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Miíase bucal e doença de Alzheimer: relato de caso clínico

Oral myiasis and Alzheimer disease: report of a clinical case

Resumos

Miíase é uma afecção causada pela presença de larvas de moscas em órgãos e/ou tecidos do homem ou de outros animais vertebrados, sendo mais frequentemente observada em países tropicais. A ocorrência de miíase na cavidade bucal é rara. Dentre os fatores predisponentes, destacam-se a senilidade, o comprometimento neurológico e a halitose. Assim, pacientes com doenças neuro-degenerativas, como a doença de Alzheimer (DA), são mais propensos a adquirirem essa alteração. Este trabalho relata um caso de miíase bucal, acometendo um paciente de 67 anos de idade, com DA em fase avançada, totalmente dependente para as atividades de vida diária (AVD), residente em uma instituição de longa permanência (ILP). O paciente apresentava falta de selamento labial e resistência aos cuidados de higiene bucal. O diagnóstico foi estabelecido clinicamente com base na observação de sangramento na região anterior do palato, descolamento da mucosa bucal e presença de larvas. Foi prescrito o uso de ivermectina e o paciente foi hospitalizado para debridamento do tecido necrótico e remoção das larvas. Após a alta, os cuidadores foram orientados quanto ao uso de máscara pelo paciente, que não se mostrou efetiva, pois o paciente passou a mordê-la, levando a seu deslocamento e reinfestação por larvas. Após o tratamento da reinfestação, adotou-se o uso de cortinado como rotina. Pacientes com DA constituem um grupo de risco para miíase bucal, sendo necessário orientar cuidadores e familiares em relação aos cuidados odontológicos para a prevenção desta patologia. O principal tratamento para a alteração baseia-se na remoção mecânica das larvas e instituição do uso oral da ivermectina.

Miíase; Cavidade bucal; Idoso; Doença de Alzheimer; Prevenção


Myiasis isadiseasecausedby the presenceof fly larvaein the organs and/or tissuesof humans orothervertebrates, and is most oftenseen intropical countries.The occurrence ofmyiasisin the oral cavityis rare.Among thepredisposing factorsstand outsenility, neurological impairmentand halitosis. Thus, patients withneurodegenerative diseasessuch asAlzheimer's disease (AD) are more likely toacquirethis disorder.Thispaper reportsacase oforalmyiasis, involving a67-year old patientwith ADat an advanced stage, completely dependentfor activitiesof daily living(ADL), residing in along-term institution(ILP). The patient suffered from a lack of lip seal and resistance to oral hygiene care. Thediagnosis was clinically made,based on the observationof bleedingin the anteriorpalate, detachment of the oral mucosa andpresence oflarvae.We prescribedthe useof ivermectinand the patientwas hospitalized fordebridementof necrotic tissueand removalof the larvae.After hospital discharge, caregivers were orientedabout the use ofmasksby the patient, which was not effectivebecause the patientbegan tobite it,leading to its displacement andre-infestation bymaggots.After treatmentof re-infestation, it was adopted theroutineuse ofdrapery. AD patientsarearisk group fororal myiasis, beingnecessary to directcaregivers and family membersin relation tooral care to prevent this disease.The main treatmentfor the changeis based onmechanical removalof larvae andinstituting the useoforalivermectin.

Myiasis; Mouth; Elderly; Alzheimer's disease; Prevention


RELATO DE CASO

Miíase bucal e doença de Alzheimer: relato de caso clínico

Oral myiasis and Alzheimer disease: report of a clinical case

Marco Túlio de Freitas RibeiroI; Carla Aparecida Sanglard-OliveiraII; Marcelo Drummond NavesII; Efigênia Ferreira e FerreiraII; Andréa Maria Duarte VargasII; Mauro Henrique Nogueira Guimarães AbreuII

IComplexo de Reabilitação e Cuidado ao Idoso, Casa de Saúde Santa Izabel. Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais. Betim, MG, Brasil

IIFaculdade de Odontologia, Departamento de Odontologia Social e Preventiva. Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, MG, Brasil

Correspondência Correspondência: Carla Aparecida Sanglard-Oliveira Universidade Federal de Minas Gerais Faculdade de Odontologia Departamento de Odontologia Social e Preventiva. Av. Antônio Carlos 6627, Pampulha 31270 901 Belo Horizonte, MG, Brasil E-mail: carlinhasanglard@yahoo.com.br

RESUMO

Miíase é uma afecção causada pela presença de larvas de moscas em órgãos e/ou tecidos do homem ou de outros animais vertebrados, sendo mais frequentemente observada em países tropicais. A ocorrência de miíase na cavidade bucal é rara. Dentre os fatores predisponentes, destacam-se a senilidade, o comprometimento neurológico e a halitose. Assim, pacientes com doenças neuro-degenerativas, como a doença de Alzheimer (DA), são mais propensos a adquirirem essa alteração. Este trabalho relata um caso de miíase bucal, acometendo um paciente de 67 anos de idade, com DA em fase avançada, totalmente dependente para as atividades de vida diária (AVD), residente em uma instituição de longa permanência (ILP). O paciente apresentava falta de selamento labial e resistência aos cuidados de higiene bucal. O diagnóstico foi estabelecido clinicamente com base na observação de sangramento na região anterior do palato, descolamento da mucosa bucal e presença de larvas. Foi prescrito o uso de ivermectina e o paciente foi hospitalizado para debridamento do tecido necrótico e remoção das larvas. Após a alta, os cuidadores foram orientados quanto ao uso de máscara pelo paciente, que não se mostrou efetiva, pois o paciente passou a mordê-la, levando a seu deslocamento e reinfestação por larvas. Após o tratamento da reinfestação, adotou-se o uso de cortinado como rotina. Pacientes com DA constituem um grupo de risco para miíase bucal, sendo necessário orientar cuidadores e familiares em relação aos cuidados odontológicos para a prevenção desta patologia. O principal tratamento para a alteração baseia-se na remoção mecânica das larvas e instituição do uso oral da ivermectina.

Palavras-chave: Miíase. Cavidade bucal. Idoso. Doença de Alzheimer. Prevenção.

ABSTRACT

Myiasis isadiseasecausedby the presenceof fly larvaein the organs and/or tissuesof humans orothervertebrates, and is most oftenseen intropical countries.The occurrence ofmyiasisin the oral cavityis rare.Among thepredisposing factorsstand outsenility, neurological impairmentand halitosis. Thus, patients withneurodegenerative diseasessuch asAlzheimer's disease (AD) are more likely toacquirethis disorder.Thispaper reportsacase oforalmyiasis, involving a67-year old patientwith ADat an advanced stage, completely dependentfor activitiesof daily living(ADL), residing in along-term institution(ILP). The patient suffered from a lack of lip seal and resistance to oral hygiene care. Thediagnosis was clinically made,based on the observationof bleedingin the anteriorpalate, detachment of the oral mucosa andpresence oflarvae.We prescribedthe useof ivermectinand the patientwas hospitalized fordebridementof necrotic tissueand removalof the larvae.After hospital discharge, caregivers were orientedabout the use ofmasksby the patient, which was not effectivebecause the patientbegan tobite it,leading to its displacement andre-infestation bymaggots.After treatmentof re-infestation, it was adopted theroutineuse ofdrapery. AD patientsarearisk group fororal myiasis, beingnecessary to directcaregivers and family membersin relation tooral care to prevent this disease.The main treatmentfor the changeis based onmechanical removalof larvae andinstituting the useoforalivermectin.

Key words: Myiasis. Mouth. Elderly. Alzheimer's disease. Prevention.

INTRODUÇÃO

O termo "miíase" é derivado do grego myio (mosca) e ase (doença), e é usado para definir a invasão dos tecidos do corpo ou cavidade de animais vivos por ovos ou larvas de moscas da ordem díptera. O termo "berne" é também usado para esta doença. É frequente a ocorrência de miíase no meio rural em animais de criação, como bovinos, caprinos, camelídeos, suínos etc., e mesmo em animais domésticos, como cães e gatos, causando danos aos rebanhos e prejuízos econômicos. Pode também ocorrer em seres humanos, embora seja mais raro do que em animais.1-4

As principais moscas causadoras dessa afecção em humanos são encontradas com frequência no Brasil, principalmente nas regiões de clima quente e úmido e na zona rural.4,5 As larvas de Cochliomyia hominivorax e Dermatobia são os agentes causais mais comuns das miíases humanas na América.6

Pesquisa realizada com 24 pacientes com diagnóstico de miíase, atendidos em três hospitais da rede pública na cidade do Recife-PE, no período de novembro de 1999 a outubro de 2002, mostrou que em relação aos sítios anatômicos, as miíases ocorrem com maior frequência nos membros inferiores (41,7%), com menor frequência na cabeça (16,7%), cavidade bucal (12,5%), ânus, ouvido e olho (8,3%) e região dorsal (4,2%).7

A ocorrência de miíase bucal é rara e há poucos relatos de casos clínicos na literatura descrevendo esta condição. Quando ocorrem, podem manifestar-se em bolsas periodontais, feridas resultantes de extrações dentárias e em diversas localizações dentro da cavidade bucal.8 As moscas depositam seus ovos diretamente sobre o tecido lesado. Depois de estes eclodirem, a larva obtém sua nutrição por meio de tecidos circunjacentes, e introduzem-se mais profundamente nos tecidos moles, podendo até produzir "túneis", separando a gengiva e o mucoperiósteo do osso. De acordo com a localização e o tecido envolvido, há diferentes nomenclaturas, como: miíase gengival, miíase dental, miíase periodontal e miíase oral.9

Pacientes acometidos por miíase bucal em geral apresentam alguns fatores predisponentes, tais como: higiene bucal deficiente, falta de selamento dos lábios, resistência corporal diminuída, desnutrição, respiração bucal (principalmente durante o sono), etilismo, senilidade, comprometimento neurológico, hemiplegia e traumas na área facial.10 A halitose severa é citada como fator de risco, pois atrai as moscas para deposição das larvas.8 Esses fatores fazem com que pacientes com doença de Alzheimer (DA) sejam mais predispostos a desenvolver miíase.8,10

A DA é uma alteração neuro-degenerativa, progressiva e fatal, com perda da função intelectual, como memória, linguagem, localização espacial e temporal, habilidade para resolver problemas e de pensar de forma abstrata e com comportamento anormal. A doença aparece mais frequentemente após os 60 anos, englobando uma população com declínio na capacidade de apreender informações novas e de fazer tarefas rotineiras. Esses pacientes começam a perder a capacidade de se preocuparem com eles próprios e, em estágios avançados, perdem a mobilidade progressivamente, terminando com a morte.11,12 Ao longo do processo de demência, o paciente demonstra a perda progressiva da capacidade diária de higiene bucal (ADHB). Esta situação se deve a capacidade motora e funções cognitivas diminuídas, o que requer o cuidado especial desses indivíduos por um cuidador.13 Problemas bucais são mais prevalentes em subgrupos de idosos, como os institucionalizados, os funcionalmente dependentes e os demenciados.14 Indivíduos com necessidades especiais de cuidados de saúde possuem risco aumentado para doenças bucais, sendo que os pacientes DA constituem um exemplo desta situação.12

Devido ao processo evolutivo da doença, é essencial investigar as complicações que a DA pode produzir na saúde bucal, de modo que esses pacientes possam ser submetidos a procedimentos preventivos adequados para evitar o desenvolvimento e progressão de doenças bucais. Em relação à miíase bucal, compete ao cirurgião-dentista orientar familiares e cuidadores, diagnosticar e tratar prontamente esta afecção antes que ela chegue a um estado crítico, às vezes mortal, por hemorragias ou comprometimento do sistema nervoso central.

O objetivo deste trabalho é relatar um caso clínico sobre miíase bucal em paciente idoso com doença de Alzheimer e discutir as medidas possíveis para prevenção e tratamento, de modo a orientar profissionais da saúde e cuidadores sobre a relevância dos cuidados com a saúde bucal nos casos da DA.

RELATO DO CASO

Paciente do sexo masculino, leucoderma, divorciado, 67 anos, portador de demência do tipo Alzheimer em fase avançada, totalmente dependente para as atividades de vida diária (AVD), afásico, residente em uma instituição de longa permanência (ILP). Solicitou-se ao cirurgião-dentista avaliação do paciente após cuidadoras observarem sangramento na região de palato duro e halitose. Ao exame clínico, observou-se que a gengiva e o mucoperiósteo apresentavam-se separados do tecido ósseo, com presença de sangramento e larvas (figura1). Foi diagnosticada miíase bucal, prescrevendo-se ivermectina e cefalexina no momento do diagnóstico, sendo o paciente hospitalizado para curetagem e remoção das larvas (figuras 2 e 3).




Na ocasião, foram realizadas as exodontias dos elementos 22, 25 e 26. Após a remoção de tecido necrótico e larvas, observou-se cicatrização da lesão (figura 4). Os cuidadores foram orientados quanto ao uso de máscara no paciente, devido à ausência de selamento labial do mesmo. Tal conduta não se mostrou efetiva para a prevenção de reinfestação por larvas, pois o paciente adotou o hábito de morder a máscara, o que fez com que esta não permanecesse em posição.


Após sete meses, o paciente foi novamente diagnosticado com miíase bucal. Foi feita novamente a prescrição de ivermectina, irrigação com nitrofurazona (Furacin®) e remoção de larvas. A irrigação com nitrofurazona e a remoção de larvas mostraram-se insuficientes para a resolução do caso, devido a localização e quantidade de larvas presentes. O paciente foi então hospitalizado por uma semana, sendo medicado com amoxicilina e clavulanato de potássio, além de ivermectina (Ivomec®). Durante esse período, foi feita diariamente a remoção das larvas. Após estas condutas, o paciente recebeu alta, sendo indicado o uso de levofloxacina 500mg por uma semana pelo médico infectologista que acompanhou o caso.

Uma semana após a alta hospitalar, o paciente compareceu à clínica da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Minas Gerais para avaliação, quando se constatou extensa área de necrose. Cuidadoras foram orientadas a realizar higiene bucal com gluconato de clorexidina 0,12% diariamente, uso de máscara e cortinado. No mês seguinte, constatou-se cicatrização das áreas de necrose da região acometida (figura 4). Na ocasião, observou-se a presença de gengivite na região de incisivos inferiores, sendo os cuidadores novamente orientados quanto aos cuidados bucais.

O referido relato de caso recebeu autorização de familiares do paciente, sendo que o cuidador principal assinou o termo de consentimento livre e esclarecido, o qual permitia o uso da imagem e o relato do caso para publicação.

DISCUSSÃO

O Brasil encontra-se num processo de transição demográfica e epidemiológica, com aumento do número de idosos e da prevalência de doenças neuro-degenerativas como a DA.15As dificuldades com as ADHBs devido a DA, associadas ao fato do Brasil ser uma região propícia ao desenvolvimento das principais espécies de moscas que causam miíase em humanos, favorecem o desenvolvimento desta patologia neste grupo de pacientes.

As condições de higiene da instituição são boas. É uma instituição classificada como boa ou muito boa pela Promotoria de Defesa da Pessoa Portadora de Deficiência e Idosos (PDPPDI), após avaliação quanto aos seguintes critérios: condições de moradia, limpeza e higiene do local, alimentação, equipe de saúde própria, atividades de lazer e recreativas, garantia aos idosos de seus direitos previdenciários, regulamentação legal, programa de manutenção de vínculos familiares, programa de capacitação e treinamento dos funcionários e cuidadores e atender especificamente pessoas com 60 anos ou mais.16

A ocorrência de miíase é mais comum em pessoas idosas, debilitadas, doentes e com deficiência mental.3,4 Assim, profissionais envolvidos no cuidado desses pacientes devem conhecer estratégias para prevenção, diagnóstico e tratamento de tal doença. A miíase bucal, ainda que mais rara, é descrita em pacientes com higiene bucal deficiente, respiração bucal, falta de selamento dos lábios e halitose severa. Esses fatores atraem as moscas para deposição das larvas.17-19

No presente caso, o paciente, por ser portador da doença de Alzheimer em estágio avançado, é totalmente dependente das cuidadoras que trabalham na ILP na qual ele vive. A dependência, associada às dificuldades com as ADHBs, a consequente halitose e falta de selamento labial do paciente, contribuíram para a infestação por larvas em sua cavidade bucal, ainda que esse viva em ambiente urbano com boas condições de higiene. Como o paciente é afásico, ele não pode externar os sintomas da infestação, sendo os sinais de anormalidade percebidos pelas cuidadoras somente quando a doença apresenta sinais clínicos. Assim, o mesmo demanda cuidados com as ADHB e uma rotina de avaliação da cavidade bucal como principal estratégia para a prevenção da infestação por larvas de moscas e outras patologias bucais. A clínica possuía um cirurgião-dentista de referência, que acompanhava os pacientes de acordo com a necessidade e por demanda da família. O paciente era acompanhado rotineiramente, recebendo visitas de um cirurgião-dentista semestralmente.

Além dos cuidados com as ADHBs, medidas de proteção individuais e coletivas são as principais formas para se prevenir a instalação de miíase. Entre elas, telar portas e janelas de hospitais ou dependências domésticas, que abriguem pacientes portadores de lesões ou de quaisquer condições predisponentes à instalação da miíase, evitar exposição de feridas abertas, ulcerações com tecido necrosado, eczemas infectados, assim como manter boa higiene individual e ambiental, são procedimentos de suma importância.18

Na instituição onde o paciente residia, não existiam telas nas janelas ou portas; entretanto, após a infestação da miíase na cavidade oral do mesmo, foram instalados cortinados no quarto do paciente, e estes foram mantidos mesmo após a resolução da infecção. A ausência de selamento labial e a colaboração do paciente devido à DA, associada à falta de informação das cuidadoras sobre as medidas preventivas para se evitar o aparecimento e recidiva da miíase, contribuíram para a infestação no caso descrito. Cabe, entretanto, ressaltar a complexidade dos cuidados bucais preventivos nos pacientes com DA, pois ainda que o uso de máscaras tenha sido recomendado às cuidadoras para evitar a recidiva da miíase, havia dificuldade da mesma em permanecer na face do paciente, pois este passou a mordê-la, provocando seu deslocamento. A incapacidade de compreensão e colaboração do paciente, tanto com as ADHBs quanto com estratégias para prevenção da reinfestação por larvas, constituiu um desafio para os profissionais envolvidos em seus cuidados, sendo necessária sua adequação à condição do paciente e do ambiente.

Quanto aos meios de tratamento, todos os estudos citados apontaram para a remoção mecânica das larvas como sendo o procedimento de escolha em pacientes acometidos pela miíase bucal. Em casos muito severos, pode ser feita antibioticoterapia sistêmica. A ivermectina oral foi o medicamento antiparasitário de escolha usado para o tratamento de miíase bucal nos estudos de Ribeiro et al.20 e Shinohara et al.,21 segundo os quais foram obtidos resultados considerados eficientes.

Fares et al.,22 em relato de caso, tratando um paciente de dez anos de idade portador de deficiência mental e paraplégico, concluiu que a miíase bucal é predominante em população rural e em pacientes especiais, com debilidade mental, senilidade avançada, caquexia, dentre outros. Quanto ao tratamento, os bons resultados obtidos deveram-se mais à remoção mecânica das larvas do que à terapêutica medicamentosa empregada, quer seja local ou sistêmica.

No caso relatado, foi realizada remoção mecânica das larvas e instituição de um tratamento medicamentoso com ivermectina, o que condiz com o tratamento para miíase proposto pela literatura. O paciente, porém, foi novamente infestado por larvas e, devido à severidade e profundidade da lesão, outros medicamentos antibióticos como a amoxicilina associada a clavulanato de potássio e cefalexina foram prescritos ao paciente, para auxiliar no combate à infestação.

Recentemente, a irrigação com nitrofurazona tem sido apontada como indicada para tratamento da miíase bucal, mas neste caso a irrigação não se mostrou eficaz, devido a profundidade da lesão e dificuldade no manuseio do paciente.

CONCLUSÃO

Pacientes com doença de Alzheimer constituem um grupo de risco para miíase bucal, e a prevenção dessa patologia constitui um desafio para cuidadores e familiares, especialmente no caso de pacientes com ausência de selamento labial.

A informação e orientação para familiares, cuidadores e para as instituições de longa permanência em relação aos cuidados bucais e ambientais e a avaliação rotineira da condição bucal desses pacientes constituem as principais estratégias preventivas para esse grupo. O principal tratamento paliativo para a alteração baseia-se na remoção mecânica das larvas e instituição do uso oral da ivermectina.

Recebido: 19/10/2011

Revisado: 29/2/2012

Aprovado: 18/6/2012

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  • Correspondência:

    Carla Aparecida Sanglard-Oliveira
    Universidade Federal de Minas Gerais
    Faculdade de Odontologia
    Departamento de Odontologia Social e Preventiva.
    Av. Antônio Carlos 6627, Pampulha
    31270 901 Belo Horizonte, MG, Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Fev 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      19 Out 2011
    • Aceito
      18 Jun 2012
    • Revisado
      29 Fev 2012
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