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Influência da escolaridade de idosas nos ganhos de função executiva após treino de dupla tarefa

Resumo

Objetivo

Investigar a influência da escolaridade nos ganhos de função executiva após o treinamento com dupla tarefa (DT).

Método

Estudo exploratório realizado com 31 idosas, com escolaridade ≥3 anos e sem alterações das funções cognitivas rastreadas pelo Miniexame do Estado Mental (MEEM). As participantes foram distribuídas em dois grupos a partir do critério escolaridade, sendo o Grupo 1 com escolaridade de três a sete anos (n=17) e o Grupo 2 com escolaridade igual e superior a oito anos (n=14). Foram avaliadas as funções executivas antes e após o treinamento através dos testes Stroop, Exame Cognitivo de Addenbrooke - Revisado (ACE-R) e Trilhas B. O protocolo de intervenção consistiu em três sessões semanais, duração de 50 minutos cada, com a realização de atividades de DT cognitiva e motora, associadas à caminhada, por 12 semanas.

Resultados

A ANOVA indicou que o treinamento de DT melhorou significativamente o desempenho nos testes Stroop (F=5,95; p=0,02) e ACE-R (F=18,33; p<0,0001), independentemente da escolaridade. Foi verificado efeito do grupo nos testes ACE-R (F=14,65; p<0,001) e Trilhas B (F=18,74; p<0,001). Em nenhum dos testes analisados, foi observado efeito da interação grupo x tempo (0,04<F<2,14; 0,15<p<0,95).

Conclusão

O treinamento de DT pode melhorar significativamente a função executiva de idosas, independente do nível de escolaridade, podendo ser utilizado na prática clínica como uma proposta de intervenção, visando o ganho de função executiva.

Palavras-Chave:
Função Executiva; Saúde do Idoso; Escolaridade; Treinamento de dupla tarefa

Abstract

Objective

Investigate the influence of education levels on gains in executive function after dual-task (DT) training.

Method

Exploratory study carried-out with 31 old women, who had ≥3 years of education and without cognitive deficits, as screened by the Mini-Mental State (MMS). The participants were distributed in two groups: group 1: 3 to 7 years of education (n=17) and group 2: ≥8 years of education (n=14). Measures of executive function (Stroop, Addenbrooke’s Cognitive Examination - Revised (ACE-R), and Trail Making Test – B (B-Trails)) were obtained before and after training. The intervention protocol consisted of three weekly sessions of 50 minutes each and included cognitive and motor DT training, associated with walking, over 12 weeks.

Results

ANOVA indicates that DT training improved the performance of Stroop (F=5.95; p=0.02) and ACE-R (F=18.33; p<0.0001) tests, regardless of the education level. The effect of the ACE-R test group (F=14.65; p<0.001) and B-Trails (F=18.74; p<0.001) was verified. In none of the investigated tests, the interaction effects between groups and time (0.04<F<2.14; 0.15<p<0.95) was observed.

Conclusion

DT training has the potential to generate effects and can positively improve the executive function of older women, regardless of educational level and may be used within clinical practice, aiming at improving executive function.

Keywords
Dual task training; Executive Function; Health of the Elderly; Educational Status

INTRODUÇÃO

O processo de envelhecimento ocorre de maneira dinâmica, irreversível e natural, podendo gerar perdas cognitivas, motoras e funcionais. A forma como o indivíduo irá envelhecer e passar por esse processo de mudanças depende das capacidades básicas adquiridas durante os anos e também do meio onde está inserido11 Sobral M, Pestana MH, Paúl C. Cognitive reserve and the severity of Alzheimer’s disease. Arq Neuropsiquiatr. 2015;73(6):480-86., relacionando assim, com a reserva cognitiva adquirida ao longo da vida. Tal reserva consiste na junção da inteligência inata com os aspectos adquiridos através dos processos educacional e ocupacional, gerando redes cognitivas funcionalmente mais eficientes22 Stern Y, Barnes CA, Grady C, Jones RN, Raz N. Brain reserve, cognitive reserve, compensation, and maintenance: operationalization, validity, and mechanisms of cognitive resilience. Neurobiol Aging. 2019;83:124-9..

O nível educacional pode relacionar-se com o nível do declínio cognitivo considerado normal a partir do processo de envelhecimento, de forma que quanto maior a escolaridade do indivíduo, mais lento será o envelhecimento cognitivo, devido a sua reserva cognitiva maior33 Stern Y. What is cognitive reserve?: Theory and research application of the reserve concept. J Int Neuropsychol So.c 2002;8(3):448-60.. Portanto, a reserva cognitiva parece exercer função neuroprotetora aos declínios cognitivos relacionados à idade33 Stern Y. What is cognitive reserve?: Theory and research application of the reserve concept. J Int Neuropsychol So.c 2002;8(3):448-60.. Além do nível educacional, indivíduos com coeficiente de inteligência pré-mórbida, atividade ocupacional mais desafiadora e atividades de lazer na idade avançada apresentam menor risco de desenvolver demência e podem ainda mitigar o declínio cognitivo relacionado ao aumento da idade22 Stern Y, Barnes CA, Grady C, Jones RN, Raz N. Brain reserve, cognitive reserve, compensation, and maintenance: operationalization, validity, and mechanisms of cognitive resilience. Neurobiol Aging. 2019;83:124-9..

As atividades de memória espacial e de trabalho, atenção visual sustentada, aprendizagem e memória episódica, tempo de reação, e velocidade de processamento, que são mais afetadas no envelhecimento, podem ser estimuladas e assim protegidas pela maior escolaridade, tornando mais efetivo o processamento das funções executivas22 Stern Y, Barnes CA, Grady C, Jones RN, Raz N. Brain reserve, cognitive reserve, compensation, and maintenance: operationalization, validity, and mechanisms of cognitive resilience. Neurobiol Aging. 2019;83:124-9.,33 Stern Y. What is cognitive reserve?: Theory and research application of the reserve concept. J Int Neuropsychol So.c 2002;8(3):448-60.. O nível de escolaridade menor pode ser associado com o menor desempenho em tarefas de atenção visual sustentada, aprendizado, memória episódica, tempo de reação e memória de trabalho demonstrado em um estudo com idosos brasileiros44 Bento-Torres NV, Bento-Torres J, Tomás AM. Influence of schooling and age on cognitive performance in healthy older adults. Braz J Med Biol Res 2017;50(4):1-9.. Diante disso, espera-se que indivíduos com maior escolaridade obtenham pontuações melhores nos testes em relação aos com menor escolaridade.

As funções executivas abrangem uma série de processos cognitivos, como planejamento, automonitorização, flexibilidade, controle inibitório e sequenciamento das ações, favorecendo uma boa execução das atividades de vida diária (AVD), sejam elas simples ou complexas55 Lopes RMF, Bastos AS, Argimon IIL. Treino das funções executivas em Idosos: uma revisão sistemática da literatura. Cuad Neuropsicol. 2017;11(1):11-29.. As funções executivas são formadas por funções cognitivas de maior complexidade que estão diretamente relacionadas ao comportamento dirigido a metas e a solução de problemas novos, além do planejamento em escala temporal, análise do custo e benefício no processo de tomada de decisão e a autorregulação comportamental66 de Paula JJ, da Silva KKM, Fuentes D,Malloy-Diniz LF. Funções executivas e envelhecimento. In: Malloy-Diniz LF, Fuentes D, Consenza R. Neuropsicologia do envelhecimento: uma abordagem multidimensional. Porto Alegre: Artmed; 2013. p. 226-39.. Ademais, dependem das conexões existentes entre o córtex pré-frontal e estruturas subcorticais, sendo que os principais circuitos77 Cummings JL. Frontal-subcortical circuits and human behavior. Arch Neurol. 1993;50(8):873-80. envolvidos são: o córtex pré-frontal dorsolateral, responsável pelo planejamento, solução de problemas, autorregulação, flexibilidade cognitiva e memória operacional; o córtex cingulado anterior, responsável pelos processos atencionais controlados, seleção de respostas e motivação; e o córtex orbito frontal que está diretamente interligado aos comportamentos sociais77 Cummings JL. Frontal-subcortical circuits and human behavior. Arch Neurol. 1993;50(8):873-80.,88 Bonelli RM., Cummings JL. Frontal-subcortical circuitry and behavior. Dialogues Clinl Neurosci. 2007;9(2):141-51.. O processo de envelhecimento cognitivo pode gerar um declínio progressivo na eficiência desses circuitos e, consequentemente, na capacidade de realizar tarefas relacionadas às funções executivas, ocasionando, em alguns casos, comprometimento funcional99 Watson NL, Rosano C, Boudreau RM, Simonsick EM, Ferrucci L, Sutton-Tyrrell K, et al. “Executive function, memory, and gait speed decline in well-functioning older adults.” J Gerontol Series A Biol Sci Med Sci. 2010:65(10):1093-1100..

O estilo de vida sedentário em conjunto com a inatividade cognitiva tem sido associado com o maior risco de declínio cognitivo relacionado ao envelhecimento1010 de Oliveira TC, Soares FC, de Macedo LD, Diniz DL, Bento-Torres NV, Picanço-Diniz CW. Beneficial effects of multisensory and cognitive stimulation on age-related cognitive decline in long-term-care institutions. Clin Interv Aging. 2014;9:309-20.. Diante disso, a atividade física regular e estilo de vida ativo são considerados neuroprotetores e importantes para a redução ou maior lentidão do declínio cognitivo, uma vez que geram alterações bioquímicas e estruturais no cérebro através da neuroplasticidade cerebral1111 El-Sayes J, Harasym D, Turco CV, Locke MB, Nelson AJ. Exercise-Induced Neuroplasticity: a Mechanistic Model and Prospects for Promoting Plasticity. Neuroscientist. 2019;25(1):65-85..

Dentre as possibilidades de intervenção a serem adotadas na prática clínica, o treino de Dupla Tarefa (DT), que consiste na realização simultânea de duas tarefas podendo ser uma delas cognitiva e a outra motora ou duas tarefas motoras1212 Lauenroth A, Ioannidis AE, Teichmann B. Influence of combined physical and cognitive training on cognition: a systematic review. BMC Geriatr. 2016;16:1-10., pode ser uma abordagem interessante e benéfica para os idosos1313 Gobbo S, Bergamin M, Sieverdes JC, Ermolao A, Zaccaria M. Effects of exercise on dual-task ability and balance in older adults: a systematic review. Arch Gerontol Geriatr. 2014;58(2):177-87.. Estudos com treinamento utilizando a DT têm demonstrado relação com os mecanismos para melhoria de características da marcha que podem levar às quedas, tais como a variabilidade da marcha em atividades com atenção dividida e equilíbrio, e na prevenção de quedas99 Watson NL, Rosano C, Boudreau RM, Simonsick EM, Ferrucci L, Sutton-Tyrrell K, et al. “Executive function, memory, and gait speed decline in well-functioning older adults.” J Gerontol Series A Biol Sci Med Sci. 2010:65(10):1093-1100.,1313 Gobbo S, Bergamin M, Sieverdes JC, Ermolao A, Zaccaria M. Effects of exercise on dual-task ability and balance in older adults: a systematic review. Arch Gerontol Geriatr. 2014;58(2):177-87.. Além disso, há estudos que mostram a influência desse treinamento em casos relacionados com declínio cognitivo leve, quadros de demência moderada, quadros neurológicos como Parkinson e Acidente Vascular Encefálico, osteoartrite e depressão1313 Gobbo S, Bergamin M, Sieverdes JC, Ermolao A, Zaccaria M. Effects of exercise on dual-task ability and balance in older adults: a systematic review. Arch Gerontol Geriatr. 2014;58(2):177-87.

14 Fritz NE, Cheek FM, Nichols-Larsen DS. Motor-Cognitive Dual-Task Training in Persons With Neurologic Disorders: a Systematic Review. J Neurol Phys Ther. 2015;39(3):142-53.
-1515 Voss MW, Weng TB, Burzynska AZ, Wong CN, Cooke GE, Clark R, et al. Fitness, but not physical activity, is related to functional integrity of brain networks associated with aging. Neuroimage. 2016;131:113-25.. A DT é normalmente utilizada na avaliação e no treinamento de funções executivas e de marcha na população idosa1313 Gobbo S, Bergamin M, Sieverdes JC, Ermolao A, Zaccaria M. Effects of exercise on dual-task ability and balance in older adults: a systematic review. Arch Gerontol Geriatr. 2014;58(2):177-87.. No entanto, a literatura ainda é escassa ao relacionar o treino de DT com a função executiva em idosas. O treinamento cognitivo gera efeitos positivos em questões relacionadas à memória e em medidas de qualidade de vida, sendo transferível e benéfica para as AVD1616 Jean L, Bergeron ME, Thivierge S, Simard M. Cognitive intervention programs for individuals with mild cognitive impairment: systematic review of the literature. Am J Geriatr Psychiatry. 2010;18(4):281-96.. A revisão sistemática de Kahya et al.1717 Kahya M, Moon S, Ranchet M, Vukas RR, Lyons KE, Pahwa R, et al. Brain activity during dual task gait and balance in aging and age-related neurodegenerative conditions: a systematic review. Exp Gerontol. 2019;128:e110756. apoia o fato de que as alterações neurodegenerativas decorrentes do envelhecimento normal ou aqueles com doença, estão associadas a mudanças na ativação da rede neural que resultam em aumento da atividade cerebral especificamente no córtex pré-frontal. Essas alterações de ativação foram demonstradas em atividades de DT e equilíbrio1717 Kahya M, Moon S, Ranchet M, Vukas RR, Lyons KE, Pahwa R, et al. Brain activity during dual task gait and balance in aging and age-related neurodegenerative conditions: a systematic review. Exp Gerontol. 2019;128:e110756.. Esse fato demonstra que pode ser por essa via de estimulação, através da utilização da DT, a otimização das intervenções de reabilitação para casos de declínio cognitivo normal e patológico, juntamente com alterações da marcha e equilíbrio.

Diante do exposto, por meio deste estudo, buscou-se investigar a influência da escolaridade nos ganhos de função executiva após o treinamento com DT. A hipótese era que níveis distintos de escolaridade influenciassem nos ganhos de função executiva após uma intervenção utilizando um treinamento de DT. A observação da função executiva em idosas, nos dois níveis de escolaridade analisados (alta e baixa), pode contribuir para a avaliação se em ambos os grupos seria identificado um ganho nessas funções e se algum deles apresentaria melhores resultados após o treinamento de DT. Isso implicaria na utilização mais adequada dessa intervenção, identificando o público que se beneficiaria desse treinamento, além de apresentar a validade da DT na melhora das funções executivas, minimizando o declínio cognitivo relacionado ao envelhecimento.

MÉTODO

Trata-se de um estudo exploratório de dados secundários de um ensaio clínico aleatorizado prospectivo, intitulado como Efeitos do treinamento aeróbico e de dupla tarefa na mobilidade, marcha, equilíbrio e cognição em idosas da comunidade: um ensaio clínico controlado 1818 Gomes GC. Efeitos do treinamento aeróbico e de dupla tarefa na mobilidade, marcha, equilíbrio e cognição em idosas da comunidade: um ensaio clínico controlado [Tese]. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, Instituto de Ciências Biológicas; 2014.. Esse, foi aprovado, em outubro de 2011, pelo Comitê de Ética e Pesquisa da UFMG (ETIC0448.203.000-11), e protocolo registrado no National Clinical Trials (número de registro: NCT02185157; disponível em: www.clinicaltrials.gov). Todas as participantes da pesquisa leram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A pesquisa foi conduzida no Departamento de Fisioterapia da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional (EEFFTO) da Universidade Federal de Minas Gerais, no período entre outubro de 2011 e outubro de 2013.

Os critérios de inclusão do estudo foram idosas (sexo feminino), com idade entre 69 e 79 anos, com o intuito de abordar indivíduos com maior probabilidade de neurodegeneração fisiológica, escolaridade igual ou superior a três anos e sem alterações das funções cognitivas rastreadas pelo Miniexame do Estado Mental (MEEM), considerando as pontuações: ≥23 para idosas com 3 anos de escolaridade, ≥25 para o estrato educacional de 4 a 7 anos e ≥26 para as participantes com 8 anos ou mais de estudo1919 Caramelli P, Herrera Jr E, Nitrini R. Education-adjusted normative values for the Mini-Mental State Examination (MMSE) in a large elderly cohort. Dement Neuropsychol. 2007;1:1-8..

A amostra foi composta por 31 idosas, integrantes do grupo intervenção do ensaio clínico que deu origem a este estudo, recrutadas da comunidade através de anúncios nos transportes públicos e de listas de participantes em trabalhos prévios realizados no Departamento de Fisioterapia. Considerando que este estudo trata-se de uma análise secundária, foi realizada uma análise de poder atingido para cada uma das análises apresentadas. Optou-se pela não inclusão de participantes do sexo masculino, uma vez que esses tendem a apresentar menor interesse e adesão a programas de atividade em grupo. As participantes foram distribuídas em dois grupos a partir do critério escolaridade, sendo o grupo 1 com baixa escolaridade (3-7 anos; n=17), e o grupo 2 com alta escolaridade (≥8 anos; n=14). A faixa de corte escolhida para a escolaridade foi de oito anos a partir da média brasileira para essa faixa etária, segundo dados do IBGE em 20162020 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2018 [acesso 28 out. 2019]. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101629.pdf .
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Idosas que apresentaram acometimentos do sistema musculoesquelético, a ponto de interferir na execução de atividades físicas; alterações auditivas e visuais não corrigidas, que impedissem a identificação dos comandos; fatores que pudessem comprometer o funcionamento do sistema nervoso central, como administração de fármacos com ação no sistema nervoso central que interferem na memória e no desempenho motor, tais como benzodiazepínicos, hipnóticos e anticonvulsivantes, ou que foram diagnosticadas com doenças neurológicas crônico-degenerativas, foram excluídas do estudo.

Foram coletadas, pela equipe da fisioterapia e psicologia, características clínicas, demográficas e funcionais através de um questionário semiestruturado, com perguntas abertas, elaborado pelos autores, sendo observados aspectos sociais (idade em anos, endereço, escolaridade, estado civil, números de filhos, ocupação, renda, com quem mora), uso de medicamentos regulares nos últimos 3 meses, comorbidades presentes, realização de atividades físicas supervisionadas (qual tipo de atividade e quantas horas por semana), ocorrência de quedas nos últimos 6 meses (quantidade de quedas, necessidade de procurar um serviço de saúde e ser internada, ocorrência ou não de fraturas, além de incapacidade funcional após a queda), percepção subjetiva de memória (dificuldade para lembrar de fatos recentes), aspectos relacionados ao sono (faz uso de medicamento para dormir, acorda de madrugada e não dorme mais, permanece acordada maior parte da noite, demora para dormir, dorme mal à noite e se é necessário dormir durante o dia para se recuperar, nos casos de resposta positiva era questionado quantas horas de sono) e percepção subjetiva do atual estado se saúde (excelente, muito bom, bom, regular, muito ruim ou nenhuma das respostas anteriores).

Com o intuito de caracterizar a amostra também foram utilizados os instrumentos Falls Efficacy Scale – International (FES-I-BRASIL)2121 Camargos FF, Dias RC, Dias JM, Freire MT. Cross-cultural adaptation and evaluation of the psychometric properties of the Falls Efficacy Scale-International Among Elderly Brazilians (FES-I-BRAZIL). Rev Bras Fisioter. 2010;14(3):237-43., relacionado com a autoeficácia relacionada às quedas, sendo considerado o ponto de corte ≥23 pontos e a Escala de Depressão Geriátrica (GDS)2222 Paradela EM, Lourenço RA, Veras RP. Validação da escala de depressão geriátrica em um ambulatório geral. Rev Saúde Pública. 2005;39(6):918-23., para rastrear as alterações de humor na última semana, sendo o ponto de corte, para alterações de humor, igual ou superior a seis2222 Paradela EM, Lourenço RA, Veras RP. Validação da escala de depressão geriátrica em um ambulatório geral. Rev Saúde Pública. 2005;39(6):918-23.. As idosas foram avaliadas na linha de base (pré-intervenção) e entre os dias 1 e 7 após a 12° semana de intervenção (pós-intervenção). O intervalo de 12 semanas possibilitou que não ocorresse o efeito de aprendizado, como preconizado pela literatura2323 Portney LG, Watkins MP. Foundations of Clinical Research Applications to Practice. 3ª ed. [Local desconhecido]: F. A. Davis Company; 2015.. Os instrumentos utilizados no estudo para a identificação das funções executivas nas idosas foram o Stroop, o Exame Cognitivo de Addenbrooke - Revisado (ACE-R), e o teste de Trilhas B. Cada um desses testes, validados para a população idosa brasileira2424 Van der Elst W, Van Boxtel MP, Van Breukelen GJ, Jolles J. The Stroop color-word test: influence of age, sex, and education; and normative data for a large sample across the adult age range. Assessment. 2006;13(1):62-79.

25 Carvalho VA, Caramelli P. Brazilian adaptation of the Addenbrooke’s Cognitive Examination-Revised (ACE-R). Dement Neuropsychol. 2007;1(2):212-6.

26 Kortte KB, Horner MD, Windham WK. The trail making test, part B: cognitive flexibility or ability to maintain set? Appl Neuropsychol. 2002;9(2):106-9.
-2727 Batista JA, Giatti L, Barreto SM, Galery ARP, Passos VMA. Reliability of cognitive tests of ELSA-Brasil, the brazilian longitudinal study of adult health. Dement Neuropsychol. 2013;7(4):367-73., avaliam diferentes componentes da função executiva. Esses instrumentos foram aplicados de forma impressa e não foi realizada a familiarização dos testes. Cada avaliador ficou responsável por acompanhar uma idosa, realizando a entrega dos testes impressos, as orientações de como cada teste deveria ser realizado, cronometrando, também, o tempo total gasto para cada bloco dentro do teste e a precisão das respostas.

O teste Stroop avalia a função executiva através do controle inibitório e os processos de memória, além da fluência de leitura e nomeação de cores. As participantes foram orientadas a falarem, o mais rápido possível, as cores observadas, enquanto o avaliador cronometrava e avaliava as respostas, como corretas ou erradas. Esse instrumento, formado por três etapas, é composto por três cartões impressos que possuem 100 itens ordenados em cinco colunas. O primeiro cartão é denominado Palavra, e consiste na leitura das palavras vermelho, azul e verde escritas aleatoriamente. O segundo recebe a denominação Cor, devendo ser realizada a nomeação das cores das palavras. Já o terceiro é denominado Cor e Palavra e consiste em falar a cor que a palavra está impressa (cor da fonte)2424 Van der Elst W, Van Boxtel MP, Van Breukelen GJ, Jolles J. The Stroop color-word test: influence of age, sex, and education; and normative data for a large sample across the adult age range. Assessment. 2006;13(1):62-79.. O escore final é obtido a partir do tempo gasto para realizar cada fase do teste, aplicando-se a fórmula: Escore final = Tempo Cor e palavra - [(Tempo Palavra + Tempo Cor)/2]. Foi cronometrado o tempo total para cada fase do teste independentemente da acurácia da resposta. Entretanto, na ocorrência de respostas erradas as idosas eram solicitadas a reconsiderarem suas respostas até que fosse fornecida a resposta correta. Dessa forma, quanto menor o tempo gasto para realizar o teste, melhor o desempenho (e.g., respostas mais rápidas e/ou menor quantidade de erros)2424 Van der Elst W, Van Boxtel MP, Van Breukelen GJ, Jolles J. The Stroop color-word test: influence of age, sex, and education; and normative data for a large sample across the adult age range. Assessment. 2006;13(1):62-79..

O ACE-R é um instrumento de avaliação cognitiva global responsável por identificar as alterações no desempenho de funções executivas, relacionadas à memória, fluência verbal, orientação, atenção, habilidade visual-espacial e linguagem. O teste foi traduzido e adaptado para a população brasileira e podendo ser aplicado em um tempo médio de 15 minutos, juntamente com o MEEM2525 Carvalho VA, Caramelli P. Brazilian adaptation of the Addenbrooke’s Cognitive Examination-Revised (ACE-R). Dement Neuropsychol. 2007;1(2):212-6.. O escore total do ACE-R é de 100 pontos, sendo 30 pontos relacionados com o MEEM, 26 à memória, 14 à fluência verbal, 18 à atenção e orientação, 16 à habilidade visual-espacial e 26 à linguagem. Quanto maior o escore ao final do teste, melhor o desempenho nos domínios analisados2525 Carvalho VA, Caramelli P. Brazilian adaptation of the Addenbrooke’s Cognitive Examination-Revised (ACE-R). Dement Neuropsychol. 2007;1(2):212-6..

O teste de Trilhas B avalia os componentes de sequenciamento e controle inibitório, presentes na função executiva, uma vez que é necessária a alternância da sequência numérica e alfabética. Cada participante foi orientada, após o comando, a conectar os números de 1 a 12 e letras do A ao L em ordem crescente e alfabética de forma alternada, como 1A- 2B- 3C, enquanto o tempo era cronometrado pelo avaliador. Essa parte é considerada mais complexa e está relacionada mais diretamente com a função executiva e com a flexibilidade cognitiva2626 Kortte KB, Horner MD, Windham WK. The trail making test, part B: cognitive flexibility or ability to maintain set? Appl Neuropsychol. 2002;9(2):106-9.. O escore total é determinado a partir do tempo gasto para realizar o teste, sendo que quanto menor o tempo, melhor é o desempenho2727 Batista JA, Giatti L, Barreto SM, Galery ARP, Passos VMA. Reliability of cognitive tests of ELSA-Brasil, the brazilian longitudinal study of adult health. Dement Neuropsychol. 2013;7(4):367-73..

Foi elaborado um protocolo de intervenção composto por 18 sessões, com 15 exercícios cada, de DT cognitiva (motora-cognitiva) e 12 sessões, com 35 exercícios cada, de DT motora (motora-motora). O número de sessões foi elaborado na tentativa de minimizar o efeito do aprendizado dos exercícios, uma vez que ao longo do treinamento, 36 sessões, cada sessão de exercício motor-cognitivo só se repetiu uma vez e as sessões de atividades motora-motora se repetiram apenas duas vezes.

O protocolo com os exercícios de DT cognitiva foi desenvolvido com o objetivo de treinar as capacidades cognitivas como as memórias imediata, recente, episódica, espacial, semântica, além dos raciocínios matemático, lógico e encadeamento de ações. Sendo exemplos de atividades propostas: conte-me sobre o seu dia de ontem; andar dois passos para um lado e dois passos para o outro, dizendo nomes de pessoas; que número é formado com o número de meses que tem um ano mais os dias da semana mais o número de dias dos meses. Os examinadores tiveram a participação no processo de raciocínio e de resposta da tarefa cognitiva, demonstrando interesse e, se necessário, realizasse as devidas correções, forçando assim o raciocínio e a elaboração de respostas adequadas. Não era permitido parar para raciocinar, entender melhor as questões ou responder ao comando solicitado.

O protocolo da DT motora abordou exercícios de lateralidade, de raciocínio, de execução do ato motor, de memorização de atos consecutivos, de coordenação e de equilíbrio. Alguns instrumentos como bastões, bolas de borracha e de isopor, foram utilizados para que a participante realizasse exercícios com os membros superiores enquanto deambulavam. Sendo exemplos de atividades propostas: faça zigue–zague nos bastões andando de lado; jogue a bolinha para o alto e ao mesmo tempo leve a ponta do pé direito à frente, ao lado e para trás; andar quicando a bola uma vez ao chão e pegue-a novamente.

Foram realizadas 36 sessões de treinamento, que ocorreram três vezes por semana, durante 12 semanas, sendo realizadas em áreas externas livre da EEFFTO. Cada sessão durava 50 minutos, sendo dividida em três momentos: a) 10 minutos de caminhada rápida em dupla; b) 10 minutos de atividades relacionadas à DT cognitiva, sendo que cada participante era acompanhada por um aplicador; c) 30 minutos de DT motora, sendo realizado em grupos de, no máximo, quatro participantes. O comando de cada exercício era repetido por duas vezes visando uma melhor compreensão. As atividades de DT cognitiva e motora foram realizadas de forma associada à marcha e os aplicadores eram responsáveis por dar o comando para que as idosas alterassem a velocidade da marcha para rápida, lenta ou velocidade habitual, pelo menos três vezes entre os exercícios e de forma aleatória. A ordem da sessão não era determinada, variando de acordo com o número de participantes e de aplicadores no momento do treino. Os treinos contavam com, no mínimo, três aplicadores para até oito participantes por hora, sendo seis aplicadores no total. No entanto todas as participantes realizaram 50 minutos de exercícios e passaram pelos três momentos propostos.

Foi realizada análise descritiva dos dados, utilizando média e desvio padrão, e frequência absoluta e relativa. A normalidade da distribuição dos dados das variáveis contínuas foi verificada por meio do teste Shapiro-Wilk. O teste t para grupos independentes e Qui-quadrado foram utilizados para verificar diferenças nas medidas de clínicas e demográficas entre os grupos de diferentes escolaridades na fase pré-intervenção.

A análise da homogeneidade das variâncias foi realizada através do Teste de Levene. A análise de variâncias (ANOVA) two-way 2x2 com medidas repetidas foi utilizada para avaliar o efeito da intervenção sobre o desempenho no teste de Stroop, ACE-R e Trilhas B. O fator de comparação entre os grupos foi o tempo (pré vs. pós) e o grupo (alta vs. baixa escolaridade). O post hoc de Bonferroni foi utilizado para comparações pareadas. Para avaliar o tamanho do efeito será apresentado o eta-quadrado parcial (η²p), sendo o tamanho de efeito considerado pequeno (0,0099), médio (0,0588) e grande (0,1379). Além disso será apresentado o power, relacionado com o poder atingido em cada análise. Foi verificada a esfericidade dos dados através do Teste de Mauchly. Todas as análises foram realizadas no programa SPSS (versão 21) com nível de significância de 5%.

RESULTADOS

Dentre as 31 participantes do estudo, 17 possuíam de 3 a 7 anos de escolaridade (4±1,2) e 14 com escolaridade igual ou superior a 8 anos (12±4,2; p<0,0001). Não ocorreu nenhum efeito adverso significativo associado à participação no programa, como problemas cardiovasculares, lesões tendíneas ou do sistema musculoesquelético. A aderência ao programa foi de 100% de realização das sessões em ambos os grupos, sendo que todas as idosas completaram todas as 36 semanas de treinamento. Na linha de base (pré-intervenção), os grupos foram similares em relação às características clínicas e funcionais, com exceção da escolaridade e renda salarial (Tabela 1).

Tabela 1
Características clínicas iniciais das participantes e comparação entre os grupos de baixa (1) e alta escolaridade (2). Belo Horizonte, MG, 2013.

A Tabela 2 apresenta os resultados da ANOVA para as três medidas de função executiva avaliadas. Com relação ao teste Stroop, foram observados efeitos principais pré e pós intervenção (η²p=0,17, power=0,66), sem efeitos significativos do grupo de interação (pré e pós e grupos) (F=2,14, p=0,15), demonstrando que os grupos tiveram comportamento similar, isto é, foram observadas melhoras no teste Stroop para os dois grupos após o DT. Resultados similares foram encontrados para o ACE-R. Foram observados efeitos principais (η²p=0,39; power=0,99), com efeito do grupo e sem efeitos de interação significativos, demonstrando que os grupos tiveram comportamento similar, isto é, foram observadas melhoras no teste ACE-R para os dois grupos. Para o teste Trilhas B, não foram encontrados efeitos principais significativos (η²p=0,30; power=0,15), mas foi identificado efeito do grupo, sem interação.

Tabela 2
Desempenho cognitivo em idosas com baixa (G1) e alta escolaridade (G2) antes e após o treinamento de dupla tarefa. Belo Horizonte, MG, 2013.

DISCUSSÃO

O presente estudo apresentou como objetivo avaliar a influência da escolaridade nos ganhos de função executiva de idosas após treino de DT. A amostra demonstrou homogeneidade entre os grupos de baixa e alta escolaridade, apresentando características clínicas sem diferença estatística em fatores que poderiam influenciar nos resultados dos testes. A escolaridade e a renda foram os fatores que apresentaram diferenças significativas entre os grupos. Entretanto, essas diferenças eram esperadas uma vez que a escolaridade foi uma das variáveis selecionadas para a seleção dos grupos e que essa influência de forma direta na renda, ou seja, uma maior escolaridade possibilita uma maior renda2828 Zahodne LB, Stern Y, Manly JJ. Differing effects of education on cognitive decline in diverse elders with low versus high educational attainment. Neuropsychology. 2015;29(4):649-57.. O desempenho na função executiva após o treinamento de DT apresentou melhora quando analisados os momentos pré e pós intervenção, nos testes Stroop e ACE-R, em ambos os grupos. No entanto, no teste Trilhas B não foi identificado ganho significativo após o treinamento em nenhum dos grupos. No teste Stroop, o treinamento de DT reduziu o tempo para a realização do teste demonstrando, consequentemente, um melhor desempenho no controle inibitório, memória, fluência de leitura e nomeação de cores nos dois níveis educacionais. Esse resultado pode estar relacionado com o treinamento, uma vez que o teste é específico para avaliar a função executiva2929 Santana AN, Melo MRA, Minervino CASM. Instrumentos de Avaliação das Funções Executivas: Revisão Sistemática dos Últimos Cinco Anos. Aval Psicol. 2019;18(1): 96-107.. O nível de escolaridade influencia nos resultados do teste Stroop uma vez que a escolaridade atua diretamente na capacidade de leitura, de nomear cores além de atuar na inibição e flexibilidade necessárias para a realização do teste3030 Zimmermann N, Cardoso CO, Trentini CM, Grassi-Oliveira R, Fonseca RP. Brazilian preliminary norms and investigation of age and education effects on the Modified Wisconsin Card Sorting Test, Stroop Color and Word test and Digit Span test in adults. Dement Neuropsychol. 2015;9(2):120-7.. Diante disso, esperava-se que as idosas de ambos os grupos apresentassem uma redução do tempo de execução do teste no pré e pós-intervenção, hipótese que se confirmou a partir dos resultados encontrados, sendo importante avaliar a magnitude do ganho. A melhora identificada em ambos os grupos pode ser explicada pelo treinamento de DT que foi suficiente para que gerasse um maior estímulo relacionados com a função executiva.

Sendo importante ressaltar que tanto no teste Stroop quanto no ACE-R foi possível perceber que o treinamento com DT gerou um efeito positivo em idosas de ambos os grupos, e isso pode ser justificado, provavelmente, pelo maior estímulo cognitivo e motor oferecido às idosas no período de treinamento. Ao realizar um treinamento específico de DT, as idosas possuem maior desafio para cumprir as tarefas e, portanto, são mais estimuladas e, consequentemente apresentam ganhos importantes no desempenho das funções executivas3131 Farina M, Paloski LH, de Oliveira CR, Argimon IIL, Irigaray TQ. Cognitive Reserve in Elderly and Its Connection with Cognitive Performance: a Systematic Review. Ageing Int 2018;43:496-507.. Dessa forma, este foi um achado relevante do presente estudo que demonstra que, quando desafiado, o cérebro de idosas responderam positivamente ao desafio, melhorando o resultado em um teste mais desafiador.

Todas as idosas foram estimuladas tanto em tarefas cognitivas, associadas à marcha, quanto motoras, associadas a atividades cognitivas, o que pode também ter contribuído com os achados do presente estudo. O nível de atividade que as idosas praticavam, por semana, não apresentou diferença significativa no estudo, o que elimina um possível fator confundidor relacionado à outras atividades extras ao realizado no treinamento. Diante disso, uma vez que as idosas foram estimuladas de forma equivalente durante o treinamento, acredita-se que os resultados encontrados nos testes corroborem com o fato que o treinamento de DT pode ter gerado efeitos benéficos na função executiva dessas idosas.

O treinamento de DT mostra-se efetivo para a cognição global de idosos saudáveis3232 Wollesen B, Wildbredt A, Van Schooten KS, Lim ML, Delbaere K. The effects of cognitive-motor training interventions on executive functions in older people: a systematic review and meta-analysis. Eur Rev Aging Phys Act. 2020;17:1- 9., sendo que a combinação de exercício físico, estimulação sensório-motora e envolvimento cognitivo podem facilitar mudanças neurofisiológicas responsáveis pelo processo de melhora cognitiva3333 Tait JL, Duckham RL, Milte CM, Main LC, Daly RM. Influence of Sequential vs. Simultaneous Dual-Task Exercise Training on Cognitive Function in Older Adults. Front Aging Neurosci. 2017;9:1-9.. Essas melhoras na função executiva foram identificadas através dos resultados dos testes nos momentos pré e pós-intervenção, corroborando assim, com os achados do presente estudo. No teste Trilhas B, não foi encontrada diferença significativa entre os momentos pré e pós treinamento de DT. Este resultado pode decorrer da simplicidade do teste, não permitindo observar mudança significativa após a intervenção3131 Farina M, Paloski LH, de Oliveira CR, Argimon IIL, Irigaray TQ. Cognitive Reserve in Elderly and Its Connection with Cognitive Performance: a Systematic Review. Ageing Int 2018;43:496-507.. A escolaridade é uma variável que influencia os resultados do teste Trilhas B3434 de Azeredo Passos VM, Giatti L, Bensenor I, Tiemeier H, Ikram MA, de Figueiredo RC, et al. Education plays a greater role than age in cognitive test performance among participants of the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). BMC Neurol. 2015;9(15):1-9. e isso pode ser observado no tempo gasto para realização do teste, considerando os dois grupos, em que o grupo de maior escolaridade obteve menor tempo gasto para concluir o teste quando comparado com o grupo de menor escolaridade na avaliação inicial. Acreditamos que as idosas já possuíam resultados altos no início do treinamento, demonstrando efeito teto no teste. Foi observado, nos testes ACE-R e Trilhas B, efeito significativo nos grupos, diante disso, independente do tempo, os grupos apresentaram valores diferentes, sendo assim, a escolaridade influenciou no desempenho desses testes, mas não nos ganhos com o treinamento de DT.

Não foi observado, em nenhum dos testes, efeito interação entre a escolaridade e os resultados dos testes. Diante disso, os efeitos do treinamento de DT não dependem dos diferentes níveis de escolaridade analisados. O treinamento foi efetivo para a melhora da função executiva em ambos os grupos, independente da escolaridade. Sendo uma contribuição importante do presente estudo, uma vez que a literatura mostra os efeitos da escolaridade no desempenho das funções executivas, mas não avaliaram se tais ganhos com determinadas intervenções poderiam ser influenciado pela escolaridade.

A ausência de um grupo controle, o qual não tenha realizado outro tipo de atividade, e a amostra composta apenas pela população idosa feminina podem ser consideradas limitações do presente estudo. O grupo controle, sem a realização de outra atividade que poderia influenciar nos resultados da função executiva, seria uma forma de minimizar os potenciais fatores de confusão dos resultados, garantindo que os efeitos encontrados fossem relacionados apenas ao treinamento realizado. Além disso, a amostra analisada não permite a generalização dos resultados para a população idosa masculina. Considerando os resultados encontrados, os quais indicam que o treino de DT é benéfico para o melhor desempenho das funções executivas na população idosa e feminina, faz-se necessário investigar se na população masculina os resultados são semelhantes. Além disso, serão interessantes novos estudos para investigar se pessoas com deficit cognitivos em diferentes graus terão benefícios na função executiva com o treinamento de DT e se a escolaridade interferirá nessa população.

CONCLUSÃO

O treino de dupla tarefa (DT) resultou na melhora no desempenho das funções executivas independente da escolaridade na maioria dos testes utilizados neste estudo. Em apenas um teste, o de Trilhas B, não foi encontrada diferença significativa após o treinamento de DT em nenhum dos grupos, provavelmente por ser um teste muito simples com baixa requisição das funções executivas. Esses resultados sugerem que intervenções que utilizem a DT podem ser utilizadas na prática clínica, objetivando a melhora no desempenho das funções executivas em idosas, independente da escolaridade, ampliando a sua utilização.

  • Não houve financiamento para a execução deste trabalho.

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Editado por

Editado por: Daniel Gomes da Silva Machado

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Abr 2021
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    01 Abr 2020
  • Aceito
    23 Dez 2020
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