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A construção da violência contra idosos

The construction of violence against the elderly

Resumo

Este artigo é uma revisão da literatura de 1985 a 2005, e tem como objetivo construir o cenário da violência familiar contra o idoso, ou seja, como ocorre, suas causas, conseqüências e principalmente as formas de enfrentamento do problema. O estudo revelou que a violência contra o idoso é alarmante e ocorre na grande maioria das vezes no âmbito familiar. Essa violência é um fenômeno complexo multifacetado e dinâmico de difícil controle, até mesmo em países com alto nível de qualidade de vida. Concluiu-se que existe ainda um grande atraso na sociedade em relação à garantia de segurança para os idosos, uma vez que as políticas que atualmente protegem essa parcela da população estão ainda muito aquém das práticas adotadas nos serviços púbicos e privados de atendimento aos idosos.

idoso; violência doméstica; família; medidas de segurança

Abstract

This article is a literature review from 1985 to 2005, whose objective is to build the scene of family violence against the elderly, as it occurs, its causes, consequences and, most of all, the ways to tackle the problem. The study concluded that violence against the elderly is alarming and mainly occurs within the family circle. This violence has multiple faces and is dynamic and complex phenomenon, hard to control, even in countries with high level of quality of life. One concluded that there is a great gap in society concerning the implementation of measures to guarantee the security of the elderly, once current policies that protect this population still are belows the practices of public and private services which assist the elderly.

aged; domestic violence; family; security measures

INTRODUÇÃO

A violência que se desenvolve no espaço intrafamiliar é bastante complexa e delicada, sendo extremamente difícil penetrar no silêncio das famílias dos idosos violentados. A insegurança, o medo de represálias oriundos do conflito da consangüinidade, da proximidade, do afeto, do amor, do instinto de proteção em defesa do agressor são alguns exemplos de justificativas para a omissão dos idosos, quando violentados por seus familiares (Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999., 1999).

Paradoxalmente, parece existir uma concepção geral de que os idosos residentes nos seus lares obtêm de sua família condições facilitadoras para a preservação do seu equilíbrio afetivo. Mas como explicar as chamadas condições facilitadoras para a preservação do equilíbrio afetivo do idoso, quando se constatam altos índices de violência dentro das famílias? (Chaves44. Chaves PGS, Costa PL. A violência afetiva e a violência doméstica contra os idosos. Belo Horizonte, 2003. Disponível em: URL: <http://www.mj.gov.br/Senasp/senasp/artigo/violen_idoso.html>
http://www.mj.gov.br/Senasp/senasp/artig...
, 2003).

Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999. (1999) salienta que, em geral, o idoso vítima de violência sente-se permanentemente ameaçado, sendo incapaz de se defender para garantir sua segurança. Além disso, muitos desses indivíduos desconhecem os serviços de assistência e proteção contra violência e não têm quem os ajude na busca de socorro, por isso hesitam em denunciar seus agressores.

Nesse sentido, a violência ao idoso torna-se ainda mais preocupante, se compreendermos que o acelerado crescimento da população de idosos, apesar de ser considerado fator positivo para a história do desenvolvimento da humanidade, não ocorre em consonância com a criação de medidas que visem a garantir a qualidade de vida desses indivíduos. Ao contrário do que se imaginava, este crescimento apontou problemas de ordem social, política e econômica, fomentando a criação e o desenvolvimento da violência.

Dados estatísticos da Organização das Nações Unidas (ONU) revelam que, atualmente, 12% da população mundial possuem mais de 60 anos. No Brasil, o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE1313. IBGE. Perfil dos idosos responsáveis pelo domicílio. Pesquisa Nacional por amostragem domiciliar 2002. Disponível em: URL: <http://www.ibge.gov.br >
http://www.ibge.gov.br...
), em 2002, apontou 16 milhões de indivíduos com mais de 60 anos, representando 9,3% da população total.

O aumento expressivo do número de idosos nos últimos anos no Brasil e no mundo tem sua procedência a partir das transformações socioeconômicas que determinaram grandes inovações científico-tecnológicas, associadas a uma melhor condição de vida da população. Fazendo uma projeção para o ano de 2025, obtém-se uma população de idosos no Brasil de cerca de 14%, quando o país figurará com uma população de idosos semelhante ao que hoje é registrado em países desenvolvidos (Coelho Filho & Ramos66. Coelho Filho JM, Ramos LR. Epidemiologia do envelhecimento no nordeste do Brasil: resultados de inquérito domiciliar. Rev Saúde Pública, 1999 out; 33(5): 445-53., 1999).

Apesar de o crescimento do número de idosos no Brasil ter-se iniciado na década de 80, sabemos que a violência contra os mesmos não é um fenômeno recente. Através dos anos, a sociedade brasileira assimilou uma cultura que tende a separar os indivíduos velhos, discriminá-los e, real ou simbolicamente, desejar sua morte, considerando-os ainda como descartáveis e um peso social (Minayo2121. Minayo MCS. Violência social sob a perspectiva da saúde pública. Cad Saúde Pública 1994; 10(S1): S7-S18, 2003).

Comparando a mortalidade por violência em idosos em relação às doenças cardiovasculares e o câncer, Minayo2121. Minayo MCS. Violência social sob a perspectiva da saúde pública. Cad Saúde Pública 1994; 10(S1): S7-S18 (2003) afirma que acidentes e violências são a sexta causa de morte em idosos no Brasil. Segundo a mesma autora, a maioria das internações por causas externas ocorre devido a lesões ou traumas provocados por quedas e atropelamento. Porém, as violências contra os idosos são muito mais abrangentes e disseminadas no país, evidenciando-se em abusos físicos, psicológicos, sexuais, financeiros e em negligências.

Gawryszewski1111. Gawryszewski VP, Jorge MPM, Koizume MS. Mortes e internações por causas externas entre idosos no Brasil: O desafio de integrar a saúde coletiva e atenção individual. Revista da Associação Medicina Brasileira 2004; 50(1):11-22. et al. (2004) pesquisaram a morbi-mortalidade por causas externas em idosos no Brasil no ano de 2000 e concluíram que 11,4% das mortes em indivíduos com mais de 60 anos ocorreram por causas externas, contra 39,5% e 26,9% nos indivíduos de 15 a 29 anos e 30 a 44 anos, respectivamente.

Os mesmos autores concluíram que, em números absolutos, a morte por causas externas nos idosos não chama atenção, em detrimento dos altos coeficientes e número de casos em jovens. Por isso, os indivíduos com mais de 60 anos não costumam ser prioridade nos estudos sobre causas externas e, conseqüentemente, alvo de políticas públicas que levem ao enfrentamento deste problema.

Sabe-se que a violência é um fenômeno complexo, multifacetado e dinâmico de difícil controle, até mesmo em países com alto nível de qualidade de vida. Minayo2020. Minayo MCS. Violência contra o idoso: relevância para um velho problema. Cad Saúde Pública 2003 Jun; 19(3): 783-91. (1994) justifica que esta dificuldade ocorre exatamente porque o espaço de criação e desenvolvimento da violência é a vida em sociedade.

Beauvoir apud Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999. (1999, p. 37) destaca a relação da violência em idosos e a sociedade, afirmando que a última “deve ser considerada não apenas culpada, mas sim criminosa, pois abrigada atrás do mito da expansão e da abundância trata os velhos como párias”.

Atualmente, considera-se a violência domiciliar como um sério problema de saúde pública. Estudos comparativos têm mostrado que indivíduos idosos de várias classes socioeconômicas, etnias e religiões são vulneráveis aos maus-tratos, que ocorrem de várias formas: física, sexual, emocional e financeira (Minayo2121. Minayo MCS. Violência social sob a perspectiva da saúde pública. Cad Saúde Pública 1994; 10(S1): S7-S18, 2003; Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999., 1999; Fávaro88. Fávaro T. Parentes mais próximos são os maiores agressores de idosos, revela pesquisa. Jornal da Unicamp 2003 Ago. Disponível em: URL: < http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/agosto2003/ju223p g05. html > .
http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_ho...
, 2003).

Contudo, a violência contra o idoso é tida como uma das mais severas e desiguais formas de agressão, visto que há uma ampla relação de desigualdade do ponto de vista físico e psicológico. Isto ocorre devido aos déficits auditivo, visual, motor e cognitivo que o idoso apresenta, além do fato de o mesmo ser submetido a uma situação constrangedora diante dos outros familiares (Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999., 1999).

A partir dessas considerações, realizou-se uma revisão bibliográfica que abrangeu no período de 1985 a 2005, com o objetivo de construir o cenário da violência familiar contra o idoso, ou seja, mostrar como ocorrem, suas causas, conseqüências e principalmente as formas de enfrentamento do problema.

A CONSTRUÇÃO DA VIOLÊNCIA CONTRA IDOSOS

Descrevendo o fenômeno da violência

Nas últimas décadas, notou-se um aumento significativo dos fenômenos relacionados à violência na sociedade. A violência tem-se mostrado com uma face tão feroz quanto qualquer outra ocorrência dita catastrófica (Muza2222. Muza GM. A criança abusada e negligenciada. J Pediatr 1994; 70: 56-60., 1994).

Configurando-se como um problema social e histórico, deve ser apreciado como objeto de atenção especial para a saúde pública e demais setores públicos, requerendo destes um esforço sobre-humano, no sentido de se criar estratégias para seu enfrentamento (Hijar-Medina1212. Hijar-Medina M, et al. Medical care of injuries caused intentionally by domestic violence. Salud pública Méx 2003 jul./ago; 45(4):252-58. et al., 2003). Entretanto, para se enfrentar a violência, faz-se necessário, primeiramente, compreendê-la. Nesse sentido, a concepção lingüística da palavra “violência” é descrita por Ferreira1010. Ferreira ABH. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. Rio de Janeiro; 1986. (1986) como sendo um constrangimento físico e moral, coação, força e qualidade de violento.

Considera-se, ainda, a violência como um conceito referente aos processos, às relações sociais e interpessoais de grupos, de classes, de gênero. Pode ser objetivada em instituições, quando empregam diferentes formas de aniquilamento a outrem, ou de sua coação direta ou indireta, causando-lhes danos físicos, mentais e morais (OMS2323. Organização Mundial de Saúde. Manual da Classificação Estatística Internacional das Doenças, Lesões e Causas de Óbitos Nona Conferência de Revisão. São Paulo: Centro Brasileiro de Classificação de Doenças em Português; 1985., 1985).

Contudo, embora a violência também possa ser compreendida como agressão, que é a conduta direcionada visando a prejudicar ou ferir outra pessoa, seus conceitos envolvem múltiplos enfoques e direcionamentos. Podem estar inseridos dentro de marcos referenciais biologicistas, comportamentais, dentro de modelos exclusivamente psiquiátricos ou de abordagens mais amplas, como a da violência estrutural, proporcionadas pelo próprio sistema social, com suas iniqüidades (Meneghel, Giugliani & Falceto1616. Meneghel SN, Giugliani EJE, Falceto O. Relações entre violência doméstica e agressividade na adolescência. Cad Saúde Pública 1998 abr./jun; 14(2):327-35., 1998; Fernandez99. Fernandez A. A agressividade: qual o teu papel na aprendizagem? In: Grossi E. editor. Paixão de aprender Rio de Janeiro: Vozes; 1992. p. 168-80., 1992).

A violência não tem como fator unicausal o aspecto biológico. Trata-se de um fenômeno biopsicossocial, que tem como espaço de criação e desenvolvimento a vida em sociedade, de forma que para entendê-la seria necessário apelar para a especificidade histórica (Minayo2020. Minayo MCS. Violência contra o idoso: relevância para um velho problema. Cad Saúde Pública 2003 Jun; 19(3): 783-91., 1994).

Marino1515. Marino JFM. Ciclos históricos da violência na América Latina. São Paulo em Perspectiva 2004 jan./mar; 18(1). Disponível em: URL: <http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?script=sciarttext&pid=S0102-88392004000100005&Ing=pt&nrm=iso>
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(2004) analisa as formas e tendências históricas da violência na América Latina, e considera que a mesma se encontra alicerçada em três princípios básicos: a desigualdade econômica, a desintegração social e a distribuição desigual do poder no “capital simbólico” – termo descrito por Bourdieu apud Marino1515. Marino JFM. Ciclos históricos da violência na América Latina. São Paulo em Perspectiva 2004 jan./mar; 18(1). Disponível em: URL: <http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?script=sciarttext&pid=S0102-88392004000100005&Ing=pt&nrm=iso>
http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?...
(2004) para demonstrar os componentes históricos social, cultural e econômico dos indivíduos inseridos em determinado espaço social.

De acordo com Morais apud Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999. (1999), a violência implica intencionalidade, exigindo, assim, inteligência, por isso os animais não são denominados violentos, mas sim agressivos e ferozes.

São considerados quatro tipos de violência nesta perspectiva: a violência estrutural, que delimita tanto estruturas organizadas e institucionalizadas da família, como sistemas econômicos, culturais e políticos que determinam a opressão de grupos, classes, nações, indivíduos, tornando-os mais vulneráveis do que outros ao sofrimento e à morte; a violência cultural, que se relaciona à anterior, acrescida de manifestações de machismo, racismo, imposição de atos ou idéias, privilegiando outros ou desvalorizando pessoas, limita a criatividade e a liberdade; a violência de resistência, que se constitui em diferentes formas de reação dos grupos subjugados pela violência estrutural, com o objetivo de contestação; e a violência de delinqüência, que é conhecida como crime e está relacionada a ações praticadas fora da lei. (Minayo2020. Minayo MCS. Violência contra o idoso: relevância para um velho problema. Cad Saúde Pública 2003 Jun; 19(3): 783-91., 1994).

Agudelo apud Camargo e Buralli33. Camargo CL, Buralli KO. Violência familiar contra crianças e adolescentes. Salvador: Ultragraph; 1998. 169p. (1998) ainda considera a violência de acordo com quatro pontos de vista. O primeiro diz respeito ao problema de poder. Para Marino1515. Marino JFM. Ciclos históricos da violência na América Latina. São Paulo em Perspectiva 2004 jan./mar; 18(1). Disponível em: URL: <http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?script=sciarttext&pid=S0102-88392004000100005&Ing=pt&nrm=iso>
http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?...
(2004), o poder envolve a habilidade probabilística, por parte de alguns agentes individuais ou coletivos, de impor sua vontade sobre os outros, fora de qualquer marco organizacional ou institucional. Assim, a violência ocorre na medida em que as relações entre os indivíduos se constroem ou se delimitam de forma assimétrica onde o poder se encontra com determinado indivíduo que determina o seu querer em detrimento de outros. Minayo1919. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo: Hucitec; 1992. (1992) acrescenta que, em sociedades de classes, como as latino-americanas, a violência é entendida como um elemento fundamental de interesse de classes, de domínio econômico e político.

O segundo ponto seria considerar a violência como um problema assimétrico que nos revela que, quanto maior a desigualdade entre os indivíduos, maior é o potencial da violência.

A violência também pode ser compreendida, a partir do terceiro ponto de vista, como um problema de anti-ação, que se relaciona ao uso indiscriminado da força física em prol de matar, aniquilar, deixar seqüelas como forma de destruir ou negar uma ordem ou sistema legal.

Por último, a violência também pode ser considerada como um problema de pró-ação, quando é empregada para restaurar, restituir ou defender um direito ou construir uma ordem ou sistema legal – por exemplo, o Movimento dos Sem-Terra e outros movimentos populares.

Portanto, podemos afirmar que muitas são as razões que sustentam a prática da violência em nossa sociedade.

Delimitando a violência contra idosos

Estudos mostram que, dentre os segmentos mais atingidos pela violência, destacam-se a criança, a mulher e o idoso. Isso se deve fundamentalmente à desvantagem desses grupos quando confrontados com o indivíduo adulto e do sexo masculino, sobretudo no que diz respeito à força física, e a configuração do status nos diversos espaços, principalmente dentro da família.

Estudo realizado por Paim2424. Paim JS, et al . Distribuição espacial da violência: mortalidade por causas externas em Salvador (Bahia), Brasil. Rev Panam Salud Publica 1999 nov; 6(5): 321-32. et al. (1999) sobre mortalidade por causas externas em Salvador, capital da Bahia, concluiu que os idosos apresentavam maior risco de morte por causas externas, seguidos dos adultos jovens e dos adolescentes, em que 38% das mortes foram por acidentes de transporte e 28% por quedas.

Não desconsiderando os dados aqui destacados, é importante considerar que as pesquisas fundamentadas em notificações dos sistemas de saúde e policial não corresponderem à totalidade de maus-tratos físicos e principalmente psicológicos relacionados aos idosos, uma vez que estes se apresentam amplos, complexos e de difícil captação.

Essa disparidade está relacionada à dificuldade de notificação dos casos, haja vista que o idoso não obtém em si próprio a coragem para prestar uma queixa formal contra seus agressores em instituições legais, por sentir-se freqüentemente inseguro e desprotegido. Por isso, os estudos que tratam da violência contra o idoso têm sido ainda incipientes, quando comparados aos demais estudos nos quais a violência ao indivíduo idoso figura à margem da sociedade e dos estudos sobre violência.

Discorrendo acerca da vulnerabilidade dos idosos à violência, Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999. (1999) ressalva que as desvantagens deste segmento social são inúmeras e desiguais, principalmente devido ao processo de envelhecimento, que tende a debilitar e reduzir as funções cognitivas e defesas do organismo.

As formas de abusos físicos, psicológicos, sexuais, financeiros e negligências praticadas contra idosos em geral não chegam aos serviços de saúde – ficam naturalizadas no cotidiano das relações familiares, nas formas de negligência social e das políticas públicas (Minayo2121. Minayo MCS. Violência social sob a perspectiva da saúde pública. Cad Saúde Pública 1994; 10(S1): S7-S18, 2003). A mesma autora ainda afirma que a negligência é um tipo de violência muito mais abrangente e disseminado no país, estando presente nas várias classes socioeconômicas, etnias e religiões, e deixam um grande número de indivíduos vulneráveis aos maus-tratos.

Newman apud Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999. (1999) esclarece que o termo “maus-tratos a idosos”, quando empregado, se refere a maus-tratos físicos, sexuais, psicológicos, materiais e negligência. Define também os tipos de maus-tratos ao idoso da seguinte forma: abuso físico, que envolve traumatismos, dor, lesão e coação física; maus-tratos sexuais, que constituem qualquer forma de intimidade mediante a força e a ameaça; maus-tratos materiais ou econômicos, que se caracterizam pelo desvio dos recursos materiais ou financeiros destinados ao cuidado do idoso; negligência, que pode ser entendida como a omissão na provisão ou administração de cuidados adequados; e maus-tratos psicológicos, que consistem na interferência negativa conduzindo a um padrão de comportamento destrutivo, evidenciado sob as formas de rejeição, isolamento e discriminação.

Contextualizando a violência intrafamiliar contra o idoso

Pesquisa realizada por Chavez55. Chavez N. Violence against the elderly. 2002 April. Disponível em: URL: <http:/www.health.org/referrals/resguides._asp>.
www.health.org/referrals/resguides._asp>...
(2002) demonstrou que 90% dos casos de maus-tratos e negligência contra pessoas com mais de 60 anos nos EUA ocorrem nos lares. No Brasil, pesquisa realizada pelo mesmo autor, na Delegacia Especializada de Proteção ao Idoso em Belo Horizonte, constatou que o maior índice de violência contra o idoso é causada pelos filhos, seguido pelo cônjuge ou companheiro e pelos vizinhos. Esses resultados apontam a importância de se dar enfoque, nas pesquisas sobre violência contra idosos, à questão da violência intrafamiliar.

A violência que ocorre no seio da família pode ser compreendida como sendo ações ou omissões que prejudiquem o estado de bem-estar, integridade física e psicológica e a liberdade. A mesma pode ser executada dentro ou fora do lar, por qualquer familiar que esteja em relação de poder com a pessoa agredida (Day77. Day VP et al. Violência doméstica e suas diferentes manifestações. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul 2003 Abr.; 25(S1). Disponível em: URL: http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?script=sciarttex t&pid=S1517-59282001000200002&Ing=pt&nrm=iso
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et al., 2003; Camargo e Buralli33. Camargo CL, Buralli KO. Violência familiar contra crianças e adolescentes. Salvador: Ultragraph; 1998. 169p., 1998).

A violência doméstica, por sua vez, não se limita à família. Envolve todas as pessoas que convivem no mesmo espaço doméstico e que estão vinculadas ou não por laços de parentesco. O termo “doméstico” incluiria também pessoas que convivem no ambiente familiar, como empregados, agregados e visitantes esporádicos (Araújo11. Araújo MF. Violência e abuso sexual na família. Psicologia em Estudo 2002; 7(2). Disponível em: URL: < http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?script=sciarttext&pid=S1517-59282001000200002&Ing=pt&nrm=iso >.
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, 2002; Day77. Day VP et al. Violência doméstica e suas diferentes manifestações. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul 2003 Abr.; 25(S1). Disponível em: URL: http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?script=sciarttex t&pid=S1517-59282001000200002&Ing=pt&nrm=iso
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et al., 2003).

Na realidade, percebemos que a família tanto pode trazer aspectos positivos, de forma a auxiliar no desenvolvimento dos indivíduos, através da manutenção do bem-estar físico e da afetividade, como pode apresentar aspectos negativos, através da disputa pelo poder, fomentando desigualdades e discriminando alguns dos seus membros.

Chavez55. Chavez N. Violence against the elderly. 2002 April. Disponível em: URL: <http:/www.health.org/referrals/resguides._asp>.
www.health.org/referrals/resguides._asp>...
(2002) pontua que a família é um elo imprescindível para o desenvolvimento afetivo dos indivíduos e que os afetos a ela destinados devem ser recíprocos para se obter soluções no ciclo vital. Por isso afirma que não é suficiente viver juntos, mas faz-se necessário manter uma relação profunda de família em plena reciprocidade intergeracional.

Entretanto, percebe-se que nas últimas décadas a família vem sofrendo modificações estruturais rápidas, ocasionadas por diferenciados motivos: separações, divórcios, novas uniões, instabilidade financeira, movimentos migratórios nacionais e internacionais em busca de oportunidades de trabalho e participação crescente das mulheres no mercado de trabalho. Estas modificações têm gerado abalos na estrutura familiar, conduzindo a uma deterioração da qualidade das relações familiares, contribuindo para um aumento das condições de estresse nos indivíduos e propiciando a manifestação de situações conflituosas (Karsch1414. Karsch UM. Idosos dependentes: família e cuidadores. Cad Saúde Pública 2003 jun;19 (3): 861-66., 2003).

Outro fator que parece contribuir para a perpetuação da violência domiciliar contra idosos estaria relacionado à existência de um grande número de idosos dependentes de suas famílias, dado o aumento da expectativa de vida advinda com o envelhecimento populacional.

Caldas22. Caldas CP. Envelhecimento com dependência: responsabilidades e demandas da família. Cad Saúde Pública 2003 jun.;19(3): 733-81 (2003) cita que, embora tenhamos uma Política Nacional de Saúde do Idoso, inexiste no Brasil um programa governamental específico e direcionado à população idosa dependente, o que deixa transparecer que a tarefa de amparar esses idosos é exclusiva da família.

Por isso, entende-se que a família que se propõe a cuidar de um idoso de alta dependência está susceptível às constantes pressões financeiras, sobrecarga física e imitação da sociabilidade por parte dos cuidadores, já que estes dispensam um longo período na prestação dos cuidados ao idoso. Assim, esses fatores em conjunto, ou mesmo isoladamente, são capazes de desencadear situações de maus-tratos e de negligência contra o idoso no âmbito familiar.

Silva2626. Silva CA. O significado da morte de um amigo-companheiro na instituição asilar: história oral de idosos. [dissertação]. Salvador, BA: Universidade Federal da Bahia, Escola de Enfermagem, 2004. (2004) contemporiza a situação de dependência do idoso, afirmando que esta é diretamente proporcional à condição de vulnerabilidade, fragilidade do estado de vida e do estado de saúde do mesmo. O resultado dessa proporção seria o ambiente susceptível à violência intrafamiliar.

Uma pesquisa etnográfica acerca da violência doméstica contra idosos realizada por Menezes, no ano de 1999, com base nos levantamentos dos boletins de ocorrência nas Delegacias de Polícia no município de Ribeirão Preto-SP e nas entrevistas com os idosos violentados, revelou a cultura da violência doméstica sob três principais aspectos: com relação ao idoso, à violência e aos autores.

Segundo o estudo, a violência, sob o aspecto relacionado ao idoso, revelou que a maioria era independente financeiramente, pertencia a todas as classes sociais, residia em suas próprias casas, era fisicamente independente para o desenvolvimento das atividades de vida diária, era do sexo feminino e tinha idades entre 62 e 82 anos.

Ainda nesse estudo ficaram evidentes todos os tipos de violência, desde a agressão verbal até o homicídio, mais foi descrita com maior freqüência a violência com intuito de extorsão e apropriação indevida.

Em relação aos autores, é relevante destacar que os infratores eram da mesma família dos idosos ou conhecidos, sendo na sua maioria filhos das vítimas do sexo masculino e estando no momento dependentes financeiramente dos últimos; o uso de álcool e drogas pelos agressores foi observado na maioria dos casos; por fim, foi também identificado o isolamento social como fator de risco para ocorrência da violência.

Esses achados comprovam claramente alguns estigmas relacionados à violência domiciliar. O primeiro diz respeito a um número elevado de vítimas pertencerem ao sexo feminino. Podemos, então, notar a forte influência da violência de gênero que ocorre dentro da sociedade em diversos níveis, classes e faixas etárias.

Teles2727. Teles MAA. O que é violência contra a mulher. São Paulo: Brasiliense; 2002. (2002) cita que a violência na mulher carrega um estigma, como se fosse um sinal no corpo. É um fenômeno antigo, complexo, proveniente de uma ideologia patriarcal histórica na qual se impõe o poder masculino em detrimento dos direitos das mulheres, subordinando-as às necessidades pessoais e políticas dos homens.

A questão de gênero é um fator preponderante na produção da violência social, interpessoal e familiar. Araújo11. Araújo MF. Violência e abuso sexual na família. Psicologia em Estudo 2002; 7(2). Disponível em: URL: < http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?script=sciarttext&pid=S1517-59282001000200002&Ing=pt&nrm=iso >.
http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?...
(2002) afirma que é importante lembrar que a predominância da categoria de gênero não existe de forma abstrata; ao contrário, articula-se com as categorias de classe e raça ou etnia.

Na escala social do exercício da dominação-exploração por legitimação do poder ou imposição através da violência, o homem adulto, branco e de classe alta tem predominância sobre as mulheres, crianças, velhos, pobres e negros. Assim, a mulher idosa, negra e pobre está altamente vulnerável à violência, principalmente no que concerne à violência doméstica.

Minayo2121. Minayo MCS. Violência social sob a perspectiva da saúde pública. Cad Saúde Pública 1994; 10(S1): S7-S18 (2003) corrobora a assertiva, ao afirmar que nos lares as mulheres idosas, proporcionalmente, são mais abusadas que os homens. E embora a violência de gênero contra idosas, seja indubitavelmente um fenômeno que ocorre no seio da família, no Brasil ainda não existem estatísticas específicas sobre este tipo de violência, por conta do não-reconhecimento social do fenômeno.

O próprio estatuto do idoso é neutro em relação aos gêneros, mesmo havendo a Convenção de Belém do Pará, de 1995, que aponta o problema da violência contra as mulheres considerando o item idade, e a Lei Maria da Penha, de 2006, que inclui nos tipos de violência de gênero aquela que humilha e deprecia em razão da idade.

É importante pontuar que uma das queixas mais registradas nas Delegacias de Polícia especializadas para idosos e mulheres vítimas de violência é a patrimonial, que decorre da apropriação indevida dos bens de outrem através do uso da violência. No caso dos idosos, eles permitem que os agressores se apropriem de seus bens, pelo medo da solidão, da vida em asilos e clínicas geriátricas. Os agressores, após estarem abastados financeiramente, detêm o poder sobre o idoso e seguem coagindo, ameaçando e perpetrando o ciclo da violência (Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999., 1999).

Também foi possível confirmar que a maioria dos agressores de idosos é um familiar ou algum conhecido. Isso revela que a intensidade da violência está associada à intimidade das relações. Ainda através desses estudos, emergiu o perfil do abusador, que na sua grande maioria eram os filhos homens, cônjuge, noras e genros (Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999., 1999; Fávaro88. Fávaro T. Parentes mais próximos são os maiores agressores de idosos, revela pesquisa. Jornal da Unicamp 2003 Ago. Disponível em: URL: < http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/agosto2003/ju223p g05. html > .
http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_ho...
, 2003; Minayo2121. Minayo MCS. Violência social sob a perspectiva da saúde pública. Cad Saúde Pública 1994; 10(S1): S7-S18, 2003).

Outro aspecto relevante a ser destacado por Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999. (1999) é a figura do neto despontando como agressor, inclusive na autoria de homicídios, o que reafirma que a violência familiar pode ser reproduzida ideologicamente por seus componentes. Ou seja, se o idoso foi uma pessoa agressiva nas relações com seus familiares, pode ser vítima de violência, na medida em que seus descendentes põem em prática oportunamente o que aprenderam e viveram. Quanto a isso, Silva2525. Silva MC. O processo de envelhecimento no Brasil: desafios e perspectivas. Textos sobre Envelhecimento 2005: 8(1). Disponível em: URL: <http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?script=sciarttext&pid=S1517-59282005000100004&Ing=pt&nrm=iso>
http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?...
(2005) esclarece que, de acordo com o IBGE1313. IBGE. Perfil dos idosos responsáveis pelo domicílio. Pesquisa Nacional por amostragem domiciliar 2002. Disponível em: URL: <http://www.ibge.gov.br >
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, é crescente o número de netos e bisnetos que vivem sob a custódia dos avós, sendo na maioria das vezes cuidados e sustentados por eles. Tal dependência pode contribuir para acirrar conflitos e motivar comportamentos violentos, pois o idoso é o responsável financeiro, no entanto está sob a custódia e responsabilidade da família.

A despeito das justificativas que recaem sobre o comportamento do agressor, encontramos em muitos estudos a relação tênue que se estabelece entre violência e uso de drogas e álcool. Nessa premissa, Minayo2020. Minayo MCS. Violência contra o idoso: relevância para um velho problema. Cad Saúde Pública 2003 Jun; 19(3): 783-91. (1994) cita que o abuso do álcool e de outras substâncias é fator fundamental associado aos homicídios, violência no trânsito e a violência interpessoal e doméstica.

Segundo Hacker apud Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999. (1999), mesmo em pequenas doses, o álcool aumenta o potencial de violência, mediante a ofuscação da mente e da desinibição.

Esta afirmação não nos leva necessariamente a crer que todo usuário de drogas é sempre o responsável pelos maus-tratos em idosos, mas é importante ressaltar que a construção da violência contra os idosos não se dá de forma isolada; ela é determinada a partir de multifatores que conduzem tanto a vítima quanto o agressor a um ambiente hostil, onde se desenvolve a violência. Nesse viés, a utilização indevida do álcool e das drogas se torna um agente potencializador para a ocorrência destes eventos trágicos no seio da família.

Por fim, e não menos importante, cita-se o isolamento social como um dos fatores encontrados em várias pesquisas sobre violência contra idosos e que parece ter relação direta com a ocorrência de maus-tratos em idosos (Menezes1818. Menezes MR. Da violência revelada à violência silenciada: um estudo etnográfico sobre a violência doméstica contra o idoso. [tese]. Ribeirão Preto, SP: Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; 1999., 1999; Souza2727. Teles MAA. O que é violência contra a mulher. São Paulo: Brasiliense; 2002., 2004).

O isolamento social pode ser descrito do ponto de vista da vítima; já em relação ao agressor, observamos o distanciamento social. O isolamento da vítima se dá no momento em que o agressor isola a vítima dos demais familiares e dos amigos (rede social), para que o último não obtenha ajuda de terceiros na desconstrução do ciclo da violência.

Já o distanciamento social do agressor diz respeito a uma característica peculiar desse indivíduo em possuir contato social reduzido, uma vez que teme as possíveis críticas da sociedade quanto a seu comportamento, ou quando o cuidado do idoso dependente toma-lhe uma boa parte do tempo e do seu lazer (Caldas22. Caldas CP. Envelhecimento com dependência: responsabilidades e demandas da família. Cad Saúde Pública 2003 jun.;19(3): 733-81, 2003).

Como já referido, os idosos maltratados, sendo mais vulneráveis que as demais faixas etárias, encontram-se muitas vezes inseguros e fragilizados, e por essa razão não procuram em primeira instância os serviços especializados. Sem o apoio de familiares e sem amizades, torna-se difícil e constrangedor procurar, sozinho, os serviços de segurança pública especializados.

Nesse contexto, é impossível ignorarmos ou omitirmos a relevância da violência intrafamiliar contra o idoso. A amplitude e a complexidade desta questão nos reportam à reflexão de que as ações que visam a romper com este ciclo criminoso ainda são muito incipientes e muito há ainda o que se debater.

Menezes1717. Menezes MR et al. Bioética do cotidiano e o cuidado do idoso. Revista Texto & Contexto Enfermagem 1997 mai./ago; 6(2): 312-21. (1997) cita que alguns idosos são, ainda, destituídos do poder de decisão, privados de ocupar um espaço físico próprio, do direito de escolha, da liberdade de expressão, do direito à saúde e do direito de envelhecer saudável e com dignidade de cidadão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A violência praticada contra o idoso é inaceitável e os fatores que corroboram para que esse fenômeno cresça, em incidência, devem ser combatidos, através de políticas públicas eficientes que visem a desconstruir esse processo no seio da sociedade.

Estudiosos afirmam que, diante de sua complexidade, qualquer processo de intervenção deve abranger questões macroestruturais, conjunturais, relacionais e subjetivas, bem como focalizar a especificidade dos problemas, dos fatores de risco e das possibilidades de mudança. Assim a complexidade da violência, suas diferenças causalidades e formas de expressão tornam seu enfrentamento um grande desafio, pois exige o desenvolvimento de ações de múltiplas naturezas e em distintos planos e espaços: governamentais, não-governamentais, comunitários e familiares.

Há que se avançar na compreensão desse fenômeno que desafia a ciência e constitui a segunda causa de morte no país, além de produzir estresse, fobias e traumas que matam silenciosamente. Tendo sido o lar identificado como local privilegiado para a expressão da violência contra idosos, ações estratégicas do Programa de Saúde da Família (PSF) podem facilitar a identificação e combate da violência no locus domiciliar.

Sugere-se também que os serviços de atendimento à população idosa sejam rigorosamente supervisionados pelos Conselhos do Idoso e Ministério Público, a fim de que as entidades governamentais e não-governamentais possam ser responsabilizadas, caso os procedimentos realizados nas mesmas não estejam em consonância com as legislações federais, estaduais e municipais direcionadas ao atendimento do idoso.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Nov 2019
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2007

Histórico

  • Recebido
    15 Ago 2006
  • Aceito
    01 Dez 2006
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