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Mudanças no estilo de vida e na percepção da saúde em estudantes do ensino médio: análise prospectiva do projeto "Saúde na Boa"

Resumos

O estilo de vida pode modificar a percepção da saúde em jovens, porém evidências prospectivas são necessárias. Este estudo analisou a associação entre mudanças no estilo de vida e na percepção da saúde em estudantes. Análise secundária do projeto "Saúde na Boa", com uma amostra de 984 estudantes (14 a 24 anos, 56,9% de meninas), selecionados aleatoriamente, em 20 escolas públicas de Recife e Florianópolis, Brasil. Duas coletas foram realizadas com nove meses de diferença para obter self-reported dados do estilo de vida (prática de atividade física, tempo de TV, hábitos alimentares, consumo de álcool e tabaco, e duração do sono) e da percepção da saúde (ruim, regular, boa, muito boa e excelente). A percepção da saúde foi categorizada em três níveis, considerando as alterações entre os intervalos das coletas: mudou negativamente, manteve ou mudou positivamente. A regressão logística multinominal ajustada foi utilizada, com p<0.05. Após ajuste para variáveis de confusão, aumentar a frequência semanal de deslocamento ativo para escola (odds ratio ajustado [ORa] = 2.06) e de consumo de frutas/suco de frutas (ORa = 1.81), bem como reduzir a frequência mensal de consumo de álcool (ORa = 2.17) estiveram significativamente associados à alterações positivas na percepção da saúde após os nove meses de acompanhamento. O consumo de doces também mostrou associação com a manutenção na percepção da saúde. Em conclusão, evidências prospectivas demonstraram que mudanças do estilo de vida em diferentes componentes parecem ser fundamentais para garantir ou gerar uma percepção positiva da saúde na juventude.

Atividade motora; Estado de saúde; Estudos prospectivos; Jovem; Hábitos alimentares


Lifestyle characteristics can modify the self-rated health of young people, but additional prospective evidence is needed. This study examined the association between changes in lifestyle and self-rated health among students. A secondary analysis of the "Saúde na Boa" project was performed, considering data from 984 students (14-24 years old, 56.9% girls) who were randomly selected from 20 public schools in Recife and Florianopolis, Brazil. Two sets of data 9-months apart were collected, and self-reported data about lifestyle characteristics (physical activity practices, TV watching time, dietary habits, alcohol and tobacco consumption, and sleep time) and self-rated health (poor, fair, good, very good and excellent) were obtained. Differences in self-rated health between collections were categorized as negative changes, stable (no changes) or positive changes. Adjusted multinomial logistic regression analysis was used (p < 0.05). After adjustment for confounding variables, increasing the weekly frequency of active commuting to school (adjusted odds ratio [aOR] = 2.06) and intake of fruits/fruit juice (aOR = 1.81), as well as reducing the monthly frequency of alcohol consumption (aOR = 2.17), was significantly associated with positive changes in self-rated health. Consumption of sweets was also associated with stable self-rated health. In conclusion, our prospective evidence demonstrated that changes in lifestyle characteristics appear to be essential to ensure or generate positive self-rated health in youth.

Eating habits; Health status; Motor activity; Prospective studies; Young


INTRODUÇÃO

Um conceito relativamente antigo da World Health Organization (1946) enfatiza que a saúde não é "meramente a ausência de doenças, mas um estado de completo bem-estar físico, mental e social"11. World Health Organization. Constitution of the world health organization. Proceedings of International Health Conference. 1964; Available from: http://whqlibdoc.who.int/hist/official_records/2e.pdf [2013 out 20].
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. Com base nesta definição, medidas psicológicas como a percepção individual da saúde (i.e., a autoavaliação das pessoas sobre suas condições e o seu estado atual de saúde) se tornaram objetos de estudos epidemiológicos tão importante quanto a identificação de enfermidades fisiológicas22. Currie C, Zanotti C, Morgan A, Currie D, Looze Md, Roberts C, Samdal O, Smith OR, Barnekow V. Social determinants of health and well-being among young people. World Health Organization Regional Office for Europe. 2012; Available from: http://www.euro.who.int/__data/assets/pdf_file/0003/163857/Social-determinants-of-health-and-well-being-among-young-people.pdf [2013 out 10].
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, 33. Ottova V, Hjern A, Rasche C-H, Ravens-Sieberer U. Child mental health measurement: Reflections and future directions. 2012; Available from: <http://www.intechopen.com/download/get/type/pdfs/id/37287> [2013 jul 28].
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. Ainda, há evidências indicando que a perceção da saúde na juventude44. Mattila VM, Parkkari J, Koivusilta L, Nummi T, Kannus P, Rimpelä A. Adolescents' health and health behaviour as predictors of injury death. A prospective cohort follow-up of 652,530 person-years. BMC public health 2008;8:90. e na vida adulta55. Idler EL, Benyamini Y. Self-rated health and mortality: A review of twenty-seven community studies. J Health Soc Behav 1997; 38(1):21-37. , 66. Kondo N, Sembajwe G, Kawachi I, van Dam RM, Subramanian S, Yamagata Z. Income inequality, mortality, and self rated health: Meta-analysis of multilevel studies. BMJ 2009; 339:1178-81. está inversamente associada à morbidade e a mortalidade. Portanto, construir uma percepção positiva da saúde desde a juventude pode ser um importante passo para o estado de saúde presente e futuro da população.

Em contrapartida, cerca de 15% da população jovem de países europeus têm uma percepção negativa da saúde22. Currie C, Zanotti C, Morgan A, Currie D, Looze Md, Roberts C, Samdal O, Smith OR, Barnekow V. Social determinants of health and well-being among young people. World Health Organization Regional Office for Europe. 2012; Available from: http://www.euro.who.int/__data/assets/pdf_file/0003/163857/Social-determinants-of-health-and-well-being-among-young-people.pdf [2013 out 10].
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. Nos Estado Unidos, estas estimativas estão em torno de 10%77. Cui W, Zack MM. Peer reviewed: Trends in health-related quality of life among adolescents in the united states, 2001-2010. Prev Chronic Dis 2013; 10:E111., semelhante ao observado em jovens brasileiros88. Istituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Sistema IBGE de recuperação automática (SIDRA). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2003-2008. 2013; Available from: <http://www.sidra.ibge.gov.br/> [2013 jul 02].
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. Há uma tendência de estabilização da percepção da saúde na população jovem europeia entre 2006 e 201022. Currie C, Zanotti C, Morgan A, Currie D, Looze Md, Roberts C, Samdal O, Smith OR, Barnekow V. Social determinants of health and well-being among young people. World Health Organization Regional Office for Europe. 2012; Available from: http://www.euro.who.int/__data/assets/pdf_file/0003/163857/Social-determinants-of-health-and-well-being-among-young-people.pdf [2013 out 10].
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, enquanto um aumento ocorreu em jovens americanos77. Cui W, Zack MM. Peer reviewed: Trends in health-related quality of life among adolescents in the united states, 2001-2010. Prev Chronic Dis 2013; 10:E111.. No Brasil, um país de média renda, preocupa o discreto aumento na proporção de jovens com percepção negativa da saúde, entre 2003 e 2008, de 9.3% para 10.0%88. Istituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Sistema IBGE de recuperação automática (SIDRA). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2003-2008. 2013; Available from: <http://www.sidra.ibge.gov.br/> [2013 jul 02].
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. Portanto, o estudo da percepção da saúde e de seus potenciais determinantes torna-se crucial para auxiliar no planejamento e no direcionamento de intervenções aos fatores modificáveis que estão associados à percepção da saúde na juventude33. Ottova V, Hjern A, Rasche C-H, Ravens-Sieberer U. Child mental health measurement: Reflections and future directions. 2012; Available from: <http://www.intechopen.com/download/get/type/pdfs/id/37287> [2013 jul 28].
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, 99. Vancea LA, Barbosa JMV, Menezes AS, Santos CM, Barros MVG. Associação entre atividade física e percepção de saúde em adolescentes: Revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2012;16(3):246-54..

Fatores do estilo de vida como práticas de atividade física99. Vancea LA, Barbosa JMV, Menezes AS, Santos CM, Barros MVG. Associação entre atividade física e percepção de saúde em adolescentes: Revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2012;16(3):246-54.

10. Afridi AAK, Motwani K, Khawaja S, Khoja AA, Fatmi Z, Azam I, et al. Self-perceived health among school going adolescents in pakistan: Influence of individual, parental and life style factors? Glob J Health Sci 2013; 5(4):71-8.

11. Chen X, Sekine M, Hamanishi S, Wang H, Gaina A, Yamagami T, et al. Lifestyles and health-related quality of life in japanese school children: A cross-sectional study. Prev med 2005;40(6):668-78.

12. Elinder LS, Sundblom E, Rosendahl KI. Low physical activity is a predictor of thinness and low self-rated health: Gender differences in a swedish cohort. J Adolesc Health 2011;48(5):481-6.

13. Erginoz E, Alikasifoglu M, Ercan O, Uysal O, Ercan G, Kaymak DA, et al. Perceived health status in a turkish adolescent sample: Risk and protective factors. Eur J Pediatr 2004;163(8):485-94.

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15. Rangul V, Bauman A, Holmen TL, Midthjell K. Is physical activity maintenance from adolescence to young adulthood associated with reduced cvd risk factors, improved mental health and satisfaction with life: The hunt study, norway. Int J Behav Nutr Phys Act 2012; 9:144
- 1616. Shi X, Tubb L, Fingers ST, Chen S, Caffrey JL. Associations of physical activity and dietary behaviors with children's health and academic problems. J Sch Health 2013;83(1):1-7., tempo assistindo TV1111. Chen X, Sekine M, Hamanishi S, Wang H, Gaina A, Yamagami T, et al. Lifestyles and health-related quality of life in japanese school children: A cross-sectional study. Prev med 2005;40(6):668-78., hábitos alimentares1010. Afridi AAK, Motwani K, Khawaja S, Khoja AA, Fatmi Z, Azam I, et al. Self-perceived health among school going adolescents in pakistan: Influence of individual, parental and life style factors? Glob J Health Sci 2013; 5(4):71-8. , 1616. Shi X, Tubb L, Fingers ST, Chen S, Caffrey JL. Associations of physical activity and dietary behaviors with children's health and academic problems. J Sch Health 2013;83(1):1-7., consumo de substâncias (e.g., álcool ou tabaco)1010. Afridi AAK, Motwani K, Khawaja S, Khoja AA, Fatmi Z, Azam I, et al. Self-perceived health among school going adolescents in pakistan: Influence of individual, parental and life style factors? Glob J Health Sci 2013; 5(4):71-8. , 1313. Erginoz E, Alikasifoglu M, Ercan O, Uysal O, Ercan G, Kaymak DA, et al. Perceived health status in a turkish adolescent sample: Risk and protective factors. Eur J Pediatr 2004;163(8):485-94. , 1717. Sousa TF, Silva KS, Garcia LMT, Del Duca GF, Oliveira ESA, Nahas MV. Autoavaliação de saúde e fatores associados em adolescentes do estado de Santa Catarina, Brasil. Rev Paul Pediatr 2010;28(4):333-9. e duração de sono1111. Chen X, Sekine M, Hamanishi S, Wang H, Gaina A, Yamagami T, et al. Lifestyles and health-related quality of life in japanese school children: A cross-sectional study. Prev med 2005;40(6):668-78. têm sido associados à percepção da saúde em jovens. Contudo, grande parte destas evidências é oriunda de estudos transversais, que apresentam habilidades limitadas para explorar a relação de causalidade entre duas variáveis. As poucas evidências longitudinais focaram na relação entre estilo de vida e outros componentes psicológicos (e.g., bem-estar mental e depressão)1818. Cousins JC, Whalen DJ, Dahl RE, Forbes EE, Olino TM, Ryan ND, et al. The bidirectional association between daytime affect and nighttime sleep in youth with anxiety and depression. J Pediatr Psychol 2011;36(9):969-79.

19. Hoare E, Skouteris H, Fuller-Tyszkiewicz M, Millar L, Allender S. Associations between obesogenic risk factors and depression among adolescents: A systematic review. Obes Rev 2014;15(1):40-51.

20. Jacka FN, Kremer PJ, Berk M, de Silva-Sanigorski AM, Moodie M, Leslie ER, et al. A prospective study of diet quality and mental health in adolescents. PLoS One 2011;6(9):e24805.
- 2121. Stavrakakis N, de Jonge P, Ormel J, Oldehinkel AJ. Bidirectional prospective associations between physical activity and depressive symptoms. The trails study. J Adolesc Health 2012;50(5):503-8. ou avaliaram a percepção da saúde somente na fase adulta1212. Elinder LS, Sundblom E, Rosendahl KI. Low physical activity is a predictor of thinness and low self-rated health: Gender differences in a swedish cohort. J Adolesc Health 2011;48(5):481-6. , 1515. Rangul V, Bauman A, Holmen TL, Midthjell K. Is physical activity maintenance from adolescence to young adulthood associated with reduced cvd risk factors, improved mental health and satisfaction with life: The hunt study, norway. Int J Behav Nutr Phys Act 2012; 9:144. Portanto, o estudo de mudanças prospectivas no estilo de vida e o seu papel na percepção da saúde de jovens tem sido pouco explorado. Analisar tais aspectos torna-se fundamental para o direcionamento de intervenções de promoção da saúde e bem-estar em populações jovens.

Assim, o presente estudo objetivou analisar de forma prospectiva a associação entre fatores do estilo de vida (práticas de atividade física, tempo de TV, hábitos alimentares, consumo de álcool e tabaco e duração do sono) com a percepção da saúde em uma amostra de adolescentes brasileiros.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Este estudo se caracteriza como uma análise secundária e prospectiva dos dados de um estudo de intervenção randomizado-controlado, denominado projeto "Saúde na Boa"2222. Nahas MV, de Barros MV, de Assis MAA, Hallal PC, Florindo AA, Konrad L. Methods and participant characteristics of a randomized intervention to promote physical activity and healthy eating among brazilian high school students: The saude na boa project. J Phys Act Health 2009;6(2):153-62.. O propósito dessa intervenção foi promover comportamentos saudáveis (principalmente práticas de atividade física e alimentação saudável) entre estudantes do Ensino Médio noturno de escolas públicas estaduais de duas capitais brasileiras: Florianópolis (Santa Catarina), ao sul do Brasil, e Recife (Pernambuco), ao nordeste do Brasil.

Cerca de dois mil jovens foram avaliados em março de 2006 (idades de 14 a 24 anos), a partir de uma seleção aleatória de 20 escolas (10 em cada município, sendo 5 escolas para grupo experimental e 5 para o controle) que considerou pareamento do tamanho da escola (pequena até 200 alunos; média de 200 a 499 alunos; e grande de 500 ou mais alunos) e localização geográfica. Nove meses após a linha de base (dezembro de 2006), uma nova coleta de dados foi realizada, com taxa de resposta no acompanhamento de, aproximadamente, 45.9% (989 adolescentes avaliados no acompanhamento). Informações detalhadas da característica das cidades envolvidas, da população alvo e do procedimento de seleção amostral foram descritas em publicação prévia2222. Nahas MV, de Barros MV, de Assis MAA, Hallal PC, Florindo AA, Konrad L. Methods and participant characteristics of a randomized intervention to promote physical activity and healthy eating among brazilian high school students: The saude na boa project. J Phys Act Health 2009;6(2):153-62.. Ainda, a perda amostral do acompanhamento segundo características demográficas, socioeconômicas e comportamentais foram analisadas em outra publicação deste suplemento2323. Silva KS, Barros MVG, Barbosa Filho VC, Garcia LMT, Wanderley Júnior RS, Beck, CC, et al. Implementation of the "Saúde na Boa" intervention: process evaluation and characteristics of participants and dropouts. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum 2014; 16(Supl.1)1-12.. Para o presente estudo, foram analisados os jovens que tiveram os dados da percepção da saúde válidos na coleta de acompanhamento, totalizando 984 estudantes de ensino médio. Foi possível detectar significância estatística para odds ratio > 1,34 para tempo de TV (fator com maior exposição à mudança positiva) e odds ratio > 1,63 para consumo de tabaco (fator com menor exposição à mudança positiva). Foram consideradas as prevalências dos desfechos (mudar positivamente a percepção da saúde) nos grupos de não expostos de 25,2% e 24,4% para tempo de TV e consumo de tabaco, respectivamente. Para os demais fatores do estilo de vida, o tamanho amostral permitiu detectar significância estatística para odds ratio neste intervalo ou superiores. Foi fixado um intervalo de confiança (IC) de 95% e um poder de 80%.

Em março e dezembro de 2006, os estudantes responderam o questionário do projeto "Saúde na Boa", o qual foi previamente validado2424. Nahas MV, Barros MVG, Florindo AA, Hallal PC, Konrad L, Barros SSH, et al. Reprodutibilidade e validade do questionário saúde na boa para avaliar atividade física e hábitos alimentares em escolares do ensino médio. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2012;12(3):12-20.. O questionário incluía itens com respostas fechadas sobre atividade física, hábitos alimentares e outros fatores do estilo de vida (e.g., consumo de álcool e tabaco, e duração diária de sono), baseados no questionário do projeto PACE+ (Patient-Centered Assessment and Counseling for Exercise Plus Nutrition)2424. Nahas MV, Barros MVG, Florindo AA, Hallal PC, Konrad L, Barros SSH, et al. Reprodutibilidade e validade do questionário saúde na boa para avaliar atividade física e hábitos alimentares em escolares do ensino médio. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2012;12(3):12-20.. O questionário também incluiu seções com informações pessoais e sociodemográficas, comportamentos sedentários, controle do peso corporal e comportamentos preventivos.

O instrumento foi aplicado em sala de aula, seguindo instruções prévias. A aplicação padronizada do protocolo de coleta, em ambos os municípios, foi conduzida por uma equipe devidamente treinada, constituída por estudantes e professores de Educação Física e de Nutrição.

A avaliação da saúde foi autorreportada pelos estudantes por meio da seguinte questão "De modo geral, como você avaliaria sua saúde?". Cada estudante classificou sua saúde em uma escala Likert com cinco pontos, a saber: "ruim", "regular", "boa", "muito boa" e "excelente". A diferença nas respostas entre as coletas baseline e após 9 meses de acompanhamento permitiu gerar um escore categorizado em três níveis: a) mudou negativamente (e.g., passou de boa para regular); b) estável (não modificou); ou c) mudou positivamente (e.g., passou de muito boa para excelente). Dez fatores do estilo de vida foram considerados no presente estudo. Na seção de atividade física, foi avaliada a frequência semanal (dias/semana) de prática de atividade física que, somadas à duração diária das atividades físicas, totalizasse ao menos 60 minutos. A frequência semanal (dias/semana) de deslocamento ativo (a pé/bicicleta) para ir à escola e de prática de exercícios físicos para o desenvolvimento da força/resistência muscular também foram avaliadas. Como fator do comportamento sedentário, avaliou-se o tempo diário gasto assistindo televisão (horas/dia). Na seção hábitos alimentares, considerou-se a frequência semanal (dias/semana) do consumo de frutas/suco de frutas, de doces e de refrigerantes. Também foi investigada a frequência de consumo mensal de tabaco e álcool (dias/mês) e a duração diária do sono (horas/dia). Para cada componente do estilo de vida, um cálculo da diferença nas respostas entre as coletas do baseline e do acompanhamento foi realizado. Os escores foram agrupados em três categorias: diminuiu, estável ou aumentou. Na descrição dos resultados, as categorias foram ordenadas do cenário menos aos mais favorável para o estilo de vida saudável.

Variáveis demográficas e socioeconômicas foram incluídas como potenciais fatores de confusão, a saber: gênero (moças e rapazes), faixa etária (14-16 anos, 17-19 anos e 20-24 anos), cor da pele (branca e não-branca), estado civil (solteiro ou outros), ocupação (trabalha, estagiário ou não trabalha), reside com a família (sim ou não) e o tipo de moradia (casa, apartamento/outro). O estado nutricional na coleta de acompanhamento foi considerado, mediante cálculo do índice de massa corporal (massa corporal [kg]/ estatura ao quadrado [m²]) e classificação de acordo com gênero e idade2525. Cole TJ, Bellizzi MC, Flegal KM, Dietz WH. Establishing a standard definition for child overweight and obesity worldwide: International survey. BMJ 2000; 320(7244):1240-3..

Frequências absoluta e relativa (com IC 95%) foram utilizadas para descrever as variáveis de controle, os componentes do estilo de vida e a percepção da saúde. A proporção por categorias das variações desses componentes e da percepção da saúde (estável, melhorou ou piorou) também foram apresentadas. A regressão logística multinominal foi utilizada para calcular o odds ratio entre mudanças prospectivas no estilo de vida e mudanças na percepção da saúde entre os jovens. A mudança negativa da percepção da saúde foi considerada como referência no desfecho. Nas variáveis de exposição, as categorias da pior situação do fator do estilo de vida (e.g., diminuir a frequência semanal de atividade física) foram consideradas como referência. Gênero não esteve associado às mudanças na percepção da saúde e não moderou os resultados, portanto, as análises foram realizadas com a amostra total. Todas as análises foram ajustadas para potenciais fatores de confusão (gênero, idade, cor da pele, estado civil, ocupação, tipo de moradia, mora com a família, estado nutricional, situação na intervenção, cidade e percepção da saúde e o comportamento na linha de base). As análises foram executadas no programa Stata, v. 11 (Stata Corp., College Station, TX, USA), considerando um nível de significância de 5%.

Todos os procedimentos adotados no estudo foram aprovados pelos Comitês de Ética da Universidade Federal de Santa Catarina (031/2005) e do Instituto Materno Infantil de Pernambuco (587/2005). Foi obtido o termo de consentimento negativo ("parental passive consent form") dos pais ou responsáveis pelos estudantes menores de 18 anos, bem como dos estudantes com 18 anos ou mais.

RESULTADOS

A amostra do estudo teve participação de estudantes das cidades de Florianópolis, SC (53.3%) e Recife, PE (46.6%). Considerando a coorte original do projeto "Saúde na Boa", 52.0% dos estudantes estavam em escolas do grupo intervenção, enquanto que 48.0% estavam no grupo controle. A maior parte da amostra era do sexo feminino, tinha idades de 17 a 19 anos, se considerava não-branco (pardos, negros, etc.), era solteiro, não trabalhava, morava com a família e residia em casas. Um em cada cinco estudantes tinha excesso de peso (Tabela 1).

Tabela 1
Caracterização na linha de base da amostra com dados válidos para o estudo. (n=984).

Houve sobreposição dos intervalos de confiança de 95% entre baseline e após nove meses de acompanhamento ao considerar a prevalência de estudantes em cada categoria da percepção da saúde (ruim, regular, boa, muito boa, excelente). Contudo, quase metade dos estudantes apresentaram mudanças na percepção da saúde entre as avaliações. Um em cada quatro estudantes mudou positivamente sua percepção da saúde (e.g., passou de boa para muito boa), enquanto que 23.3% dos estudantes mudaram negativamente sua percepção da saúde (Figura 1).

Figura 1
Prevalência (intervalo de confiança de 95%) da percepção da saúde na linha de base, após nove meses de acompanhamento e as mudanças entre as duas avaliações em estudantes de ensino médio. (n=984). † Diferenças entre a linha de base e após nove meses foram classificadas em mudança negativa (e.g., passou de boa para regular), manteve ou mudança positiva (e.g., passou de muito boa para excelente).

Considerando as prevalências dos fatores do estilo de vida no baseline e após nove meses de acompanhamento, observou-se uma sobreposição dos intervalos de confiança de 95% na maioria dos fatores do estilo de vida. As excessões foram a frequência semanal de atividade física (diminuiu) e de exercícios físicos para força/resistência muscular (aumentou, Tabela 2).

Tabela 2
Prevalência e intervalo de confiança de 95% das variáveis do estilo de vida entre os estudantes na linha de base e após nove meses. (n=984).

Após ajuste por potenciais variáveis de confusão, estudantes que mantiveram a quantidade de dias por semana de deslocamento ativo para escola e de consumo de doces tiveram maior odds ratio de manter a percepção da saúde (referência: piorar a percepção da saúde), em comparação aos seus pares que reduziram a frequência semanal destes comportamentos. Adicionalmente, um maior odds ratio de manter a percepção da saúde foi observado entre os estudantes que aumentaram a frequência semanal de consumo de frutas/suco de frutas (Tabela 3).

Tabela 3
Prevalência e odds ratio da associação entre mudanças no estilo de vida e na percepção da saúde entre estudantes do ensino médio. (n=984).

Ao analisar o odds dos estudantes que aumentaram a percepção da saúde (referência: piorar a percepção da saúde), observou-se que tanto manter quanto aumentar o número de dias por semana realizando deslocamento ativo à escola esteve significativamente associado às mudanças positivas na percepção da saúde. Adicionalmente, aumentar a frequência semanal de consumo de frutas/suco de frutas e reduzir a frequência mensal de consumo de álcool também estiveram significativamente associados a um aior odds de ter alterações positivas na percepção da saúde. Alterar ou manter os demais comportamentos (atividade física total, tempo de TV, consumo de doces, refrigerantes e tabaco, e duração diária de sono) não esteve significativamente associado à manutenção ou à mudança positiva da percepção da saúde após nove meses de acompanhamento (Tabela 3).

Após ajuste por potenciais variáveis de confusão, estudantes que mantiveram a quantidade de dias por semana de deslocamento ativo para escola e de consumo de doces tiveram maior odds ratio de manter a percepção da saúde (referência: piorar a percepção da saúde), em comparação aos seus pares que reduziram a frequência semanal destes comportamentos. Adicionalmente, um maior odds ratio de manter a percepção da saúde foi observado entre os estudantes que aumentaram a frequência semanal de consumo de frutas/suco de frutas (Tabela 3).

DISCUSSÃO

Ao que se observou na literatura, este foi o primeiro estudo a analisar se mudanças prospectivas em fatores do estilo de vida estão associadas às alterações (positivas ou negativas) na percepção da saúde em uma população de jovens estudantes. Investigações analisaram a associação prospectiva entre atividade física e a percepção da saúde, mas a medida de desfecho foi avaliada somente em idades adultas1212. Elinder LS, Sundblom E, Rosendahl KI. Low physical activity is a predictor of thinness and low self-rated health: Gender differences in a swedish cohort. J Adolesc Health 2011;48(5):481-6. , 1515. Rangul V, Bauman A, Holmen TL, Midthjell K. Is physical activity maintenance from adolescence to young adulthood associated with reduced cvd risk factors, improved mental health and satisfaction with life: The hunt study, norway. Int J Behav Nutr Phys Act 2012; 9:144. Outros estudos analisaram a associação prospectiva entre fatores do estilo de vida e componentes psicológicos em jovens, mas não avaliaram a percepção da saúde1818. Cousins JC, Whalen DJ, Dahl RE, Forbes EE, Olino TM, Ryan ND, et al. The bidirectional association between daytime affect and nighttime sleep in youth with anxiety and depression. J Pediatr Psychol 2011;36(9):969-79.

19. Hoare E, Skouteris H, Fuller-Tyszkiewicz M, Millar L, Allender S. Associations between obesogenic risk factors and depression among adolescents: A systematic review. Obes Rev 2014;15(1):40-51.

20. Jacka FN, Kremer PJ, Berk M, de Silva-Sanigorski AM, Moodie M, Leslie ER, et al. A prospective study of diet quality and mental health in adolescents. PLoS One 2011;6(9):e24805.
- 2121. Stavrakakis N, de Jonge P, Ormel J, Oldehinkel AJ. Bidirectional prospective associations between physical activity and depressive symptoms. The trails study. J Adolesc Health 2012;50(5):503-8.. Os resultados do presente estudo apontaram que mudanças em alguns fatores do estilo de vida (deslocamento ativo para escola, hábitos alimentares e consumo de álcool) estiveram estatisticamente associadas às alterações positivas na percepção da saúde em jovens. Estas associações permaneceram significativas mesmo após ajustes por potenciais fatores de confusão, como sexo, idade, estado nutricional, condições socioeconômicas e a percepção da saúde no baseline. Estas evidências reforçam a importância da promoção de estilos de vida saudáveis e como estas mudanças podem determinar melhorias na percepção da saúde do jovem.

Manter ou aumentar a frequência semanal de deslocamento ativo para escola esteve associado às mudanças positivas na percepção da saúde em estudantes. Não há dados prévios indicando a associação entre estas variáveis em jovens. Apenas dois estudos prospectivos indicaram que a frequência semanal de atividade física na adolescência1212. Elinder LS, Sundblom E, Rosendahl KI. Low physical activity is a predictor of thinness and low self-rated health: Gender differences in a swedish cohort. J Adolesc Health 2011;48(5):481-6. e mudanças durante a adolescência nesta variável (i.e., se tornar ativo)1515. Rangul V, Bauman A, Holmen TL, Midthjell K. Is physical activity maintenance from adolescence to young adulthood associated with reduced cvd risk factors, improved mental health and satisfaction with life: The hunt study, norway. Int J Behav Nutr Phys Act 2012; 9:144 estão positivamente associadas à percepção da saúde na fase adulta. Contudo, estes estudos avaliaram a atividade física no lazer, e a extrapolação destes achados para outro domínio da atividade física (neste caso, no deslocamento) é inviável. O deslocamento ativo para escola tem diminuído em jovens com o passar dos anos, e as ações de intervenção têm tido efeitos modestos na promoção do deslocamento ativo nestas populações2626. Chillón P, Evenson KR, Vaughn A, Ward DS. A systematic review of interventions for promoting active transportation to school. Int J Behav Nutr Phys Act 2011;8:10.. Uma recente revisão sistemática2727. Saunders LE, Green JM, Petticrew MP, Steinbach R, Roberts H. What are the health benefits of active travel? A systematic review of trials and cohort studies. PLoS One 2013;8(8):e69912. indicou que deslocar-se ativamente à escola pode trazer benefícios à saúde como redução da obesidade, mas destacou a necessidade de evidências prospectivas para outros desfechos da saúde. Os achados sugerem que promover estímulos ao deslocamento ativo pode ser fundamental não somente para aumentar o tempo total de atividade física e promover os benefícios fisiológicos aliados ao estilo de vida ativo, mas também por proporcionar uma percepção positiva do estado de saúde na população jovem.

Não houve uma associação significativa e prospectiva entre a frequência semanal de atividade física por 60 minutos diários, a frequência de exercícios de força/resistência muscular e a percepção da saúde. Estes resultados diferem da literatura com achados de estudos com delineamentos transversais 99. Vancea LA, Barbosa JMV, Menezes AS, Santos CM, Barros MVG. Associação entre atividade física e percepção de saúde em adolescentes: Revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2012;16(3):246-54.

10. Afridi AAK, Motwani K, Khawaja S, Khoja AA, Fatmi Z, Azam I, et al. Self-perceived health among school going adolescents in pakistan: Influence of individual, parental and life style factors? Glob J Health Sci 2013; 5(4):71-8.
- 1111. Chen X, Sekine M, Hamanishi S, Wang H, Gaina A, Yamagami T, et al. Lifestyles and health-related quality of life in japanese school children: A cross-sectional study. Prev med 2005;40(6):668-78. , 1313. Erginoz E, Alikasifoglu M, Ercan O, Uysal O, Ercan G, Kaymak DA, et al. Perceived health status in a turkish adolescent sample: Risk and protective factors. Eur J Pediatr 2004;163(8):485-94. , 1414. Galán I, Boix R, Medrano M, Ramos P, Rivera F, Pastor-Barriuso R, et al. Physical activity and self-reported health status among adolescents: A cross-sectional population-based study. BMJ open 2013;3(5). , 1616. Shi X, Tubb L, Fingers ST, Chen S, Caffrey JL. Associations of physical activity and dietary behaviors with children's health and academic problems. J Sch Health 2013;83(1):1-7.. Contudo, realizou-se a avaliação da atividade física por meio de medidas subjetivas. Como medidas subjetivas e objetivas (e.g., acelerometria ou pedometria) podem diferenciar na associação com desfechos de saúde2828. Reilly JJ, Penpraze V, Hislop J, Davies G, Grant S, Paton JY. Objective measurement of physical activity and sedentary behaviour: Review with new data. Arch Dis Child 2008;93(7):614-9., destaca-se a necessidade de futuros estudos avaliando se a atividade física medida objetivamente e se outros contextos da atividade física estão associados de forma prospectiva com a percepção da saúde em jovens.

Mudar determinados hábitos alimentares (i.e., frequência semanal de consumo de doces e frutas/suco de frutas) esteve significativamente associado às alterações na percepção da saúde. Dados transversais também destacaram a importância de uma alimentação saudável na percepção da saúde em jovens1010. Afridi AAK, Motwani K, Khawaja S, Khoja AA, Fatmi Z, Azam I, et al. Self-perceived health among school going adolescents in pakistan: Influence of individual, parental and life style factors? Glob J Health Sci 2013; 5(4):71-8. , 1616. Shi X, Tubb L, Fingers ST, Chen S, Caffrey JL. Associations of physical activity and dietary behaviors with children's health and academic problems. J Sch Health 2013;83(1):1-7., mas dados prospectivos são pouco explorados. Um estudo avaliou se a qualidade da dieta estava associada prospectivamente (um ano de acompanhamento) com a saúde mental (avaliada com o Pediatric Quality of Life Inventory) em estudantes Australianos2020. Jacka FN, Kremer PJ, Berk M, de Silva-Sanigorski AM, Moodie M, Leslie ER, et al. A prospective study of diet quality and mental health in adolescents. PLoS One 2011;6(9):e24805.. Este estudo apontou que melhoria na qualidade da dieta associou-se à diminuição de sintomas depressivos. Estudos de intervenção também são necessários para testar a eficácia da prevenção de problemas psicológicos (como a percepção negativa da saúde) através da modificação alimentar.

Ainda, considerando que o elevado consumo de doces e o baixo consumo de frutas têm apresentado estimativas preocupantes na população jovem brasileira2929. Barbosa-Filho VC, Campos W. Lopes, AS. Epidemiology of physical inactivity, sedentary behaviors, and unhealthy food habits among Brazilian adolescents: A systematic review. Cienc Saúde Colet 2014;19(1):171-91., mudanças nestes hábitos alimentares são cruciais para a promoção de uma percepção positiva da saúde. Talvez, uma especial atenção deva ser dada à criação de ambientes que promovam a alimentação saudável, e também, a criação de estratégias que envolva os pais e a comunidade escolar possa auxiliar na adoção ou na manutenção de uma boa alimentação durante a adolescência.

Diminuir a frequência mensal de consumo de bebidas alcoólicas após o período de acompanhamento esteve forte e estatisticamente associado à alterações positivas na percepção da saúde em estudantes (ver Tabela 3). Dados transversais apontaram uma tendência semelhante1010. Afridi AAK, Motwani K, Khawaja S, Khoja AA, Fatmi Z, Azam I, et al. Self-perceived health among school going adolescents in pakistan: Influence of individual, parental and life style factors? Glob J Health Sci 2013; 5(4):71-8.. Uma revisão de revisões sobre o efeito do consumo de álcool no estado de saúde do jovem3030. Newbury-Birch D, Gilvarry E, McArdle P, Ramesh V, Stewart S, Walker J, et al. Impact of alcohol consumption on young people: A review of reviews. 2008. Department for Children, Schools and Families: Nottingham. Available from: https://www.education.gov.uk/consultations/downloadableDocs/Review%20of%20existing%20reviews%20(Full).pdf [2013 ago 04].
https://www.education.gov.uk/consultatio...
indicou que o consumo de álcool pode estar associado à sentimentos de depressão, ansiedade, e tentativas de suicídio entre jovens. Contudo, muitos estudos apresentam fragilidade na análise da relação temporal ou causal entre as duas situações, resultando em conclusões que são, muitas vezes, ambíguas (i.e., o consumo de álcool antecede problemas psicológicos ou o inverso)3030. Newbury-Birch D, Gilvarry E, McArdle P, Ramesh V, Stewart S, Walker J, et al. Impact of alcohol consumption on young people: A review of reviews. 2008. Department for Children, Schools and Families: Nottingham. Available from: https://www.education.gov.uk/consultations/downloadableDocs/Review%20of%20existing%20reviews%20(Full).pdf [2013 ago 04].
https://www.education.gov.uk/consultatio...
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Embora haja plausibilidade para uma possível bidirecionalidade de efeito, o presente estudo trouxe informações importantes de que, independentemente da percepção de saúde e do consumo de álcool no baseline, a redução desse consumo foi determinante nas alterações positivas na percepção da saúde. Estas evidências reforçam que intervenções públicas voltadas à redução do consumo de álcool são primordiais para promoção da saúde mental e percepção da saúde na população jovem.

Mudanças nas horas diárias assistindo TV, na duração diária do sono e na frequência mensal de consumo de tabaco não estiveram associados às alterações na percepção da saúde (ver Tabela 3). Embora alguns estudos transversais não corroborem os achados do presente estudo1111. Chen X, Sekine M, Hamanishi S, Wang H, Gaina A, Yamagami T, et al. Lifestyles and health-related quality of life in japanese school children: A cross-sectional study. Prev med 2005;40(6):668-78. , 1313. Erginoz E, Alikasifoglu M, Ercan O, Uysal O, Ercan G, Kaymak DA, et al. Perceived health status in a turkish adolescent sample: Risk and protective factors. Eur J Pediatr 2004;163(8):485-94. , 1717. Sousa TF, Silva KS, Garcia LMT, Del Duca GF, Oliveira ESA, Nahas MV. Autoavaliação de saúde e fatores associados em adolescentes do estado de Santa Catarina, Brasil. Rev Paul Pediatr 2010;28(4):333-9., evidências prospectivas são desconhecidas. Contudo, parece aceitável pensar que o acompanhamento de curta duração (apenas 9 meses) e as medidas subjetivas dos comportamentos possam explicar, em parte, esta falta de associação entre as variáveis. A baixa prevalência de estudantes que mudaram a frequência semanal de consumo de tabaco e as dificuldades de se diminuir o consumo desta substância também podem explicar a falta de associação nesta variável (ver Tabela 3). Futuras investigações com delineamento prospectivos de maior duração são estimulados. Adicionalmente, estudos com medidas objetivas, sobretudo, para duração do sono e comportamento sedentário, podem auxiliar na compreensão se estes fatores do estilo de vida são determinantes da percepção da saúde na juventude.

O delineamento prospectivo é uma das forças dos estudo, pois permitiu analisar modificações no estilo de vida e sua relação com a percepção da saúde. Além disso, a inclusão de diferentes fatores do estilo de vida permitiu indicar que as mudanças na percepção da saúde em jovens são preditas por um conjunto de fatores comportamentais que representam o estilo de vida, e não somente um. Outra força do estudo foi a inclusão de uma amostra de estudantes que residiam em cidades de duas regiões brasileiras com perfil sociocultural distinto (Nordeste e Sudeste), o que aumenta o grau de extrapolação dos dados. Por fim, destaca-se a avaliação de fatores de estilo de vida e da percepção da saúde em uma população de país de renda média, uma vez que grande parte da literatura sobre esta temática é oriunda de países de elevada renda99. Vancea LA, Barbosa JMV, Menezes AS, Santos CM, Barros MVG. Associação entre atividade física e percepção de saúde em adolescentes: Revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2012;16(3):246-54. , 1919. Hoare E, Skouteris H, Fuller-Tyszkiewicz M, Millar L, Allender S. Associations between obesogenic risk factors and depression among adolescents: A systematic review. Obes Rev 2014;15(1):40-51..

Dentre as limitações, destacam-se a subjetividade das medidas dos fatores do estilo de vida, o que, em alguns momentos, pode ser a explicação para a falta de associação com a percepção da saúde. Contudo, contextos para determinadas medidas do estilo de vida, como o deslocamento ativo e o tempo de TV, são difíceis de serem mensurados objetivamente em estudos com grande amostra. Outra limitação foi o período de acompanhamento de nove meses, o qual pode ter sido relativamente pequeno para encontrar associações entre algumas variáveis. Por fim, a perda amostral do acompanhamento de mais de 50% também representa uma limitação. Estes comentários não diminuem a importância dos achados, mas estimulam a continuidade da discussão em busca de evidências consistentes e prospectivas sobre o estilo de vida em jovens e seu impacto na saúde física e mental em idades precoces e avançadas.

CONCLUSÕES

Mudanças em fatores do estilo de vida como aumentar a frequência semanal de deslocamento ativo para escola e do consumo de frutas/suco de frutas, bem como reduzir o consumo de doces e de álcool, foram importantes determinantes da percepção da saúde entre estudantes. Esta associação permaneceu significativa mesmo após ajuste para potenciais fatores de confusão, como sexo, idade, estado nutricional, condições socioeconômicas e a percepção da saúde e os fatores do estilo de vida no baseline. Estes resultados sugerem que diferentes fatores do estilo de vida, e não um específico, são determinantes das alterações na percepção da saúde durante a juventude. A criação de ambientes que estimulem o deslocamento de forma ativa, hábitos alimentares saudáveis e prevenção do consumo de bebidas alcoólicas são primordiais para garantir uma percepção positiva da saúde na juventude. Intervenções com modificação nestes fatores do estilo de vida merecem especial atenção pela possibilidade de promover saúde mental na população jovem.

Agradecimentos

Este estudo foi apoiado pelas instituições: Pan American Health Organization (PAHO), US Centers for Disease Control and Prevention (CDC), CNPq (Ministério da Ciência e Tecnologia, Brasil), Universidade Federal de Santa Catarina e Universidade Estadual de Pernambuco. Os autores agradecem aos alunos e professores das 20 escolas que participaram do projeto e aos Secretários Estaduais de Educação em Santa Catarina e Pernambuco.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul 2014

Histórico

  • Recebido
    11 Jan 2014
  • Aceito
    22 Mar 2014
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