Análise de variáveis inerentes à dinâmica da prática da vaquejada para determinação de sua influência sobre o resultado obtido na competição

Resumo

Objetivou-se com este trabalho avaliar por meio de análise de vídeos de domínio público de competições de vaquejadas, diversas tentativas de derrubada de rezes e correlacionar o êxito obtido com ações desempenhadas pelos conjuntos cavalo/ cavaleiro. Foram considerados aproximadamente 300 vídeos, sendo os grupos avaliados quanto à categoria de competição, Amador/Aspirante e Profissional, e aos animais utilizados na prova, Puxar ou Esteirar a rês. Verificou-se que para o conjunto de puxar, da categoria profissional de competição, apenas as características de direcionamento da rês na pista, comportamento na condução e posicionamento na puxada foram significativos (p<0,01), enquanto para a categoria amador/ aspirante houve efeito (p<0,01) para a característica de permanecer ou não na puxada após queda da rês e para o comportamento na porteira. A característica, permanecer na puxada após a queda da rês, na categoria de atletas puxadores profissionais, existe em maior prevalência em ações durante a prova com 85,3% dos casos, enquanto a característica de direcionar a rês para a lateral da pista é realizada por 87,6% dos competidores. Para o conjunto utilizado para esteirar a rês, os valores das dimensões 1 e 2 foram de 96,56% e 3,43%, respectivamente, totalizando 99,9% da variância total dos dados com base nos critérios selecionados para o resultado final de “Valeu o boi”. O uso da análise de correspondência múltipla no estudo de variáveis associadas ao sucesso em competições de vaquejada mostrou-se bastante eficaz, no que tange a diminuição do universo de elementos com maior peso de determinação no resultado final obtido.

Palavras-chave:
Equideocultura; esforço; cavalo de puxar; cavalo de esteira

Abstract

The objective of this work was to evaluate several attempts to knock down neats and to correlate the success obtained with actions performed by the horse/rider sets through an analysis of public domain videos of vaquejadas. Approximately 300 videos were considered, and the groups were evaluated according to the competition category, that is, amateur/aspirant and professional, and the animals used in the test, that is, pulling or tracking of the neat. It was found that for the pull set in the professional competition category, only the characteristics of directing the cow on the track, and the guiding behavior and positioning in the pull were significant (p<0.01), while for the amateur/aspirant category, the characteristics of remaining in the pull after falling of the cattle and of the behavior at the gate had an effect (p<0.01). The characteristic of remaining in the pull after the fall of the neats, in the category of professional pulling athletes, exists in greater prevalence during the competition with 85.3%, while the characteristic of directing the neat to the side of the track is performed by 87.6% of the competitors. For the set used to track the cattle, the values of the dimensions 1 and 2 were 96.56% and 3.43%, respectively, which is 99.9% of the total variance of the data based on those selected for the final result of “earn the ox”. The use of multiple diversity analysis in this study of variables associated with the vaquejada set proved to be quite advantageous, and there was not much variation in the elements obtained with a greater weight in the determination of the final result.

Keywords:
equine breeding; efort; pull horse; track horse

1. Introdução

A análise de dados é primordial para a melhoria dos índices produtivos de qualquer atividade pecuária, e muitos estudos são desenvolvidos anualmente no Brasil e no mundo para este fim. Contudo, na equideocultura, onde o principal produto obtido não é a produção de carne ou leite, mas sim os resultados dos animais nas provas equestres das quais participam, muitos fatores além dos relacionados a própria criação podem influenciar nesse processo, devido a dinâmica inerente à prática de cada modalidade. Em situações como essa, onde um conjunto grande de variáveis pode interferir em um resultado produtivo obtido, as estatísticas multivariadas de dados permitem a análise simultânea destas variáveis envolvidas no processo, estudando e descrevendo as covariações e relações entre elas (¹).

A vaquejada é um esporte tradicional do Brasil que envolve cavalos e atletas de competição, gerando impacto na economia nacional e contribuindo para tornar o rebanho equino do país um dos maiores do mundo (², ³). Há uma grande exigência dos cavalos utilizados nessas competições, uma vez que estes efetuam um esforço físico de elevada intensidade em um intervalo de tempo de curta duração, o qual se traduz em veloz largada, variações de direção e estancadas inesperadas, além de exigir elevada força física durante a derrubada do boi (⁴, ⁵).

A relação homem-animal é um dos fatores que influenciam o desempenho e o comportamento do cavalo, e embora a vaquejada seja um esporte popular no Brasil, o manejo dos animais e os estudos sobre o comportamento animal são deficientes (⁵, ⁶, ⁷). Assim, o entendimento da dinâmica do esporte e dos vários aspectos que podem vir a determinar o sucesso ou o fracasso da “busca e derrubada da rês” na pista de competição torna-se fundamental para o treinamento dos atletas.

Apesar de vários trabalhos científicos demonstrarem a importância e a influência dos aspectos fisiológicos e biométricos dos animais para a prática da vaquejada (⁸, ⁹, ⁵), nenhum estudo aborda o efeito da relação homem-animal durante a competição como parâmetro influenciador para obtenção de êxito por parte do conjunto cavalo/cavaleiro no resultado final das provas.

Dentre as técnicas de análise multivariada, a análise de correspondência múltipla permite avaliar graficamente as relações entre as categorias do esporte e fatores da relação homem-animal durante a competição, reduzindo a dimensionalidade do conjunto de dados através da determinação do grau de associação global entre suas linhas e as colunas de uma matriz, indicando como as variáveis estão relacionadas (¹⁰). Desta forma, objetivou-se com esse estudo, avaliar aspectos inerentes à dinâmica da prática da vaquejada a fim de identificar fatores associados as ações dos conjuntos cavalo/ cavaleiro para obtenção do sucesso na prática desta atividade esportiva.

2. Material e métodos

O trabalho foi realizado por meio de análise de vídeos de domínio público de competições de vaquejadas credenciadas junto a Associação Alagoana de Criadores de Cavalo Quarto de Milha (ALQM), realizadas no segundo semestre do ano de 2018, cujas regras e condutas seguem as instruções normativas reguladoras do esporte referentes à sua prática com garantia do bem-estar dos animais envolvidos. Foram avaliadas mais de trezentas (300) tentativas de derruba de rezes, sendo cento e setenta e nove (179) praticadas por atletas inscritos na categoria de competidores amadores/aspirantes e outras cento e vinte e nove (129) por atletas inscritos na categoria de competidores profissionais.

Os avaliadores permaneceram em sala isolada, dotada de equipamentos para assistirem os materiais gravados em mídia, para avaliar as tentativas de derrubada das rezes em vários aspectos, que envolveram condutas dos competidores, dos cavalos utilizados para puxar a rês e do cavalo utilizado para esteirar a rês. Foram considerados os grupos quanto à categoria de competição, quer sejam Amador/Aspirante e Profissional, e aos animais utilizados na prova, quer sejam para Puxar ou Esteirar a rês.

Levando em consideração a dinâmica própria desse esporte equestre, elencou-se fatores que podiam influenciar no sucesso na competição, quer estivessem relacionados aos competidores, quer aos cavalos utilizados para puxar e para esteirar a rês, quer associados as inter-relações entre os dois conjuntos cavalo/cavaleiro, a fim de tentar identificar quais destes seriam mais ou menos determinantes na obtenção de um resultado positivo ao final do processo em questão. Assim, os elementos considerados no estudo foram dispostos nas linhas de ações de variáveis associadas à conduta/ações do conjunto cavalo/cavaleiro de puxar a rês, e variáveis associadas à conduta/ações do cavalo/cavaleiro de esteirar a rês, conforme a Tabela 1.

Tabela 1
Variáveis elencadas e consideradas no estudo em relação as categorias de atletas e de cavalos avaliadas neste estudo

Cavalo/Cavaleiro de puxar		Cavalo/Cavaleiro de esteira
Característica	Resultado	Característica	Resultado
Posição de corrida	Esquerda	Movimento da rês	Sim
	Direita		Não
Sai da sela na puxada	Sim	Posição de condução	Atrás
	Não		Ao lado
Permanece na puxada após queda da rês	Sim	Entrega a cauda da rês	Sim
	Não		Não
Direcionamento da rês na pista	Na lateral	Confere a rês após a derrubada	Sim
	No meio		Não
Comportamento adequado na porteira	Sim	Comportamento adequado na porteira	Sim
	Não		Não
Participa da movimentação da Rês	Sim	Participa da movimentação da rês	Sim
	Não		Não
Comportamento tranquilo na condução	Sim	Comportamento tranquilo na condução	Sim
	Não		Não
Posicionamento na puxada	Diagonal	Posicionamento na puxada	Atrás da Rês
	Perpendicular		Ao lado da Rês

Os dados foram primariamente submetidos a análise de frequência para verificar a quantidade de vezes que os eventos elencados na tabela 1 ocorreram, e posteriormente esses valores foram testados pelo teste de qui-quadrado para avaliar as suas significâncias, verificando quais eventos diferem do seu oposto, considerando a natureza binária dos dados. As características que apresentaram significância para p≤ 0,10 foram selecionadas e analisadas através da análise multivariada de correspondência múltipla com o objetivo de verificar quais categorias dentro de cada característica mais influenciariam no resultado final.

Para a avaliação dos grupos profissional e amador (atleta de puxar e de esteira) foi realizado o teste de regressão logística múltipla com os resultados da análise de frequência, divididos por grupo com seleção de variáveis pelo método de stepwise com o objetivo de examinar os fatores subjacentes que influenciam no resultado final de validação de derrubada da rês em relação aos comportamentos realizados durante aprova de vaquejada. Para este trabalho foi utilizado o link logit (distribuição logística) ou a transformação logit da probabilidade p π (x), que considera:

$1\text{n}=\left\{\frac{\text{π}\left(\text{x}\right)}{1-\text{π}\left(\text{x}\right)}\right\}={\text{β}}_0+{\text{β}}_1{\text{x}}_1+{\text{β}}_2{\text{x}}_2+\cdots +{\text{β}}_{\text{k}}{\text{x}}_{\text{k}}.$

O modelo de regressão logística múltipla considera um conjunto de k variáveis independentes, que podem ser ou não numéricos, para prever a probabilidade de resposta a variável Y. Este modelo é expresso como:

$\text{Y}={\text{β}}_0+{\text{β}}_1{\text{x}}_1+{\text{β}}_2{\text{x}}_2+\cdots +{\text{β}}_{\text{k}}{\text{x}}_{\text{k}}+\text{ε}$

Neste caso específico em que a resposta é qualitativa binária, é considerada uma variável aleatória Y do tipo Bernoulli, e utiliza-se apenas dois valores: "um" que representa o sucesso ao final da prova, com probabilidade (de sucesso) π, ou "zero" para o insucesso na prova de vaquejada com probabilidade (de falha) 1 - π.

Por definição do valor esperado, a média condicional para dados dicotômicos é dada por $\text{E}\left(\text{Y}|\text{X}=\text{x}\right)=\text{π}\left(\text{x}\right)$. Assim:

$\text{E}\left(\text{Y}|\text{X}=\text{x}\right)={\text{β}}_0+{\text{β}}_1{\text{x}}_1+{\text{β}}_2{\text{x}}_2+\cdots +{\text{β}}_{\text{k}}{\text{x}}_{\text{k}}=\text{π}\left(\text{x}\right)$

Como $\text{E}\left(\text{Y}|\text{X}=\text{x}\right)$ deve estar entre zero e um, então: $\text{0}\le \text{E}\left(\text{Y}|\text{X}=\text{x}\right)\le 1$

$0\le {\text{β}}_0+{\text{β}}_1{\text{x}}_1+{\text{β}}_2{\text{x}}_2+\cdots +{\text{β}}_{\text{k}}{\text{x}}_{\text{k}}\le 1\le 1$

Desta forma, o modelo de regressão logística múltipla pode ser resumido por $\text{Y}=\text{E}\left(\text{Y}|\text{X}=\text{x}\right)+\text{ε}$, onde:

$\text{E}\left(\text{Y}|\text{X}=\text{x}\right)=\text{π}\left(\text{x}\right)=\frac{e^{{\text{β}}_0+{\text{β}}_1{\text{x}}_1+{\text{β}}_2{\text{x}}_2+\cdots +{\text{β}}_{\text{k}}{\text{x}}_{\text{k}}}}{1+e^{{\text{β}}_0+{\text{β}}_1{\text{x}}_1+{\text{β}}_2{\text{x}}_2+\cdots +{\text{β}}_{\text{k}}{\text{x}}_{\text{k}}}}$

A chance de um evento ocorrer em relação a outro é chamada de odds ratio (OR) e é dada por:

$O{R}_j=\frac{{\text{Chance}}_{\left(\text{J}+1\right)}}{{\text{Chance}}_{\left(\text{J}+1\right)}}=e^{{\beta }_j},j=1,2,3,\dots ,n$

Todas as análises foram realizadas no programa estatístico Statistical Analysis System SAS versão 9.0.

3. Resultados

Observa-se na Tabela 2 e na Figura 1 que para o conjunto de puxar, da categoria profissional de competição, apenas as características de direcionamento da rês na pista, comportamento na condução e posicionamento na puxada foram significativos (p<0,10), enquanto para a categoria amador/aspirante as características de permanecer ou não na puxada após queda da rês e o comportamento na porteira também se mostraram com significância estatística (p<0,10).

Tabela 2
Comparação de variáveis avaliadas entre as categorias Profissional (Prof) e Amador/ Aspirante (AM/AS) em função do resultado positivo ou negativo de “Valeu o boi” para o grupo de puxar em vaquejada.

Característica		Categoria da Característica	Cat. Profissional			Cat. Amador/Aspirante
			N	(%)	p-value	N	(%)	p-value
Posição de corrida	VB	Esquerda	31	41,3	0,236	52	55,9	0,208
		Direita	44	58,7		41	44,1
	NVB	Esquerda	28	48,2		56	65,1
		Direita	26	51,8		30	34,8
Sai da sela na puxada	VB	Sim	43	57,3	0,391	36	38,7	0,306
		Não	32	42,7		57	61,3
	NVB	Sim	35	64,8		27	31,4
		Não	19	35,2		59	68,6
Permanece na puxada após queda da rês	VB	Sim	14	18,7	0,136	24	25,8	0,048
		Não	61	81,3		69	74,2
	NVB	Sim	5	9,3		12	13,9
		Não	49	90,7		74	86,1
Direcionamento da rês na pista	VB	Na lateral	69	92	0,073	78	83,9	0,082
		No meio	6	8		15	16,1
	NVB	Na lateral	44	81,5		63	73,3
		No meio	10	18,5		23	26,7
Comportamento adequado na porteira	VB	Sim	41	54,7	0,346	59	63,4	0,078
		Não	34	45,3		34	36,5
	NVB	Sim	34	62,9		65	75,6
		Não	20	37,1		21	24,4
Participa da movimentação darês	VB	Sim	66	88	0,621	87	93.5	0,332
		Não	9	12		6	6,5
	NVB	Sim	49	90,7		77	89,5
		Não	5	9,3		9	10,5
Comportamento tranquilo na condução	VB	Sim	51	68	0,063	55	59,1	0,25
		Não	24	32		38	40,9
	NVB	Sim	28	51,8		58	67,4
		Não	26	48,2		28	32,6
Posicionamento na puxada	VB	Diagonal	26	34.7	0,051	36	38,7	0,009
		Perpendicular	49	65,3		57	61,3
	NVB	Diagonal	28	51,8		50	58,1
		Perpendicular	26	48,2		36	41,9

• VB – Valeu o boi; NVB – Não valeu o boi.

Figura 1
Representação da análise de correspondência em plano bidimensional das categorias das características significativas dos diferentes grupos: Valeu o Boi Categoria Profissional (VBP), Não Valeu o Boi Categoria Profissional (NVBP); Valeu o Boi Categoria Amador / Aspirante (VBA) e Não Valeu o Boi Categoria Profissional (NVBA).

Uma segunda ação com diferença estatística significativa observada foi a que se relaciona com o comportamento do animal de puxar durante a condução da rês pela pista, no que tange a este ser tranquilo ou conturbado (p=0,063). No que se refere ao posicionamento do cavalo de puxar na ação de derrubada da rês, para competidores da categoria profissional (p=0,051), verificou-se prevalência de 65,3% dos que realizam o movimento perpendicular a esta, nas apresentações que apresentaram resultado final positivo para o competidor.

Avaliando os dados dos atletas puxadores da categoria amador/aspirante, percebe-se uma prevalência de comportamento semelhante, em relação as mesmas ações verificadas nas apresentações dos puxadores profissionais. Assim, a ação de não permanecer na puxada após a queda da rês foi verificada em 79,9% dos casos, a de direcionar a rês para a lateral da pista em 78,8%, e a ação de participar da movimentação da rês junto à esteira, foi feita por 91,6% dos puxadores da categoria.

Considerando as ações com diferenças estatísticas significativas para os puxadores dessa categoria, identifica-se a variável de permanência da puxada na rês após a derrubada (p=0,048), observando-se prevalência para a não realização dessa ação em 74,2% das apresentações analisadas cujo resultado final foi positivo para o competidor. A segunda variável com diferença estatística comprovada no estudo, na categoria puxador amador/aspirante, foi a da prática de direcionar a rês para a lateral da pista (p=0,082), que contribuiu com o sucesso de 83% das apresentações analisadas que culminaram com resultado positivo, significância também observada nas apresentações da categoria de puxador profissional. Já a variável que trata do comportamento adequado do cavalo de puxar na porteira de saída do brete no início de cada apresentação analisada, mostrou-se significativa (p=0,078) para os puxadores dessa categoria, mas não para a dos profissionais.

No que se refere ao posicionamento do cavalo de puxar na ação de derrubada da rês para competidores da categoria amador/aspirante (p=0,009), verifica-se uma prevalência de 61,3% dos que realizam o movimento perpendicular a esta, nas apresentações que apresentaram um resultado final positivo para o competidor, resultado semelhante ao que foi encontrado para os competidores da categoria profissional. Foi possível identificar através da análise de correspondência duas dimensões (Dimensões 1 e 2), que explicaram 72,84% e 16,23%, respectivamente, totalizando 89,1% da variância total dos dados com base nos critérios selecionados para o resultado final de “Valeu o boi” adotados (Figura 1), o que representou uma perda de explicação de apenas 10,9%.

Avaliando os resultados contidos na Tabela 3 e na Figura 2, identifica-se que diferentemente dos conjuntos cavalo/cavaleiro de puxar, para os conjuntos cavalo/ cavaleiro de esteira existem preferências e prevalências de ações sobre quase todas as variáveis que destes são dependentes diretamente, com exceção da que se refere a participação ou não destes conjuntos na movimentação da rês que apresentou percentuais semelhantes para “sim” ou “não” independentemente da categoria considerada e do resultado final obtido. Foi possível identificar através da análise de correspondência duas dimensões (Dimensões 1 e 2), que explicaram 96,56% e 3,43%, respectivamente, totalizando 99,9% da variância total dos dados com base nos critérios selecionados para o resultado final de “Valeu o boi” adotados (Figura 2), demostrando que a análise conseguiu absorver toda a variação dos dados aumentando a confabilidade dos resultados apresentados.

Tabela 3
Comparação de variáveis avaliadas entre as categorias Profissional (Prof) e Amador/Aspirante (AM/AS) em função do resultado positivo ou negativo de “Valeu o Boi” para o grupo de esteira em vaquejada

Característica		Categoria da Característica	Cat. Profissional			Cat. Amador/Aspirante
			N	(%)	p-value	N	(%)	p-value
Movimento da Rês	VB	Sim	39	52	0,282	43	46,2	0,151
		Não	36	48		50	53,8
	NVB	Sim	22	42,3		33	35,9
		Não	30	57,6		59	64,1
Posição de Condução	VB	Atrás	16	21,1	0,599	6	6,45	0,984
		Ao lado	60	78,9		87	93,5
	NVB	Atrás	9	17,3		6	6,5
		Ao lado	43	82,7		86	93,5
Entrega a cauda da rês	VB	Sim	66	86,8	0,722	80	86	0,309
		Não	10	13,2		13	14
	NVB	Sim	44	84,6		74	80,43
		Não	8	15,4		18	19,57
Confere a rês após a derrubada	VB	Sim	69	90,8	<,0001	89	95,7	<0,001
		Não	7	9,2		4	4,3
	NVB	Sim	27	51,9		47	51,1
		Não	25	48,1		45	48.1
Comportamento adequado na porteira	VB	Sim	65	85,5	0,016	83	89,3	0,185
		Não	11	14,5		10	10,7
	NVB	Sim	51	98,1		87	94,6
		Não	1	1,92		5	5,43
Participa da movimentação da rês	VB	Sim	37	48,7	0,354	41	44,1	0,323
		Não	39	51,3		52	55,9
	NVB	Sim	21	40,4		34	37
		Não	31	59,6		58	63
Comportamento tranquilo na condução	VB	Sim	68	89,5	0,345	87	93,5	0,195
		Não	8	10,5		6	6,45
	NVB	Sim	49	94,2		81	88
		Não	3	5,77		11	12
Posicionamento na puxada	VB	Atrás da Rês	12	15,8	0,716	7	7,5	0,771
		Ao lado da Rês	64	84,2		86	92,5
	NVB	Atrás da Rês	7	13,5		8	8,7
		Ao lado da Rês	45	86,5		84	91,3
Partida imediata após abertura do portão	VB	Sim	35	46,1	0,386	51	54,8	0,198
		Não	41	53,9		42	45,2
	NVB	Sim	28	53,8		59	64,1
		Não	24	46,2		33	35,9
Comportamento durante a condução	VB	Fácil	68	89,5	0,054	78	83,9	0,542
		Dificulta	8	10,5		15	16,1
	NVB	Fácil	40	76,9		74	80,4
		Dificulta	12	23,1		18	19,6

• VB – Valeu o boi; NVB – Não valeu o boi.

Figura 2
Representação da análise de correspondência em plano bidimensional das categorias das características significativas dos diferentes grupos: Valeu o Boi Categoria Profissional (VBP), Não Valeu o Boi Categoria Profissional (NVBP); Valeu o Boi Categoria Amador/Aspirante (VBA) e Não Valeu o Boi Categoria Profissional (NVBA).

Para VBP, tanto o ato de permanece ou não na puxada após a queda, a direção da puxada e a confirmação ou não da rês após a derrubada estão significativamente relacionadas p<0,001 com a chance de obtenção de êxito nas provas de vaquejadas. Os modelos logísticos obtidos quando houve o êxito na prova (Valeu o boi), considerando as variáveis em estudo de provas de vaquejada nas categorias profissional (1) amador/ aspirante (2), de forma conjunta para conjuntos de puxar e de esteira, foram.

(1) $\text{VBP}=\text{P}\left(\text{Y}=1\right)=\frac{e^{-1,4095-1,6871\text{APQ}-1,0183\text{PX}+2,5681\text{CRAD}}}{1+e^{-1,4095-1,6871\text{APQ}-1,0183\text{PX}+2,5681\text{CRAD}}}$

(2) $\text{VBA}=\text{P}\left(\text{Y}=1\right)=\frac{e^{0,7341-0,8684\text{PX}-1,2119\text{CA}-1,8081\text{CT}}}{1+e^{0,7341-0,8684\text{PX}-1,2119\text{CA}-1,8081\text{CT}}}$

Onde VBP: valeu o boi profissional, VBA: valeu o boi amador/aspirante, APQ: permanece na puxada após a queda (1=sim 0=não), PX: direção da puxada (1= Diagonal 0= Perpendicular), CRAD: Confirmação da rês após a derrubada (1=sim 0 =não), CAP: Comportamento adequado na porteira (1=não, 0=sim), CTC: Comportamento tranquilo na condução (1=não, 0=sim).

No modelo de regressão logística para VBP, foram observados os índices de Somers'D, Goodman-Kruskal Gamma e Kendall's Tau-a com valores de iguais a 0,54, 0,68 e 0,27, respectivamente. Já para VBA, os índices foram iguais a 0,34, 0,50 e 0,17, nesta ordem, demonstrando uma média a boa capacidade preditiva.

4. Discussão

Percebe-se que para algumas características na categoria de atletas puxadores profissionais, independente da obtenção do êxito na derrubada da rês, existe maior prevalência em ações durante a prova. É o caso da ação de não permanecer na puxada após a queda da rês, verificada em 85,3% dos casos, a ação de direcionar a rês para a lateral da pista, realizada por 87,6% dos competidores, e a ação de participar da movimentação da rês junto ao esteira, feita por 89,1% dos puxadores da categoria profissional, nas 129 apresentações analisadas. Em relação as ações com diferenças estatísticas significativas para essa categoria em análise, a prática de direcionar a rês para a lateral da pista (p=0,073) ocorre durante sua condução até a área demarcada para sua derrubada, e é realizada com o objetivo de ampliar a área de deslocamento lateral do cavalo utilizado para puxar a rês, no momento oportuno, ampliação esta que aumenta a capacidade de geração de força motriz contrária ao deslocamento da rês, e consequentemente amplia as possibilidades de sucesso em sua derrubada.

Acontece que a pista de competição de vaquejada possui dimensões específicas, e a distância do portão de saída do brete até a primeira faixa de sinalização da área de derrubada da rês, é de pelo menos 100 metros. Este fato exige controle do cavalo por parte do cavaleiro, de forma que aqueles que são mais tranquilos diminuem as chances de uma antecipação no movimento de afastamento da rês, necessário para sua derrubada, e assim promova-a antes da área de pontuação. Os resultados comprovam este fato, verificando-se animais de puxar de condução tranquila em 68% das apresentações analisadas, com resultado final satisfatório para o competidor.

O afastamento do cavalo de puxar de forma abrupta em relação a rês, na área demarcada para pontuação na pista de competição, é condição primordial para que o cavaleiro consiga obter êxito na derrubada do animal. O fato é que, ao se deslocar em trajetória diagonal a direção de condução que vinha seguindo, existe uma demora maior para que seja exercida a força máxima de tração no protetor de cauda da rês a ser derrubada por parte do cavaleiro, o que acaba por aumentar os riscos de fazê-la fora da área de pontuação. Ao se deslocar em movimento perpendicular, o cavalo acelera o momento de tração junto a rês, e amplia assim as possibilidades de derrubada no local especificado.

Vale ressaltar-se que o ato de permanecer puxando a rês mesmo após sua derrubada, não caracteriza uma ação obrigatória, nem tampouco gera algum tipo de bonificação em pontuações para o competidor, tratando-se apenas de uma ação que é usada por alguns para demonstração de maior habilidade. Observa-se que muitas vezes, por oportuno dessa prática no curso de uma apresentação, aumentam-se os riscos de lesões de ordem músculo-esqueléticas tanto nos vaqueiros quanto em seus cavalos, ficando claro com os resultados desse estudo que pode ser uma prática a ser descartada pelos competidores, por não gerar vantagens competitivas e apenas aumentar riscos nas competições.

Devido a maior experiência e habilidade dos competidores profissionais em comparação aos amadores/ aspirantes, é possível que um inadequado comportamento de seus cavalos no momento inicial da apresentação possa ser corrigida em seu transcorrer, e seus efeitos sejam minimizados no resultado final obtido, o que, de maneira contrária não se observa para os puxadores amadores/ aspirantes, já que a variável foi anotada de maneira positiva em 63,4% das apresentações desta categoria que findaram exitosas.

Na análise multivariada utilizada no estudo, produz-se gráficos que permitem uma avaliação visual das variáveis de interesse que se afastam do pressuposto de independência, percebendo-se possíveis associações e forma como elas se dão. As variáveis, assim, assumem posições nesses gráficos de acordo com a associação e similaridade entre elas (¹⁰), o que, neste caso, está vinculado ao sucesso ou não na tentativa de derrubar a rês, dentro das categorias de competição consideradas.

Percebe-se que as características de manter a rês no meio da pista e realizar a puxada na diagonal, foram as variáveis que mais distanciaram do resultado positivo, enquanto suas características opostas apresentaram maiores correlações com o êxito nas apresentações por parte dos competidores. A característica de tranquilidade na condução mostrou ser mais importante para o grupo amador/aspirante quando o resultado for negativo. Todas as características selecionadas mostraram ter significância para a explicação do resultado final. Os resultados obtidos por meio da análise multivariada de dados são importantíssimos para atividades em que um grande conjunto de fatores pode exercer influência sobre o resultado obtido, já que nem todos pesam da mesma maneira no resultado alcançado (¹¹).

A formação de um cavalo não é determinada apenas por fatores geneticamente controlados, uma vez que existem vários componentes ambientais que influenciam em seu desempenho, como nutrição, saúde e o treinamento (¹²). Os resultados aqui descritos podem servir como referência tanto para treinadores, que observarão com mais atenção as variáveis que potencialmente demonstraram influenciar mais fortemente o resultado positivo nas apresentações dos atletas, quanto para os próprios competidores, que saberão a quais fatores darem mais atenção tanto em seus treinos, quanto na valorização dos cavalos que irão montar.

Observa-se na Tabela 3 que na categoria profissional as características de conferir a rês após a derrubada, comportamento na porteira e o comportamento da rês durante a condução, as diferenças foram estatisticamente significativas. A função desempenhada pelo conjunto cavalo/cavaleiro de esteira envolve ações focadas em auxiliar o cavalo/cavaleiro de puxar no desenrolar da competição. Nessa prática esportiva, a pontuação é alcançada quando a rês é derrubada na área delimitada na pista para este fim, e milita aí a importância do ato de conferir a rês após a derrubada (p<0,0001) feita pelo esteira, pois evita que a mesma levante fora desta área e consequentemente percam os pontos.

Já o bom comportamento do cavalo de esteira na porteira de saída do brete (p=0,016), aumenta as chances de um bom início na prova, evitando que o bovino tenha receio em seguir pelo trajeto de condução desejado pela dupla de competidores, que é ao longo da lateral da pista, e que conforme descrito anteriormente ao se avaliar os resultados da Tabela 2 para cavalos de puxar, influenciam significativamente em um resultado positivo final. A propósito, a terceira característica que apresentou diferença significativa para o conjunto cavalo/cavaleiro de esteira na categoria profissional, que foi o comportamento da rês durante a condução (p=0,054), também acaba por relacionar-se com o aumento na dificuldade de condução do bovino através da pista de competição. Embora esta seja uma variável que seja mais influenciada pela rês, já que associa-se a um padrão de comportamento seu, acaba por enquadrar-se junto as ações do conjunto de esteira, uma vez que fica a cargo deste uma eventual correção.

Já para a categoria amador/aspirante apenas a variável associada ao ato de conferir a rês após a derrubada (p<0,0001) feita pelo esteira, apresentou diferença estatística para o resultado positivo, mostrandose uma variável a qual deve ser dada especial atenção pelos treinadores e competidores, uma vez que também foi significativa para na categoria profissional.

Percebe-se que as características de não confirmação da rês após a derrubada (SemConfRAD) e o difícil comportamento de condução apresentam-se distantes do resultado positivo, da prova tanto para a categoria amador/aspirante quanto para a categoria profissional. Neste sentido, entende-se que quando essas duas características estiverem presentes durante a prova de vaquejada o resultado da mesma tenderá a ser negativo para o “valeu o boi”. Suas características opostas (ConfRAD e CompCondFácil) estão mais próximas dos resultados positivos para ambas as categorias, demostrando maior correlação com os resultados positivos. É interessante perceber a complementaridade que a uma análise estatística multivariada entrega a uma estatística univariada em um estudo dessa natureza. Percebe-se na Figura 2, por exemplo, que um universo de dados provenientes de 10 variáveis e em duas categorias de competição, foi reduzido para dois fatores que tiveram o poder de influenciar em quase 100% os resultados obtidos, sendo que uma dessas características, o ato de conferir a rês após sua derrubada, é algo que é influenciado diretamente pelo treinamento dado ao cavalo e por sua condução pelo cavaleiro. Embora a outra variável relevante identificada esteja relacionada ao um comportamento da rês, de dificultar a condução por parte dos conjuntos, a possibilidade de ajustes nesse processo ao longo do percurso de prova fica muito a cargo do esteira, ficando assim também sinalizado tanto para os treinadores, que preparam os animais, quanto para os cavaleiros, a importância do conjunto cavalo/cavaleiro de esteira nesse processo.

Segundo resultados da regressão logística, a chance de um atleta em competição obter resultado positivo na prova de vaquejada diminui em mais de uma vez e meia (-1,6871) quando realiza o ato de permanecer na puxada após a queda. Os resultados obtidos nas análises anteriores corroboram com estes agora descritos, quando a prática dessa técnica aparece distanciada dos resultados positivos seja para a categoria profissional ou amador/aspirante.

O atleta que realiza a puxada na direção diagonal (1) tem uma chance de obter um resultado positivo na prova de vaquejada de 36,1% (OR PX = 0,361) em relação aos que realizam a puxada na direção perpendicular a rês com porcentagem de 63,9%. Já o trabalho de conferir a rês após a derrubada, feito pelo conjunto cavalo/cavaleiro de esteira, multiplica a chance de sucesso na prova em mais de duas vezes e meia (2,5681) em relação àquelas onde esta ação não é executada.

Para VBA, considerando as variáveis comportamentais o odds ratio para o comportamento não adequado dos atletas na porteira, ou seja, quando igual a 1, as chances do resultado ser positivo em relação ao negativo é de cerca de 30% (OR CAP = 0,298). Já na ausência do comportamento tranquilo durante a condução, quando igual a 1, as chances do resultado ser positivo em relação ao resultado negativo é de apenas 16%, (OR CTC = 0,164).

A direção da puxada também foi uma característica significativa para a estimativa do resultado final para a categoria amador/aspirante com um aumento nas chances de insucesso de 42% e diminuição de quase uma vez (-0,8684) em relação a sua oposta. Os modelos de regressão logística para VBP e VBA, mostraram o modelo estimado possui um bom poder preditivo podendo assim, prever as chances do sucesso ou insucesso ao final da prova. Esta capacidade de predição para VBP pode estar relacionada com a experiência adquirida que os atletas profissionais possuem por meio de treinamentos realizados com a prática do esporte. Para VBA os resultados demonstraram que a capacidade preditiva do modelo estimado é de média a boa capacidade para prever a chance do resultado final da prova, o que já era esperado tendo em vista a pouca experiência dos participantes.

5. Conclusão

O uso da análise de correspondência múltipla no estudo de variáveis associadas ao sucesso em competições de vaquejada mostrou-se bastante eficaz, no que tange a diminuição do universo de elementos com maior peso de determinação no resultado final obtido. Os resultados aqui encontrados, podem servir como base para treinadores e competidores desse esporte, no que se refere a atenção a ser dada a determinadas ações durante o curso da competição, que proporcionam um aumento nas chances de êxito na prática esportiva em foco.

Agradecimentos

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas -FAPEAL

References

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  29 Maio 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  03 Nov 2022
• Aceito
  12 Dez 2022
• Publicado
  29 Mar 2023