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Qualidade de vida e situação de saúde de idosos: um estudo de base populacional no Sertão Central do Ceará

Resumos

Introdução

: O envelhecimento saudável e com qualidade de vida tornou-se um grande anseio da sociedade contemporânea. Conhecer o perfil dessa população pode favorecer o estabelecimento de ações e políticas mais adequadas em prol da promoção da saúde e qualidade de vida.

Objetivo:

Mapear aspectos relacionados à saúde e qualidade de vida na percepção de idosos residentes na cidade de Canindé, no Sertão Central do Ceará.

Método:

Estudo quantitativo, transversal, de base domiciliar. De uma população de 5.214 idosos, a amostragem estratificada proporcional alcançou uma amostra de 372 indivíduos. Utilizou-se um questionário de caracterização, abordando aspectos sociodemográficos e condições de saúde, e a versão abreviada do WHOQOL. Aplicou-se o programa SPSS, versão 16.0, para estatísticas descritivas e inferenciais, adotando-se o nível de significância de 5%.

Resultados:

A maioria dos idosos era do sexo feminino, casada, de cor parda, entre 60 e 69 anos de idade, com ensino fundamental incompleto e renda de até um salário mínimo. A maioria esteve em uma-três consultas/internações nos últimos 12 meses, reportando elevada prevalência de hipertensão, diabetes, osteoporose, ansiedade e doenças cardiovasculares, apesar de a saúde e a qualidade de vida serem reportadas como "boas". Quanto à qualidade de vida, o domínio psicológico obteve a maior e o meio ambiente, a menor média.

Conclusões:

As doenças/comorbidades prevalentes pertencem ao grupo das doenças crônicas não transmissíveis. O domínio meio ambiente influenciou negativamente a qualidade de vida geral, evidenciando a importância de ambientes que favoreçam a promoção da saúde e qualidade de vida nos idosos do sertão.

Idoso; Qualidade de Vida; Saúde


Introduction

: Healthy aging and quality of life has become a major desire of contemporary society. Understanding the profile of this population will allow the creation of more appropriate policies and actions for the promotion of health and quality of life.

Objective

: To map aspects related to health and quality of life as perceived by elderly residents of the city of Canindé, in the central sertão region of the state of Ceará.

Method

: A quantitative, cross-sectional, household-based study was performed. From a population of 5,214 elderly persons, proportional stratified sampling resulted in a sample of 372 individuals. A characterization questionnaire addressing sociodemographic characteristics and health status and the abbreviated version of WHOQOL were used. SPSS version 16.0 was used for descriptive and inferential statistics, adopting a significance level of 5%.

Results

: Most elderly individuals were female, married, brown skinned, aged 60 to 69 years old, with an incomplete primary education and an income of up to one minimum wage. Most of the elderly persons had attended 1-3 consultations/admissions in the last 12 months, and reported a high prevalence of hypertension, diabetes, osteoporosis, anxiety and cardiovascular diseases, despite describing their health and quality of life as "good". In terms of quality of life, the psychological domain had the highest, and the environmental domain had the lowest mean score.

Conclusions

: The prevalent diseases/comorbidities belonged to the chronic non-communicable diseases group. The environmental domain negatively influenced overall quality of life, indicating the importance of environments that provide health promotion and quality of life for elderly people from rural regions.

Elderly; Quality of Life; Health


INTRODUÇÃO

O envelhecimento da população mundial é evidente, em decorrência da redução da natalidade, da mortalidade e do aumento da longevidade, resultantes de avanços em inúmeros fatores de cuidados em saúde. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)¹ afirma que o Brasil tem envelhecido de maneira rápida e intensa, e que a maioria dos idosos tem se apresentado com baixo nível socioeconômico e com alta prevalência de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), o que ocasiona uma sobrecarga substancial para a economia nacional, especialmente pelos gastos com aposentadoria e recursos médicos.

As DCNTs representam hoje um problema de saúde global, sendo a principal causa de morbi-mortalidade também nos países em desenvolvimento, como o Brasil. Mesmo reconhecendo que o desenvolvimento de hábitos e estilos de vida está relacionado de forma complexa aos condicionantes e determinantes sociais da saúde, os fatores de risco comportamentais compartilhados no desenvolvimento das DCNTs são a inatividade física, a alimentação não saudável, o tabagismo e o uso abusivo do álcool.22. Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção a Saúde. Política Nacional de Promoção da Saúde. 3.ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2010.,33. Schmidt MI, Ducan BB, Silva GA, Menezes AM, Monteiro CA, Barreto SM. Doenças crônicas não transmissíveis no Brasil: carga e desafios atuais. Lancet [Internet] 2011 [acesso em 15 fev 2014]:61-74. Disponível em http://download.thelancet.com/flatcontentassets/pdfs/brazil/brazilpor4.pdf
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Nesse sentido, o envelhecimento saudável tem sido um amplo anseio de toda a sociedade contemporânea. Segundo Deponti & Acosta,44. Deponti RN, Acosta MAF. Compreensão dos idosos sobre os fatores que influenciam no envelhecimento saudável. Estud Interdiscip Envelhec 2010;15(1):31-50. para a melhor compreensão da relação entre envelhecimento e saúde, tem-se optado por uma abordagem multidimensional, considerando os aspectos biológicos, físicos, psicológicos, econômicos e sociais. Para os autores, é importante também conhecer a percepção dos próprios idosos acerca de tais fatores, uma vez que esses são os atores principais desse processo.

Num cenário mundial de transições demográfica, nutricional e epidemiológica, surge o termo Qualidade de Vida (QV), referindo-se à manutenção da saúde nos aspectos físicos, espirituais, psíquicos e sociais,55. Organização Mundial de Saúde. Principios de las naciones unidas a favor de las personas de edad: resolución 46/91. Genebra: OMS; 1991. e abrangendo a percepção sobre posição na vida, nível de dependência, contexto cultural e sistema de valores.66. The WHOQOL Group. The World Health Organization Quality of Life Assessment (WHOQOL): position paper from the World Health Organization. Soc Sci Med [Internet] 1995 [acesso em 19 nov 2012];41(10):1403-9. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/8560308
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Vários são os fatores que influenciam a QV, dentre eles, o estado de saúde, as relações familiares, longevidade, disposição, lazer, satisfação no trabalho, salário, prazer, espiritualidade,77. Nahas MV. Atividade física, saúde e qualidade de vida: conceitos e sugestões para um estilo de vida ativo. 5. ed. Londrina: Midiograf, 2010. capacidade funcional, enfraquecimento, deficiência,88. Barbote E, Guillemin F, Chau N, Lorhandicap Group. Prevalence of impairments, disabilities, handicaps and quality of life in the general population: a review of recent literature. Bull World Health Organ 2011;79(11):1047-55. nível de atividade física, parâmetros antropométricos e uso de medicamentos.99. Ferreira EEDBA. Gestão de custos com medicamentos, hidroginástica e qualidade de vida em pessoas idosas de Santarém [Dissertação]. Coimbra: Universidade de Coimbra, Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física; 2011.

10. Gomes Neto M, De Castro MF. Estudo comparativo da independência funcional e qualidade de vida entre idosos ativos e sedentários. Rev Bras Med Esporte. 2012;18(4):234-7.
-1111. Silva RS, Silva I, Silva RA, Souza L, Tomasi E. Atividade física e qualidade de vida. Ciênc Saúde Coletiva 2010;15(1):115-20. Constata-se que QV é um termo amplo e subjetivo, com definições diferentes para diversos autores, dependendo também da influência de aspectos e percepções individuais, sociais e ambientais.

Com o aumento global da expectativa de vida, passou-se a refletir que não adianta apenas proporcionar ao indivíduo uma longevidade, mas é também necessário garantir meios para que ele passe esses anos de maneira satisfatória. Dessa forma, se intencionaria não somente uma existência longa, mas uma vida associada à autonomia, suporte social, bem-estar, amor e felicidade, entre outros.22. Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção a Saúde. Política Nacional de Promoção da Saúde. 3.ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2010.,55. Organização Mundial de Saúde. Principios de las naciones unidas a favor de las personas de edad: resolución 46/91. Genebra: OMS; 1991.

Ao se deparar com esse contexto, a QV passa a ser bastante estudada na população idosa. Atendendo às necessidades da sociedade, incluindo profissionais de saúde e seus pacientes, a QV e sua relação com a saúde tem sido fortemente utilizada como meio de avaliação dos resultados de determinadas intervenções,1212. Santos CAS, Dantas EEM, Moreira MHR. Correlation of physical aptitude; functional capacity, corporal balance and quality of life (QoL) among elderly women submitted to a post-menopausal physical activities program. Arch Gerontol Geriatr 2011;53(3):344-9. tratamentos,1313. Li R, Yan BP, Dong M, Zhang Q, Yip GWK, Chan CP, et al. Quality of life after percutaneous coronary intervention in the elderly with acute coronary syndrome. Int J Cardiol 2012;155(1):90-6. programas1414. Fernández-prado S, Conlon S, Mayán-Santos JM, Gandoy-Crego M. The influence of a cognitive stimulation program on the quality of life perception among the elderly. Arch Gerontol Geriatr 2012;54(1):181-4. e estratégias,1515. Olsson IN, Runnamo R, Engfeldt P. Drug treatment in the elderly: an intervention in primary care to enhance prescription quality and quality of life. Scand J Prim Health Care 2012;30(1):3-9. envolvendo as múltiplas percepções, contextos e parâmetros.

Diante da complexidade do tema, os estudos, indicadores e instrumentos operacionalmente viáveis tornam-se ferramentas essenciais para a prática dos profissionais de saúde que atuam com o público idoso. No mesmo mérito, pesquisas e estudos populacionais sobre diversos temas1616. Silva GDOB, Gondim APS, Monteiro MP, Frotal MA, Meseses ALL. Uso de medicamentos contínuos e fatores associados em idosos de Quixadá, Ceará. Rev Bras Epidemiol 2012;15(2):386-95.

17. Giehl MWC, Schneider IJC, Corseuil HX, Benedetti TRB, D'Orsi E. Atividade física e percepção do ambiente em idosos: estudo populacional em Florianópolis. Rev Saúde Pública 2012;46(3):516-25.
-1818. De Oliveira MA, Francisco PMSB, Costa KS, Barros MBA. Automedicação em idosos residentes em Campinas, São Paulo, Brasil: prevalência e fatores associados. Cad Saúde Pública 2012;28(2):335-45 tendem a apresentar a estrutura, composição e a forma de distribuição de determinados componentes, propiciando, a partir de um conhecimento amplo da população estudada, possibilidades de melhores condições de vida.

O Sertão Nordestino é uma das regiões do país em que os indicadores das condições de vida são mais escassos.1919. Santos JP, Paes NA. Envelhecimento demográfico e fatores explicativos da mortalidade dos homens idosos da região Nordeste do Brasil [Internet]. In: 29º Congreso de La Asociación Latinoamericana de Sociologia; 2013; Santiago. Santiago: ALAS; 2013 [acesso em 20 jan 2014]. Disponível em: http://actacientifica.servicioit.cl/biblioteca/gt/GT9/GT9_PereiraJAntunesN.pdf
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Dessa forma, estudos como o presente contribuem sobremaneira com referências e dados úteis para informação e comparativos tanto a nível local como regional.

Sabendo que a análise da situação de saúde e QV pode ajudar a estabelecer o perfil de populações específicas e traçar metas de intervenção apropriadas de acordo com suas necessidades, e cientes das especificidades decorrentes de aspectos ambientais, culturais e subjetivos, o presente estudo objetivou mapear aspectos relacionados à saúde e qualidade de vida a partir da percepção de idosos residentes na cidade de Canindé, localizada no Sertão Central do Ceará.

MÉTODO

Desenho e local do estudo

O presente estudo é quantitativo, transversal, de base domiciliar e com a utilização de dados primários e objetivos. O local definido como área de estudo foi a região urbana da sede do município de Canindé, localizado na região denominada Sertão Central do Estado do Ceará, distante 114 km da capital, Fortaleza. A coleta de dados foi realizada no período de abril a junho de 2013.

População e amostra

A população do estudo foi constituída dos 5.214 idosos que residiam na área urbana da sede do município de Canindé-CE. A amostragem estratificada proporcional alcançou uma amostra de 372 indivíduos (7,13% da população total). O cálculo do tamanho da amostra foi feito por meio da fórmula indicada para populações finitas (menos de 100.000 unidades) e considerou o nível de confiança, escolhido em número de desvios (95%, equivalentes a 2 desvios-padrão); proporção estimada da característica pesquisada no universo (50%); proporção estimada do universo que não possui a característica pesquisada (50%); tamanho da população (5.214 idosos) e erro máximo admissível (5%). Após o cálculo do tamanho da amostra, fez-se a determinação do tamanho proporcional dos estratos (bairros da cidade), garantindo a representação, mais exata possível deles, segundo sua proporção na população.

Foram incluídas pessoas idosas, independente do sexo, com idade igual ou superior a 60 anos no período de coleta de dados, não institucionalizadas e residentes no município há pelo menos seis meses. Foram excluídos os idosos incapazes de se comunicar, portadores de condição neurológica grave, cadeirantes, com obesidade mórbida e com intervenções cirúrgicas recentes.

Instrumentos e procedimentos

Um questionário com questões fechadas, que permite caracterizar a amostra quanto aos aspectos sociodemográficos (idade, sexo, estado civil, religião, cor da pele, aposentadoria, escolaridade e renda) e condições de saúde (percepção de saúde, percepção de saúde comparada aos pares, presença de doenças, consultas/internações nos últimos 12 meses, sistema de saúde), elaborado pelos pesquisadores, e o World Health Organization Quality of Life Assessment na versão abreviada (WHOQOL-bref) para a avaliação da QV.

A coleta de dados foi realizada mediante inquérito domiciliar. Os idosos foram sorteados a partir das ruas/avenidas e dos números das residências, na proporção adequada para cada bairro. Em cada rua/avenida foram visitadas as casas situadas no lado esquerdo e direito, de forma alternada. Nos casos em que no domicílio sorteado não tinha nenhum idoso que preenchesse os critérios de inclusão, o domicílio seguinte era imediatamente selecionado, continuando a alternância a partir do último domicílio visitado, até que todo o bairro fosse coberto de acordo com a amostragem. Quando existiam mais de um idoso no mesmo domicílio, foram escolhidos os de maior idade, por ter uma representatividade menor na população.

Os avaliadores foram treinados e orientados quanto aos procedimentos metodológicos tanto de seleção quanto de aplicação dos instrumentos na forma de entrevista, a fim de se estabelecer parâmetros de semelhança e replicabilidade e evitar possíveis vieses na coleta dos dados. Todas as informações obtidas quanto à presença/ausência de doenças foram apenas reportadas. Os questionários preenchidos foram checados para inconsistências e, a seguir, tabulados em um banco de dados.

Análise dos dados

Para a análise dos dados foi utilizado o programa SPSS (Statistical Package for the Social Sciences), versão 16.0, com a aplicação do teste de normalidade (Kolmogorov-Smirnov) e cálculos de estatística descritiva (média, moda, desvio-padrão e percentagens) e inferenciais (teste Qui-quadrado), de acordo com as variáveis estudadas, adotando-se o nível de significância de 5% (p<0,05). Os resultados obtidos são apresentados por meio de tabelas.

Aspectos éticos

A presente pesquisa cumpriu os princípios éticos contidos na Declaração de Helsinki, tendo sido aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo seres humanos da Universidade de Fortaleza (nº 244.796/2013), procedendo também conforme a Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), no que concerne ao respeito à pessoa, a beneficência e a justiça, entre outros.2020. Brasil. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 dezembro de 2012. Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Brasília: Conselho Nacional de Saúde; 2013. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso466.pdf
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A amostra foi questionada quanto ao consentimento e voluntariedade na participação da pesquisa por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

RESULTADOS

Foram entrevistados 372 idosos, com média de idade de 71,0(+9,2) anos, com idade mínima de 60 anos, máxima de 96 anos e moda de 60,0 anos. O teste de normalidade apontou que a amostra não foi considerada normal (p=0,00).

As características sociodemográficas dos idosos estudados indicam que, em sua maioria, era do sexo feminino (64,0%), de cor parda (47,6%), com idade entre 60 e 69 anos (51,9%), casados (53,5%) e de religião católica (91,1%). Quanto à escolaridade, a maioria reportou possuir o ensino fundamental incompleto (51,9%), seguida do analfabetismo (21,0%). A maior parte também afirmou ser aposentada (84,7%), tendo renda de até um salário mínimo (54,3%), seguido de dois a quatro salários mínimos (40,9%).

As principais doenças ou comorbidades relatadas pelos idosos estudados, ressaltando-se a possibilidade de o idoso indicar mais de uma das doenças listadas, por ordem de prevalência foram: hipertensão (46,2%), seguida da diabetes (18,0%), osteoporose (12,4%), ansiedade (11,8%), e doenças cardiovasculares (10,2%). Ainda, 25,0% dos idosos afirmaram não possuir nenhuma doença e 15,8% deles, ter "outra" doença de menor prevalência, dentre as quais aparecem a artrose, gastrite, dores na coluna e labirintite, reumatismo, asma, complicações na próstata, glaucoma, incontinência urinária, hanseníase, hérnia de disco, pedra na vesícula, doença de Parkinson e úlcera.

Fazendo uma análise por intervalos de idade, foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre a hipertensão (p=0,01), diabetes (p<0,01) e obesidade (p=0,04). A frequência de hipertensão e diabetes foi bem maior em idosos acima de 80 anos. Já para obesidade, a relação foi inversa, tendo maior prevalência em idosos de 60 a 69 anos; nenhum idoso acima de 80 anos afirmou ser obeso. Na análise estratificada por sexo, foram identificadas diferenças estatisticamente significativas nas prevalências de osteoporose (p<0,01) e de ansiedade (p<0,01), para o grupo feminino quando comparado ao masculino (tabela 1).

Tabela 1.
Prevalência de morbidades por sexo e faixa etária. Canindé-CE, 2013.

Em função das doenças ou comorbidades, a maioria dos idosos (46,5%) relatou a ocorrência de uma a três consultas ou internações nos últimos 12 meses, seguido de 33,3% dos idosos que reportaram ter realizado de quatro a seis consultas ou internações nesse período; 15,1% relataram não ter realizado esses procedimentos nenhuma vez. Não foram encontradas diferenças significativas (p=0,72) nessa distribuição por sexo, mas quando analisado por faixa etária, identificou-se que idosos com mais idade tendem a elevar significativamente (p<0,01) a frequência de tais procedimentos.

Quando questionados quanto ao sistema de saúde que buscam para a realização de consultas/internações, 84,1% apontaram o Sistema Único de Saúde (SUS) e apenas 15,9% afirmaram utilizar a saúde suplementar. Vale ressaltar que é possível que os idosos que possuem plano de saúde suplementar também façam uso dos serviços do SUS em alguma esfera.

De modo geral, a maioria dos idosos estudados percebe como "boa" tanto a saúde (76,3%) como a QV (45,7%), não havendo diferenças significativas entre o sexo e a idade nas duas variáveis. Ao comparar a sua saúde com os demais idosos, a maioria a considerou como "semelhante" (47,3%) e "melhor" (47,0%), com diferenças expressivas na análise estratificada por sexo e faixa etária (p=0,01), tendo as mulheres e as pessoas mais novas uma melhor saúde comparada aos pares.

Quanto à QV, a média (desvio-padrão) dos escores obtidos nos seus quatro domínios e globalmente é apresentada na tabela 2. É possível observar que os domínios psicológico e derelações sociais se apresentaram como aspectos positivos da QV e que o domínio ambiente mostrou-se o aspecto com menor valor médio entre essa população.

Tabela 2.
Média e desvio-padrão(+) dos escores dos domínios e qualidade de vida global segundo sexo e faixa etária. Canindé-CE, 2013.

Dentre as facetas presentes no questionário do WHOQOL-bref, as que se destacam por maiores valores (média) foram: sentimentos negativos (79,2+0,8), relações pessoais (77,6+0,7), suporte e apoio pessoal (77,7+0,7), autoestima (74,5+0,7), espiritualidade/religião/crenças pessoais (74,1+0,7) e imagem corporal e aparência (72,2+0,8). As que se destacaram pelos menores valores (média) foram: recreação e lazer (39,9+1,0), recursos financeiros (49,8+0,9), atividade sexual (51,4+0,8), sentimentos positivos (53,7+0,9) e cuidados de saúde (54,5+1,0).

Ao analisar os resultados da QV em função do sexo foi observado que a QV das mulheres mostrou-se inferior à dos homens no aspecto geral e em todos os domínios, sendo, porém, estatisticamente significante apenas no domínioambiente (p=0,04). Quanto à faixa etária, pode-se observar que a QV geral e todos seus domínios tendem a diminuir com o aumento da idade, tendo sido estatisticamente relevante novamente no domínioambiente (p=0,02). Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre a QV global e seus domínios separados por cor, religião, estado civil, escolaridade e renda (tabela 3).

Tabela 3.
Média e desvio-padrão(+) dos escores dos domínios e qualidade de vida global segundo os aspectos relacionados à saúde. Canindé-CE, 2013.

Quanto aos domínios de QV separados de acordo com as doenças/morbidades, foram identificadas diferenças significativas entre o domínio físicoe a presença de hipertensão (p=0,02) e diabetes (p=0,03), e também entre o domínioambiente e a presença de doença pulmonar (p=0,01) e câncer (p=0,03). Embora as demais variáveis não tenham apresentado diferenças estatisticamente significativas, observam-se amplas variações nas médias de QV em função da presença de algumas doenças.

Quanto aos outros aspectos relacionados à saúde, a variável que apresentou maior associação com a QV dos idosos foi o número de consultas/internações nos últimos 12 meses, sendo estatisticamente importante no domínio físico(p=0,04), psicológico(p=0,04) e QV global(p=0,00).

DISCUSSÃO

O presente estudo apresentou predominâncias de características específicas da população bastante similares a outro estudo,1616. Silva GDOB, Gondim APS, Monteiro MP, Frotal MA, Meseses ALL. Uso de medicamentos contínuos e fatores associados em idosos de Quixadá, Ceará. Rev Bras Epidemiol 2012;15(2):386-95. realizado com 384 idosos residentes na área urbana de Quixadá, cidade igualmente localizada na região central do Estado do Ceará, que também reportou a predominância do sexo feminino (64,3%), idade entre 60 e 69 anos (41,0%), casados (56,0%), com ensino fundamental incompleto (54,4%), sem atividade remunerada (84,1%) e com renda até um salário mínimo (55,1%). Considerando a localidade das cidades, o tamanho das populações e das amostras, pode-se supor certa uniformidade nas demais cidades que compõem a região do Sertão Central do Ceará.

Buscando-se fazer um comparativo com as demais regiões do país, observou-se que o estudo2121. Salvador EP, Reis RS, Florindo AA. A prática de caminhada como forma de deslocamento e sua associação com a percepção do ambiente em idosos. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2012;14(3):197-205. realizado no distrito de Ermelino Matarazzo, localizado na Zona Leste do Estado de São Paulo, com 385 idosos apresentou maioria do sexo feminino (60,5%), com idade entre 60 e 74 anos (57,1%), de cor branca (55,5%), solteira, divorciada ou viúva (54,2%), não exercendo nenhuma função remunerada (78,4%) e com ensino fundamental incompleto (47,6%). Já no estudo1717. Giehl MWC, Schneider IJC, Corseuil HX, Benedetti TRB, D'Orsi E. Atividade física e percepção do ambiente em idosos: estudo populacional em Florianópolis. Rev Saúde Pública 2012;46(3):516-25. realizado com 1.705 idosos de Florianópolis-SC, a maioria era mulher (63,9%), de cor branca (86,0%), casada ou com companheiro (58,8%), com idade entre 60 e 69 anos (51,1%), com baixa escolaridade (40,0%) e valores de renda com até um salário mínimo (25,2%) e de um a dois salários mínimos (25,0%).

Pode-se constatar que há semelhanças entre algumas variáveis, mas nem todos os dados corroboraram o presente estudo. Dentre as semelhanças encontradas entre os estudos nos Estados do Ceará1616. Silva GDOB, Gondim APS, Monteiro MP, Frotal MA, Meseses ALL. Uso de medicamentos contínuos e fatores associados em idosos de Quixadá, Ceará. Rev Bras Epidemiol 2012;15(2):386-95. e São Paulo,2121. Salvador EP, Reis RS, Florindo AA. A prática de caminhada como forma de deslocamento e sua associação com a percepção do ambiente em idosos. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2012;14(3):197-205. ressalta-se a baixa instrução e renda, apesar de os Estados possuírem características diferenciadas. Já em Santa Catarina,1717. Giehl MWC, Schneider IJC, Corseuil HX, Benedetti TRB, D'Orsi E. Atividade física e percepção do ambiente em idosos: estudo populacional em Florianópolis. Rev Saúde Pública 2012;46(3):516-25. a baixa escolaridade também foi evidenciada, porém a renda reportada pelos idosos foi levemente mais elevada.

O Sertão Nordestino, comparado a outras regiões do Brasil, é marcado por desigualdades em seu desenvolvimento, onde se observa ainda evidentes contradições. Suas chuvas irregulares e secas intermitentes são fatores que exercem grande influência nas dimensões sociais, políticas e econômicas.2222. Morrison CEF. A seca, o semi-árido e o pequeno agricultor em Canindé, Ceará. In: Taddei R, Gamboggi AL, organizadores. Depois que a chuva não veio: respostas sociais às secas no Nordeste, na Amazônia e no Sul do Brasil. Fortaleza: FUNCEME/CIFAS; 2010. p.137-175. Abrangendo grande porção do nordeste brasileiro, o Sertão do Ceará enfrenta ainda as transições demográficas e epidemiológicas. Nessa região, a principal causa de morte na população em geral são as doenças cardiovasculares, principalmente no sexo masculino, em que ocorre um aumento crescente nas doenças cerebrovasculares.1919. Santos JP, Paes NA. Envelhecimento demográfico e fatores explicativos da mortalidade dos homens idosos da região Nordeste do Brasil [Internet]. In: 29º Congreso de La Asociación Latinoamericana de Sociologia; 2013; Santiago. Santiago: ALAS; 2013 [acesso em 20 jan 2014]. Disponível em: http://actacientifica.servicioit.cl/biblioteca/gt/GT9/GT9_PereiraJAntunesN.pdf
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Algumas especificidades da cidade de Canindé-CE, onde o presente estudo foi realizado, é que essa tem o turismo religioso como uma das principais fontes de renda dos setores urbanos, além de possuir uma das maiores concentrações de assentamentos de reforma agrária do Brasil.2323. Rondon M, Brum PC. Exercício físico como tratamento não farmacológico da hipertensão arterial. Rev Bras Hipertens 2003;10(2):134-9. Tais aspectos exercem influências nas características sociais, econômicas e ambientais, fatores que podem refletir na situação de saúde e QV da população. Por exemplo, o fato de Canindé-CE ser um centro religioso importante na região auxilia a compreensão da influência da espiritualidade na QV encontrada neste estudo; da mesma forma com os assentamentos, que ajudam na explicação da baixa escolaridade.

Como a saúde e a QV são constructos complexos, amplos e de difícil mensuração, reconhece-se aqui que a apresentação de alguns aspectos são capazes apenas de dar indícios de como está a situação de saúde e QV dos indivíduos, e não sua "classificação" propriamente dita. Assim, o presente estudo considerou a existência de doenças/comorbidades, a frequência de consultas e/ou internações recentes, o acesso ao sistema de saúde e a percepção de saúde, da QV e da saúde comparada aos pares como indicadores da situação de saúde e QV dessa população.

A presença de determinadas doenças é fator contribuinte para uma maior fragilização do idoso, podendo interferir negativamente na sua QV.2424. De Araújo PL, Galato D. Risco de fragilização e uso de medicamentos em idosos residentes em uma localidade do sul de Santa Catarina. Rev Bras Geriatr Gerontol 2012;15(1):119-26. Nos idosos estudados, a hipertensão apresentou a maior prevalência, especialmente entre aqueles com idade mais avançada, seguida por elevadas prevalências de diabetes, osteoporose, ansiedade e demais doenças cardiovasculares.

Entre os idosos de outra cidade do Sertão do Ceará, Quixadá, as morbidades mais frequentes foram a hipertensão, o diabetes e as dislipidemias.1616. Silva GDOB, Gondim APS, Monteiro MP, Frotal MA, Meseses ALL. Uso de medicamentos contínuos e fatores associados em idosos de Quixadá, Ceará. Rev Bras Epidemiol 2012;15(2):386-95. Entre os idosos de uma cidade de São Paulo, Campinas, foram hipertensão, problemas de circulação e problemas osteocarticulares.1818. De Oliveira MA, Francisco PMSB, Costa KS, Barros MBA. Automedicação em idosos residentes em Campinas, São Paulo, Brasil: prevalência e fatores associados. Cad Saúde Pública 2012;28(2):335-45 Uma pesquisa25 25. Virtuoso JF, Mazo GZ, Menezes EC, Cardoso AS, Dias RG, Balbé GP. Perfil de morbidade referida e padrão de acesso a serviços de saúde por idosos praticantes de atividade física. Ciênc Saúde Coletiva 2012;17(1):23-31.feita com idosos de Santa Catarina constatou que as doenças mais prevalentes foram hipertensão, doenças osteoarticulares e hipercolesterolemia, tendo destaque as doenças cardíacas e diabetes no grupo masculino.

Verifica-se assim que as DCNTs representam as principais patologias entre idosos nas diferentes regiões do Brasil, se desenvolvendo inclusive nas regiões do Sertão, historicamente menos desenvolvidas que o Centro-Sul do país, e que enfrentam ainda problemas como a fome e as doenças transmissíveis. Dentre as DCNTs, tem-se que as doenças cardiovasculares são a principal causa de morte e geram os maiores gastos com internações no sistema de saúde brasileiro, alcançando especialmente adultos de meia idade e idosos.33. Schmidt MI, Ducan BB, Silva GA, Menezes AM, Monteiro CA, Barreto SM. Doenças crônicas não transmissíveis no Brasil: carga e desafios atuais. Lancet [Internet] 2011 [acesso em 15 fev 2014]:61-74. Disponível em http://download.thelancet.com/flatcontentassets/pdfs/brazil/brazilpor4.pdf
http://download.thelancet.com/flatconten...

Tendo a maioria dos idosos pesquisados apontado o SUS como sistema de saúde mais utilizado, grande parte deles afirmou ter realizado mais de um procedimento de consulta/internação no último ano, com maior prevalência entre o sexo feminino e os idosos mais velhos, podendo indicar o grau de fragilização e/ou os indicativos de cuidados curativos/preventivos nesses grupos.

A literatura documenta uma considerável invisibilidade masculina nos serviços de atenção primária à saúde, apontando a possível ausência de investimentos necessários para a organização do serviço em termos de gênero, havendo assim pouca oferta de serviços especializados e uma compreensão limitada acerca dos fatores simbólicos e culturais que envolvem o universo masculino.2626. Gomes R, Moreira MCN, Nascimento EF, Rebello LEFS, Couto MT, Schraiber LB. Os homens não vem! Ausência/invisibilidade masculina na atenção primária. Ciênc Saúde Coletiva [Internet> 2011 [acesso em 15 jan 2014];16(1):983-92.

A população idosa masculina também apresenta alta prevalência de comportamentos considerados prejudiciais à saúde, como o tabagismo, alcoolismo e má alimentação, que afetam a interação social e comprometem a qualidade de vida, indicando a necessidade de ações de saúde e políticas de prevenção e intervenção. 2727. Senger AEV, Ely LS, Gandolfi T, Schneider RH, Gomes I, Carli GA. Alcoolismo e tabagismo em idosos: relação com ingestão alimentar e aspectos socioeconômicos. Rev Bras Geriatr Gerontol 2011;14(4):713-9.

Um estudo24 24. De Araújo PL, Galato D. Risco de fragilização e uso de medicamentos em idosos residentes em uma localidade do sul de Santa Catarina. Rev Bras Geriatr Gerontol 2012;15(1):119-26.realizado em Santa Catarina também reportou que a maioria dos idosos (37,7%) informou de duas a três consultas médicas e (81,0%) nenhuma hospitalização nos últimos 12 meses. Os autores encontraram que a maior fragilização (repetidas internações hospitalares) esteve associada à presença de diversos problemas de saúde, polifarmácia e uso de antibióticos no último mês. Essa constatação corrobora a correlação encontrada entre o número de consultas/internações e a QV, contribuindo para a compreensão da influência dessa variável nos idosos do presente estudo.

É possível ainda que as associações encontradas entre a QV e determinadas doenças neste trabalho tenham se dado em função da quantidade e uso contínuo de medicamentos necessários para o seu tratamento e seus efeitos colaterais, juntamente com os próprios agravos decorrentes dessas doenças. Nesse aspecto, destaca-se que, além da utilização de fármacos, existem outras medidas recomendadas para o auxílio no tratamento de DCNT, tais como atividade física e alimentação, que podem contribuir para uma melhora na QV.2323. Rondon M, Brum PC. Exercício físico como tratamento não farmacológico da hipertensão arterial. Rev Bras Hipertens 2003;10(2):134-9.

Por exemplo, mesmo a hipertensão arterial sendo considerada uma síndrome poligênica com influência genética, recentes estudos de metanálises têm apontado a atividade física regular como um agente de redução dos níveis pressóricos, ocasionando, inclusive, a redução da dosagem de medicamentos anti-hipertensivos em alguns casos.2323. Rondon M, Brum PC. Exercício físico como tratamento não farmacológico da hipertensão arterial. Rev Bras Hipertens 2003;10(2):134-9.

Quanto à QV global, a média encontrada no presente estudo está abaixo da média encontrada em idosos de Porto Alegre-RS,2828. Vitorino LM, Paskulin LMG, Vianna LAC. Qualidade de vida de idosos da comunidade e de instituições de longa permanência: estudo comparativo. Rev Latinoam Enferm 2013;21(n. esp):3-11. tanto para os idosos institucionalizados (69,83), como os da comunidade em geral (69,81). Esses dados reforçam a importância de se buscar uma melhoria na QV dos idosos entrevistados.

Analisando a QV a partir de seus domínios, a média dos escores apresentou o domínio psicológico como o fator de maior e o meio ambiente, de menor influência na pontuação da QV global. Nesse sentido, é importante compreender os fatores ambientais não somente a partir das estruturas naturais e construídas, mas também da localização geográfica, segurança, facilidades de acesso, estabelecimentos e tempo de deslocamento até eles, equipamentos, sua manutenção e aspectos de socialização; aspectos que exercem grande influência na QV e no estilo de vida coletivo e individual.1717. Giehl MWC, Schneider IJC, Corseuil HX, Benedetti TRB, D'Orsi E. Atividade física e percepção do ambiente em idosos: estudo populacional em Florianópolis. Rev Saúde Pública 2012;46(3):516-25.

É possível afirmar que, de modo geral, alguns fatores têm ameaçado a saúde e QV das populações urbanas do país, tais como desemprego, poluição do ar, depredação do meio ambiente, transporte urbano precário, entre outros.2929. Westphal MF. O modelo de atenção na perspectiva de saúde integral: a promoção de saúde e a estratégia de "municípios saudáveis". Sanare 2000;2(3):1-6. No sentido de reverter essa situação, a autora2929. Westphal MF. O modelo de atenção na perspectiva de saúde integral: a promoção de saúde e a estratégia de "municípios saudáveis". Sanare 2000;2(3):1-6. aponta a estratégia dos "municípios saudáveis" como efetiva, juntamente com uma racionalização de recursos, desenvolvimento de projetos numa perspectiva intersetorial, envolvendo diferentes órgãos do governo e também os vários setores da sociedade local.

Um estudo que comparou idosos que vivem sozinhos com os que vivem com a família e com os institucionalizados3030. Dias DSG, Carvalho CS, De Araújo CV. Comparação da percepção subjetiva de qualidade de vida e bem-estar de idosos que vivem sozinhos, com a família e institucionalizados. Rev Bras Geriatr Gerontol 2013;16(1):127-38. mostrou que todos apresentaram níveis regulares de QV. No entanto, o domíniofísico apresentou diferenças estatisticamente significativas entre idosos que vivem com a família comparado aos institucionalizados; esse último grupo apresentou ainda maior grau de satisfação.

Em outro estudo31 31. Maués CR, Paschoal SMP, Jaluul O, França CC, Jacob Filho W. Avaliação da Qualidade de vida: comparação entre idosos jovens e muito idosos. Rev Bras Clín Med 2010;5(8):405-10.envolvendo grupos de idosos jovens (60-70 anos) e muito idosos (85 anos ou mais), observou-se que a QV nos dois grupos foi considerada boa, dando indícios de que ela não tende a diminuir com o avanço da idade. Todavia, os resultados apresentados no presente estudo mostram que idosos de 60 a 69 anos de idade apresentaram uma melhor QV que os de 70 anos ou mais.

Ao analisar mais especificamente, pode-se identificar a influência de determinadas facetas na QV geral dos idosos pesquisados. As que apresentaram valores mais elevados foram os sentimentos negativos, relações pessoais, suporte e apoio social, autoestima e espiritualidade/religião/crenças pessoais. As com valores menores foram a recreação e lazer, recursos financeiros e atividade sexual.

Sabe-se que o lazer no trabalho social com idosos é responsável por gerar uma melhor autoestima, socialização, formas de convivência e aprendizagem voluntária, o que pode favorecer a QV. No entanto, um equívoco frequente é pensá-lo de forma autônoma e desvinculada dos condicionamentos sociais e das relações de produção, tendo, assim, o indivíduo como seu único responsável.3232. Teixeira SM. Lazer e tempo livre na "terceira idade" potencialidades e limites no trabalho social com idosos. Rev Kairós 2010;10(2):169-88.

Quanto aos recursos financeiros, outro estudo3333. Neri MC, Soares WL. Estimado o impacto da renda na saúde através de programas de transferência de renda aos idosos de baixa renda no Brasil. Cad Saúde Pública 2007;23(8):1845-56. também aponta a forte relação das questões econômicas com a QV e a saúde na terceira idade, indicando que grande parte dos idosos com nível socioeconômico baixo apresenta prevalência de DCNT, além de um menor acesso a bens e serviços.

Tratando-se da saúde sexual dos idosos, a maioria deles atribui grande importância à sexualidade, mesmo esta se manifestando na forma de carinho, toques e companheirismo. Entretanto, ainda existem preconceitos por parte da sociedade e dos próprios profissionais da saúde, o que repercute na escassez de estudos que abordem essa temática.3434. Bastos CC, Closs VE, Pereira AMVB, Batista C, Idalêncio FA, Carli GA, et al. Importância atribuída ao sexo por idosos do município de Porto Alegre e associação com a autopercepção de saúde e o sentimento de felicidade. Rev Bras Geriatr Gerontol 2012;15(1):87-95.

Em suma, diversos estudos88. Barbote E, Guillemin F, Chau N, Lorhandicap Group. Prevalence of impairments, disabilities, handicaps and quality of life in the general population: a review of recent literature. Bull World Health Organ 2011;79(11):1047-55.

9. Ferreira EEDBA. Gestão de custos com medicamentos, hidroginástica e qualidade de vida em pessoas idosas de Santarém [Dissertação]. Coimbra: Universidade de Coimbra, Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física; 2011.

10. Gomes Neto M, De Castro MF. Estudo comparativo da independência funcional e qualidade de vida entre idosos ativos e sedentários. Rev Bras Med Esporte. 2012;18(4):234-7.
-1111. Silva RS, Silva I, Silva RA, Souza L, Tomasi E. Atividade física e qualidade de vida. Ciênc Saúde Coletiva 2010;15(1):115-20. apontam a influência de aspectos individuais, sociais e ambientais na saúde e QV, tais como nível de atividade física, parâmetros antropométricos, uso de medicamentos, capacidade funcional, enfraquecimento, deficiência, estado de saúde, relações familiares, satisfação no trabalho, lazer, disposição, longevidade, prazer e espiritualidade. O conhecimento dos níveis de saúde juntamente com a QV na terceira idade é relevante para compreender a realidade dessa população naturalmente mais vulnerável, podendo ajudar na minimização das demandas pelos serviços de saúde e auxiliando na definição de estratégias para melhorar esses aspectos.3535. Lima MJB, Portela MC. Elaboração e avaliação da confiabilidade de um instrumento para medição da qualidade de vida relacionada à saúde de idosos independentes. Cad Saúde Pública 2010;26(8):1651-62.

É importante destacar que, apesar de o presente estudo ser representativo da população estudada e relevante em termos de registro dos indicadores das condições de saúde e vida dos idosos que habitam o Sertão Central do Nordeste, uma região historicamente menos favorecida, ele apresenta algumas limitações. Dentre essas estão o delineamento transversal, que impossibilita o estabelecimento de uma relação de causa e efeito entre a situação de saúde e a QV, e a utilização de informações reportadas pelos idosos, sem a aferição das variáveis ou diagnósticos das patologias.

CONCLUSÃO

O presente estudo identificou um perfil de idosos similar ao encontrado em outras cidades do Sertão Central do Ceará e possibilitou explicitar algumas diferenças regionais nessa população. Corroborando outros estudos, identificou-se que as doenças/comorbidades mais prevalentes pertencem ao grupo das doenças crônicas não transmissíveis, e que essas, assim como o maior número de consultas/internações, acometem aqueles com idade mais avançada.

A maior fragilização desses idosos, sua percepção de pior qualidade de vida e o processo natural de redução da vitalidade apresentaram relação com o domínio demeio ambiente. Esse resultado indica a relevância de se pensar ambientes que proporcionem não somente longevidade, mas também que sejam promotores da saúde e da qualidade de vida nessa população. Além disso, diferenças entre os sexos mostram a necessidade de mais estudos que auxiliem a compreensão do processo de envelhecimento e adoecimento vivenciado pelo sexo masculino.

Ao observar que as facetas que influenciaram positivamente a qualidade de vida foram as relações pessoais, o suporte e apoio social, a autoestima e a espiritualidade, e as que afetaram negativamente foram a saúde sexual e a emocional, considera-se que a sociedade e os serviços, especialmente os de saúde, precisam estar atentos para não negligenciar a afetividade e o sentido da vida nessa população, sendo capaz de efetivamente desenvolver um cuidado integral à saúde. Diante do exposto, evidencia-se a importância de que ações de promoção à saúde sejam desenvolvidas visando modificar os determinantes e condicionantes do processo de adoecimento e de percepção negativa da qualidade de vida que alcançam os idosos do Sertão Central do Ceará.

AGRADECIMENTOS

Aos alunos e professores do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará-IFCE, Campus Canindé, que apoiaram e contribuíram na coleta de dados para elaboração deste trabalho.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2015

Histórico

  • Recebido
    24 Jun 2014
  • Revisado
    06 Abr 2015
  • Aceito
    18 Ago 2015
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