Radiografia, ultrassonografia e antropometria como métodos de avaliação nutricional de cães

Resumo

O estado nutricional dos cães é um tema de destaque na atualidade por ser considerado um dos cinco parâmetros vitais dos animais. Diversas são as técnicas que permitem diagnosticar afecções ou distúrbios da condição corporal desses pacientes. Embora tenha certa subjetividade, por ser uma avaliação visual e de palpação, o escore de condição corporal (ECC) é o mais utilizado para essa finalidade. O presente estudo avaliou medidas radiográficas, ultrassonográficas e antropométricas da gordura subcutânea depositada na região dorsal sobre a sétima vértebra lombar de 100 cães, comparando-se com uma classificação duplo-cega dos pacientes na escala numérica do ECC. Houve correlação positiva das medidas ultrassonográficas com o escore de condição corporal (p-valor abaixo de 2 x 10^-16 e R = 0,54) e o mesmo foi observado com as medidas radiográficas (p-valor abaixo de 2 x 10^-16 e R = 0,56) e avaliações antropométricas (cujo p-valor variou de 1,55 x 10^-7 a 2,34 x 10^-11 e seu R foi de 0,24 a 0,36). Com isso, foi possível identificar maior intensidade na relação dos exames de imagem com o ECC. Conclui-se que a radiografia e a ultrassonografia apresentam grande potencial de utilização na rotina clínica como uma forma mais precisa e acessível de diagnosticar distúrbios nutricionais. Este é o primeiro estudo a utilizar tais equipamentos juntamente com exames de imagem para contribuir para o diagnóstico precoce de mudanças no estado nutricional e promover melhorias no acompanhamento de programas de ganho ou perda de peso.

Palavras-chave:
adipômetro; canina; obesidade; radiologia; ultrassom

Abstract

The nutritional status of dogs is a prominent theme nowadays because it is considered one of the five vital parameters of animals. There are several techniques that allow diagnosing disorders or disturbances in the body condition of these patients. Although it has some subjectivity, as it is a visual and palpation evaluation, the body condition score (BCS) is the most used for this purpose. The present study evaluated radiographic, sonographic and anthropometric measurements of subcutaneous fat deposited in the dorsal region over the seventh lumbar vertebra of 100 dogs, compared to a double-blind classification of patients on the numerical scale of the BMC. There was a positive correlation of the sonographic measurements with the body condition score (p-value below 2 x 10^-16 and R = 0.54) and the same was observed with the radiographic measurements (p-value below 2 x 10^-16 and R = 0.56) and anthropometric evaluations (whose p-value ranged from 1.55 x 10^-7 to 2.34 x 10^-11 and its R was 0.24 to 0.36). With this, it was possible to identify greater intensity in the relationship of imaging exams with ECC. It is concluded that radiography and ultrasonography have great potential for use in clinical routine as a more accurate and affordable way to diagnose nutritional disorders. This is the first study to use such equipment together with imaging tests to contribute to the early diagnosis of changes in nutritional status and promote improvements in the follow-up of weight gain or weight loss programs.

Keywords:
adipometer; canine; obesity; radiology; ultrasound

1. Introdução

O estado nutricional tornou-se o 5° Parâmetro Vital (5VA) de um animal, conforme proposto pela WSAVA (World Small Animal Veterinary Association)(¹). Dessa forma, a avaliação nutricional uniu-se a temperatura, pulso, respiração e avaliação da dor(¹). A avaliação nutricional dos cães abrange diversos métodos, sendo que o mais utilizado para tal é o Escore de Condição Corporal ou ECC, proposto por Laflamme (1997). Ele classifica os cães numa escala que varia de um até nove, sendo de fácil realização, devido a sua avaliação visual e palpação além de não ser invasivo. Todavia, é necessário ressaltar que o ECC possui uma alta subjetividade, causada pelo grande viés humano, já que veterinários diferentes podem classificar um mesmo animal de maneiras divergentes(², ³, ⁴).

Isto posto, torna-se notório a necessidade de métodos mais objetivos para avaliar esse parâmetro vital. Ao mesmo tempo busca-se ferramentas que sejam de fácil realização e com boa relação custo/benefício nas consultas nutricionais dos cães. Encaixa-se nessas exigências o uso de exames imagiológicos, que já vêm ganhando espaço na área, como a ultrassonografia, que teve bons resultados quando usada com essa finalidade por Wilkinson e McEwan (1991). Além disso, o uso de equipamentos antropométricos, como adipômetros, também vêm sendo testado na medicina veterinária com esse intuito.

Dessa forma, esta pesquisa visou correlacionar as medidas da gordura subcutânea de cães feitas por meio da ultrassonografia e radiografia com o escore de condição corporal desses animais. Ademais, também buscou-se correlacionar as medidas antropométricas feitas com paquímetro, adipômetro e trena antropométrica nos pacientes do estudo com o ECC, verificando assim qual das medidas utilizadas apresentava melhor correlação com esse método já tão difundido na Medicina Veterinária.

2. Material e métodos

2.1 Amostra

Essa pesquisa conta com certificado de aprovação da Comissão de Ética no Uso de Animais – CEUA - Faculdade de Odontologia - Campus de Araçatuba pelo processo nº 00599-2019. O presente estudo foi realizado em 100 animais da espécie canina atendidos no hospital veterinário da instituição, mediante autorização do tutor para a participação dos mesmos no projeto.

A seleção dos cães participantes não incluia pacientes com alguma disfunção que interferisse em sua condição corporal, como hiperadrenocorticismo, hiper ou hipotireoidismo, leishmaniose, entre outras enfermidades com as características citadas. Além disso, buscou-se manter na pesquisa apenas cães dentro de uma faixa etária na qual o escore de condição corporal é mais indicado. Baseado nisso, cães considerados filhotes (abaixo de seis meses de idade) também foram excluídos do estudo. Foram coletadas informações gerais de triagem e do histórico do paciente e cada cão foi classificado de acordo com seu ECC. Em seguida, foi realizada uma radiografia, ultra-sonografia e medição com equipamento antropométrico. Todas estas medições foram realizadas na região lombar dos cães analisados, pois esta é considerada uma das melhores regiões para a avaliação de gordura subcutânea pela ultrassonografia(⁵).

2.2 Escore de condição corporal

Todos os cães do estudo foram classificados quanto ao seu escore condição corporal, utilizando a escala numérica de 9 pontos proposta por Laflamme (1997). Este foi um procedimento duplo-cego, ou seja, dois profissionais (avaliador 1 = homem e avaliador 2 = mulher) avaliaram os mesmos animais, mas não se comunicaram sobre o ECC dos pacientes, reduzindo assim as influências na classificação da amostra para aumentar a confiabilidade do estudo, além de permitir uma melhor visualização e análise das diferenças entre os escores propostos por cada observador.

2.3 Exames de imagem

2.3.1 Exame radiográfico

A radiografia foi realizada na projeção laterolateral direita (LLD) sendo efetuada com aparelho de Raios X, modelo CRX 3, com capacidade para 150 mA, equipado com grade antidifusora Potter-bucky. As imagens capturadas foram digitalizadas utilizando aparelho CR.

A técnica radiográfica utilizada foi a que relaciona miliamperagem-segundo e quilovoltagem à espessura da região a ser radiografada(⁶). Os animais foram posicionados com o auxílio dos tutores, observando-se as normas de proteção radiológica, como o uso de protetor de tireoide e aventais plumbíferos. Por meio do exame radiográfico, mensurou-se a camada subcutânea da região dorsal do paciente. Essa medida foi realizada sobre a sétima vértebra lombar (L7), partindo de seu processo espinhoso, mediante imagem obtida na radiografia.

2.3.2 Exame ultrassonográfico

A tricotomia na região entre as vértebras lombares e sacrais antecedeu a realização do exame ultrassonográfico, e somente foi realizada após o consentimento do tutor. Com o animal em posição quadrupedal posicionava-se a probe ultrassonográfica em sentido transversal sobre a região dorsal, na altura da região lombossacra. Durante o exame ultrassonográfico não se aplicava pressão sobre o dorso do animal, evitando-se desvios da amostragem real. Por meio da imagem gerada, avaliou-se a medida da gordura subcutânea a partir do processo espinhoso da L7. O exame ultrassonográfico foi realizado utilizando o aparelho da marca Esaote modelo MyLab70 VET XV. Os exames foram realizados no modo B utilizando transdutor linear com frequência entre 4 e 13 MHz.

2.4 Equipamentos antropométricos

Para a mensuração dos dados antropométricos dos cães, utilizou-se:

• a) Paquímetro Corporal Prime Med com mandíbulas duplas e em acrílico, sapatas deslizantes e escala em alumínio especial. O equipamento foi posicionado na região dorsal do cão, próximo à região da pelve e, a partir daí, a medida foi coletada;

• b) Trena Corporal Antropométrica Prime Med 1,5 m, contendo ponteira independente que completa 1,8 m, elástico redutor de pressão, trava de retenção e retorno automático, usada para medir o perímetro abdominal do animal, na região lombar e próximo à pelve;

• c) Adipômetro Clínico Neo Prime Med com corpo neutro, visor dupla face, abertura de medição até 60 mm, mola em pressão constante de 9,8g/mm², feito de alumínio maciço, tolerância de 0,3 mm a 60 mm e dimensões de 245 mm por 85 mm;

• d) Adipômetro Científico DGI Prime Med com abertura máxima de 60 mm, relógio de precisão científica, precisão, ultraleve e tolerância de 0,3 mm a 60 mm. Os dois adipômetros (um científico e outro não) foram usados para medir a gordura subcutânea da prega da pele na região lombar do animal, em seu dorso. As medidas foram realizadas três vezes seguidas no mesmo cão, para obter a média de gordura subcutânea para cada animal.

A Figura 1, permite visibilizar a forma como todas essas medidas utilizadas na presente pesquisa foram feitas.

Figura 1
A- Imagem radiográfica da mensuração da camada de gordura subcutânea sobre o processo espinhoso da vértebra L7 (apontado pela seta em vermelho). B- Imagem ultrassonográfica da mensuração da camada de gordura subcutânea sobre o processo espinhoso da vértebra L7 (destacado na ponta da seta). C- Demonstração do posicionamento do paquímetro. D-Demonstração da mensuração do perímetro abdominal com trena antropométrica. E e F- Demonstração do uso dos adipômetros clínico e científico na mensuração da gordura subcutânea da prega da pele na região lombar do animal. Fonte da imagem: Arquivo pessoal e com autorização do tutor para utilização da mesma.

2.4 Análise estatística

Para realização da análise estatística utilizou-se o software estatístico livre Rstudio, adotando-se valor de a igual a 5%. O teste preconizado foi a regressão linear, na qual comparou-se o preditor (escore corporal determinado pelo veterinário) com as medidas obtidas pelo o ultrassom, radiografia e pelos equipamentos antropométricos. Dessa forma, buscou-se visualizar a existência de uma relação positiva entre esse preditor e essas variáveis respostas. Além disso explorou-se um cálculo percentual relacionando o número de variações dos escores entre os diferentes avaliadores e o total de animais do projeto, de modo a demonstrar a hipótese de subjetividade do ECC e como o mesmo muda de acordo com o avaliador.

3. Resultados

Neste estudo, houve maior prevalência de fêmeas (53%) e animais não castrados (52%). Além disso, pode-se notar a superioridade no número de pacientes com crânio mesocefálico e de raça pura. Quanto ao peso, houve uma ampla distribuição que variou de 2,5 kg até 50 kg (Tabela 1).

Tabela 1
Distribuição da amostra de acordo com a conformação do crânio, faixa etária, peso e raça.

Variáveis	N
Conformação do crânio	Braquicefálico	14
	Mesocefálico	80
	Dolicocefálico	6
Faixa etária	0 - 1 ano	21
	1 - 9 anos	60
	Acima de 9 anos	19
Peso (kg)	0 - 10	46
	10 - 25	28
	Acima de 25	12
Raça	Border Collie	4
	Boxer	3
	Bulldogue Francês	2
	Chihuahua	1
	Chow Chow	1
	Cocker	1
	Golden Retriever	1
	Jack Russel	1
	Labrador	3
	Lhasa Apso	2
	Maltês	2
	Pinscher	1
	Pit Bull	1
	Poodle	11
	Pug	2
	Rottweiler	1
	Schnauzer	7
	Shih Tzu	6
	SRD	43
	Teckel	5
	Whippet	2

Avaliando-se os dados sobre dieta, fornecimento de petiscos, prática de exercícios e ambiente que o animal mora, obteve-se o seguinte arranjo:

• Dieta: 65% dos animais se alimentavam somente de ração, 4% comiam comida caseira e os 31% restantes tinham uma dieta combinada de ração com comida caseira;

• Petiscos: a maior parte dos cães recebiam petiscos de seus tutores durante o dia (79%);

• Prática de exercícios: 14% dos animais não praticavam exercícios, outros 37% tiveram a prática de exercícios descrita como leve por seus tutores, 38% possuiam uma prática moderada de exercícios e os 10% restantes tinham uma prática intensa;

• Ambiente: dois animais moravam em propriedade rural com os tutores, nove viviam em apartamento e o restante residia em casas com acesso a quintal cimentado e/ou gramado.

3.1 Escore de condição corporal

A distribuição do ECC proposto pelos avaliadores está descrita na Tabela 2. De acordo com o avaliador 1, 54% dos cães encontravam-se fora do escore de condição corporal ideal (ECC 5). Dentre esses, cerca de 85% dos animais (46/54) foram classificados como obesos ou em sobrepeso, correspondendo esse valor a 46% do total de cães. Por outro lado, 69% dos cães foram identificados como fora do escore ideal pelo avaliador 2. Destes, aproximadamente 85,5% estavam acima do peso considerado ideal (59/69), ou seja, 59% do total.

Tabela 2
Escore de Condição Corporal (ECC) dos 100 cães avaliados no estudo, de acordo com os avaliadores.

ECC	Avaliador 1	Avaliador 2
	n
2	0	1
3	1	0
4	7	9
5	46	31
6	19	22
7	13	19
8	7	14
9	7	4
Total	100	100

Houve uma discrepância entre o ECC proposto pelo avaliador 1 e o 2 em 52% dos casos. Considerando esses 52 cães, estima-se que cerca de 10% divergiram em mais de um ponto na classificação numérica. Notou-se também que o avaliador 2 classificou os cães em um escore maior que o avaliador 1 em aproximadamente 65% dos casos (34/52).

3.2 Comparação entre os métodos

Os resultados da análise estatística estão descritos na imagem abaixo, que representa um gráfico de correlação entre todas as variáveis avaliadas (Figura 2). Nota-se que os escores propostos pelos dois avaliadores apresentaram uma diferença em suas classificações, porém ainda assim sua força de correlação foi extremamente alta (83%). Além disso, observa-se que dentre todos os métodos e técnicas testados neste experimento, as medidas da gordura subcutânea feitas pela ultrassonografia e pela radiografia são as que possuem maior força de correlação com o ECC, sem sofrer influência do avaliador. Quanto aos equipamentos antropométricos, a maior correlação com o ECC foi observada com o paquímetro, com uma média de 59%. Seguido dele temos adipômetro científico, adipômetro clínico e, por último, a trena. Nesse caso, é importante salientar que o uso dos equipamentos antropométricos, mesmo apresentando uma correlação aceitável com o escore de condição corporal, precisa de mais estudos e pesquisas.

Figura 2
Gráfico de correlação demonstrando a força e existência de correlação entre todos os métodos de avaliação da condição nutricional do paciente empregados no trabalho. Nele ECC1 e ECC2 representam os escores do avaliador 1 e 2, respectivamente; US e RX indicam os valores de correlação das medidas obtidas pelos exames ultrassonográficos e radiográficos; Trena = correlação dos valores do perímetro abdominal mensurados com a trena; AdCi = correlação das medidas do adipômetro científico; AdCl = correlação das medidas do adipômetro clínico; Paq = correlação das medidas obtidas através do paquímetro.

Na Figura 3 visualiza-se os valores encontrados nas mensurações radiográficas e ultrassonográficas da gordura subcutânea em cães com diferentes escores de condição corporal.

Figura 3
Imagens ultrassonográficas e radiográficas da mensuração da camada de gordura subcutânea sobre o processo espinhoso da vértebra L7 em cães classificados em ECC 3/4 (A e B), ECC 5 (C e D) e ECC 9 (obeso) (E e F). Fonte da imagem: Arquivo pessoal e com autorização do tutor para utilização da mesma.

4. Discussão

Os resultados acima da condição corporal ideal (de 46 a 54%) nos cães do estudo são similares ao que se observou em alguns estudos na última década que avaliaram a ocorrência de obesidade canina em diferentes países, nos quais detectou-se que 40 a 60% da população canina encontrava-se em estado de obesidade ou sobrepeso(⁷, ⁸, ⁹, ¹⁰, ¹¹, ¹²). Já no Brasil, identificou-se em 2002, que 17% dos cães na cidade de São Paulo (SP) eram obesos, sendo uma porcentagem bem menor que a observada neste estudo(¹³). Este elevado número de cães obesos no estudo pode ser devido à maioria dos cães possuírem fatores que predispõem a obesidade como fornecimento de petiscos, baixa prática de exercício e habitações com pouco espaço para adequada prática de exercício físico diário.

Assim como nesse estudo, a confiabilidade do ECC já havia sido destacada por outros trabalhos em que se demonstrou que esse método apresentava uma alta correlação com o percentual de gordura obtido pela absorciometria de raios-x de dupla energia – DEXA(¹⁴). Mesmo o ECC sendo um método dito como subjetivo e semiquantitativo, pesquisas já demonstraram haver boa reprodutividade do escore de condição corporal inter e intraobservadores(², ¹⁵). As variações do ECC entre os dois avaliadores podem ser devido à diferença anatomofisiológica existente entre a visão do homem e da mulher. Vale ressaltar que pesquisas detectaram que a visão feminina é mais precisa quando atua sobre objetos próximos do seu ponto central, a cerca de 0,5 m(¹⁶). Já a visão masculina apresenta maior precisão quando se trata de objetos localizados à 100 m de distância(¹⁶). Isto posto, poderia-se supor que o escore proposto pela profissional do sexo feminino é mais preciso, já que os cães devem ficar bem próximos do médico veterinário para a realização da palpação e avaliação visual no ECC. Por outro lado, outro trabalho identificou que os homens têm maior capacidade de foco em objetos que estão em movimento, ao contrário das mulheres(¹⁷). Isso pode ser de grande valia na classificação do escore dos cães, já que é da natureza comportamental de alguns animais manter-se em constante movimentação no consultório do médico veterinário. Dessa forma, coloca-se em pauta se o sexo do profissional que faz a avaliação nutricional dos cães não torna-se uma variável importante que afeta a precisão e eficácia do ECC. Assim, são necessários ainda estudos que verifiquem detalhadamente a existência dessa variação, os motivos e se algum dos sexos possui melhor capacidade de realizar essa classificação.

A correlação encontrada entre as medidas dos exames de imagem com o ECC é justificada pelo fato dos métodos de avaliação nutricional que fazem uso dos exames de imagem permitirem avaliar melhor os depósitos de gordura(¹⁸). Ademais, é importante lembrar que tais métodos possibilitam uma melhor avaliação das mudanças adiposas já que a gordura gera uma alteração na qualidade da imagem (principalmente da ultrassonografia) facilitando sua identificação(¹⁸).

A existência de correlação entre o escore de condição corporal e a medida ultrassonográfica da gordura subcutânea lombossacral já foi constatada em um estudo com 20 cães adultos obesos. Além disso, outro estudo concluiu que essas medidas feitas pela ultrassonografia também apresentam uma boa correlação com a técnica de bioimpedância na estimação da gordura corporal(¹⁹). Isso comprova a eficácia que o método ultrassonográfico possui quando usado no intuito de uma avaliação nutricional. No entanto, deve-se levar em conta que ainda são necessários estudos mais aprofundados, pois algumas pesquisas ainda afirmam que a ultrassonografia possui alta discrepância e baixa sensibilidade na identificação de animais obesos(²⁰).

Essa é a primeira vez que o exame radiográfico é utilizado a fim de gerar uma avaliação nutricional de cães. O uso da radiação com essa finalidade já vem sendo pesquisado e realizado, porém de forma distinta, com a absorciometria de raios-x de dupla energia (DEXA). Tal método é comprovadamente preciso e eficaz na estimativa da composição corporal, no entanto, seu uso é caro e menos prático, e é apenas experimental(²¹). Assim, o uso da radiografia como proposto neste estudo, além de mostrar bons resultados, elimina os obstáculos encontrados com o uso do DEXA, gerando maior acessibilidade na rotina do veterinário. Entretanto, são necessários mais estudos para investigar se estas medidas são afetadas por outras variáveis como raça, tamanho, peso e idade dos animais.

O uso de adipômetros na Medicina Veterinária é escasso, sendo este um dos poucos estudos que utilizaram o equipamento. Ademais, em 2013 pesquisadores utilizaram o adipômetro em ovinos, porém não se identificou relação entre as medidas da carcaça dos animais e aquelas dadas pelos equipamentos(²³). Já em humanos, é dito que esses equipamentos fornecem dados bastante precisos sobre a gordura subcutânea, necessitando apenas que as medidas sejam realizadas por um profissional treinado e usando o equipamento adequado(²⁴). Além disso, pesquisas concluíram que as medidas das dobras cutâneas apresentavam boa correlação com outros métodos de avaliação da condição corporal humana (pesagem hidrostática e DEXA), tal como esse presente estudo(²⁵, ²⁶). Com isso, nota-se que há um vasto campo de pesquisa a ser explorado sobre o uso dos adipômetros na Medicina Veterinária, visto que tal método pode se provar eficaz, seguro e simples de ser utilizado em uma avaliação nutricional de cães. As medidas morfométricas apresentam grande importância na avaliação nutricional de cães. Esse fato já foi demonstrado ao comprovar-se que a medida do perímetro abdominal sofre uma influência direta de acordo com o peso do animal, variando conforme ocorre o ganho ou a perda de peso(²²).

Ainda não há estudos no qual se use o paquímetro para fazer as mensurações demonstradas nesse estudo. No entanto, na Medicina há uma medida antropométrica chamada de diâmetro abdominal sagital (DAS), que é feita com o paciente em decúbito dorsal e se assemelha muito a medida utilizada no presente trabalho. O DAS avalia a obesidade abdominal, tendo grande relação com a gordura visceral e, assim, sendo um bom preditor de distúrbios metabólicos(²⁷). Essa medida vem sendo cada vez mais utilizada por ser simples e de fácil obtenção por meio de um paquímetro(²⁷). Dessa maneira, torna-se notório a importância desta medida na Medicina e como o uso do paquímetro na Medicina Veterinária pode vir a ser extremamente útil.

5. Conclusão

Conclui-se que o uso do escore de condição corporal é um método extremamente confiável, mas que apresenta ressalvas como uma possível variação entre o ECC de acordo com o sexo do avaliador, que deve ser considerado durante a análise da condição nutricional dos cães. Além disso, as medições da gordura subcutânea localizada sobre a sétima vértebra lombar de cães feita pelos exames radiográfico e ultrassonográfico apresentaram uma forte correlação com o escore de condição corporal. Dessa forma, conclui-se que tais medidas têm grande potencial para serem introduzidas na rotina clínica como uma forma de diagnosticar distúrbios nutricionais, como a obesidade. O uso dos equipamentos antropométricos (adipômetro, paquímetro e trena) demonstrou também uma correlação positiva com o escore de condição corporal dos pacientes, porém a força dessas correlações não apresentou uma alta intensidade como no caso dos exames de imagem.

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer à Clínica Médica de Pequenos Animais do Hospital Veterinário "Luiz Quintiliano de Oliveira", UNESP, Araçatuba, São Paulo, Brasil, cuja colaboração foi extremamente importante para a realização do estudo. Aproveitamos também a oportunidade para dirigir estas palavras ao setor de Diagnóstico por Imagem da mesma instituição, a toda a equipe de profissionais da área e àqueles que caminharam conosco neste projeto. Todos os equipamentos antropométricos foram gentilmente fornecidos pela empresa Prime Med Antropometria®, a quem enviamos nossa profunda e sincera gratidão. Muito obrigado ao professor Yuri Tani Utsunomiya por sua inestimável ajuda e assistência na análise estatística deste estudo. Um agradecimento mais do que especial a todos os cães e seus tutores que participaram deste estudo e permitiram o desenvolvimento completo deste projeto sem nenhum contratempo. Este trabalho foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) processo n° 2020/02133-1.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  22 Set 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  23 Mar 2022
• Aceito
  19 Jun 2022
• Publicado
  14 Ago 2023