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Relação entre aptidão aeróbia e capacidade de sprints repetidos no futebol: efeito do protocolo

Relationship between aerobic fitness and repeated sprint ability in soccer: protocol effect

Resumos

O objetivo do estudo foi investigar a associação entre variáveis fisiológicas relacionadas à aptidão aeróbia determinadas de forma contínua em corrida na esteira (pico de velocidade da esteira: PV EST, consumo máximo de oxigênio: VO2max, velocidade correspondente ao VO2max: vVO2max e velocidade referente ao limiar anaeróbio: vLAn) e intermitente com mudança de sentido (pico de velocidade: PV) com a capacidade de sprints repetidos (CSR) em jogadores de futebol. Vinte e nove atletas (17,9 ± 1,0 anos; 178,7 ± 5,2 cm; 73,6 ± 6,7 kg; 11,1 ± 1,3 % gordura) realizaram, em dias diferentes, os seguintes testes: 1) protocolo incremental na esteira rolante para determinar o PV EST, o VO2max, a vVO2max e a vLAn; 2) teste incremental de corrida intermitente (TCar) para determinar o PV e 3) teste de Bangsbo para avaliar a CSR e determinar o tempo médio (TM), melhor tempo (MT) e índice de fadiga (IF). Foi realizada a correlação linear de Pearson, adotando-se o valor de p<0,05 para significância. O PV obtido no TCar apresentou maior correlação com o TM e o MT (r = -0,70, p<0,01; r= -0,51, p<0,01, respectivamente) do teste de CSR, que a vVO2max (r = -0,43, p<0,05; r= -0,14 p>0,05) e o PV EST (r= -0,42, p<0,05; r=-0,14, p>0,05) determinados no modelo de corrida em linha reta na esteira. Pode-se concluir que a relação entre aptidão aeróbia e CSR é dependente do tipo de protocolo utilizado (contínuo em linha reta vs intermitente com mudança de sentido) e da variável aeróbia utilizada (capacidade vs potência).

Aptidão aeróbia; Capacidade de sprints repetidos; Futebol; Variáveis fisiológicas


The aim of this study was to evaluate the association between physiological variables related to physical fitness determined by continuous straight running on a treadmill (peak velocity on treadmill: PV TRE, maximum oxygen uptake: VO2max, minimum velocity needed to reach VO2max: vVO2max, and velocity at the anaerobic threshold: vAT) and intermittent running with directional changes (peak velocity: PV) and repeated sprint ability (RSA) in soccer players. Twenty-nine athletes (17.9 ± 1.0 years, 178.7 ± 5.2 cm, 73.6 ± 6.7 kg, and 11.1 ± 1.3% body fat) performed the following tests on different days: 1) incremental protocol on a treadmill to determine PV TRE, VO2max, vVO2max, and vAT; 2) incremental intermittent running test to determine PV, and 3) Bangsbo test to evaluate RSA and to determine the mean time (MT), fastest time (FT), and fatigue index (FI). Pearson's correlation coefficient was used and a level of significance of 5% was adopted. PV obtained in the intermittent running test showed a higher correlation with MT and FT of the RSA test (r = -0.70, p < 0.01; r = -0.51, p < 0.01, respectively) than vVO2max (r = -0.43, p < 0.05; r = -0.14 p > 0.05) and PV TRE (r = -0.42, p < 0.05; r =-0.14, p > 0.05) determined by straight running on a treadmill. In conclusion, the relationship between physical fitness and RSA depends on the type of protocol (continuous line running vs. intermittent with directional changes) and the aerobic index used (capacity vs. power).

Physical fitness; Repeated sprint ability; Soccer; Physiological variables


ARTIGO ORIGINAL

DOI: 10.5007/1980-0037.2011v13n2p111

Relação entre aptidão aeróbia e capacidade de sprints repetidos no futebol: efeito do protocolo

Relationship between aerobic fitness and repeated sprint ability in soccer: protocol effect

Juliano Fernandes da Silva; Luiz Guilherme Antonacci Guglielmo; Naiandra Dittrich; Leandro Teixeira Floriano; Francimara Budal Arins

Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Desportos. Laboratório de Esforço Físico. Florianópolis, SC, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Juliano Fernandes da Silva Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Desportos - Laboratório de Esforço Físico Campus Universitário da Trindade, s/n CEP: 88040-900 Florianópolis (SC) Brasil E-mail: jufesi23@yahoo.com.br

RESUMO

O objetivo do estudo foi investigar a associação entre variáveis fisiológicas relacionadas à aptidão aeróbia determinadas de forma contínua em corrida na esteira (pico de velocidade da esteira: PVEST, consumo máximo de oxigênio: VO2max, velocidade correspondente ao VO2max: vVO2max e velocidade referente ao limiar anaeróbio: vLAn) e intermitente com mudança de sentido (pico de velocidade: PV) com a capacidade de sprints repetidos (CSR) em jogadores de futebol. Vinte e nove atletas (17,9 ± 1,0 anos; 178,7 ± 5,2 cm; 73,6 ± 6,7 kg; 11,1 ± 1,3 % gordura) realizaram, em dias diferentes, os seguintes testes: 1) protocolo incremental na esteira rolante para determinar o PVEST, o VO2max, a vVO2max e a vLAn; 2) teste incremental de corrida intermitente (TCar) para determinar o PV e 3) teste de Bangsbo para avaliar a CSR e determinar o tempo médio (TM), melhor tempo (MT) e índice de fadiga (IF). Foi realizada a correlação linear de Pearson, adotando-se o valor de p<0,05 para significância. O PV obtido no TCar apresentou maior correlação com o TM e o MT (r = -0,70, p<0,01; r= -0,51, p<0,01, respectivamente) do teste de CSR, que a vVO2max (r = -0,43, p<0,05; r= -0,14 p>0,05) e o PVEST (r= -0,42, p<0,05; r=-0,14, p>0,05) determinados no modelo de corrida em linha reta na esteira. Pode-se concluir que a relação entre aptidão aeróbia e CSR é dependente do tipo de protocolo utilizado (contínuo em linha reta vs intermitente com mudança de sentido) e da variável aeróbia utilizada (capacidade vs potência).

Palavras-chave: Aptidão aeróbia; Capacidade de sprints repetidos; Futebol; Variáveis fisiológicas.

ABSTRACT

The aim of this study was to evaluate the association between physiological variables related to physical fitness determined by continuous straight running on a treadmill (peak velocity on treadmill: PVTRE, maximum oxygen uptake: VO2max, minimum velocity needed to reach VO2max: vVO2max, and velocity at the anaerobic threshold: vAT) and intermittent running with directional changes (peak velocity: PV) and repeated sprint ability (RSA) in soccer players. Twenty-nine athletes (17.9 ± 1.0 years, 178.7 ± 5.2 cm, 73.6 ± 6.7 kg, and 11.1 ± 1.3% body fat) performed the following tests on different days: 1) incremental protocol on a treadmill to determine PVTRE, VO2max, vVO2max, and vAT; 2) incremental intermittent running test to determine PV, and 3) Bangsbo test to evaluate RSA and to determine the mean time (MT), fastest time (FT), and fatigue index (FI). Pearson's correlation coefficient was used and a level of significance of 5% was adopted. PV obtained in the intermittent running test showed a higher correlation with MT and FT of the RSA test (r = -0.70, p < 0.01; r = -0.51, p < 0.01, respectively) than vVO2max (r = -0.43, p < 0.05; r = -0.14 p > 0.05) and PVTRE (r = -0.42, p < 0.05; r =-0.14, p > 0.05) determined by straight running on a treadmill. In conclusion, the relationship between physical fitness and RSA depends on the type of protocol (continuous line running vs. intermittent with directional changes) and the aerobic index used (capacity vs. power).

Key words: Physical fitness; Repeated sprint ability; Soccer; Physiological variables.

INTRODUÇÃO

O futebol é considerado um esporte complexo, visto que o desempenho depende de um alto nível técnico, tático, físico e psicológico. Entretanto, apesar da importância da técnica e tática, as adaptações físicas são frequentemente enfatizadas nos treinamentos, pois tal progresso busca aprimoramentos anatômicos, funcionais, biomecânicos e fisiológicos específicas ao futebol1. No entanto, para um melhor delineamento dos programas de treinamento é importante o conhecimento da caracterização fisiológica da modalidade2, assim como, verificar quais índices fisiológicos melhor se correlacionam com o desempenho dos atletas3.

Estudos recentes têm destacado a potência aeróbia (consumo máximo de oxigênio: VO2max e velocidade correspondente ao VO2max: vVO2max), a velocidade referente ao limiar anaeróbio (vLAn) e a capacidade de sprints repetidos (CSR) como componentes da aptidão física do jogador de futebol1,4,5. A importância destas variáveis foi confirmada por Rampinini et al.5, que reportaram significantes correlações entre o pico de velocidade (PV) obtido no teste de aptidão aeróbia Montreal University Track Test adaptado e a CSR, com a distância percorrida em alta intensidade (> 19,8 Km.h-1) por jogadores de futebol durante a partida. Além disso, Helgerud et al.4 observaram melhorias no desempenho de jogadores de futebol, avaliados pelo número de sprints e pelo número de envolvimentos com bola, após a implementação de um programa de treinamento de potência aeróbia de oito semanas.

Vários testes têm sido propostos com o objetivo de aumentar a especificidade das avaliações que mensuram o PV em esportes intermitentes6,7, reproduzindo o padrão motor das modalidades. Tais testes permitem avaliar um elevado número de atletas simultaneamente, aumentam a motivação dos avaliados, apresentam baixo custo e ainda são de fácil aplicação7,8.

Em protocolos contínuos, o PV está associado com a velocidade do consumo máximo de oxigênio (vVO2max); entretanto, é importante ressaltar que em testes intermitentes este índice fisiológico também é influenciado pela capacidade e potência anaeróbia e capacidade neuromuscular para correr em altas velocidades9.

Desta forma, a contribuição da CSR e da aptidão aeróbia para o desempenho no futebol está bem descrita na literatura1,4,5. Entretanto, ainda são conflitantes os achados acerca da relação entre aptidão aeróbia e CSR. Tomlin e Wenger10, em uma revisão sobre CSR e aptidão aeróbia, reportaram que existe uma associação entre as variáveis; contudo, os autores também afirmaram que esta relação pode não ser causa efeito. Aziz et al.11 reportaram uma correlação moderada (r= -0,346, p<0,05) entre o VO2max e CSR (tempo total dos sprints) (8 x 40-m sprints com 30 s de recuperação entre os sprints). Porém, utilizando um diferente teste de CSR (6 x 20-m sprints com 20 s de recuperação entre os sprints), Aziz et al.12 não encontraram relação entre o VO2max e o desempenho no teste de CSR utilizado. É importante enfatizar que a idade e o nível de treinamento dos atletas nos dois estudos eram diferentes, além de ambos os estudos utilizarem testes incrementais com características continuas, fatores estes que podem ter influenciado os resultados da comparação.

Tendo em vista que exercícios com mudança de sentido exigem uma frenagem, seguida de uma aceleração, verifica-se que a força e a resistência muscular dos membros inferiores também são passíveis de serem aumentadas neste modelo de esforço. Assim, em comparação com protocolos que utilizam corrida em linha reta, os exercícios com mudança de sentido poderiam apresentar uma demanda aeróbia maior dos membros inferiores13,14. Desta forma, parece existir uma lacuna na literatura sobre a relação de indicadores anaeróbios com variáveis aeróbias determinados em diferentes modelos de corrida (contínua em linha reta vs intermitente com mudança de sentido).Tais achados poderão contribuir para o delineamento dos modelos de treino que visam combinar treinamento aeróbio e CSR para atletas de futebol.

Assim, o objetivo do presente estudo foi investigar a associação entre variáveis fisiológicas relacionadas à aptidão aeróbia determinadas de forma contínua em corrida na esteira (PV, vVO2max, VO2max) e intermitente com mudança de sentido (PV) com a CSR (tempo médio, melhor tempo, índice de fadiga) em jogadores de futebol de elite.

A hipótese do presente estudo é que o PV determinado no teste incremental de corrida intermitente (TCar) apresenta maior correlação com a CSR que os índices determinados no modelo sem mudança de sentido (vVO2max, VO2max e PV), visto que as corridas com mudança de sentido apresentam respostas fisiológicas e neuromusculares que, em tese, assemelham-se mais às corridas de protocolos de CSR que as corridas contínuas em linha reta.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Sujeitos

Vinte e nove jogadores de futebol treinados (17,9 ± 1,0 anos; 178,7 ± 5,2 cm; 73,6 ± 6,7 kg; 11,1 ± 1,3 % gordura) de duas equipes de nível nacional (A, B) participaram do estudo. A equipe A (n=15) foi campeã da categoria (taça júnior) dois meses antes do estudo, enquanto que a equipe B (n=14) também estava entre as melhores do país na categoria. O termo de consentimento informado foi assinado por todos os atletas, após uma breve explicação detalhada sobre os principais objetivos, benefícios e riscos que envolviam esta investigação. Os participantes foram informados de que estavam livres para se retirar do estudo a qualquer momento sem penalidade. Todos os procedimentos foram aprovados pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Santa Catarina (protocolo-384/07).

Capacidade de Sprints Repetidos (CSR)

Previamente ao teste de CSR, cada atleta realizou um período de quinze minutos de alongamento e aquecimento, seguido por cinco minutos de repouso. O teste de CSR envolveu sete sprints máximos de 34,2 m15. Em cada sprint foram realizadas três mudanças de sentido e um período de recuperação de 25 segundos, enquanto o atleta se posicionava para um novo sprint. O tempo de cada sprint foi mensurado por meio do sistema de fotocélulas (CEFISE® - Speed Test 6.0).

As seguintes variáveis foram derivadas do teste de CSR:

Melhor tempo (MT): O melhor tempo do atleta nos sete sprints;

Tempo médio (TM): A média de tempo dos sete sprints;

Índice de fadiga (IF):

Teste de laboratório

Para a determinação do VO2max, IVO2max, vLAn, e PV, foi realizado um protoloco incremental em esteira ergométrica (Imbramed Millenium Super ATL, 10.200, Brazil). A velocidade inicial foi 9,0 km.h-1 (1% inclinação) com incrementos de 1,2 km.h-1 a cada 3 minutos até a exaustão voluntária, intercalados com intervalos de 30 s para dosagem do lactato sanguíneo. Durante o teste, cada sujeito foi encorajado verbalmente para realizar o máximo esforço.

O consumo de oxigênio (VO2) foi mensurado respiração a respiração, utilizando-se um analisador de gás, que foi calibrado de acordo com as recomendações do fabricante antes de cada teste (K4b2, Cosmed, Rome, Italy). Os dados foram reduzidos às médias de 15 segundos e o VO2max foi considerado como sendo o maior valor nestes intervalos de 15 s. O VO2max foi definido pelos critérios propostos por Taylor et al.16 e Lacour et al. 6 A vVO2max foi considerada como sendo a menor intensidade de exercício na qual ocorreu o VO2max. A vLAn foi determinada como a intensidade correspondente à concentração fixa de 3,5 mmol.L-1, a qual apresenta correlação (r=0.80, p<0.05) com a máxima fase estável de lactato (MLSS)17.

Teste de Carminatti (Tcar)

Os atletas foram submetidos a um teste incremental máximo, com multi estágios de 90 segundos de duração, em sistema "ida-e-volta", constituído de 5 repetições de 12 segundos de corrida (distância variável), intercaladas por 6 segundos de caminhada (± 5 metros). O ritmo foi ditado por um sinal sonoro (bip), em intervalos regulares de 6 segundos, que determinam a velocidade de corrida a ser desenvolvida nos deslocamentos entre as linhas paralelas demarcadas no solo e também sinalizadas por cones.

A velocidade inicial foi de 9,0 km·h-1 (15 m distância inicial), com incrementos de 0,6 km·h-1 a cada estágio, até a exaustão voluntária, mediante aumentos sucessivos de 1 m a partir da distância inicial. Quando o atleta foi incapaz de completar o último estágio, a correção do pico de velocidade (PVTCAR) foi baseada na equação de Kuipers et al.18: PV (km.h-1) = v + [(nv/10)*0.6], onde "v" é a velocidade de corrida do último estágio completado, "nv" é o número de voltas no estágio incompleto, "10" é o total de número de voltas (correndo) no estágio e "0,6" é o incremento de velocidade (adaptado Kuipers et al.)18. Quando os sujeitos não alcançavam a linha final duas vezes consecutivas o teste era encerrado.

Análise Estatística

O programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS 13.5 for Windows) foi utilizado para realização da análise estatística. Foi empregada a análise descritiva (média e desvio-padrão) para apresentação dos valores referentes aos testes realizados, seguido do teste de Shapiro-Wilk (n<50) para verificar a normalidade dos dados. A escala de magnitudes proposta por Hopkins19 foi usada para interpretar os coeficientes de correlação: <0,1 = trivial; 0,1-0,29 = pequena; 0,30-0,49 = moderada; 0,50-0,69 = alta; 0,70-0,90 = muito alta; >0,90 = quase perfeita. Foi utilizada correlação linear de Pearson para determinar a relação entre as variáveis aeróbias (PV, PVEST, VO2max, IVO2max, vLAn) com as variáveis do teste de CSR (MT, TM, IF). O nível de significância adotado foi de p<0,05.

RESULTADOS

Os dados descritivos do teste TCar, do protocolo laboratorial em esteira rolante e do teste de CSR estão apresentados na tabela 1.

Os coeficientes de correlação (r) entre a vLAn e os índices determinados no teste de CSR (TM, IF) estão descritos nas figuras 1 e 2.



Na tabela 3, estão apresentadas as associações entre as variáveis referentes à potência aeróbia e os índices do teste de CSR.

DISCUSSÃO

O principal achado deste estudo foi que os índices referentes à CSR (TM, MT) apresentaram maior associação com o PV determinado no modelo intermitente com mudança de sentido (TCar) (r = -0,70, p<0,01; r = -0,51, p<0,01, respectivamente), que com a vVO2max (r = -0,43, p<0,05; r = -0,14 p>0,05) e o PVEST (r = -0,42, p<0,05; r = -0,14, p>0,05) determinados no modelo de corrida em linha reta. Assim, foi possível aceitar a hipótese do nosso estudo, pois o modelo de exercício interfere nas associações entre variáveis de potência aeróbia e CSR, demonstrando que o PV, quando determinado em protocolos intermitentes com mudanças de sentido, é mais fortemente correlacionado com a CSR, que em protocolos contínuos de corrida em linha reta.

Os dados de VO2max dos futebolistas deste estudo estão de acordo com a literatura, que apresenta uma variação de 55 a 68 mL.kg-1.min-12, sendo considerado os valores acima de 60 mL.kg-1.min-1 como mínimo para um elevado desempenho, em nível internacional20. Os atletas que apresentam elevado VO2max, possuem características favoráveis para o desempenho, como aumento nos estoques de glicogênio muscular3, no grau de recuperação21, no número de sprints22, na mobilização e utilização de gorduras, poupando o glicogênio para momentos decisivos das partidas23, além de percorrerem uma maior distância em altas intensidades e apresentarem elevado número de situações de envolvimento com a bola4.

Neste estudo, também, foi determinada a vVO2max, que reflete a combinação entre a potência aeróbia máxima e a economia de movimento. A vVO2max é considerada um importante preditor de desempenho aeróbio e para controle dos efeitos do treinamento 24. Os dados referentes à vVO2max do presente estudo são inferiores aos achados de Santos25, porém superiores aos dados reportados por Stolen, Chamari, Castagna e Wisloff26 para jogadores de futebol. A diferença nos valores encontrados pode estar associada com a faixa etária das amostras, períodos de treinamento, mas, principalmente, aos protocolos utilizados, pois apesar de todos os estudos terem sido realizados no laboratório, o incremento, a duração do estágio e a inclinação da esteira são fatores que interferem no valor da vVO2max26.

É importante ressaltar que a determinação do VO2max e da vVO2max necessita de avaliações individualizadas, aparelhos de alto custo e pessoal especializado. Neste sentido, o PV em testes de campo é um índice de fácil obtenção, elevada validade e reprodutibilidade, e por isso vem sendo utilizado para avaliação da potência aeróbia de futebolistas9. Segundo Ahmaidi et al.8, protocolos incrementais com mudança de sentido tendem a apresentar uma maior solicitação anaeróbia ao final do teste, devido ao fato de acelerar, reduzir a velocidade, parar e mudar de sentido durante o teste, causando deslocamento vertical do centro de massa e menor eficiência da passada8.

De acordo com Buchheit et al.14, os exercícios com mudança de sentido exigem uma frenagem, seguidos por uma aceleração, assim, a importância da força e da resistência muscular dos membros inferiores também é passível de ser aumentada neste modelo de esforço. Desta forma, em comparação com a corrida em linha reta, os exercícios com mudança de sentido tendem a apresentar uma demanda aeróbia maior dos membros inferiores para uma mesma intensidade submáxima de exercício13.

Por outro lado, não foi encontrada associação entre o VO2max e os índices referentes a CSR. O fato de o VO2max ser limitado principalmente por fatores centrais e o modelo utilizado para sua determinação ter sido contínuo em linha reta podem explicar os resultados encontrados, visto que a CSR é determinada principalmente por adaptações periféricas5. Já a vLAn, que está associada principalmente às respostas aeróbias periféricas, apresentou correlação moderada com o TM (r = 0,49, p<0,01). Desta forma, é possível considerar que tanto o tipo de variável aeróbia (capacidade ou potência; central ou periférica) como o modelo de protocolo empregado (com ou sem mudança de sentido), apresentam respostas diferentes no que diz respeito à relação entre aptidão aeróbia e CSR.

Durante exercícios de sprints repetidos, o desempenho pode ser definido como a capacidade de repetir máxima potência após prévio exercício27. A incapacidade de manter o desempenho em sprints repetidos tem sido atribuída principalmente ao acúmulo de metabólitos, tais como o aumento na concentração sanguínea de lactato ([La])28, acúmulo de H+29 e depleção de fosfocreatina muscular30. Entretanto, fatores como mudanças na coordenação neuromuscular da contração muscular também tem sido relacionadas à fadiga em exercícios de sprints repetidos27.

Outro achado deste estudo foi a alta correlação entre o MT e o PV no TCar (r = -0,51, p<0,01), ratificando que o PV determinado no modelo intermitente com mudança de sentido é influenciado pela capacidade do indivíduo acelerar e alcançar elevada intensidade em curtos espaços. Adicionalmente, não foi encontrada correlação entre o MT e os indicadores de potência aeróbia no protocolo contínuo de laboratório (PVEST, VO2max e vVO2max). Este fato suporta que as características intermitentes do TCar permitem avaliar aspectos anaeróbios, devido a sua relação com o MT e o TM.

Aziz et al.11, ao estudarem a relação do VO2max determinado em protocolo contínuo em esteira com o MT (8 X 40 m, 30 s recuperação) em teste de CSR, não encontraram correlação significante, corroborando nossos achados. A ausência de correlação entre o VO2max e o MT sustenta a ideia que o VO2max não tem impacto significativo sobre o desempenho em sprints curtos (<@ 6 s)11, 30.

O índice de fadiga no teste de CSR apresentou correlação moderada com o VO2max (r = -0,39, p<0,01), e grande com a vVO2max (r = -0,52, p<0,01) e o PVEST (r = -0,52, p<0,01), sugerindo que a queda de desempenho em sprints repetidos em modelos de esforço como o utilizado no presente estudo é influenciada pela aptidão aeróbia11.

CONCLUSÕES

De acordo com os achados do presente estudo, conclui-se que a relação entre aptidão aeróbia e CSR é dependente do tipo de protocolo utilizado (contínuo em linha reta vs intermitente com mudança de sentido), assim como, da variável aeróbia utilizada (capacidade vs potência), proporcionando importantes implicações para o delineamento dos modelos de treino que visam combinar treinamento aeróbio com os de CSR.

Recebido em 14/06/10

Revisado em 15/09/10

Aprovado em 21/10/10

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  • Endereço para correspondência:
    Juliano Fernandes da Silva
    Universidade Federal de Santa Catarina
    Centro de Desportos - Laboratório de Esforço Físico
    Campus Universitário da Trindade, s/n
    CEP: 88040-900 Florianópolis (SC) Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Jul 2011
    • Data do Fascículo
      Abr 2011

    Histórico

    • Recebido
      14 Jun 2010
    • Revisado
      15 Set 2010
    • Aceito
      21 Out 2010
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