INTRODUÇÃO
A qualidade das mudas influencia diretamente o estabelecimento e o desenvolvimento inicial pós-plantio (CARNEIRO, 1995; JACOBS e LANDIS, 2009). O "choque pós-plantio" é frequentemente usado para descrever as respostas visuais do crescimento vegetal relacionadas aos diferentes mecanismos ou processos fisiológicos (CLOSE et al., 2005), podendo ser reduzido com a rustificação das mudas ao final do ciclo de produção (JACOBS e LANDIS, 2009).
A rustificação de mudas objetiva aumentar a resistência aos estresses advindos do transporte, manejo, plantio e pós-plantio. As práticas de rustificação compreendem a redução da densidade de mudas, a monda das mudas para áreas com diferentes regimes de luz e temperatura, a redução da frequência de regas, a redução da fertilização, ou ainda a poda da raiz ou da parte aérea com vistas a potencializar o balanço entre aquelas. Contudo, a prática adotada deve refletir as condições ambientais e edáficas em que as mudas estarão propensas após o plantio (JACOBS e LANDIS, 2009), no qual, as mudas devem estar preparadas para suportar as adversidades climáticas (MUNISHI e CHAMASHAMA, 1994; GUO, 1999; PELTOLA et al., 2000; CLOSE et al., 2005).
Jaffe (1980) definiu a tigmomorfogênese como o crescimento resposta de plantas ao estímulo mecânico, promovendo alterações nos padrões de crescimento. In the wild, these patterns can be evinced by wind, raindrops, and rubbing by passing animals. Quando induzido mecanicamente, ou pela ação biótica e abiótica, a resposta tigmomorfogenética primária corriqueiramente observada é a redução do alongamento do caule e uma estimulação do crescimento radial (GARNER e BJÖRKMAN, 1996; TELEWSKI e PRUYN, 1998; PRUYN et al., 2000; CHERAB et al., 2009).
O estresse mecânico, principalmente causado pelo vento, como também pela neve ou pela chuva pode levar à quebra do caule após o plantio. Caramori et al. (1986) estudaram os efeitos do vento em mudas de Coffea arabica cv. Mundo Novo e Catuaí-Vermelho e reportaram redução significativa na altura, área foliar, comprimento dos internódios, e matéria seca e um aumento no diâmetro do caule quando submetidas a vento com velocidade superior a 2 m s-1.
Na produção de mudas por sementes de espécies lenhosas nativas, a heterogeneidade do crescimento aéreo é corriqueiramente observada, dada a variabilidade genética entre matrizes, que resultam em sementes com diferentes níveis de vigor. O manejo no viveiro potencializa este comportamento diferenciado de crescimento e desenvolvimento gerando mudas com diferentes classes quanto à altura, onerando em classificação prévia para atender aos limites pré-estabelecidos para a muda-alvo.
A altura da muda exerce influencia direta na sobrevivência e crescimento no campo (CARNEIRO, 1995). Figueiredo et al. (2011) reportaram que mudas clonais do híbrido de Eucalyptus grandis com Eucalyptus urophylla com maiores dimensões de altura e diâmetro, provenientes da mesma data de semeadura, apresentaram maior crescimento inicial no primeiro ano em sítios de diferentes condições edafoclimáticas, mas as diferenças tenderam a desaparecer ao longo do tempo. Del Campo et al. (2010) descreveram que a sobrevivência de mudas de Quercus ilex no campo foi correlacionada positivamente com o diâmetro do coleto e negativamente com a altura das mudas expedidas para o plantio.
Maytenus ilicifolia (Schrad.) Planch. é uma espécie arbórea nativa do sul do Brasil, Uruguai, Paraguai, norte da Argentina (NASCIMENTO et al., 2005), Chile e Bolívia (CORDEIRO et al., 1999) sendo popularmente conhecida como espinheira-santa apresentando- se útil em tratamentos medicinais (JORGE et al., 2004).
Este trabalho objetivou quantificar os efeitos da tigmomorfogênese induzida através de flexões caulinares na morfometria em mudas de Maytenus ilicifolia ao final do ciclo de produção.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi instalado e observado nos meses de agosto de 2010 a fevereiro de 2011, em casa de vegetação com 50% de sombreamento, estando esta, situada na Universidade Estadual do Oeste do Paraná, campus de Marechal Cândido Rondon nos meses de agosto de 2010 a fevereiro de 2011. A temperatura média do ambiente propagativo manteve-se a 27,0 ± 3,0°C, e a umidade relativa do ar em 90,0 ± 7,0%. Mudas de Maytenus ilicifolia (RNC: 24421) foram propagadas via semeadura direta em tubetes de 120 cm3 preenchidos com uma mistura 4:1 (v.v) de substrato comercial à base de casca de pinus e solo local com a incorporação de fertilizante de liberação controlada (18N: 5P: 9K) na proporção de 50 g para 25 kg da mistura utilizada como substrato, acomodados em suportes plásticos com capacidade de ocupação para 96 tubetes. As irrigações foram efetuadas vespertinamente durante o período de condução do ensaio.
Os tratamentos consistiram de flexões caulinares durante 30 dias através de cinco intensidades (0, 5, 10, 20 e 40 flexões diárias). Cada tratamento foi aplicado em mudas classificadas de acordo com a altura (maior ou menor do que 15,0 cm) obtidas a partir do mesmo lote de produção (Tabela 1).
As flexões foram realizadas uma vez ao dia numa única direção não mais do que 45° da vertical com uma estrutura de ferro sobre rolamentos e de um cano de PVC (Figura 1) sempre no mesmo horário à tarde. O cano de PVC colidiu com o caule das mudas a 5,0 cm da gema apical para cada classe de altura. Os movimentos foram realizados a uma velocidade de 0,10 m seg-1. A estrutura foi construída a partir de adaptações de um modelo proposto por Jacobs e Landis (2009).
Ao final dos tratamentos, as mensurações incluíram os incrementos na altura e no diâmetro do coleto de dez mudas por repetição, bem como na quantificação dos incrementos na massa seca de raiz (MSR) e na massa seca da parte aérea (MSPA) obtidos pelo método de secagem em estufa a 65°C por 72 h de quatro mudas por repetição. Os resultados da biomassa foram utilizados nas estimativas da taxa de crescimento absoluto (TCA) expressos em g dia-1. Adicionalmente, o efeito dos tratamentos foi estimado com o teste da perda de eletrólitos das raízes (PER). Para a quantificação do PER, as raízes de cada muda foram lavadas com água corrente para remoção de partículas do solo, e posteriormente com água deionizada para remoção de íons das superfícies. A porção central do sistema radicular foi removida e descartada. Utilizou-se aproximadamente 0,2 g de raízes finas (< 2 mm), retiradas do terço superior que foram acondicionadas em recipientes de vidro contendo 20 mL de água deionizada, e mantidas a temperatura de 20oC por 24 horas (WILNER, 1955). Após este período, a condutividade elétrica da solução (Cviva) foi obtida com condutivímetro termocompensado. Em seguida, as mesmas raízes foram autoclavadas a 100oC por 10 minutos, e recolocadas em solução renovada nas mesmas condições anteriormente descritas. A condutividade elétrica da solução (Cmorta) foi quantificada da mesma maneira da Cviva. O valor de PER resulta da razão Cviva/ Cmorta multiplicada por 100.
O ensaio foi conduzido em delineamento inteiramente ao acaso em arranjo fatorial (5 x 2) com quatro repetições de dez mudas cada. Os dados foram averiguados quanto à normalidade da distribuição dos resíduos pelo teste de Lilliefors, e quanto à homogeneidade da variância pelo teste de Cochran e Bartlet. Posteriormente, os dados foram submetidos à análise de variância com o auxilio do software estatístico Sistema para Análises Estatísticas, versão 9.1 (SAEG, 2007). Quando da existência de diferenças estatisticamente significativas, os dados foram submetidos à análise de regressão a 5% de probabilidade.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As flexões caulinares em mudas de Maytenus ilicifolia proporcionaram redução no incremento em altura e aumento no incremento em diâmetro do coleto independente da altura da muda (Figura 2-a e 2-b). De acordo com as regressões calculadas, a indução de 23 flexões caulinares em mudas com altura menor que 15 cm resultou em um aumento no crescimento em diâmetro de até 69% e em uma redução no incremento em altura de 50% comparados as mudas controle (sem flexões caulinares). Em mudas com altura maior que 15 cm, a imposição de 40 flexões resultou em aumento no crescimento do diâmetro de até 49%.
Em estudo de dose resposta por flexões caulinares, Telewski e Pruyn (1998) observaram em mudas de Ulmus americana submetidas a flexões caulinares efetuadas manualmente, durante três semanas, a redução no crescimento em altura e aumento no diâmetro do coleto com a aplicação de até 40 flexões diárias. Resultado semelhante foi reportado por Pruyn et al. (2000) com mudas de dois híbridos de Populus trichocarpa × Populus deltoides submetidas a 20 flexões caulinares diárias durante 60 dias, que foram eficientes para promover a redução de 8% no incremento altura e ganho de 34% de incremento no diâmetrodo coleto. Logo, os resultados observados na Figura 2 corroboram com a redução no alongamento, seguido do incremento na elongação celular, respostas tigmomorfogenéticas primárias de mudas submetidas à perturbação mecânica.
A massa seca da raiz apresentou um aumento diretamente proporcional à frequência das flexões caulinares em ambos os tamanhos de mudas testados (Figura 3-a). De acordo com Binotto (2007), um sistema radicular mais desenvolvido em mudas de espécies lenhosas assegura uma melhor sobrevivência a campo.
A massa seca da parte aérea reagiu indiferentemente da frequência dos estímulos em mudas menores que 15 cm de altura (P > 0,05), externando média de 0,841 g. Por outro lado, em mudas maiores que 15 cm, houve maior incremento da massa seca da parte aérea com 20 flexões, apresentando redução na massa conforme aumento da frequência dos estímulos (Figura 3-b). Vegetais submetidos a oscilações similares àquelas da movimentação atmosférica reduzem o crescimento primário e aumentam o crescimento secundário (NEEL e HARRIS, 1971; 1972; MITCHELL e MYERS, 1995; OSLER et al., 1996).
Segundo Telewski e Jaffe (1986), a redução no crescimento das plantas sujeitas a maior carga mecânica pode estar associada à diminuição da área foliar e, consequentemente, à redução da capacidade fotossintética. Para Gomes e Paiva (2004), o peso da matéria seca da parte aérea indica a rusticidade e correlaciona-se diretamente com a sobrevivência e desempenho inicial das mudas após o plantio a campo.
A análise dos dados da taxa de crescimento absoluto, com mudas maiores ou menores que 15 cm de altura (Figura 3-c), revelou que em até 20 flexões diárias ocorreu aumento na velocidade de crescimento tanto dos tecidos aéreos como dos radiculares. A taxa de crescimento absoluto indica a velocidade média de crescimento ao longo do período de observação (BENINCASA, 2003).
O estímulo da tigmomorfogênese varia entre os indivíduos da espécie e entre as espécies vegetais, tendo em vista que organismos adaptados a ambientes com movimentação atmosférica (vento) expressam resposta maior aos estímulos mecânicos do que outras não adaptadas (TELEWSKI e PRUYN, 1998). Plantas sem células sensoriais especializadas respondem também à perturbação mecânica. No entanto, aquelas reagem lentamente ao longo do tempo, alterando a morfologia bem como a taxa de crescimento (CHERAB et al., 2009).
Tecidos vegetais submetidos a qualquer situação de estresse apresentaram um aumento na atividade da peroxidase desencadeando processos fisiológicos que culminam na proteção celular contra reações oxidativas, na lignificação da parede celular, na oxidação de compostos fenólicos, na biossíntese de etileno, e na manutenção da integridade das membranas (TAIZ e ZEIGER, 2009).
O aumento no número de flexões caulinares resultou na redução linear da perda de eletrólitos das raízes (PER) em mudas de Maytenus ilicifolia (Figura 4). Um valor baixo de PER indica alta viabilidade dos tecidos radiculares permitindo a absorção de água para amenizar o choque pós- plantio. Mudas com altura maior ou menor que 15 cm submetidas a 40 flexões caulinares diárias mostraram redução no extravasamento de eletrólitos de até 24% e 38%, respectivamente, em contraste com as mudas do tratamento controle.
A distinção entre classes das mudas em função da altura pela perda de eletrólitos de raízes foi efetiva após 20 flexões caulinares diárias, cujas discrepâncias entre classes foram mais evidentes. Mudas categorizadas como pequenas (altura menor que 15 cm) por apresentarem menor valor para perda de eletrólitos de raízes, evidenciaram menor integridade das membranas em comparação com as mudas categorizadas como grandes (altura maior do que 15 cm), pois o sistema de reparo de membranas foi mais efetivo naquela classe, dado pela maior magnitude na redução do extravasamento de íons.
A degradação ocasionada pelo estresse leva à perda da capacidade da permeabilidade seletiva da membrana celular de tecidos radiculares e, consequentemente, a de reter íons. Portanto, a quantificação dos íons que extravasam através das membranas celulares dos tecidos radiculares estima as condições de integridade celular dos mesmos (PALTA et al., 1977; FERNANDES e SOUZA, 2006). O estímulo mecânico induz a uma deposição de substâncias osmoticamente ativas no sistema radicular como prolina e açúcares solúveis os quais conferem maior tolerância ao estresse por meio do ajustamento osmótico (GUO et al., 1999).
O estresse mecânico aplicado por meio de flexões caulinares durante a fase de rustificação de mudas é uma opção para promover a melhoria na qualidade de mudas, pela capacidade de manipulação das relações entre parte aérea e sistema radicular. Contudo, torna-se necessário investigar se as respostas observadas no viveiro mediante estudos de dose-resposta refletem em melhoria no estabelecimento das mudas a campo, além de torná-lo o método exequível para outras espécies e replicável em grandes áreas de produção de mudas.
CONCLUSÕES
Flexões caulinares induzem alteração na morfometria de mudas de Maytenus ilicifolia, independentemente da altura inicial. A alteração na morfometria, aferida pelo teste da perda de eletrólitos das raízes (PER), sugere maior rusticidade das mudas frente a estresses abióticos. Mudas de Maytenus ilicifolia com altura maior que 15 cm apresentaram maior velocidade no crescimento, redução no alongamento da parte aérea, e maior crescimento radial quando submetidas a 20 flexões caulinares diárias.