100%). MP = grão de milho (50%) + polpa cítrica (50%). PC= polpa cítrica (100%). MS = matéria seca; PB = proteína bruta; FDN = fibra em detergente neutro; FDA = fibra em detergente ácido; Ca = cálcio; P = fósforo; EE = extrato etéreo; CNF = carboidratos não fibrosos.
2Fosbovi 20® = Ca-107 g/kg; P-88 g/kg; S-12 g/kg; Na-126 g/kg; Co-55,6 mg/kg; Cu-1.530 mg/kg; Fe-1.800 mg/kg; I-75 mg/kg; Mn-1.300 mg/kg; Se-15 mg/kg; Zn-3.630 mg/kg; F-880 mg/kg;
3Bovigold®: Ca-190 g/kg; P-60 g/kg; S-20 g/kg; Mg-20 gkg; K-35 g/kg; Na-70 g/kg; Co-15 mg/kg; Cu-700 mg/kg; Cr-10 mgkg; Fe-700 mg/kg; I-40 mg/kg; Mn-1.600 mg/kg; Se-19 mg/kg; Zn-2.500 mg/kg; F-600 mg/kg; Vit. A-200.000 Ul/kg; Vit. D3-50.000 UI/kg; Vit E-1.500 UI/kg.
As análises químicas dos componentes da dieta foram realizadas no Laboratório de Bromatologia do Departamento de Zootecnia da PUC/GO. Os alimentos foram analisados quanto aos teores de matéria seca (MS), proteína bruta (PB), extrato etéreo (EE), matéria mineral (MM) e amido, seguindo os procedimentos padrões da Association of Official Analytical Chemists(5), fibra solúvel em detergente neutro (FDN) e fibra solúvel em detergente ácido (FDA)(6). Semanalmente, determinou-se a MS do volumoso. As amostras dos alimentos oferecidos e das sobras foram coletadas do 15º ao 21º dia de cada período, acondicionadas em sacos plásticos e congeladas para posteriores análises químicas.
As análises dos componentes do leite foram realizadas no Centro de Pesquisas de Alimentos (CPA), da Escola de Veterinária da Universidade Federal de Goiás, determinadas por espectrometria de infravermelho em aparelho B2300 Combi® (Bentley). A densidade das amostras foi determinada pela leitura direta em um termolactodensímetro. As análises de nitrogênio ureico no leite foram realizadas no Laboratório de Fisiologia da Lactação da Clínica do Leite, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ), Piracicaba-SP, utilizando-se aparelho Chemspec150®, Bentley Instruments. As análises dos ácidos graxos voláteis, nitrogênio amoniacal e marcadores externos foram realizadas no Laboratório de Nutrição do Departamento de Zootecnia da Escola de Veterinária da UFMG, pela espectrometria de absorção atômica em espectrofotômetro Perkin Elmer 3110®, e por análise de cromatografia gasosa em aparelho Shimadzu GC-17 A®, respectivamente.
Para cálculo da digestibilidade aparente, utilizou-se a coleta total de fezes por cinco dias consecutivos, do 14º ao 19º dia de cada período experimental, sendo as fezes coletadas diretamente do piso de concreto do tie stall, armazenadas em containers plásticos e pesadas ao final do período(7,8). Durante as coletas, procurou-se evitar a mistura das fezes com urina no piso do tie stall. Para análise laboratorial, as fezes foram coletadas diretamente na ampola retal dos nove animais, com luvas plásticas descartáveis, a intervalos de 12 horas, às 6 e 18 h, 9 e 21 h, 12 e 24 h, 15 e 03 h, 18 e 6 h, sempre atrasando 3 horas, em quatro dias seguidos, a partir do 18º dia do período experimental. Após a pré-secagem as amostras foram moídas em peneira com malhas de 1 mm, perfazendo uma amostra composta por animal no período, sendo submetidas a análises de MS, FDA, FDN, PB, EE e MM. Os CNF foram obtidos por diferença (CNF = 100 - (FDN +PB +EE + Cinzas)(9).
De cada ordenha individual coletaram-se 30 mL de leite, homogeneizados em frascos com tampa de baquelita, esterilizados e com conservante Bronopol® (2-bromo-2-nitropropano-1, 3-diol), sendo o material enviado imediatamente ao laboratório onde se determinaram as percentagens de extrato seco total, gordura, lactose e proteína, pelo método de leitura por infravermelho, com análise automatizada em aparelho Milco Scan 104, Foss Electric®.
As análises de nitrogênio ureico do leite (NUL) foram realizadas por colorimetria enzimática, em equipamento ChemSpeck 150® (Bentley Instruments, Chaska, MN). A produção total de leite foi aferida em quatro ordenhas consecutivas, nas manhãs e tardes do 18º e 19º dias de cada período experimental, pesando-se individualmente as produções de cada animal em balanças digitais. A produção total de cada animal no período foi corrigida para 4% de gordura, calculado como: (0,4 x peso do leite) + (15 x peso da gordura)(10).
As médias foram comparadas por contrastes ortogonais com utilização do SAS(11), adotando-se um nível de significância de 5% (P≤0,05).
Resultados e discussão
Não houve efeito (P≥0,05) nos consumos de matéria seca (CMS), de proteína bruta (CPB), fibra em detergente neutro (CFDN), fibra em detergente ácido (CFDA), carboidratos não-fibrosos (CCNF), consumo de MS em percentagem do peso vivo (PPVCMS) e consumo de FDN em percentagem do peso vivo das dietas oferecidas aos animais (PPVCFDN), nos períodos experimentais (Tabela 2). Esses resultados concordam com os resultados de Salvador et al.(12), que não observaram diferenças no consumo de MS com inclusão de polpa cítrica na dieta.
Tabela 2 Consumo dos nutrientes (kg dia) por vacas da raça Holandês em lactação alimentadas com dietas de polpa cítrica em substituição do milho
Nutrientes | Tratamentos | EP | Valor de P | ||||
---|---|---|---|---|---|---|---|
MG | MP | PC | MG vs MP |
MG vs PC |
MP vs PC |
||
CMS | 16,14 | 16,39 | 17,17 | 2,66 | 0,6120 | 0,5735 | 0,5553 |
CFDN | 7,54 | 7,91 | 8,04 | 1,02 | 0,8411 | 0,3387 | 0,7911 |
CFDA | 3,74 | 4,19 | 4,29 | 0,63 | 0,4698 | 0,1054 | 0,7412 |
CPB | 2,57 | 2,31 | 2,41 | 0,39 | 0,4701 | 0,2388 | 0,5946 |
CCNF | 4,29 | 4,24 | 4,61 | 0,21 | 0,3233 | 0,4282 | 0,1200 |
PPVCMS | 2,53 | 2,48 | 2,58 | 0,43 | 0,8001 | 0,9915 | 0,6343 |
PPVCFDN | 1,26 | 1,28 | 1,41 | 0,22 | 0,5142 | 0,4093 | 0,2615 |
MG = grão de milho triturado (100%). MP = grão de milho triturado (50%) + polpa cítrica (50%); PC= polpa cítrica (100%). CMS = consumo de matéria seca; CPB = consumo de proteína bruta; CFDN = consumo de fibra em detergente neutro; CFDA = consumo de fibra em detergente ácido; CCNF = consumo de carboidratos não-fibrosos; PPVCMS = consumo de MS em percentagem do peso vivo; PPVCFDN = consumo de FDN em percentagem do peso vivo; Valor de P = nível de significância. EP = erro padrão da média.
A Tabela 3 apresenta os coeficientes médios de digestibilidade dos nutrientes das dietas.
Tabela 3 Digestibilidade aparente dos nutrientes de dietas por vacas holandesas em lactação alimentadas com dietas com polpa cítrica em substituição ao milho
Dieta | DMO | DMS | DFDN | DFDA | DCNF |
---|---|---|---|---|---|
MG | 69,90 | 67,17 | 54,06 | 51,59 | 81,36 |
MP | 67,18 | 63,98 | 57,81 | 54,43 | 78,59 |
PC | 70,50 | 67,24 | 59,29 | 54,69 | 84,45 |
Contrastes | Valor de P | ||||
MG vs MP | 0,5912 | 0,4280 | 0,0912 | 0,4039 | 0,9755 |
MG vs PC | 0,8507 | 0,1586 | 0,6001 | 0,1285 | 0,7758 |
MP vs PC | 0,1760 | 0,1768 | 0,5873 | 0,5850 | 0,1164 |
DMO = digestibilidade da matéria orgânica; DMS = digestibilidade da matéria seca; DFDN = digestibilidade da fibra em detergente neutro; DFDA = digestibilidade da fibra em detergente ácido; DCNF = digestibilidade dos carboidratos não-fíbrosos; MG = milho grão triturado (100%); MP = milho grão triturado (50%) + polpa cítrica (50%); PC= polpa cítrica (100%).
Não houve diferença (P≥0,05) para a digestibilidade dos nutrientes das dietas com inclusão de níveis crescentes de polpa cítrica em substituição ao milho grão triturado (Tabela 3). Os resultados aproximam-se dos obtidos por Assis et al.(13), que não obtiveram diferença para digestibilidade dos nutrientes com inclusão de polpa cítrica em substituição a até 100% do grão de milho em dietas para vacas em lactação. Também se assemelham aos resultados obtidos por Miron et al.(14) para digestibilidade de dietas para vacas em lactação com substituição do grão de milho por polpa cítrica, podendo-se inferir que a digestibilidade mais alta das dietas com polpa cítrica em relação às dietas com níveis mais altos de milho seria em consequência da alta digestibilidade dos carboidratos presentes na polpa. É possível que fatores associados à palatabilidade da polpa cítrica tenham influenciado nessa digestibilidade.
Não houve diferença (P≥0,05) para a digestibilidade dos nutrientes das dietas com inclusão de níveis crescentes de polpa cítrica em substituição ao milho grão triturado (Tabela 3).
Os resultados aproximam-se dos obtidos por Assis et al.(13), que não obtiveram diferença para digestibilidade dos nutrientes com inclusão de polpa cítrica em substituição a até 100% do grão de milho em dietas para vacas em lactação. Também se assemelham aos resultados obtidos por Miron et al.(14) para digestibilidade de dietas para vacas em lactação com substituição do grão de milho por polpa cítrica, podendo-se inferir que a digestibilidade mais alta das dietas com polpa cítrica em relação às dietas com níveis mais altos de milho seria em consequência da alta digestibilidade dos carboidratos presentes na polpa. É possível que fatores associados à palatabilidade da polpa cítrica tenham influenciado nessa digestibilidade.
A inclusão de polpa cítrica na dieta em substituição ao grão de milho triturado não influenciou (P>0,480) a produção total de leite corrigido para 4% de gordura, nem os percentuais de proteína, lactose, extrato seco total e gordura do leite (Tabela 4). O possível efeito associativo de milho com polpa cítrica no rúmen pode ter capturado mais nitrogênio.
Tabela 4 Produção e composição do leite e produção de leite corrigido para 4% de gordura de vacas holandesas em lactação com polpa crítica em substituição parcial ou total do milho na porção concentrada da dieta.
Tratamentos | Contraste | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
MG | MP | PC | EP | Linear | Quadrático | |
P. Leite 4% gord. (kg/d) | 20,72 | 20,55 | 20,25 | 0,58 | >0,373 | > 0,480 |
Gordura (%) | 4,34 | 4,02 | 3,96 | 0,15 | >0,122 | > 0,349 |
Proteína (%) | 3,55 | 3,36 | 3,33 | 0,08 | >0,191 | > 0,244 |
EST (%) | 13,29 | 12,92 | 12,83 | 0,17 | >0,138 | > 0,345 |
Lactose (%) | 4,63 | 4,62 | 4,50 | 0,05 | >0,184 | > 0,274 |
NUL (mg/dl) | 17,07 | 15,84 | 16,84 | 0,59 | >0,438 | >0,195 |
MG = milho grão triturado (100%). MP = milho grão triturado (50%) + polpa cítrica (50%); PC= polpa cítrica (100%). NUL = nitrogênio uréico do leite, EST = extrato seco total; P. Leite 4% gord. = produção de leite corrigida para 4% de gordura; EP = erro padrão da média; p valor = nível de significância.
Quando da substituição parcial ou total de milho seco por polpa de citrus sobre a produção e a composição do leite de vacas, não foi detectada diferença na produção de leite total, de leite corrigido para gordura e para sólidos entre tratamentos. Vacas que receberam polpa de citrus tiveram maior porcentagem de gordura no leite(15).
A substituição total de milho por polpa cítrica reduziu o teor e a produção de proteína no leite (P<0,03) e não afetou a secreção de gordura(12). Garcia et al.(15) e Santos et al.(16) também relataram aumento da produção de leite corrigido para gordura com a inclusão de polpa cítrica na dieta.
Pedroso et al.(17) avaliaram substituição do milho moído por farelo de glúten de milho para vacas em lactação alimentadas com ração completa contendo silagem de milho como volumoso principal e polpa cítrica como parte da fonte energética e verificaram que a produção de leite, a produção de leite corrigida, o teor de gordura e o teor de sólidos totais não foram afetados pela substituição do milho moído por farelo de glúten de milho. Os resultados obtidos para produção total de leite corrigidos para 4% de gordura, bem como os percentuais de proteína, lactose, extrato seco total e gordura do leite assemelham-se aos descritos por Pedroso et al. (17), que, ao substituírem o milho grão triturado pela polpa cítrica, não encontraram diferenças significativas na produção de leite ou nos teores de gordura, proteína e lactose.
Hall et al.(18), avaliando carboidratos na dieta de vacas leiteiras, relataram que animais que consumiram polpa cítrica tiveram percentual de gordura de leite maior em relação a vacas que consumiram milho moído, mas tiveram menor percentual de proteína e nitrogênio ureico do leite. Neste estudo, porém, a gordura do leite não aumentou com a substituição do milho grão por polpa cítrica na dieta.
Costa et al.(19) avaliaram o desempenho de vacas leiteiras que consumiram polpa cítrica e dois teores dietéticos de silagem de grão úmido de milho. O teor de polpa cítrica na dieta foi de 16,2% ou 25,6%, com alto e baixo milho, respectivamente. Alto milho diminuiu o teor de gordura do leite e aumentou o teor de proteína.
As médias aferidas no presente trabalho para composição do leite estão dentro dos parâmetros verificados por Broderick(20) e Hristov et al.(21).
De acordo com Stoop et al.(22) e Miglior et al.(23), a correlação fenotípica de NUL com cada uma das características de produção de leite é baixa e esses autores sugerem que seus valores podem ser influenciados tanto pelo manejo do rebanho, quanto pela seleção genética. No presente trabalho, não foram constatadas alterações (p> 0,195) nos teores de NUL para as diferentes proporções de polpa cítrica na dieta, sugerindo que a inclusão de proporções mais elevadas de carboidratos prontamente fermentáveis na dieta não influencia a concentração de nitrogênio ureico do leite.
A Tabela 5 apresenta os resultados para pH do líquido ruminal em função das dietas.
Tabela 5 Valores para pH do líquido ruminal de vacas holandesas em lactação com polpa cítrica em substituição ao grão de milho na dieta
Tempo (h) | Tratamentos | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
MG | S | MP | S | PC | S | |
0 | 7,21 | 0,54 | 7,26 | 0,219 | 7,05 | 0,13 |
2 | 6,49 | 0,30 | 6,73 | 0,40 | 6,82 | 0,36 |
3 | 6,16 | 0,19 | 6,25 | 0,17 | 6,43 | 0,38 |
6 | 6,14 | 0,31 | 6,12 | 0,09 | 6,23 | 0,56 |
9 | 6,42 | 0,47 | 6,48 | 0,60 | 6,50 | 0,42 |
12 | 6,23 | 0,42 | 5,96 | 0,33 | 6,21 | 0,84 |
14 | 6,01 | 0,08 | 5,76 | 0,33 | 6,06 | 0,21 |
15 | 6,03 | 0,16 | 6,20 | 0,15 | 6,16 | 0,32 |
18 | 6,37 | 0,31 | 6,40 | 0,39 | 6,44 | 0,52 |
24 | 6,54 | 0,43 | 6,76 | 0,13 | 6,80 | 0,43 |
MG = grão de milho triturado (100%). MP = grão de milho triturado (50%) + polpa cítrica (50%); PC= polpa cítrica (100%). s = desvio padrão.
As médias para o pH do fluido ruminal, nos diferentes tempos, situaram-se entre 5,86 e 7,35, valores que permitem atividade regular de bactérias fibrolíticas e manutenção da degradação da fibra. Esses resultados são similares aos obtidos por Burke et al.(24) com polpa de beterraba, com concentração de carboidratos solúveis semelhantes às desta pesquisa.
O pH do líquido ruminal aumentou gradativamente à medida que se aproximou do tempo pré-alimentar (0 h) ou do tempo final de coleta (24 h). A redução do pH pode estar associada à presença de matéria orgânica rapidamente fermentável. Esses resultados se assemelham aos resultados obtidos por Assis et al.(25), em estudo com derivados de citrus.
O teor de N-NH3 apresentou diferenças nos tempos equivalentes a 2 e 3 horas pós-alimentação em relação às demais médias (Tabela 6). O aumento das concentrações de N-NH3 nestes tempos evidenciam degradação rápida das dietas, notadamente pelos teores de carboidratos solúveis dos concentrados e pela pronta degradabilidade da pectina, favorecendo a digestibilidade da dieta. Nesse período, as médias estavam acima de 23 mg/100 mL, parâmetro considerado ótimos para a atividade fermentativa máxima ruminal.
Teores elevados de amido na dieta podem predispor um pH ruminal crítico para a degradação de fibra no rúmen. A fração fibrosa da polpa cítrica apresenta elevada digestibilidade ruminal. A substituição de parte do amido por polpa cítrica peletizada permite elevar o teor de fibra na dieta e manter adequada disponibilidade de carboidrato degradável no rúmen.
Tabela 6 Concentrações de N-NH3 (mg/100 mL) do líquido ruminal de vacas holandesas em lactação com polpa cítrica em substituição parcial ou total do milho na porção concentrada da dieta em função do tempo pós-alimentação (horas pós-alimentação)
Tempo pós-alimentaçào | Tratamentos | ||
---|---|---|---|
MG | MP | PC | |
0 | 14,46 | 15,51 | 16,10 |
2 | 25,43 | 25,43 | 23,56 |
3 | 20,30 | 26,83 | 24,50 |
6 | 13,30 | 11,20 | 12,09 |
9 | 14,90 | 14,00 | 14,00 |
12 | 17,50 | 14,00 | 15,63 |
14 | 10,87 | 10,03 | 9,33 |
15 | 13,30 | 12,60 | 10,50 |
18 | 10,96 | 9,80 | 9,33 |
24 | 20,06 | 17,03 | 13,30 |
MG = milho grão triturado (100%). MP = milho grão triturado (50%) + polpa cítrica (30%) PC= polpa cítrica (100%). N-NH3 = nitrogênio amoniacal.
Os tratamentos não influenciaram a concentração de AGV's totais ou a relação acetato/propionato (Tabela 7). Em termos absolutos esta relação foi maior para a dieta com 100% de polpa cítrica (média de 1,39), seguida pelo tratamento com 50% de polpa cítrica e 50% de milho grão (média de 1,24) e milho grão triturado (média de 1,13). Apesar da rápida fermentação da polpa cítrica no rúmen e do seu potencial de proporcionar uma maior energia fermentável para aumentar a produção de proteína microbiana, alimentando açúcares em lugar de fontes de amido na dieta, ela não diminui o pH ruminal ou melhora a eficiência de utilização de nitrogênio, bem como a produção de proteínas do leite em vacas leiteiras(26). Os resultados assemelham-se aos obtidos por Salvador et al.(12), que não encontraram alterações nas taxas de AGV's, ou na relação acetato/propionato, quando da substituição total do milho pela polpa cítrica na dieta de vacas leiteiras.
Tabela 7 Concentração de AGYs totais e relação acetato/propionato (mMol/lOOmL) aferida do liquido ruminal de vacas holandesas em lactação com polpa cítrica em substituição parcial ou total do milho na porção concentrada da dieta em função do tempo pós-alimentação (horas pós-alimentação)
Tempo | Tratamentos | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
MG | MP | PC | ||||
AGV’s totais | Acet./prop. | AGV’s totais |
Acet./prop. | AGV’s totais |
Acet./prop. | |
0 | 6,15 | 0,89 | 5,98 | 1,48 | 7,79 | 1,21 |
2 | 6,47 | 0,99 | 7,71 | 1,27 | 7,47 | 1,69 |
3 | 10,56 | 1,05 | 9,18 | 1,21 | 8,79 | 1,06 |
6 | 9,63 | 1,06 | 5,17 | 1,37 | 8,62 | 1,50 |
9 | 6,41 | 1,73 | 7,35 | 1,18 | 10,95 | 1,39 |
12 | 9,83 | 1,00 | 9,25 | 1,16 | 6,53 | 1,28 |
14 | 8,85 | 1,02 | 8,37 | 1,15 | 9,04 | 1,38 |
15 | 8,77 | 1,06 | 8,98 | 1,13 | 8,42 | 1,48 |
18 | 7,66 | 1,26 | 8,99 | 1,33 | 6,29 | 1,39 |
24 | 7,86 | 1,27 | 8,69 | 1,14 | 5,74 | 1,54 |
MG = milho grão triturado (100%). MP = milho grão triturado (50%) + polpa cítrica (50%); PC= polpa cítrica (100%). AGV's totais = concentração total de ácidos graxos voláteis; Acet./prop.= relação acetato/propionato.
O aumento dos valores médios de pH à medida que se aproximou o período pré-alimentar dos animais sugere a absorção do conjunto de ácidos graxos produzidos. Como os valores médios estavam dentro dos parâmetros que favorecem a atividade ótima da microbiota ruminal, essa variável não interferiu na digestão da dieta.
A maior produção de acetato e maior relação acetato/propionato quando do fornecimento de dieta com 100% de polpa cítrica reforça a maior produção de acetato quando da degradação da pectina, enquanto a degradação do amido dos grãos resulta em maior proporção de propionato(27).
O padrão de fermentação não se deu pelo tipo de carboidrato utilizado na porção concentrada da dieta. A manutenção da proporção molar dos AGV's obtida no trabalho sugere que os fatores intrínsecos ruminais como o pH e as concentrações de N-NH3 não influenciaram a microbiota, permitindo a utilização dos nutrientes de maneira similar dentro dos tratamentos. Isso se reflete na similaridade dos coeficientes de digestibilidade das dietas e no desempenho dos animais quanto à produção e composição do leite
Conclusões
Vacas leiteiras da raça Holandês com nível de produção de leite de 20 kg/dia, em média, podem ser alimentadas com dietas com polpa cítrica em substituição de 50 a 100% do grão de milho, uma vez que a produção e a composição do leite se mostraram semelhantes quando da variação das dietas. A inclusão de polpa cítrica na dieta de vacas leiteiras em substituição ao milho grão triturado, em 50 ou 100%, não promove alterações nos parâmetros de fermentação ruminal e no consumo de nutrientes.