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Perfil epidemiológico das denúncias de violência contra a pessoa idosa no Rio Grande do Norte, Brasil (2018-2019)

Resumo

Objetivo

caracterizar as denúncias de violência contra pessoas idosas no Disque 100 no Rio Grande do Norte, Brasil, entre dezembro de 2018 e novembro de 2019.

Métodos

estudo transversal no qual foram analisados descritivamente os dados contidos nos extratos das denúncias de violência efetuadas no Disque 100 e, posteriormente, realizada uma análise espacial exploratória. Foram analisados os municípios de residência das vítimas, tipos de violência, local de ocorrência e os encaminhamentos para a rede de garantia de direitos. Além disso, idade, sexo e raça/cor das vítimas; e idade, sexo, raça/cor dos suspeitos e parentesco com a vítima

Resultados

No total, 878 denúncias contra 1.014 pessoas idosas foram registradas, a maioria de Natal, RN (46,9%). As denúncias mais prevalentes foram: negligência (77%), violência psicológica (44,9%) e abuso financeiro (19%) e ocorreram predominantemente na residência das vítimas (95,3%), atingindo principalmente as mulheres (66,9%). Os suspeitos das violências foram na maioria os filhos (62,1%) e do sexo feminino (49,3%).

Conclusão

Os resultados sugerem uma fragilidade do apoio/núcleo familiar e a necessidade da atenção do Estado para o cuidado nesse âmbito. Ademais, o fato de que as principais formas de violência nem sempre deixam marcas físicas alerta a população para a sua contribuição na identificação da violência contra a pessoa idosa. Finalmente, os resultados sugerem o desconhecimento do Disque 100 pelos indivíduos que residem no interior, fazendo-se necessário melhor divulgação dos canais de comunicação de violência para esse público, para uma análise mais realista dessa problemática no estado e um enfrentamento mais efetivo.

Palavras-Chave:
Idosos; Violência; Maus-tratos ao Idoso

Abstract

Objective

to characterize the reports of violence against older people made via the Dial 100 service in the state of Rio Grande do Norte (RN), Brazil, between December 2018 and November 2019.

Methods

a cross-sectional study involving a descriptive analysis of data contained in excerpts from reports of violence made via the Dial 100 service was conducted and an exploratory spatial analysis carried out. The cities of residence of the victims, types of violence, place of occurrence and referrals to the Network for Securing Rights were analyzed, along with age, sex and race/color of both victims and suspected perpetrators, besides the relationship between them.

Results

In total, 878 reports of violence against 1,014 older people were registered, the majority in the city of Natal-RN (46.9%). The most prevalent complaints were neglect (77%), psychological violence (44.9%) and financial abuse (19%). Acts of violence were perpetrated predominantly in victims’ homes (95.3%) and affected mainly women (66.9%). Most suspected perpetrators were children of the victim (62.1%) and female (49.3%).

Conclusion

The results suggest a weakness in the family support/nucleus and the need for state assistance to deliver care in this context. In addition, the fact that the main forms of violence do not always leave physical evidence highlights the role of the population in helping to identify violence against the older population. Finally, the results suggest a lack of awareness about the Dial 100 service among residents in the interior of the state, pointing to the need for greater dissemination of the channels for denouncing violence against this group, allowing a more accurate analysis of the problem in the state and more effective actions to tackle the issue.

Keywords
Aged; Violence; Elder Abuse

INTRODUÇÃO

O envelhecimento humano faz parte do processo da vida e possui uma experiência variável de pessoa para pessoa de acordo com os contextos biológicos e sociais associados. Normalmente, é nessa fase que as relações sociais diminuem e a família assume um papel mais dominante na vida dos idosos. Apesar de serem sujeitos de direitos, os idosos se tornam muito vulneráveis frente às necessidades de saúde e às impossibilidades que emergem à medida que envelhecem, se tornando, muitas vezes, vítimas de violência11 Diel M, Barbiani R. Violência familiar contra a pessoa idosa: expressões do fenômeno e perspectivas para o seu enfrentamento. Textos Contextos. 2018;17(2):379-92.. Segundo o Estatuto do Idoso, art. 19, §1, capítulo IV, “violência contra o idoso é qualquer ação ou omissão praticada em local público ou privado que lhe cause morte, dano ou sofrimento físico ou psicológico”22 Brasil. Lei nº 10.741, de 1 de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.741.htm.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei...
. Trata-se de um problema que atinge a sociedade de forma integral, acometendo diferentes culturas, independentemente de status socioeconômico, etnia e religião33 Silva CFS, Dias CMSB. Violência contra idosos na família: motivações, sentimentos e necessidades do agressor. Psicol Ciênc Prof. 2016;36(3):637-52..

A violência contra a pessoa idosa pode se manifestar através de violações do tipo (1) física, que envolvem o uso de força física para ferir, provocar dor, incapacidade ou morte; (2) psicológica, incluindo agressões verbais ou gestuais e humilhações; (3) sexual, contemplando excitação sexual do suspeito, relação sexual ou práticas eróticas sem consentimento da vítima; (4) abandono, que envolve a omissão dos responsáveis governamentais, institucionais ou familiares na prestação de serviços de cuidado ou proteção; (5) negligência, que se refere à recusa ou omissão na prestação dos cuidados necessários por parte dos responsáveis familiares ou institucionais; (6) financeira, relacionada à exploração imprópria das pessoas idosas ou uso não consentido de seus recursos financeiros e patrimoniais; e (7) autonegligência, caracterizada como a conduta da pessoa idosa que ameaça sua própria saúde ou segurança, pela recusa a cuidar de si 44 Minayo MCS. Violência contra idosos: o avesso do respeito à experiência e à sabedoria. Brasília, DF: Secretaria Especial dos Direitos Humanos; 2005..

Nesse sentido, nem sempre é fácil identificar atos de violência praticados contra pessoas idosas, uma vez que nem todas as agressões direcionadas a esse público deixam marcas físicas55 Oliveira AAV, Trigueiro DRSG, Fernandes MGM, Silva AO. Maus-tratos a idosos: revisão integrativa da literatura. Rev Bras Enferm. 2013;66(1):128-33.. Além das lesões físicas, idosos vítimas de violência vivenciam traumas morais e psicoemocionais. A violência contra pessoas idosas, muitas vezes, provoca o desenvolvimento de condições dependência e incapacidade, podendo, em alguns casos, resultar em óbito66 Correira TMP, Leal MCC, Marques APO, Salgado RAG, Melo HMA. Perfil dos idosos em situação de violência atendidos em serviço de emergência em Recife-PE. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(3):529-36.. De acordo com uma meta análise incluindo com 52 trabalhos publicados entre 2002 e 2015, estima-se que uma em cada seis pessoas idosas sejam vítimas de agressão ao redor do mundo77 Yon Y, Mikton CR, Gassoumis ZD, Wilber KH. Elder abuse prevalence in community settings: a systematic review and meta-analysis. Lancet Glob Health. 2017;5(2):147-56..

Nesse sentido, diante da magnitude que esse problema representa para o corpo social, em 2010, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da república do Brasil, órgão coordenador da Política Nacional do Idoso, instaurou o Disque 100 com um módulo específico de denúncias de violência contra pessoas idosas, o “Módulo Idoso do Disque Direitos Humanos”88 Mallet SM, Conceição M, Côrtes W, Giacomin KC, Gontijo ED. Violência contra idosos: um grande desafio do envelhecimento. Rev Méd Minas Gerais. 2016;26(Supl 8):408-13..

Uma pesquisa de abrangência nacional no Brasil identificou um total de 233.383 denúncias de violência contra pessoas idosas encaminhadas ao Disque 100 entre 2011 e 201899 Freitas LG, Benito LAO. Denúncias de violência contra idosos no Brasil: 2011-2018. REVISA. 2020;9(3):483-99.. Além disso, a região nordeste do Brasil ocupava a segunda posição em casos de violência contra pessoas idosas denunciadas88 Mallet SM, Conceição M, Côrtes W, Giacomin KC, Gontijo ED. Violência contra idosos: um grande desafio do envelhecimento. Rev Méd Minas Gerais. 2016;26(Supl 8):408-13.. Ainda segundo dados do Disque 100, o Rio Grande do Norte foi terceiro estado brasileiro entre 2011 e 2015 com maior número de denúncias de violência contra pessoas idosas realizadas por 100.000 habitantes1010 Taveira LMM, Oliveira MLC. Perfil da violência contra a pessoa idosa registrada no Disque 100 de 2011 a 2015, Brasil. Geriatr Gerontol Aging. 2020;14(2):120-7..

Entretanto, há uma perda considerável de informações sobre e caracterização de vítimas e suspeitos, destacando a necessidade da realização de outros estudos com o intuito de se entender a dinâmica do problema que é a violência contra os idosos e de embasar, posteriormente, estratégias políticas que atuem na promoção de saúde, no diagnóstico precoce de violações, no combate à violência contra esse público e no acompanhamento das vítimas e familiares. Apesar de pesquisas realizadas com abrangência nacional já terem quantificado as denúncias de violência contra pessoas idosas no Rio Grande do Norte, inexistem estudos que caracterizam os tipos de violência mais prevalentes, bem como o perfil das vítimas e dos agressores no estado. Portanto, o objetivo deste estudo consiste em caracterizar às denúncias do Disque 100 nos municípios do Rio Grande do Norte, Brasil.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo epidemiológico e descritivo de caráter transversal e individuado, realizado a partir da análise dos extratos de denúncias de violência contra a pessoa idosa. Tais denúncias foram direcionadas ao Disque 100, tendo sido recebidas pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e encaminhadas para o Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Idosa (CEDEPI/RN). O período de estudo – entre dezembro de 2018 e novembro de 2019 – foi escolhido com base na disponibilidade dos dados fornecidos pelo CEDEPI-RN. Foram consideradas todas as denúncias recebidas durante o período de investigação estipulado e que estavam relacionadas a indivíduos com idade ≥60 anos. O projeto foi aprovado pelo Comitê Central de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (CEP) do Hospital Universitário Onofre Lopes, pertencente à Universidade Federal do Rio Grande do Norte (parecer nº 3.898.143). Por se tratar de uma pesquisa que utilizou exclusivamente dados secundários, foi requerida a dispensa do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Para além disso, foi coletada a assinatura de um Termo de Concessão por parte do CEDEPI/RN, de forma a autorizar a utilização dos dados das denúncias para análise e divulgação.

O Disque 100 é um canal de comunicação da sociedade com o Poder Público – Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos – que busca a resolução de conflitos em casos de suspeita de violações de direitos e funciona durante 24 horas todos os dias da semana através de um serviço telefônico gratuito, sendo as denúncias analisadas e encaminhadas aos órgãos responsáveis1111 Rocha RC, Cortês MCJW, Dias EC, Gontijo ED. Violência velada e revelada contra idosos em Minas Gerais-Brasil: análise de denúncias e notificações. Saúde Debate 2018;42:81-4..

O território de investigação foi o Rio Grande do Norte, estado brasileiro que possui um total de 167 municípios e uma população idosa de 342.890 indivíduos, que representa cerca de 9,7% da população total do estado. Destes, aproximadamente 55,9% são do sexo feminino e 44,1% masculino, de acordo com o último censo1212 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [Internet]. Brasília, DF: IBGE; [1995 - ]. Censo Demográfico [acesso 12 jul. 2020]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/ .
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. O estado conta, ainda, com um IDH de 0,684, ocupando o 16º lugar no ranking dos estados brasileiros1313 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [Internet]. Brasília, DF: IBGE; [1995 - ]. Rio Grande do Norte: Cidades [acesso 14 jan. 2021]. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rn/natal/panorama .
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.

As investigações realizadas foram de natureza observacional, tendo sido conduzidas de forma espectadora sem interferências por parte dos pesquisadores. Após a coleta de dados através dos extratos de denúncias do Disque 100, que foram encaminhadas ao CEDEPI/RN através de um relatório, os autores elaboraram um banco de dados constando todas as variáveis analisadas de acordo com o perfil sociodemográfico dos idosos e a caracterização da violência sofrida. Para essa fase do estudo, dois pesquisadores foram treinados para padronizar o relato do tipo de violência descrita pelo denunciante no relatório a fim de se minimizar vieses de observador.

Dentre as variáveis contidas no estudo, constam aquelas relativas à violência: os municípios em que ocorreram as violências, os encaminhamentos à Rede de Garantia de Direitos, os tipos de violência cometidos (física, psicológica, sexual, financeira, abandono, negligência e autonegligência), bem como o local em que as violências ocorreram. No que se refere especificamente à descrição do perfil dos indivíduos violentados, o número de vítimas por denúncia, a idade, o sexo e a raça foram analisados. Já no que diz respeito à descrição dos(as) agressores(as), o número de suspeitos (as), a idade, o sexo, a raça/cor e o parentesco com a vítima foram objetos de investigação.

Nos dados colhidos, as denúncias de violência contra a pessoa idosa envolveram, com frequência, a ocorrência simultânea de mais de um tipo de agressão, sendo possível, por exemplo, que um mesmo indivíduo tenha sofrido múltiplas violências e que isso tenha sido relatado em uma única denúncia. De modo semelhante, uma parcela expressiva das denúncias foi encaminhada para mais de um órgão da Rede de Garantia de Direitos.

Foram realizadas análises descritivas dos dados coletados a fim de obter as frequências absoluta (n) e relativa (%) com intervalo de confiança de 95% (IC95%) para as variáveis categóricas e a média e o desvio-padrão das variáveis quantitativas. Caracterizou-se também os dados perdidos por ausência de preenchimento no extrato de denúncia, de modo a manter o mesmo número amostral de denúncias para todas as variáveis analisadas. Posteriormente, foi feita uma análise espacial exploratória com a pretensão de identificar a distribuição das denúncias de violência contra pessoas idosas no Rio Grande do Norte.

RESULTADOS

Entre dezembro de 2018 e novembro de 2019, no Rio Grande do Norte, foram registradas no canal Disque 100 um total de 878 denúncias de casos de violência contra 1.014 indivíduos com 60 anos ou mais de idade, sendo a maioria das vítimas oriundas do município de Natal (n=411; 46,9%; IC 95%: 43,8–50,0), seguido por Mossoró (n=69; 8,0%; 6,3–9,7) e Parnamirim (n=64;7,3%; 5,7–8,9). A Figura 1 ilustra a distribuição do número de denúncias pelos municípios do estado.

Figura 1
Distribuição espacial do número de denúncias de violência contra pessoas idosas realizadas através do Disque 100 no estado do Rio Grande do Norte, no período de dezembro de 2018 a novembro de 2019.

Quanto aos tipos de violência denunciados, conforme apresentado na tabela 1, houve um predomínio das situações de negligência (n=781; 77%; IC95%=74,4–79,6), seguidas por violência psicológica (n=506; 49,9%; IC95%=46,8–53,0), abuso financeiro (n=455; 44,9%; IC95%=41,8–48,0) e violência física (n=193; 19%; IC95%= 16,6–21,4), respectivamente, as quais ocorreram de forma isolada ou em concomitância. Abandono (n=17; 1,7%; IC95%=0,9–2,5) e/ou autonegligência (n=11; 1,1%; IC95%=0,5–1,7) estavam presentes em uma pequena parcela dos casos. Não houve denúncias de violência sexual no período analisado. Além disso, algumas das denúncias relataram que as vítimas se encontravam em situação de vulnerabilidade social (n=46; 4,3%; IC95%: 3,1–5,5).

Tabela 1
Caracterização dos tipos de violência contra a pessoa idosa denunciadas ao Disque 100 no período de dezembro/2018 a novembro/2019 no Rio Grande do Norte.

As informações referentes ao perfil das vítimas e dos suspeitos, bem como aos locais de ocorrência das violências, podem ser encontradas na tabela 2. No que diz respeito ao perfil das vítimas, a idade média foi de 76,9±9,3 anos, variando de 60 a 105 anos, sendo a maioria do sexo feminino (n=79; 66,9%; IC95%: 28,8–34,5). Desses indivíduos que sofreram violência, a maior parte foram declaradas pelos denunciantes como brancos (n= 384; 37,9%; IC95%: 34,9–40,9), vindo na sequência pardos (n=345; 34%; IC95%: 31,1-36,9) e negros. O principal local onde ocorreram as violências foi na casa em que os idosos residiam (n=837; 95,3%; IC95%=94,0–96,6).

Tabela 2
Caracterização do local, vítimas e suspeitos dos casos de violência contra a pessoa idosa denunciadas ao Disque 100 no período de dezembro/2018 a novembro/2019 no Rio Grande do Norte.

Em se tratando das características dos suspeitos, uma pequena maioria era do sexo feminino (n=707; 49,3%; IC95%: 46,2–52,4). No que se refere à cor/raça dos suspeitos, um maior número de indivíduos foi declarado como pardos (n=435; 30,3%; 27,5-33,1) e brancos (n=403; 28,1%; IC95%: 25,3–30,9), seguidos dos negros (n=96; 6,7%; IC95%: 5,1–8,3). Ademais, houve um predomínio dos casos em que os filhos eram os suspeitos (n=891; 62,1%; IC95%: 59,1–65,1), seguidos dos netos (n=128; 8,9%; IC95%: 7,2–10,6) e dos genros ou noras (n=72; 5%; IC95%: 3,7–6,3).

A partir das denúncias registradas no Disque 100, foram realizados 1.640 encaminhamentos para os órgãos da Rede de Garantia de Direitos, sendo a maioria para o Centro de Referência em Direitos Humanos Marcos Dionísio da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (CRDH/UFRN) (n=394; 44,9%; IC95%: 41,6–48,2), acompanhado pela Coordenadoria dos Direitos das Mulheres e das Minorias (CODIMM) da Segurança Pública e Defesa Social do Rio Grande do Norte (SESED) (n=221; 25,2%; IC95%: 22,3-28,1) e da Promotoria de Justiça de Defesa da Pessoa com Deficiência e do Idoso de Natal, RN (26ª PmJ) (n=21; 2,1%; IC95%: 1,2–3,0).

Em 14,7% (n=129; IC95%: 12,4-17,0) das denúncias, o denunciante realizou mais de um contato com o Disque 100, dentre as quais em 97 (75,2%; IC95%: 72,9–78,5) foram realizados dois contatos, tendo o caso com maior número de ligações um total de 52 contatos. Um grande número de denúncias envolveu mais de um suspeito (37,2%; n=327; IC95%: 34,0–40,3), chegando a ter até 9 suspeitos para um mesmo caso. Ademais, uma parcela expressiva das denúncias envolveu mais de uma vítima (13,8%; n=120; IC95%: 11,5–16,1).

Tabela 3
Caracterização das denúncias de violência contra a pessoa idosa realizadas ao Disque 100 no período de dezembro/2018 a novembro/2019 no Rio Grande do Norte.

DISCUSSÃO

No presente estudo, as denúncias concentraram-se nas cidades de Natal, Mossoró e Parnamirim, que são as três cidades mais populosas do estado do Rio Grande do Norte. A concentração das denúncias de violência contra as pessoas idosas nessas cidades e a baixa incidência em outras pode estar atrelada a diversos fatores, incluindo-se aspectos relacionados ao tamanho populacional, dado que as cidades com maior número de denúncias são também as mais populosas1414 Sousa CLS, Cunha RIM, Guerra LMB, Mendes TCO. Caracterização das denúncias de violência contra a pessoa idosa no Brasil. In: Anais do 6º Congresso Internacional do Envelhecimento Humano; Campina Grande; 2019. Campina Grande: Realize Eventos e Editora; 2019., bem como a possibilidade de que, por desconhecimento do canal Disque 100 nos municípios menos populosos, os casos de violência contra tal público não sejam denunciados. Nesse sentido, é possível que os dados colhidos a partir das denúncias realizadas não representem a totalidade dos casos de violência direcionados às pessoas idosas no Rio Grande do Norte.

Em estudo realizado a partir das denúncias de violência contra pessoas idosas endereçadas ao Disque 100 entre os anos de 2011 e 2018, foi encontrando uma maior taxa de notificações nos estados do Paraná, Rio Grande do Norte e São Paulo1414 Sousa CLS, Cunha RIM, Guerra LMB, Mendes TCO. Caracterização das denúncias de violência contra a pessoa idosa no Brasil. In: Anais do 6º Congresso Internacional do Envelhecimento Humano; Campina Grande; 2019. Campina Grande: Realize Eventos e Editora; 2019.. Com exceção do RN, a maior notificação de violência em locais mais desenvolvidos reitera a hipótese de que os dados do presente estudo sejam fortemente influenciados pelo reconhecimento dos munícipes sobre a importância da denúncia e conhecimento da existência do canal Disque 100.

A violência contra a pessoa idosa é um fenômeno complexo que tem implicações individuais, sociais e políticas, possuindo caráter multicausal33 Silva CFS, Dias CMSB. Violência contra idosos na família: motivações, sentimentos e necessidades do agressor. Psicol Ciênc Prof. 2016;36(3):637-52.. No presente estudo, a negligência, a violência psicológica e o abuso financeiro foram as expressões de agressão mais denunciadas e estavam presentes em concomitância com outras tipologias de violência na maioria das denúncias. Assim como neste estudo, no Brasil, os principais tipos de violência contra a pessoa idosa são a negligência, seguida de abusos psicológicos, financeiros e agressões físicas77 Yon Y, Mikton CR, Gassoumis ZD, Wilber KH. Elder abuse prevalence in community settings: a systematic review and meta-analysis. Lancet Glob Health. 2017;5(2):147-56.,1515 Brasil. Ministério dos Direitos Humanos. Disque Direitos Humanos [Internet]. Brasília, DF: MDH; 2018. Balanço anual Ouvidoria 2017. Disponível em: http://www.mdh.gov.br/informacao-ao-cidadao/ouvidoria/balanco-disque-100.
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Tais violências podem estar relacionadas com a desvalorização e os estigmas sociais referentes ao processo de envelhecimento presentes na sociedade. Carregar no corpo as marcas deixadas pelo tempo em uma sociedade que zela pela máxima produtividade e pela juventude deixaram de ser valorizadas. Isso fica ainda mais visível quando vislumbramos que o corpo social, de forma intrínseca, ainda alimenta preconceitos e estereótipos relacionados ao envelhecer, associando, de forma depreciativa, as pessoas dessa faixa etária com características socialmente desvalorizadas1616 Torres TL, Camargo BV, Bousfield ABS. Estereótipos sociais do idoso para diferentes grupos etários. Psic Teor Pesq. 2016;32(1):209-18..

A negligência é um tipo de violação presente tanto em nível doméstico quanto institucional no Brasil, sendo a responsável, por vezes, pelo desencadeamento posterior das demais tipologias de violência1717 Silva GCN, Almeida VL, Brito TRP, Godinho MLSC, Nogueira DA, Chini LT. Violência contra idosos: uma análise documental. Aquichan. 2018;18(4):449-60.. De acordo com estudo, a sobrecarga provocada pelo exercício das atividades de cuidado com a pessoa idosa é um fator de risco para a ocorrência de negligência importante de ser considerado1818 Orfila F, Coma-Solé M, Cabanas M, Cegri-Lombardo F, Moleras-Serra A, Pujol-Ribera E. Family caregiver mistreatment of the elderly: prevalence of risk and associated factors. BMC Public Health. 2018;18(1):1-9..

A violência psicológica é mais relatada que a agressão física e isso pode ser explicado pelo próprio ciclo da violência, já que, na maioria das vezes, antes de ocorrer a agressão física, a vítima é ameaçada ou sofre violência psicológica1919 Paiva MM, Tavares DMS. Physical and psychological violence against the elderly: prevalence and associated factors. Rev Bras Enferm. 2015;68(6):1035-41.. É válido ressaltar ainda que, por vezes, os maus tratos psicológicos não são reconhecidos como um abuso, o que leva tal tipo de violência a ser subnotificada. O abuso financeiro, outra tipologia prevalente neste estudo, é uma condição recorrentemente descrita na literatura. A dependência financeira do agressor em relação à pessoa idosa é um dos fatores que contribuem para a ocorrência da violência financeira, sendo os rendimentos mais baixos potencializadores da negligência e, os mais altos, por sua vez, da violência psicológica2020 Manso MEG, Oliveira RR, Almeida VP. A triangulação de métodos na abordagem da violência contra o idoso: resultados em um núcleo de convivência. Pesquisa, Sociedade e Desenvolvimento. 2020;9(10):e1409108522..

Os dados colhidos por meio do canal de denúncias Disque 100 referentes à violência contra a pessoa idosa no Rio Grande do Norte revelaram que mais de 95% (n= 837) dos casos ocorreram no próprio domicílio da vítima. Em Estudos realizados na cidade de Recife, PE, Brasil, os resultados destoaram daqueles encontrados no presente estudo, uma vez que apresentaram 47,52%2121 Paraíba PMF, Silva MCM. Perfil da violência contra a pessoa idosa na cidade do Recife-PE. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2015;18(2):295-306. e 59,3%2222 Abath MB, Leal MCC, Melo Filho DA. Fatores associados à violência doméstica contra a pessoa idosa. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(2):305-14. de casos nos quais as pessoas idosas sofreram violência em sua residência. Essa diferença, no entanto, pode ser explicada pela fonte de dados utilizada, já que no primeiro estudo comparativo os dados foram oriundos do Instituto Médico Legal2121 Paraíba PMF, Silva MCM. Perfil da violência contra a pessoa idosa na cidade do Recife-PE. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2015;18(2):295-306. e, no segundo, do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan)2222 Abath MB, Leal MCC, Melo Filho DA. Fatores associados à violência doméstica contra a pessoa idosa. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(2):305-14., ambos com notificações realizadas pelos profissionais de saúde.

Os resultados obtidos em pesquisa realizada também a partir da análise das denúncias do Disque 100 no período de 2011 a 2015 no Brasil, por outro lado, demonstraram um maior percentual de violências ocorrendo dentro da casa da vítima (72,47%)1010 Taveira LMM, Oliveira MLC. Perfil da violência contra a pessoa idosa registrada no Disque 100 de 2011 a 2015, Brasil. Geriatr Gerontol Aging. 2020;14(2):120-7., assim como neste estudo. Tendo em vista que o Disque 100 é um sistema aberto à sociedade, apresentando, portanto, um maior acesso para a realização de denúncias e, por conseguinte, uma elevada probabilidade de agregação no número de denúncias2323 Brasil. Governo Federal, Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos [Internet]. Disque 100 [acesso 06 dez. 2020]. Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/acesso-a-informacao/disque-100-1
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, há, nesse sentido, uma maior facilidade na identificação das violências dentro do domicílio.

Nesse sentido, o ambiente intrafamiliar configura-se como o principal meio no qual ocorreram as agressões direcionadas às pessoas idosas. Em razão disso, frequentemente a pessoa idosa tem receio de denunciar e de que denunciem seus agressores, seja por desejar não prejudicar um familiar com o qual possui vínculos ou por temer o agravamento das situações de violência dentro do seu próprio lar2424 Moraes TM, Aurelio SM, Lamego AMPC, Mendonça EF, Gonçalves LHT, Neves AB, et al. Caracterização do idoso vitimado pela violência no Pará. Enferm Bras. 2019;18(4):544-51..

Paralelo a isso, é necessário que se trace estratégias de enfrentamento à violência doméstica contra idosos com base em políticas públicas que garantam os direitos desses indivíduos. Para tal, é indispensável um trabalho em rede entre a atenção básica de saúde, familiares, amigos e pessoas da comunidade. Nesse sentido, ressalta-se o papel da atenção primária à saúde, representada pela Unidade Básica de Saúde (UBS) e pela Estratégia de Saúde da Família (ESF), cuja rede de apoio é capaz, através do maior contato dos profissionais com os usuários, de detectar e manejar as situações de violência familiar, especialmente dos mais vulneráveis, graças ao acesso e a proximidade do cuidado fornecido por esse modelo de assistência2525 Lopes EDS, D´Elboux MJ. Violência contra a pessoa idosa no município de Campinas, São Paulo, nos últimos 11 anos: uma análise temporal. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2021;24(6):1-10..

Além do ambiente domiciliar, foram citadas como suspeitas de praticar maus tratos contra pessoas idosas três instituições privadas e 12 instituições públicas, sendo uma delas uma Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPI). No Brasil, estudos chamam atenção para a necessidade de capacitação permanente dos profissionais de ILPI, abordando a presença de negligência institucional e outras formas de violência, problemas de acessibilidade, acesso aos medicamentos, dificuldades de atendimento à saúde no Sistema único de Saúde (SUS), barreiras de interação social com a comunidade e a necessidade de melhorias e execução das políticas públicas brasileiras2626 Poltronieri BC, Souza ER, Ribeiro AP. Análise do tema violência nas políticas de cuidado de longa duração ao idoso. Ciênc Saúde Colet. 2019;24:2859-70..

Na análise da violência contra as pessoas idosas é importante considerar os problemas relacionais frequentemente surgidos durante os processos de cuidado. Os cuidadores, muitas vezes um familiar pouco preparado para a função, ao não receberem auxílio para o exercício do cuidado, acabam apresentando aumento acentuado nos níveis de estresse, manifestando comportamentos abusivos e praticando atos violentos2727 Brasil. Secretaria da Saúde. Caderno de Violência contra pessoa idosa: orientações gerais. São Paulo: CODEPPS; 2007.. Consonante a tal afirmação, a maior parte dos suspeitos identificados na pesquisa eram familiares das vítimas, principalmente os filhos. Tal dado condiz com os resultados obtidos em outro estudo realizado no estado do Pará, Brasil, no qual os principais agressores de pessoas idosas também eram os próprios filhos das vítimas2424 Moraes TM, Aurelio SM, Lamego AMPC, Mendonça EF, Gonçalves LHT, Neves AB, et al. Caracterização do idoso vitimado pela violência no Pará. Enferm Bras. 2019;18(4):544-51..

No presente estudo, as mulheres foram as principais suspeitas de cometerem violências, fato que decorre principalmente do fato de que o papel de prover cuidados é, na maioria das vezes, assumido por pessoas do sexo feminino. Daí a importância do apoio do Estado às famílias, provendo instâncias de cuidado prolongado, especialmente diante do atual cenário sociodemográfico marcado pela diminuição no número de filhos e da maior participação da mulher no mercado de trabalho2828 Meira ED, Reis LA, Gonçalves LHT, Rodrigues VP, Philipp RR. Vivências de mulheres cuidadoras de pessoas idosas dependentes: orientação de gênero para o cuidado. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2017;21(2):1-8..

A maior parte das vítimas foram do sexo feminino, dado que se apresentou de maneira semelhante aos resultados de estudos já discutidos na literatura científica, que evidenciaram que as mulheres são as maiores vítimas de violência domiciliar quando comparadas aos homens1111 Rocha RC, Cortês MCJW, Dias EC, Gontijo ED. Violência velada e revelada contra idosos em Minas Gerais-Brasil: análise de denúncias e notificações. Saúde Debate 2018;42:81-4.,2727 Brasil. Secretaria da Saúde. Caderno de Violência contra pessoa idosa: orientações gerais. São Paulo: CODEPPS; 2007.. Tal fato pode ser atribuído à construção social acerca do papel das mulheres na sociedade, ainda muito atrelado à subordinação e à desvalorização2929 Damaceno DG, Alarcon MFS, Sponchiado VBY, Chirelli MQ, Marin MJS, Ghezzi JFS. Denunciando as agressões: o protagonismo de mulheres idosas vítimas de violência. In: Atas do Congresso Ibero-americano em Investigação Qualitativa. Lisboa; 16-19 julho 2019. Lisboa: CIAIQ; 2019. p.1156-65.. Além disso, no Brasil, os maiores índices de sobremortalidade de indivíduos do sexo masculino, quando comparados ao sexo feminino, desde o momento do nascimento até a idade adulta3030 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Tábuas completas de mortalidade por sexo e idade. Breve análise da mortalidade no período 2011-2012. Rio de Janeiro: IBGE; 2013., bem como a menor busca por serviços de saúde por parte do público masculino3131 Oliveira CO, Medeiros WR, Lima KC. Diferenciais sócio-demográficos da mortalidade de idosos em idades precoces e longevas. Rev Baiana Saúde Pública. 2015;39(2):249-61., podem ter relação com tal cenário, uma vez que existem mais mulheres idosas do que homens.

No que diz respeito à cor/raça, as violências foram mais frequentes nas pessoas de cor/raça declaradas como branca e parda, aspecto provavelmente relacionado às características da população brasileira, que apresenta cerca de 45,2% de pessoas da cor/raça branca, 45,1% de pardos e 8,9% de pretos1212 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [Internet]. Brasília, DF: IBGE; [1995 - ]. Censo Demográfico [acesso 12 jul. 2020]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/ .
http://www.ibge.gov.br/home/ ...
. Ademais, a condição de vulnerabilidade social vivenciada por alguns indivíduos neste estudo, seja ela associada ou não a outras violações, pode estar relacionada à violência estrutural presente no Brasil, especialmente no Nordeste, ao qual se caracteriza pelas desigualdades ocorridas nas estruturas organizadas e institucionalizadas da família e dos sistemas econômicos, culturais e políticos, conduzindo à opressão desses indivíduos e, por conseguinte, tornando-os mais vulneráveis3232 Minayo MCS. Manual de enfrentamento à violência contra a pessoa idosa: é possível prevenir, é necessário superar. Brasília, DF: SDPR; 2014.,3333 Coelho EBS, Silva ACLG, Lindner SR. Violência: definições e tipologias. Florianópolis: UFSC; 2014.. Assim, indivíduos desse grupo frequentemente estão expostos a um maior risco de adoecimento ou de agravamento de doenças pré-existentes66 Correira TMP, Leal MCC, Marques APO, Salgado RAG, Melo HMA. Perfil dos idosos em situação de violência atendidos em serviço de emergência em Recife-PE. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(3):529-36., além de um menor acesso aos serviços de saúde, falta de suporte social e baixa escolaridade, que podem culminar em um agravamento ou condição de saúde mais fragilizada3434 Freitas CV, Sarges ESNF, Moreira KECS, Carneiro SR. Avaliação de fragilidade, capacidade funcional e qualidade de vida dos idosos atendidos no ambulatório de geriatria de um hospital universitário. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2016;19(1):119-28.. Além da violência estrutural, os determinantes sociais são importantes fatores relacionados à violência interpessoal3535 Souto RMCV, Barufaldi LA, Nico LS, Freitas MG. Perfil epidemiológico do atendimento por violência nos serviços públicos de urgência e emergência em capitais brasileiras, Viva 2014. Ciênc Saúde Colet. 2017;22(9):2811-23..

Em se tratando das limitações contidas no presente estudo, é importante destacar que os dados analisados foram coletados de um único canal de denúncias, fato que dificulta a construção de um diagnóstico situacional mais abrangente no que se refere ao perfil de violência contra a pessoa idosa no estado do Rio Grande do Norte. Somado a isso, cabe pontuar também a pouca representatividade dos casos de violência em uma significativa parcela das pequenas cidades do estado, expressa por meio de escassas denúncias ou da ausência delas, aspecto que pode estar relacionado ao desconhecimento do canal Disque 100 nesses municípios. Além disso, a omissão de dados referentes à raça/cor nos registros do Disque 100 também se mostrou como um fator limitante no empreender de uma caracterização mais precisa tanto das vítimas quanto dos agressores.

CONCLUSÃO

A pesquisa evidenciou que a maioria dos casos de violência contra pessoas idosas no Rio Grande do Norte ocorreram no domicílio da vítima, sendo perpetrada principalmente por seus filhos. Dentre os tipos mais recorrentes de violência, destacaram-se, respectivamente, a negligência, a violência psicológica e o abuso financeiro. Por assumirem com maior frequência o cuidado direcionado às pessoas idosas, as mulheres foram as principais suspeitas de cometerem violência; também foram elas as principais vítimas. No que se refere à raça/etnia, houve um predomínio de pessoas brancas e pardas (declaradas pelos denunciantes). Ademais, o número de denúncias foi proporcional a densidade populacional dos municípios, uma vez que os maiores índices de violência foram observados nas três cidades mais populosas do Rio Grande do Norte (Natal, Mossoró e Parnamirim).

Diante disso, é primordial que haja um maior investimento na ampliação e na divulgação dos setores de atendimento às denúncias de violência contra pessoas idosas, sobretudo nos municípios menos populosos, nos quais existe um expressivo desconhecimento desses canais de denúncia. O investimento em órgãos competentes de investigação e de resolução dos casos de violência também deve ser realizado. Aliado a isso, é necessário o desenvolvimento de políticas públicas voltadas para a atenção às pessoas idosas e aos seus cuidadores, de modo a envolver o Estado, a sociedade e a família na ampliação do cuidado a fim de que possa ocorrer uma garantia efetiva dos direitos à população idosa.

  • Não houve financiamento para a execução deste trabalho.

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Editado por

Editado por: Tamires Carneiro de Oliveira Mendes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Out 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    16 Mar 2021
  • Aceito
    16 Jul 2021
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