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Talk test como método para controle da intensidade de exercício

Talk test as method to control exercise intensity

Resumos

O Talk Test ou limiar de conversação é um método simples e não-invasivo para controle da intensidade de exercício. O pressuposto básico de tal método é que, em determinadas intensidades de exercício, o indivíduo não pode mais manter uma conversa confortável e que a ventilação e outras respostas fisiológicas estão associadas a essa inabilidade. Com isso, alguns limiares de transição fisiológica (LTF) podem ser determinados de maneira indireta através da dificuldade na fala. Estudos passaram a explorar esta alternativa, investigando a sua relação com variáveis fisiológicas e psicofísicas, bem como evidências de validade de aplicação para várias populações, principalmente, nas últimas duas décadas, quando se nota crescente atenção da comunidade científica. O objetivo desta revisão é trazer informações relevantes sobre os estudos que utilizaram o Talk Test como estimativa de limiares de transição fisiológica e intensidades de esforço em distintas populações. São apresentados aspectos como o controle fisiológico da fala em repouso e durante o exercício, contextualização do limiar de conversação, delineamentos metodológicos utilizados e as relações entre o Talk Test e os limiares de transição fisiológica. A revisão foi feita a partir de buscas de artigos referentes ao tópico na base de dados Medline, Lilacs e Sportsdiscuss, sendo complementado com a produção recente de nosso grupo de pesquisa. Conclui-se que o Talk Test pode predizer limiares fisiológicos e delimitar zonas de segurança para exercício aeróbio para diversas populações. No entanto, necessita-se de estudos que aprimorem o protocolo de fala para a comparação e associação com outras variáveis fisiológicas e psicofísicas.

Exercício aeróbio; Limiar anaeróbio; Teste de esforço


The Talk Test (TT) or conversation threshold is a simple and subjective method used to control exercise intensity by a no invasive manner. The basis of this method is that, for many exercise intensities, subjects are not able to maintain comfortable speech and ventilation and other physiological responses are associated to this inability. Thus, some physiological transition thresholds (LTF) can be predicted indirectly by speech difficult. Several studies have explored this alternative by investigating its relationship to physiological and psychophysical variables and evidence of validity for application in distinct populations. It occurred mainly at the 2 last decades which great attention have been given by the scientific community. The aim of this review is to make a discussion about the studies which used the Talk Test to estimate physiological transition thresholds and effort intensities in distinct populations. We present some aspects, such as physiological mechanisms of speech control during exercise, the context of talk test, the methodological alternatives applied, the hypothetical relationship between the talk test and physiological transition thresholds. The search for scientific articles related to this topic was done at the Medline, Lilacs e SportDiscus databases, and by the last studies from our research group. In conclusion, speech production difficult can predict physiological thresholds and identify target zones to aerobic exercise for many populations. However, further studies have to improve the speech protocol for comparison to other physiological and psychophysical variables.

Aerobic exercise; Anaerobic threshold; Exercise test


ARTIGO DE REVISÃO

Talk test como método para controle da intensidade de exercício

Talk test as method to control exercise intensity

Leonardo De LuccaI; Guilherme Weiss FrecciaI; Adriano Eduardo Lima e SilvaII; Fernando Roberto de OliveiraIII

IUniversidade do Estado de Santa Catarina. Centro de Ciências da Saúde e do Esporte. Florianópolis, SC. Brasil

IIUniversidade Federal de Alagoas. Grupo de Pesquisas em Ciências do Esporte. Maceió, AL. Brasil

IIIUniversidade Federal de Lavras. Departamento de Educação Física. Lavras, MG. Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Leonardo de Lucca Universidade do Estado de Santa Catarina Centro de Ciências da Saúde e do Esporte. Rua Pascoal Simone, 358, Coqueiros 88080-350 - Florianópolis, SC. E-mail: leodelucca85@hotmail.com

RESUMO

O Talk Test ou limiar de conversação é um método simples e não-invasivo para controle da intensidade de exercício. O pressuposto básico de tal método é que, em determinadas intensidades de exercício, o indivíduo não pode mais manter uma conversa confortável e que a ventilação e outras respostas fisiológicas estão associadas a essa inabilidade. Com isso, alguns limiares de transição fisiológica (LTF) podem ser determinados de maneira indireta através da dificuldade na fala. Estudos passaram a explorar esta alternativa, investigando a sua relação com variáveis fisiológicas e psicofísicas, bem como evidências de validade de aplicação para várias populações, principalmente, nas últimas duas décadas, quando se nota crescente atenção da comunidade científica. O objetivo desta revisão é trazer informações relevantes sobre os estudos que utilizaram o Talk Test como estimativa de limiares de transição fisiológica e intensidades de esforço em distintas populações. São apresentados aspectos como o controle fisiológico da fala em repouso e durante o exercício, contextualização do limiar de conversação, delineamentos metodológicos utilizados e as relações entre o Talk Test e os limiares de transição fisiológica. A revisão foi feita a partir de buscas de artigos referentes ao tópico na base de dados Medline, Lilacs e Sportsdiscuss, sendo complementado com a produção recente de nosso grupo de pesquisa. Conclui-se que o Talk Test pode predizer limiares fisiológicos e delimitar zonas de segurança para exercício aeróbio para diversas populações. No entanto, necessita-se de estudos que aprimorem o protocolo de fala para a comparação e associação com outras variáveis fisiológicas e psicofísicas.

Palavras-chave: Exercício aeróbio; Limiar anaeróbio; Teste de esforço.

ABSTRACT

The Talk Test (TT) or conversation threshold is a simple and subjective method used to control exercise intensity by a no invasive manner. The basis of this method is that, for many exercise intensities, subjects are not able to maintain comfortable speech and ventilation and other physiological responses are associated to this inability. Thus, some physiological transition thresholds (LTF) can be predicted indirectly by speech difficult. Several studies have explored this alternative by investigating its relationship to physiological and psychophysical variables and evidence of validity for application in distinct populations. It occurred mainly at the 2 last decades which great attention have been given by the scientific community. The aim of this review is to make a discussion about the studies which used the Talk Test to estimate physiological transition thresholds and effort intensities in distinct populations. We present some aspects, such as physiological mechanisms of speech control during exercise, the context of talk test, the methodological alternatives applied, the hypothetical relationship between the talk test and physiological transition thresholds. The search for scientific articles related to this topic was done at the Medline, Lilacs e SportDiscus databases, and by the last studies from our research group. In conclusion, speech production difficult can predict physiological thresholds and identify target zones to aerobic exercise for many populations. However, further studies have to improve the speech protocol for comparison to other physiological and psychophysical variables.

Key words: Aerobic exercise; Anaerobic threshold; Exercise test.

INTRODUÇÃO

A prescrição de exercício para indivíduos saudáveis e portadores de patologias cardiovasculares e metabólicas é baseada em diversas variáveis. Em geral, a base para a determinação das intensidades de exercício são oriundas de faixas, com percentuais fixos do consumo máximo de oxigênio (%VO2máx), da frequência cardíaca máxima (%FCmáx), da frequência cardíaca de reserva (%FCR) e do consumo de oxigênio de reserva (%VO2R), dos limiares metabólicos e da intensidade correspondente ao VO2máx (iVO2máx)1.

Neste contexto, a frequência cardíaca (FC) é muito aplicada na estimativa da intensidade do exercício, baseado na sua relação linear, em faixas intermediárias, com o consumo de oxigênio (VO2)2. As recomendações do American College of Sports Medicine (ACSM) para a melhora na aptidão cardiorrespiratória consistem de intensidades entre moderadas e intensas, de 55 a 90% da FCmáx ou 40 a 85% da FCR3. Embora o uso da FC para monitorar a intensidade de exercício seja muito prático, algumas dificuldades desse método têm sido notadas.

Na ausência de um cardiofrequêncímetro são encontradas dificuldades na determinação precisa da FC a partir da palpação da frequência de pulso4. Alguns estudos ressaltaram que muitos sujeitos tiveram dificuldades em palpar o pulso ou em temporizar a contagem de pulso adequadamente, o que poderia causar um erro de mensuração4,5. Borg6 sugeriu que os sujeitos que usam a FC para monitorar a intensidade de exercício podem ter uma preocupação excessiva durante a prática, devido ao estresse adicional para manter-se dentro dos limites de zona alvo. Essa preocupação e sucessivas pausas na atividade podem ainda ter um efeito negativo no aproveitamento e aderência à atividade. O uso do cardiofrequencímetro poderia eliminar problemas associados à palpação e prover um meio alternativo para estimar a intensidade de exercício. Entretanto, muitos indivíduos podem interpretar a necessidade de utilizar um dispositivo durante a prática como algo não confortável e a despesa adicional com o aparelho ser uma barreira para início e/ou manutenção da prática de exercícios físicos.

Como alternativa, foi proposto um método subjetivo para controle da intensidade de exercícios baseado na dificuldade de fala denominado Talk Test (TT) ou teste da conversa7. Nas últimas duas décadas, esse método vem ganhando aderência e atenção na comunidade científica. Alguns pesquisadores passaram a explorar esta alternativa investigando a sua relação com variáveis fisiológicas e psicofísicas7-11 assim como evidências de validade de aplicação para várias populações.

O pressuposto básico de tal método é que, em determinadas intensidades de exercício, o indivíduo não pode mais manter uma conversa confortável sendo que a ventilação e outras respostas fisiológicas estão associadas a essa dificuldade8,11-14. Com isso, alguns limiares de transição fisiológica (LTF) podem ser determinados de maneira indireta.

O objetivo desta revisão é discutir os achados referentes ao TT, na literatura, através de tópicos específicos como o controle da intensidade de exercícios, a metodologia utilizada nos estudos e as populações nas quais o método foi aplicado Para tal, buscaram-se estudos nas bases de dados Medline, Lilacs e SportDiscus através de combinações dos termos Talk Test, Exercise Intensity, Speech Physiology. Dessa forma, foram selecionados estudos que abordam o TT, bem como outras referências que, de alguma forma, complementam a revisão.

MODELO TEÓRICO DO LIMIAR DE CONVERSAÇÃO

A intensidade de exercício na qual a fala começa a ficar prejudicada estaria associada ao comportamento de algumas variáveis fisiológicas como a ventilação (VE)7,13-16, FC17-19 Percepção Subjetiva de Esforço (PSE)12,19 e lactato sanguíneo [La]11.

Utilizando o Limiar Ventilatório (LV) como referência, foi observado que: a) a fase positiva – intensidade na qual a fala ainda é confortável - consiste numa intensidade recomendável para exercício abaixo do LV; b) o último estágio no qual o sujeito tinha dúvida sobre a fala confortável seria correspondente ao LV e; c) o primeiro estágio negativo, ou seja, no qual o avaliado não conseguia mais falar confortavelmente estaria acima de uma zona de segurança recomendável para exercício aeróbio ou acima do LV13-16,18. Para fins didáticos, como já aplicado em estudo recente13, denominamos a fase em que o indivíduo é capaz de conversar confortavelmente como Usim, a última fase em que o indivíduo talvez possa falar como Utalv e a primeira fase em que o indivíduo não consegue falar normalmente como PN.

O modelo teórico do TT é sustentado pelas mudanças que ocorrem a partir do primeiro Limiar Ventilatório (LV1), dado pela perda da eficiência ventilatória e incremento preferencial da frequência ventilatória para aumentar o VO220. O incremento da VE pode dificultar a manutenção de uma conversa confortável durante o exercício13, sendo esta a razão dos LV serem as variáveis mais utilizadas para relacionar e explicar os momentos de transição do TT. Com o aumento na intensidade de exercício, o metabolismo anaeróbio passa a contribuir cada vez mais para a produção de energia e a manutenção do pH sanguíneo via tamponamento começa a entrar em falência21. Essa queda é detectada pelos corpos aórticos e carotídeos gerando um aumento na VE pelos centros respiratórios, o que marca o início da hiperventilação a fim de diminuir a pressão parcial de CO2 (PCO2) venosa e aumentar o pH plasmático21,22. Esse ponto caracteriza-se pela perda da linearidade da curva da ventilação versus VCO­2, conhecido como Ponto de Compensação Respiratória (PCR) ou Limiar Ventilatório 2 (LV2)22.

Dessa forma, os estágios iniciais de percepção de fala prejudicada nos quais os sujeitos ainda conseguem conversar confortavelmente com algumas falhas de vocalização parecem ocorrer em intensidades entre o LV1 e LV2. Já momentos de extrema dificuldade na fala, ocorreriam em intensidades próximas ou acima do LV2, onde a hiperventilação, percepção de dor e outros mecanismos passam a limitar a fonação.

Os estudos aplicando LVs para investigar o TT utilizam apenas a nomenclatura Limiar Ventilatório (LV), o que deixa dúvidas de interpretação quanto a se tratar do LV ou PCR / LV2. De acordo com a literatura e de nosso entendimento, as intensidades relativas ao VO2máx (entre 67 e 80%) correspondentes ao LV relatado em alguns estudos revisados8,13,15,16 são características do LV2. Assim, utilizaremos nesta revisão apenas a terminologia LV referindo-se ao LV2.

As variações do TT relatadas na literatura com indivíduos saudáveis, cardiopatas e treinados empregam diferentes metodologias. Uma estratégia comumente adotada é que os participantes respondam às questões reproduzidas em um aparelho de som enquanto exercitam-se16 e outra, considerada clássica, seria recitar um parágrafo padronizado através de leitura para classificar a sua habilidade para conversar confortavelmente com base nos níveis já descritos (Usim, Utalv e PN)13. Dentre os autores que aplicaram a estratégia clássica, destacam-se Persinger et al.13 e Recalde et al.14 que adotaram uma passagem com 31 palavras bastante conhecida da população americana para facilitar a realização do estudo. Dehart-Beverly et al.7 utilizaram uma passagem padrão de 101 palavras que é comumente utilizada na avaliação patológica da fala. Nesses estudos, os sujeitos deveriam recitar a passagem padrão a partir de leitura opcional, em voz alta, em seguida, questionados se eram capazes ou não de recitar o trecho confortavelmente para identificar Usim, Utalv e PN. O quadro 1 apresenta diferentes Métodos de Aplicação do Talk Test e critérios de identificação para a habilidade de conversação.


Persinger et al.13 investigaram a consistência do TT, comparando diferentes modalidades de exercício, nos quais os sujeitos saudáveis se exercitaram na esteira rolante e no cicloergômetro. Em ambas as situações, os valores percentuais de VO2R, VO2máx, FCmáx e FCR no LV não foram diferentes do Utalv. Além disso, esses valores foram correlacionados, o que suporta a validade do TT como uma boa aproximação do LV nos dois ergômetros, além de discriminante da aptidão aeróbia.

Nos estudos de Dehart-Beverly et al.7 e Recalde et al.14 com adultos jovens, não foram encontradas diferenças significantes no VO2, %VO2pico, FC, %FCmáx no LV e no Utalv com correlação significativa entre estes. Esses pesquisadores encontraram diferenças significativas para todos os resultados entre LV e PN, bem como LV e USim. Voelker et al.15 não encontraram diferença significativa entre VO2 no LV e no Usim (p<0,05), com correlação significativa do VO2 no LV com o do Utalv (r=0,51) e PN (r= 0,67) em pacientes com doença cardíaca.

Depois de ter sido demonstrado que o LV precede o limiar de isquemia em pacientes com isquemia induzida pelo esforço23, Cannon et al.17 demonstraram que o TT foi um sinalizador efetivo do limiar de isquemia nesses pacientes. O tempo de exercício, FC e Duplo Produto (DP) no USim foram significativamente menores que os valores correspondentes à primeira evidência eletrocardiográfica de isquemia do miocárdio (EEIM). Já essas mesmas variáveis obtidas no PN foram significativamente maiores que a EEIM. O USim precedeu o limiar de isquemia em 84% dos sujeitos e foi similar a uma intensidade correspondente a 10 batimentos por minuto (bpm) abaixo das primeiras EEIM. Esses achados deram o suporte inicial para o investimento na utilização do método na avaliação e prescrição de exercícios neste tipo de paciente.

Para Cannon et al.17 a falta de habilidade em conversar confortavelmente não foi equivalente à dispnéia. Em seu estudo, todos que realizaram o exercício incremental atingiram o PN do TT sem ter as trocas gasosas afetadas pela dispnéia, sendo que os três sujeitos que terminaram o teste pelo critério de dispnéia já haviam atingido o PN antes da dispnéia.

Portanto, apesar de subjetiva, a dificuldade na produção de fala é perceptível e perece ser confiável, uma vez que esses pacientes puderam distingui-la de um sintoma patológico. Além do mais, esses achados oferecem mais suporte para a hipótese da fala durante o exercício estar relacionada com parâmetros ventilatórios e metabólicos, pois a dispnéia não foi fator limitante para atingir esse suposto limiar fisiológico.

De fato, o TT serviu como estimativa de LTF quando sujeitos foram submetidos a teste progressivo em esteira e cicloergômetro, e delimitou faixas de segurança para exercício aeróbio em diversas populações a partir de intensidade relativas utilizando parâmetros fisiológicos. No entanto, existe a necessidade de investigar outras modalidades de exercício para subsidiar a validade do método, pois os estudos foram realizados somente com corrida e ciclismo e de forma contínua.

CONTROLE DE INTENSIDADE DE EXERCÍCIO A PARTIR DO TALK TEST

O comportamento não-linear do [La] e da VE durante o exercício incremental representa um marcador de intensidades de treinamento muito utilizado para controlar as cargas de atletas de resistência25. Além disso, a identificação da FC dos LTF fornece uma aproximação fácil de ser administrada, pois embora a carga dos limiares modifique com a melhora do condicionamento físico, existe pouca mudança na FC ou PSE26. Os LV são correlacionados com o rendimento de longa duração, considerado uma intensidade efetiva de treinamento, além de conversível a técnicas de monitoramento bem conhecidas como a FC e a PSE.

Com base nessas premissas, Recalde et al.14 observaram que o VO2 no LV não foi diferente do VO2 no USim e também do VO2 no Utalv em triatletas e corredores. O VO2 no PN e PCR foram significativamente diferentes de todos os outros índices, porém não entre si, o que pôde fornecer subsídios para estimar a intensidade dos LV através da dificuldade na fala.

Norman et al.12 idealizaram uma metodologia denominada Talk Test de Contagem (TTC) com já explicado na tabela 2. O percentual do TTC era calculado pelo valor numérico de contagem crescente, identificado em cada intensidade de exercício, divido pelo valor obtido em repouso. Os sujeitos se exercitaram na esteira em uma primeira sessão a 50%, 60%, 75% e 85% da FCR. Na segunda sessão, os sujeitos foram divididos em grupos e cada grupo realizou o exercício em 4 intensidades diferentes baseadas no TT em sequências alternadas. Comparando %FCR, PSE e equivalente metabólico (MET) calculado entre as duas sessões, foram encontradas fortes correlações para cada uma dessas variáveis entre as duas sessões de teste. Em estudo posterior de Norman et al18, os sujeitos realizaram exercício constante a 40, 50, 60, 75 e 85% da FCR e FCmáx preditas pela idade. Os autores encontraram fortes correlações entre o percentual do Talk Test de Contagem (%TTC) representado pela equação (TTC no exercício / TTC em repouso) x 100 e %VO2R, % FCR e PSE. Esses achados indicam que o TTC responde de maneira similar às alterações na intensidade de exercício quando comparado ao VO2R, FCR e PSE e possui validade concorrente como um método para controlar a intensidade de exercício em indivíduos adultos jovens aparentemente saudáveis a partir desses parâmetros.

Rotstein et al.24 idealizaram uma escala contendo 13 níveis de dificuldade desde a fase caracterizada como "nada difícil falar" até "impossível falar", na qual o sujeito deveria escolher o número correspondente para cada estágio do teste e encontraram resultados distintos dos relatados até então neste tópico. Foram realizadas regressões de valores de VO2, FC, VE, todas como percentuais de seus respectivos valores máximos e plotados em função do TT. Essas variáveis tiveram associação forte e estatisticamente significante entre elas, entretanto a variabilidade individual dos valores relativos de VO2, FC e VE foi muito alta. A distribuição dos sujeitos em relação ao seu LV foi muito dispersa ao longo da escala do TT, indicando que não é válido mensurar a intensidade do exercício de acordo com a dificuldade da fala.

Dehart-Beverly et al.7 demonstraram que quando os indivíduos não estavam mais aptos a manter uma conversa confortável durante o exercício, a intensidade do exercício estaria por volta dos 90% da FCmáx e serviria como um indicador de uma intensidade limite para exercício. Esses pesquisadores visualizaram que, no último estágio de dúvida do TT, os sujeitos estavam se exercitando em media a 88% da FCmáx. Persinger et al.13 mostraram valores de 89% em esteira e 82% no cicloergômetro e Volker et al.15 94,8% da FCmáx em cardiopatas, o que suporta a utilização do TT como aproximação de intensidades de exercício aeróbio de maneira simples e sem custos adicionais de acordo com índices fisiológicos estabelecidos previamente.

O TT parece ser sensível ao estado de treinamento, como relatado por Foster et al.8 que manipularam o VO2 através de retirada de volume sanguíneo (diminuição) e 6 semanas de treinamento aeróbio (aumento). Foi demonstrado que tanto o VO2 no LV quanto no USim foram significantemente modificados (diminuição com doação de sangue e aumento com treinamento). Desse modo, tanto o LV quanto o TT podem ser bons índices fisiológicos para prescrição de exercícios, não só pela reprodutibilidade e validade, mas também por apresentarem sensibilidade ao treinamento.

Brawner et al.16 aplicaram o TT em portadores de doença arterial coronariana (DAC). Na primeira etapa do teste, foi determinado o PN, na segunda etapa, os sujeitos se exercitaram em uma pista, na velocidade mais rápida possível de fala confortável. Durante a primeira etapa, os indivíduos alcançaram 60 ± 24% da FCR, enquanto na segunda, 69 ± 26%. Esses valores relativos foram próximos quando foi levado em consideração que na segunda etapa o exercício era mantido por mais tempo de carga constante.

Com o intuito de controlar a intensidade de exercício aeróbio contínuo, Jeans et al10 submeteram 14 sujeitos treinados a 3 corridas de 40 minutos em velocidades correspondentes ao estágio anterior ao USim-1, USim e Primeiro estágio de Dúvida (Talv-1). Foi demonstrado que após 20 minutos de exercício, a FC e %FCmáx foram maiores durante o Talv-1 em comparação ao USim-1 e USim e permaneceram mais altas até o final do exercício. Durante as três atividades, houve aumento significativo da FC e %FCmáx entre o 20o e o 40o minuto. Os escores do TT e da PSE aumentaram significativamente após 20 minutos de exercício na velocidade do Talv-1 em comparação ao USim-1 e USim. Embora tenha ocorrido um desvio para cima dos escores do TT em todas as velocidades, tal que nem todos os sujeitos tinham a fala confortável durante o USim-1 e USim, a magnitude do desvio foi pequena e, portanto, é plausível afirmar que os sujeitos, em geral, estavam falando confortavelmente nestas duas intensidades. Já no Utalv-1 nenhum sujeito conseguiu falar confortavelmente. Assim, foi possível "traduzir" parâmetros derivados de um teste incremental para intensidades absolutas de exercício.

Em outro estudo9 foi evidenciado que a FC durante exercício em estado estável ou treinamento intervalado pode ser mais alta (desvio cardiovascular) que a predita a partir do TT durante o exercício incremental. Os autores ainda sugerem que existe uma "downregulation" da intensidade absoluta de treinamento, em compensação ao desvio das respostas fisiológicas que ocorrem durante o exercício submáximo prolongado. Essa "downregulation" pode ser de ~10% da intensidade ou pelo menos um estágio. Quando os autores assumiram que o Talv-1 aproxima o LV2, a "downregulation" requerida para confirmar que a intensidade absoluta de treinamento está abaixo do LV2 foi de 2 estágios, no caso o USim-110.

Assim, essa estratégia foi útil, pois os resultados da avaliação do exercício submáximo puderam ser utilizados para definir uma intensidade absoluta de treino abaixo do LV, porém sem os requerimentos técnicos de mensuração do LV em laboratório. Dessa forma, percebe-se que o problema de predizer intensidades absolutas de treinamento a partir do LV1, LV2 ou [La] obtidos em teste incremental, reside no fato de haver um atraso nas respostas do método de detecção (padrão de fala ou VE/[La]). Assim, a intensidade absoluta que produz a resposta desejada durante o treinamento é constantemente mais baixa que a intensidade durante o exercício incremental. Os principais achados dos estudos investigando o valor preditivo do TT para variáveis e limiares fisiológicos encontram-se no quadro 2.


LIMITAÇÕES DO TALK TEST

Embora a maioria dos estudos tenha dado suporte para a efetividade do TT em definir um limite superior de intensidade de exercícios, algumas limitações do método ainda persistem. Somente o estudo de Norman et al.18 se preocupou em estabelecer limites inferiores de intensidade relativa mínima para melhora da aptidão física. Os pesquisadores utilizaram o TTC e evidenciaram que o limite inferior referia-se à intensidade na qual o sujeito conseguisse realizar uma contagem correspondente a 50% da contagem máxima em repouso. Ademais, os autores afirmam que 33% do valor de repouso seria o limite superior de intensidade, de acordo com as recomendações do American College Of Sports Medicine.

Apesar dos estudos citados comprovarem a consistência do TT, os resultados apresentados são, ainda, limitados em virtude da metodologia utilizada e das associações com variáveis. Isto ocorre, pois a grande maioria dos estudos envolvendo o TT adota metodologias semelhantes, utilizando protocolos progressivos contínuos em testes laboratoriais. A hipótese prévia implícita é de que a partir do TT seria possível encontrar a faixa de intensidade do máximo estado de equilíbrio, o que dentro do escopo de alguns estudos foi corroborada com a limitação de que, foi utilizado para este fim, o LT2 identificado pela medida dos Limiares de Lactato e LV2. Estes métodos, apesar de serem muito atrativos pelo uso de metodologias já consagradas, são alvo de muitas controvérsias, pois podem não corresponder à máxima fase de equilíbrio.

Ademais, protocolos contendo estágios de 3 minutos foram aplicados na maioria dos estudos, pois entre 3-5 minutos é possível alcançar estados estáveis de FC e VO2. Com isso, as variáveis do TT podem ser limitadas por 3 minutos de intervalo e afetar a resolução temporal da relação com outras variáveis. Assim, os estágios do TT poderiam ser mais precisos com maior variabilidade de intensidades e melhor analisados com as variáveis fisiológicas se o protocolo permitisse um maior número de estágios.

Por fim, para aplicar o TT, os estudos utilizaram um parágrafo que poderiam caracterizar uma passagem longa e provavelmente, mais extensa do que seria comumente falada durante o exercício. Por se tratar de um método subjetivo no qual o sujeito determina o grau de dificuldade da fala, a real situação de comprometimento da vocalização devido a parâmetros ventilatórios talvez não seja bem elucidada. Uma forma menos subjetiva poderia ser a observação por outros avaliadores e de acordo com uma escala de dificuldade previamente elaborada. Outro ponto que deve ser questionado é se realmente os sujeitos recitaram o parágrafo em voz alta. Caso o tom de voz seja baixo, os sujeitos poderiam se exercitar em uma intensidade maior, pois o aumento da frequência ventilatória, que ocorre no LV, interfere no controle ventilatório que é necessário para a vocalização.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A habilidade em poder conversar confortavelmente (último estágio positivo do TT) pode representar intensidades abaixo do segundo limiar de transição (LV2). O sinal de incerteza (estágio de dúvida) pode predizer intensidades entre o LV1 e LV2. A clara inabilidade em conversar confortavelmente é representativa de intensidades acima dos limiares de transição fisiológica e de limites superiores de segurança para exercício aeróbio de acordo com valores relativos à FCmáx e VO2máx.

Para efeitos de aplicação prática, os limiares de transição fisiológica abordados nos estudos aqui revisados, podem ser estimados de maneira simples, sem custos adicionais e equipamentos sofisticados No entanto, estudos demonstram ressalva quanto ao protocolo de exercício e variáveis analisadas. Existe a necessidade de estudos com metodologias melhor delineadas tanto para o protocolo de fala e análise de sua dificuldade quanto para a comparação e associação com outras variáveis fisiológicas (lactato, ventilação, FC), psicofísicas (percepção subjetiva de esforço) e sensibilidade ao treinamento.

Recebido em 24/08/11

Revisado em 30/09/11

Aprovado em 11/10/11

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  • Endereço para correspondência
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Jan 2012
    • Data do Fascículo
      2012

    Histórico

    • Recebido
      24 Ago 2011
    • Aceito
      11 Out 2011
    • Revisado
      30 Set 2011
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