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A influência dos níveis de atividade física nos parâmetros da marcha durante atividades de dupla tarefa em idosos

Resumo

Objetivo

Analisar as possíveis diferenças nas variáveis ​​cinemáticas da marcha entre idosos fisicamente ativos e fisicamente inativos durante a realização de atividades de dupla tarefa. Metodo: Participaram idosos, com idade entre 60 e 75 anos, divididos em dois grupos: fisicamente inativo (FI) (n=20) e fisicamente ativo (FA) (n=20). Os participantes foram agrupados igualmente em dez indivíduos do sexo feminino e masculino, classificados por meio do Questionário Internacional de Atividade Física (International Physical Activity Questionnaire - IPAQ). Os participantes realizaram inicialmente tarefas simples (aritmética, fluência verbal e marcha) e depois realizaram atividades de dupla tarefa, associando a marcha com as duas atividades cognitivas (aritmética e fluência verbal). Foram analisadas as variáveis ​​velocidade, cadência, comprimento da passada, largura do passo, tempo da passada e duplo apoio. Para comparar as variáveis ​​por tarefa e grupo, foi utilizado o modelo de Equações de Estimativas Generalizadas (GEE) complementado pelo teste de Bonferroni.

Resultados

Na análise intragrupo, ambos os grupos apresentaram reduções significativas na velocidade, cadência, largura da passada, tempo da passada e duplo apoio, tanto na dupla tarefa aritmética quanto na dupla tarefa de fluência verbal. No entanto, nas comparações entre os grupos, não houve diferenças estatisticamente significativas em nenhum parâmetro cinemático analisado, tanto na análise da marcha simples quanto nas tarefas duplas.

Conclusão

As duplas tarefas influenciaram negativamente os parâmetros cinemáticos da marcha em ambos os grupos. No entanto, o nível de atividade física não pode ser considerado um fator que minimiza os efeitos da dupla tarefa na marcha de idosos.

Palavras-Chave:
Atividade Física; Envelhecimento; Marcha; Cognição

Abstract

Objective

To analyze the possible differences in the kinematic variables of gait between physically active and physically inactive older people while performing dual-task activities.

Method

Older individuals, aged between 60 and 75 years, participated, divided into two groups: physically inactive (PI) (n=20) and physically active (PA) (n=20). Participants were equally grouped into ten female and male individuals, classified using the International Physical Activity Questionnaire (IPAQ). Participants initially performed simple tasks (arithmetic, verbal fluency, and gait) and then performed dual task activities, associating gait with the two cognitive activities (arithmetic and verbal fluency). The variables velocity, cadence, stride length, step width, stride time and double support were analyzed. To compare variables according to task and group, the Generalized Estimating Equations (GEE) model complemented by the Bonferroni test was used.

Results

In the intragroup analysis both groups showed significant decreases in velocity, cadence, step width, stride time and double support, both in the arithmetic dual task and in the verbal fluency dual task. However, in the comparisons between the groups, there were no statistically significant differences in any kinematic parameter analyzed, both in the single gait analysis and in the dual tasks.

Conclusion

The dual tasks had a negative influence on the kinematic gait parameters in both groups. However, the level of physical activity can not be considered a factor that minimizes the effects of the dual task on gait in the older people.

Keywords
Physical Activity; Aging; Gait; Cognition

INTRODUÇÃO

O processo de envelhecimento está relacionado ao comprometimento das funções físicas e cognitivas11 Demnitz N, Esser P, Dawes H, Valkanova V, Johansen-Berg H, Ebmeier KP, et al. A systematic review and meta-analysis of cross-sectional studies examining the relationship between mobility and cognition in healthy older adults. Gait Posture. 2016;50:164–74. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.gaitpost.2016.08.028
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. Dentre as alterações físicas nos idosos, destacam-se as alterações na marcha e na mobilidade. A marcha é uma tarefa motora complexa para idosos, cuja execução é considerada automática em adultos saudáveis e com ausência desse automatismo na velhice². Porém, é comum que as pessoas caminhem enquanto realizam outra tarefa.

A dupla tarefa envolve o desempenho de uma tarefa motora e cognitiva simultaneamente, exigindo recursos atencionais e cognitivos e está envolvida em muitas atividades diárias³. Independentemente da idade, quando a execução de uma tarefa interfere no desempenho de outra, ocorre uma interação negativa entre as tarefas, ultrapassando a capacidade do recurso disponível44 Clouston SA, Brewster P, Kuh D, Richards M, Cooper R, Hardy R, et al. The dynamic relationship between physical function and cognition in longitudinal aging cohorts. Epidemiol Rev. 2013;35(1):33–50. Disponível em: https://doi.org/10.1093/epirev/mxs004
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. Como resultado, pode ocorrer menor desempenho na marcha, que vem sendo muito relacionado ao aumento do risco de quedas, principalmente em idosos55 Bayot M, Dujardin K, Dissaux L, Tard C, Defebvre L, Bonnet CT, et al. Can dual-task paradigms predict falls better than single task? - A systematic literature review. Neurophysiol Clin. 2020;50(6):401–40. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.neucli.2020.10.008
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. Além disso, o envelhecimento está relacionado ao baixo desempenho nas funções cognitivas, como atenção e funções executivas, aumentando o risco de quedas66 Montero-Odasso M, Speechley M. Falls in cognitively impaired older adults: implications for risk assessment and prevention. J Am Geriatr Soc. 2018;66(2):367–75. Disponível em: https://doi.org/10.1111/jgs.15219
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. Devido ao alto custo que as quedas podem acarretar para os indivíduos e para a sociedade, é fundamental encontrar formas de melhorar o desempenho físico e cognitivo dos idosos77 Chaparro GN, Stine-Morrow EAL, Hernandez ME. Effects of aerobic fitness on cognitive performance as a function of dual-task demands in older adults. Exp Gerontol. 2019;118: 99–105. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.exger.2019.01.013
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.

As diretrizes atualizadas da OMS (Organização Mundial de Saúde) sobre atividade física confirmaram a importância da atividade física regular para obter benefícios à saúde, especialmente em idosos88 Bull FC, Al-Ansari SS, Biddle S, Borodulin K, Buman MP, Cardon G, et al. World Health Organization 2020 guidelines on physical activity and sedentary behaviour. Br J Sports Med. 2020;54(24):1451–62. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1136/bjsports-2020-102955
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. Isso auxilia na prevenção de quedas e lesões decorrentes de quedas88 Bull FC, Al-Ansari SS, Biddle S, Borodulin K, Buman MP, Cardon G, et al. World Health Organization 2020 guidelines on physical activity and sedentary behaviour. Br J Sports Med. 2020;54(24):1451–62. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1136/bjsports-2020-102955
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. Para a manutenção da saúde, independência e qualidade de vida, a prática de atividade física tem efeitos benéficos para uma melhor longevidade e bem-estar dos idosos, através de múltiplos mecanismos e vias fisiológicas99 Hayes L, Burtscher M, Elliott B. Editorial: Exercise as a countermeasure to human aging, volume II. Front Physiol. 2022;13:1–3. Disponível em: https://doi.org/10.3389/fphys.2022.878983
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. Alguns estudos já demonstraram que as atividades físicas são intervenções capazes de reduzir o declínio cognitivo, apresentando efeitos favoráveis no cérebro, além de promover a manutenção da função física durante o avanço da idade1010 Stillman CM, Esteban-Cornejo I, Brown B, Bender CM, Erickson KI. Effects of exercise on brain and cognition across age groups and health states. Trends Neurosc. 2020;43(7):533–43. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.tins.2020.04.010
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. À medida que envelhecemos, a importância de se manter ativo e praticar exercício físico torna-se fundamental para uma vida mais longa1111 Kivimäki M, Singh-Manoux A. Prevention of dementia by targeting risk factors. Lancet. 2018;391(10130):1575–76. Disponível em: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)30578-6
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. Apesar do conhecimento de que a atividade física influencia os sistemas musculoesquelético e cognitivo, poucos estudos avaliaram a influência dos níveis de atividade física nos parâmetros da marcha da população idosa durante atividades de dupla tarefa1212 Muhaidat J, Al-Yahya E, Mohammad MT, Qutishat D, Okasheh R, Al-Khlaifat L, et al. Dual-tasking in older women: physical activity or else? J Women Aging. 2022;34(1):101–11. Disponível em: https://doi.org/10.1080/08952841.2020.1819177
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,1313 Gomes CS, Carvalho MT, Coelho VHM, de Walsh IAP, Martins LJP, Nogueira CM, et al. Relações entre sedentarismo e mobilidade com e sem dupla tarefa em idosos usuários da atenção básica em saúde. Estud Interdiscip Envelhec. 2021; 26(1):217–23. Disponível em: https://doi.org/10.22456/2316-2171.96876
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. Diante do exposto, o objetivo principal deste estudo foi analisar as possíveis diferenças nas variáveis cinemáticas da marcha entre idosos fisicamente ativos e fisicamente inativos durante a realização de atividades de dupla tarefa. A principal hipótese do presente estudo é que a dupla tarefa influenciaria menos os parâmetros da marcha em idosos fisicamente ativos na comparação com idosos fisicamente inativos.

MÉTODO

Este é um estudo observacional, analitico e quasi-experimental. O estudo foi realizado no Laboratório de Análise de Biomecânica do Movimento Humano do Centro Clínico da Universidade de Caxias do Sul (CECLIN-UCS), localizado no Bloco 70, da Universidade de Caxias do Sul (UCS). Os dados foram coletados entre maio e julho de 2022.

A amostra foi composta por 40 participantes idosos, recrutados por meio de cartazes na Universidade de Caxias do Sul, divididos em dois grupos: grupo fisicamente inativo (FI): 20 idosos de ambos os sexos (dez do sexo feminino e dez do sexo masculino), que não praticam exercícios físicos regularmente e grupo fisicamente ativo (FA): 20 idosos de ambos os sexos (dez mulheres e dez homens), que praticam exercícios físicos regularmente. O tamanho da amostra foi calculado utilizando o programa estatístico G*Power 3.1, tendo como parâmetro principal de análise a velocidade da marcha. Com um tamanho de amostra de 20 participantes por grupo, o modelo de Equações de Estimativas Generalizadas (GEE) (interações entre tarefas e entre grupos) terá um poder estatístico de 80% e um tamanho de efeito de 0,30.

Para o início da coleta de dados, primeiramente, foi realizado contato telefônico com os possíveis participantes da pesquisa, realizando o convite para participação e explicações sobre a pesquisa. Aqueles que aceitaram participar do estudo, e que atenderam aos critérios de inclusão e exclusão, foram convidados a comparecer ao Laboratório de Análise Biomecânica do Movimento Humano em dias e horários pré-determinados. Foram incluídos os participantes que tivessem entre 60-75 anos. Foram excluídos os participantes que apresentassem doença aguda nos os últimos 3 meses; que apresentassem condições cardiovasculares, neurológicas e musculoesqueléticas instáveis que pudessem interferir na deambulação independente e/ou limitassem a realização segura do protocolo experimental; que fizessem uso de medicamentos que pudesse afetar a memória e a função cognitiva; que tivessem comprometimento cognitivo ou falta de fluência na língua portuguesa que interferisse no entendimento do consentimento informado, dos questionários ou das instruções do estudo.

No dia agendado para a avaliação, os participantes foram recebidos no laboratório pelos pesquisadores e imediatamente receberam explicações sobre os procedimentos do estudo e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Uma vez de acordo, foram mensurados os dados antropométricos [massa corporal, altura, índice de massa corporal (IMC)] e em seguida foi aplicado um questionário com perguntas sobre dados pessoais (nome e idade), histórico de patologias pregressas e atuais, uso de medicamentos, tratamento fisioterapêutico. Em seguida, os participantes responderam aos questionários sobre os níveis de atividade física e cognição. Para avaliação dos níveis de atividade física foi utilizado o Questionário Internacional de Atividade Física (International Physical Activity Questionnaire - IPAQ). Esse questionário é composto por 27 itens que abrangem diferentes domínios (relacionados ao trabalho, transporte, atividades domésticas e lazer) e diferentes intensidades e exige que os participantes estimem o tempo gasto em vários níveis de atividade física durante a semana anterior1414 Saglam M, Vardar-Yagli N, Savci S, Inal-Ince D, Calik-Kutukcu E, Arikan H, et al. Functional capacity, physical activity, and quality of life in hypoxemic patients with chronic obstructive pulmonary disease. Int J Chron Obstruct Pulmon Dis. 2015;26(10):423–8. Disponível em: https://doi.org/10.2147/COPD.S78937
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. O IPAQ utiliza um nível geral de atividade física dos participantes com base em seus minutos de Tarefa Equivalente Metabólica (MET-min) por semana e classifica os participantes em cinco categorias: muito ativos, ativos, irregularmente ativos A, irregularmente ativos B e sedentários. Os participantes classificados como irregularmente ativos A, irregularmente ativos B e sedentários foram incluídos no grupo FI e os participantes classificados como muito ativos e ativos foram incluídos no grupo FA. O IPAQ possui fortes características psicométricas para monitoramento dos níveis de atividade física de adultos de 18 a 85 anos1515 Craig CL, Marshall AL, Sjöström M, Bauman AE, Booth ML, Ainsworth BE, et al. International physical activity questionnaire: 12-country reliability and validity. Med Sci Sports Exerc. 2003;35(8):1381–95. Disponível em: https://doi.org/10.1249/01.MSS.0000078924.61453.FB
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. Para a avaliação cognitiva foram utilizados dois questionários, o Mini Exame do Estado Mental (MEEM) e a Avaliação Cognitiva de Montreal (MoCA). Cada questionário tem duração de aproximadamente dez minutos, é de fácil aplicação e não necessita de nenhum material específico. O MEEM é uma avaliação padronizada, simples e rápida, com ampla aceitação na comunidade científica e clínica, já validada e adaptada para a população brasileira1616 Melo DM, Barbosa AJG. O uso do Mini-Exame do Estado Mental em pesquisas no Brasil: uma revisão sistemática. Cien Saude Col. 2015;20(1):3865–76. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1413-812320152012.06032015
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. O MEEM avalia funções cognitivas como orientação espacial, temporal, memória imediata e de evocação, cálculo, linguagem-nomeação, repetição, compreensão, escrita e cópia de desenho; a pontuação máxima é de 30 pontos e pontuações inferiores a 23 podem ser interpretadas como comprometimento cognitivo1717 BruckI S, Nitrini R, Caramelli P, Bertolucci P, Okamoto I. Sugestões para o uso do mini-exame do estado mental no Brasil. Arq Neuropsiquiatr. 2003;61:777–81. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0004-282X2003000500014
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. O MoCA avalia tributos semelhantes ao MEEM, mas também avalia habilidades visuoespaciais e função executiva1818 Nasreddine ZS, Phillips NA, Bédirian V, Charbonneau S, Whitehead V, Collin I, et al. The Montreal Cognitive Assessment, MoCA: a brief screening tool for mild cognitive impairment. J Am Geriatr Soc. 2005;53(4):695–9. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1532-5415.2005.53221.x
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.

Posteriormente, foram realizadas tarefas simples. Primeiro, as duas tarefas cognitivas simples e depois a tarefa motora simples da marcha. Para a realização das tarefas cognitivas simples, os participantes do estudo foram convidados a sentarem-se em uma cadeira confortável, em uma sala silenciosa, e realizaram os seguintes testes: 1) tarefa aritmética de subtração: consistiu em os participantes realizarem a subtração de cinco em cinco, começando do número 4001919 Mirelman A, Maidan I, Bernad-Elazari H, Nieuwhof F, Reelick M, Giladi N, et al. Increased frontal brain activation during walking while dual tasking: an fNIRS study in healthy young adults. J Neuroeng Rehabil. 2014;11:1–7. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1532-5415.2005.53221.x
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; 2) tarefa de fluência verbal: consistiu em os participantes falarem o número máximo de palavras em 1 minuto que iniciassem com a letra “P” ou “B”2020 Yogev-Seligmann G, Rotem-Galili Y, Mirelman A, Dickstein R, Giladi N, Hausdorff JM. How does explicit prioritization alter walking during dual-task performance? Effects of age and sex on gait speed and variability. Phys Ther. 2010;90(2):177–86. Disponível em: https://doi.org/10.2522/ptj.20090043
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Em seguida, foi realizada a tarefa simples da marcha. Os procedimentos para coleta de dados da marcha foram baseados no protocolo de Laroche et al.2121 Laroche D, Duval A, Morisset C, Beis JN, d’Athis P, Maillefert JF, et al. Test–retest reliability of 3D kinematic gait variables in hip osteoarthritis patients. Osteoarthr Cartil. 2011;19(2):194–9. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.joca.2010.10.024
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. A velocidade autosselecionada foi utilizada para a avaliação. Para adaptação dos participantes ao protocolo de avaliação, primeiramente foi solicitado que esses caminhassem oito metros em linha reta em velocidade autosselecionada no local destinado à coleta da marcha no laboratório. Os participantes foram orientados a memorizar o número de passos e o ritmo necessário para conseguir fazer contato com a plataforma, ora com todo o pé direito, ora com todo o pé esquerdo. Após a familiarização, marcadores retrorrefletivos (VICON MX systems, Oxford Metrics Group, Reino Unido) foram afixados seguindo o modelo Plug-in gait lower body (Motion Capture Systems, VICON MX systems, Oxford Metrics Group, Reino Unido) nos seguintes pontos anatômicos, à direita e à esquerda: espinhas ilíacas anterossuperiores, espinhas ilíacas póstero-superiores, porções médio-lateral dos fêmures, porções médio-lateral dos joelhos, porções médio-lateral das tíbias, maléolo lateral dos tornozelos, porções centro-posterior dos calcâneos e face dorsal dos segundos metatarsos. O protocolo de marcha consistiu na realização de passos na plataforma, sendo que em todas as tentativas os participantes realizaram o mesmo percurso da sessão de adaptação. Foram realizadas tentativas até que oito passos fossem totalmente capturados2121 Laroche D, Duval A, Morisset C, Beis JN, d’Athis P, Maillefert JF, et al. Test–retest reliability of 3D kinematic gait variables in hip osteoarthritis patients. Osteoarthr Cartil. 2011;19(2):194–9. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.joca.2010.10.024
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. Durante o protocolo de avaliação da marcha foram coletados simultaneamente dados cinemáticos e cinéticos. Para a captura da trajetória tridimensional dos marcadores posicionados no corpo dos participantes durante a marcha, foi utilizado um sistema de cinemetria dotado de sete câmeras integradas (VICON MX systems, Oxford Metrics Group, Reino Unido). Os dados cinemáticos foram coletados em uma taxa de amostragem de 100Hz.

Após a realização de cada uma das tarefas simples, tanto as duas tarefas cognitivas quanto a tarefa motora da marcha, foram realizadas as atividades de dupla tarefa. As duplas tarefas consistiram na realização da tarefa motora da marcha realizada simultaneamente à cada uma das duas tarefas cognitivas. Isso significa que os participantes caminharam em velocidade autosselecionada enquanto realizavam ao mesmo tempo cada uma das duas tarefas cognitivas. Vale ressaltar que os participantes realizaram primeiro todas as tarefas simples, tanto as cognitivas como a motora e, após, realizaram as atividades de dupla tarefa. Tanto a ordem de execução das atividades cognitivas simples quanto de dupla tarefa, foram definidas de forma aleatória, por meio de sorteio realizado pelos pesquisadores antes da chegada dos participantes para a coleta de dados da pesquisa.

O estudo está de acordo com a Resolução 466/2012, que aprova as diretrizes e normas regulamentadoras para pesquisas envolvendo seres humanos. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade de Caxias do Sul, sob número CAAE 97497518.1.0000.5341.

O tratamento estatístico dos dados foi realizado pelo programa estatístico Statistical Package for Social Sciences versão 21.0 (SPSS Inc., Chicago, EUA) para Windows, e inicialmente os dados foram organizados em planilha eletrônica no programa Microsoft Excel®. As variáveis da marcha analisadas foram velocidade (velocidade do centro de massa medida em metros por segundo); cadência (medida em passos por minuto), comprimento da passada (distância do contato inicial de um pé até o contato inicial seguinte do mesmo pé medida em metros), largura do passo (a distância lateral entre os pés medida em metros), tempo de passada (período de tempo desde o contato inicial de um pé até o contato inicial seguinte do mesmo pé medido em segundos), duplo apoio (período de tempo em que ambos os pés estão em contato com o solo medido em segundos). Os dados foram filtrados com filtro digital recursivo Butterworth de 4ª ordem com corte de 6Hz. As variáveis quantitativas foram descritas em média e desvio padrão/erro padrão e as variáveis categóricas como frequências absolutas e relativas. O teste de Shapiro-Wilk foi utilizado para verificar a distribuição normal. Para comparação de médias entre grupos foi utilizado o teste t-Student. Na comparação de proporções foi utilizado o teste qui-quadrado de Pearson ou o teste exato de Fisher. Para comparação das variáveis segundo tarefa e grupo foi utilizado o modelo de Equações de Estimativas Generalizadas (GEE) complementado pelo teste de Bonferroni. Como critério de decisão, o nível de significância adotado foi de 5% (p<0,05).

RESULTADOS

Os resultados apresentados referem-se a uma amostra de 40 participantes da pesquisa, divididos em grupo fisicamente inativo (n=20) e grupo fisicamente ativo (n=20), sem perdas amostrais. A caracterização da amostra foi estratificada pelos dois grupos e as características antropométricas e dos questionários (MEEM, MoCA e IPAQ) são apresentadas na Tabela 1. Observa-se que não foram verificadas diferenças estatisticamente significativas entre os grupos, tanto na análise das características dos participantes como na análise dos resultados dos questionários cognitivos. Em relação aos valores de IMC, ambos os grupos apresentaram valores médios que os classificam como excesso de peso, segundo a Organização Mundial da Saúde2222 World Health Organization. Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of a World Health Organization Consultation. Geneva: World Health Organization, 2000;284:256. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/42330
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. Porém, no grupo FI, três (15%) participantes se apresentaram com peso normal (entre 18,5 Kg/m² e 24,9 Kg/m²), oito (40%) com excesso de peso (entre 25 Kg/m² e 29,9 Kg/m²), sete (35 %) como obesidade grau I (entre 30 kg/m² e 34,9 kg/m²) e dois (10%) como obesidade grau II (entre 35 kg/m² e 39,9 kg/m²); enquanto o grupo FA apresentou sete (35%) participantes com peso normal, sete (35%) com sobrepeso, quatro (20%) com obesidade grau I e dois (10%) com obesidade grau II. Para classificação da amostra foi utilizado o IPAQ, onde todos os participantes do grupo FI se mostraram irregularmente ativos, ou seja, realizam atividades físicas, mas insuficientes para serem classificados como ativos por não atenderem às recomendações quanto à frequência ou duração. Destes, sete (35%) foram considerados irregularmente ativos A (35%) e treze (65%) irregularmente ativos B. No grupo FA, dois (10%) participantes foram categorizados como muito ativos e dezoito (90%) como ativos.

Tabela 1
Características dos participantes e resultados dos questionários cognitivos (N=40). Caxias do Sul, RS, 2022.

Com relação às variáveis cinemáticas da marcha durante as tarefas simples e duplas, os resultados são apresentados na Tabela 2. Nas comparações entre os grupos, não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas em nenhum parâmetro cinemático analisado, tanto na análise da marcha simples quanto nas tarefas duplas.

Tabela 2
Resultados da análise dos parâmetros cinemáticos da marcha durante a execução de tarefas cognitivas realizadas isoladamente (tarefa simples) e realizadas em associação com a marcha (tarefa dupla) (N=40). Caxias do Sul, RS, 2022.

Na análise intragrupo, onde foi verificado o efeito da dupla tarefa nos parâmetros da marcha, comparando os resultados da tarefa dupla com a tarefa simples da marcha, ambos os grupos apresentaram reduções significativas na velocidade, cadência, largura do passo, tempo de passada e duplo apoio, tanto na dupla tarefa durante a tarefa cognitiva aritmética como na dupla tarefa durante a tarefa de fluência verbal.

DISCUSSÃO

Os resultados analisados demonstraram que nas comparações entre os grupos FI e FA, não houveram diferenças estatisticamente significativas, apesar do grupo FI ter apresentado desempenhos inferiores na análise dos parâmetros cinemáticos da marcha, tanto na tarefa simples da marcha como nas duplas tarefas. Porém, quando os resultados das duplas tarefas são comparados com a tarefa simples da marcha, foram demonstradas diferenças significativas em ambos os grupos e em ambas as tarefas cognitivas na análise da velocidade, cadência, tempo de passada, largura do passo e duplo apoio da marcha. A marcha é uma tarefa chave para a independência funcional e apresenta diversas alterações decorrentes do processo de envelhecimento. No entanto, os parâmetros da marcha foram avaliados enquanto os participantes caminhavam e realizavam uma tarefa cognitiva de maneira simultânea. Esse fato é de maior relevância para a vida cotidiana dos idosos2323 Metzger FG, Ehlis AC, Haeussinger FB, Schneeweiss P, Hudak J, Fallgatter AJ, et al. Functional brain imaging of walking while talking - An fNIRS study. Neuroscience. 2017;343:85–93. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.neuroscience.2016.11.032
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. Além disso, a análise da marcha durante atividades de dupla tarefa pode ser utilizada para monitorar as deteriorações da marcha durante o processo de envelhecimento2424 Ko SU, Jerome GJ, Simonsick EM, Studenski S, Hausdorff JM, Ferrucci L. Differential associations between dual-task walking abilities and usual gait patterns in healthy older adults - Results from the Baltimore Longitudinal Study of Aging. Gait Posture. 2018;63:63–7. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.gaitpost.2018.04.039
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. Nessa direção, o presente estudo teve como objetivo analisar as possíveis diferenças nas variáveis cinemáticas da marcha entre idosos fisicamente inativos e fisicamente ativos durante a realização de atividades de dupla tarefa.

Em ambos os grupos, a análise MEEM demonstrou valores médios acima dos 23 pontos, considerados como valor de corte para diferenciar indivíduos saudáveis de indivíduos que já apresentam danos cognitivos1717 BruckI S, Nitrini R, Caramelli P, Bertolucci P, Okamoto I. Sugestões para o uso do mini-exame do estado mental no Brasil. Arq Neuropsiquiatr. 2003;61:777–81. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0004-282X2003000500014
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. Já a comparação entre os valores médios do MoCA e os normativos revelou que ambos os grupos apresentaram valores médios abaixo dos 26 pontos, considerados ponto de corte para a população brasileira2525 Memória CM, Yassuda MS, Nakano EY, Forlenza O. Brief screening for mild cognitive impairment: validation of the Brazilian version of the Montreal cognitive assessment. Int J Geriatr Psychiatry. 2013;28(1):34–40. Disponível em: https://doi.org/10.1002/gps.3787
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. Isso ocorre porque o MoCA apresenta uma complexidade maior em relação aos seus subtestes e apresenta abordagens mais complexas sobre atenção, funções executivas e habilidades linguísticas e visuoespaciais2525 Memória CM, Yassuda MS, Nakano EY, Forlenza O. Brief screening for mild cognitive impairment: validation of the Brazilian version of the Montreal cognitive assessment. Int J Geriatr Psychiatry. 2013;28(1):34–40. Disponível em: https://doi.org/10.1002/gps.3787
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.

Quanto à influência das atividades de dupla tarefa nos parâmetros da marcha em ambos os grupos, estudos prévios também demonstraram que as atividades de dupla tarefa reduzem a velocidade da marcha de idosos saudáveis2626 Simoni D, Rubbieri G, Baccini M, Rinaldi L, Becheri D, Forconi T, et al. Different motor tasks impact differently on cognitive performance of older persons during dual task tests. Clin Biomech. 2013;28(6):692–6. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.clinbiomech.2013.05.011
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. Outras pesquisas que avaliaram idosos frágeis e idosos com comprometimento cognitivo leve também apresentaram resultados que corroboram com essa afirmativa2727 Beauchet O, Dubost V, Herrmann F, Rabilloud M, Gonthier R, Kressig RW. Relationship between dual-task related gait changes and intrinsic risk factors for falls among transitional frail older adults. Aging Clin Exp Res. 2005;17(4):270–5. Disponível em: https://doi.org/10.1007/BF03324609
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. Os demais parâmetros cinemáticos da marcha também são influenciados pelas atividades duplas em ambos os grupos, com exceção do comprimento da passada. Estudos prévios também demonstraram mudanças significativas na cadência, comprimento da passada, aumento da variabilidade da passada, tempo de duplo apoio e largura do passo de idosos2727 Beauchet O, Dubost V, Herrmann F, Rabilloud M, Gonthier R, Kressig RW. Relationship between dual-task related gait changes and intrinsic risk factors for falls among transitional frail older adults. Aging Clin Exp Res. 2005;17(4):270–5. Disponível em: https://doi.org/10.1007/BF03324609
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,2828 Al-Yahya E, Mahmoud W, Meester D, Esser P, Dawes H. Neural substrates of cognitive motor interference during walking; peripheral and central mechanisms. Front Hum Neurosci. 2019;12(1):536–48. Disponível em: https://doi.org/10.3389/fnhum.2018.00536
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. O efeito da tarefa cognitiva adicional e o aumento da ativação do córtex pré-frontal e motor, demonstra que se utiliza diferentes estratégias para manter a estabilidade dinâmica e que isso depende das demandas da tarefa e das capacidades individuais de cada indivíduo2828 Al-Yahya E, Mahmoud W, Meester D, Esser P, Dawes H. Neural substrates of cognitive motor interference during walking; peripheral and central mechanisms. Front Hum Neurosci. 2019;12(1):536–48. Disponível em: https://doi.org/10.3389/fnhum.2018.00536
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. As alterações da marcha decorrentes da tarefa cognitiva secundária são consideradas preditoras de quedas2727 Beauchet O, Dubost V, Herrmann F, Rabilloud M, Gonthier R, Kressig RW. Relationship between dual-task related gait changes and intrinsic risk factors for falls among transitional frail older adults. Aging Clin Exp Res. 2005;17(4):270–5. Disponível em: https://doi.org/10.1007/BF03324609
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. Além disso, estudos mostraram que a associação de duas ou mais tarefas pode afetar o equilíbrio, promovendo maiores índices de quedas, o que contribui para pior qualidade de vida de idosos2929 Hall CD, Echt KV, Wolf SL, Rogers WA. Cognitive and motor mechanisms underlying older adults’ ability to divide attention while walking. Phys Ther. 2011;91(7):1039–50. Disponível em: https://doi.org/10.2522/ptj.20100114
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Com relação à influência da atividade física nos parâmetros da marcha, o presente estudo não observou diferenças significativas entre participantes fisicamente inativos e ativos, tanto na avaliação da marcha simples como na avaliação da marcha durante as duplas tarefas. Contudo, diferentemente dos presentes resultados, melhores níveis de atividade física estão associados a melhor mobilidade em idosos88 Bull FC, Al-Ansari SS, Biddle S, Borodulin K, Buman MP, Cardon G, et al. World Health Organization 2020 guidelines on physical activity and sedentary behaviour. Br J Sports Med. 2020;54(24):1451–62. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1136/bjsports-2020-102955
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. Além disso, outros parâmetros cinemáticos, como variabilidade do comprimento do passo, tempo do passo, duplo apoio3030 Kovács É, Simon A, Petridisz NA, Erdős RL, Rozs F, Virág A. Gait parameters in physically active and inactive elderly as well as young community-living people. J Sports Med Phys Fitness. 2019;59(7):1162–7. Disponível em: https://doi.org/10.23736/S0022-4707.18.09205-8
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, menor comprimento do passo, menor tempo do passo, menor tempo de balanço e maior cadência3131 Eckstrom E, Neukam S, Kalin L, Wright J. Physical activity and healthy aging. Clin Geriatr Med. 2020;36(4):671–83. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.cger.2020.06.009
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foram associados aos níveis de atividade física. Quando comparamos a influência da dupla tarefa entre idosos ativos e inativos, também não foram observadas diferenças significativas. Muhaidat et al.1212 Muhaidat J, Al-Yahya E, Mohammad MT, Qutishat D, Okasheh R, Al-Khlaifat L, et al. Dual-tasking in older women: physical activity or else? J Women Aging. 2022;34(1):101–11. Disponível em: https://doi.org/10.1080/08952841.2020.1819177
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avaliaram 120 mulheres idosas e também não identificaram relação entre nível de atividade física e melhores parâmetros de marcha durante atividades duplas. Contudo, Gomes et al.1313 Gomes CS, Carvalho MT, Coelho VHM, de Walsh IAP, Martins LJP, Nogueira CM, et al. Relações entre sedentarismo e mobilidade com e sem dupla tarefa em idosos usuários da atenção básica em saúde. Estud Interdiscip Envelhec. 2021; 26(1):217–23. Disponível em: https://doi.org/10.22456/2316-2171.96876
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destacam que idosos inativos têm maior probabilidade de apresentar comprometimento do desempenho da marcha durante atividades de dupla tarefa. Dessa forma, está bem estabelecido em diversas publicações que a prática regular de exercícios físicos proporciona aos idosos maior segurança nas atividades de vida diária, melhor equilíbrio e maior velocidade de marcha, reduzindo o risco de quedas99 Hayes L, Burtscher M, Elliott B. Editorial: Exercise as a countermeasure to human aging, volume II. Front Physiol. 2022;13:1–3. Disponível em: https://doi.org/10.3389/fphys.2022.878983
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. Além disso, a importância da atividade física em idosos é essencial para melhorar a qualidade de vida e prevenir doenças relacionadas ao avanço da idade99 Hayes L, Burtscher M, Elliott B. Editorial: Exercise as a countermeasure to human aging, volume II. Front Physiol. 2022;13:1–3. Disponível em: https://doi.org/10.3389/fphys.2022.878983
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,1010 Stillman CM, Esteban-Cornejo I, Brown B, Bender CM, Erickson KI. Effects of exercise on brain and cognition across age groups and health states. Trends Neurosc. 2020;43(7):533–43. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.tins.2020.04.010
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.

Sabe-se que a atividade física regular é um componente importante do envelhecimento saudável3131 Eckstrom E, Neukam S, Kalin L, Wright J. Physical activity and healthy aging. Clin Geriatr Med. 2020;36(4):671–83. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.cger.2020.06.009
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. Apesar da importância da atividade física nos idosos já estar muito bem descrita na literatura científica, o presente estudo não foi capaz de demonstrar a interferência da atividade física nos parâmetros cinemáticos da marcha durante atividades de dupla tarefa.

No entanto, algumas limitações precisam ser destacadas. Primeiramente, o presente estudo se caracteriza como um estudo quase-experimental, que apresenta um nível de evidência inferior quando comparado a um estudo com longitudinal. Em segundo lugar, apesar do fato de existirem muitos estudos relacionados às atividades de dupla tarefa, a maneira como estas atividades duplas são avaliadas são muito heterogêneas, o que dificulta a análise e comparação dos dados. Outro aspecto que pode ter influenciado os resultados é que os idosos foram classificados por meio do IPAQ. Apesar do IPAQ ser um dos instrumentos mais utilizados em pesquisa, esse é um questionário autoadministrado no qual os participantes relataram seus níveis de atividade física durante a semana anterior.

CONCLUSÃO

Esta pesquisa demonstrou que as atividades de dupla tarefa tiveram influência negativa nos parâmetros da marcha de idosos. No entanto, os resultados não confirmaram a hipótese de que as duplas tarefas teriam menor influência na marcha dos idosos fisicamente ativos quando comparado aos fisicamente inativos. Embora os idosos ativos tenham apresentado menores declínios nos parâmetros cinemáticos da marcha em comparação aos idosos inativos, a prática de atividade física não pôde ser considerada um fator que minimizasse os efeitos das duplas tarefas na marcha dos idosos participantes desse estudo. Acreditamos que esse fato ocorreu pela média de idade dos participantes, que, apesar de serem idosos, são considerados idosos jovens e também pelo grau de dificuldade das tarefas cognitivas utilizadas, uma vez que a complexidade da interferência cognitiva envolve maiores demandas concorrentes.

A importância do presente estudo é destacada pelo elevado número de estudos atuais que investigam os efeitos da dupla tarefa no desempenho da marcha, o que reflete sua importância da área de pesquisa e suas potenciais aplicações clínicas. Em perspectivas futuras, são necessários mais estudos que relacionem a prática de atividade física com a marcha associada à dupla tarefa, para fornecer mais evidências científicas. Tendo em vista o rápido crescimento da população idosa, espera-se que os resultados desta pesquisa possam ampliar a compreensão das atividades de dupla tarefa, de modo a qualificar os profissionais, bem como auxiliar os pesquisadores na criação de estratégias que permitam minimizar os efeitos do envelhecimento.

  • Financiamento da pesquisa: Programa de apoio a pós graduação (PROAP) (Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre - UFCSPA).

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Editado por

Editado por: Marquiony Marques dos Santos

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    19 Jun 2023
  • Aceito
    26 Set 2023
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