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Aspectos epidemiológicos da podridão-de-raízes da erva-mate (Ilex paraguariensis)

Epidemiological aspects of root-rot of 'erva-mate' (Ilex paraguariensis)

Resumos

A podridão-de-raízes da erva-mate, causada por Fusarium spp., Rhizoctonia sp. e Pythium sp., é a principal doença da cultura e causa sérios prejuízos em viveiro e a campo. No entanto, existem poucos estudos referentes à epidemiologia dessa doença. Assim, o presente trabalho teve por objetivo estudar e descrever os principais aspectos epidemiológicos relacionados à podridão-de-raízes da erva-mate em viveiro e a campo. Para isso, foram demarcados para estudo ervais e viveiros localizados na região alta do Vale do Taquari - RS, nos quais se procedeu a coleta de flores, frutos, sementes, plântulas, mudas e substrato para análises laboratoriais. Observou-se que as flores podem ser a porta de entrada dos patógenos no patossistema, pois 80% delas apresentaram contaminação por Fusarium sp. e 15% por Rhizoctonia sp. Além disso, o método de obtenção e estratificação das sementes, utilizado pelos viveiristas, contribuem para o aumento da contaminação, chegando a 100% das sementes no momento da semeadura. Observou-se, também, que as mudas podem estar contaminadas, mesmo não apresentando sintomas e, ao serem replantadas a campo, venham a contaminar áreas livres dos patógenos. Os testes de patogenicidade com alguns isolados mostraram sua capacidade em causar a doença.

ervais; proteção florestal; viveiros


The root-rot of erva-mate, caused for Fusarium spp., Rhizoctonia sp. and Pythium sp., is the main disease of the culture and causes serious damages in nurseries and forest stands. However, few studies exist regarding to the epidemiology of this disease. Thus, the present work studied and described the main epidemic aspects related to erva-mate root-rot in nurseries and forest stands. For that, nurseries and forest stands were chosen for studies in Vale do Taquari, RS state, where flowers, fruits, seeds, plantlets, seedlings and soil were collected for laboratory analyses. It was observed that the pathogens can enter in the patho-system through the flowers, because 80% of them presented contamination of Fusarium sp. and 15% of Rhizoctonia sp. Moreover, the obtaining method and stratification of the seeds, used in the nurseries, contribute to the increase of contamination, reaching 100% of the seeds in the moment of sowing. It was also observed that contaminated seedlings may be symptomless and, after transplanting in the field, contaminate pathogen free areas. Pathogenicity tests with some isolates showed their capacity of causing the disease.

stands; forest protection; nurseries


INTRODUÇÃO

A erva-mate (Ilex paraguariensis A. St.-Hill) pertence à família Aquifoliaceae, é nativa da Região Sul do Brasil e também da Argentina e Paraguai, compreendendo, entre os três países, aproximadamente 540.000 km2 de área natural (ANDRADE, 1999ANDRADE, F M. de. . A exploração e utilização do recurso Ilex paraguariensis A. St.-Hil. (erva-mate), seus impactos sócio-econômicos atuais e potencialidades de manejo sustentável . In: SEMINÁRIO NACIONAL DE RECURSOS FLORESTAIS DA MATA ATLÂNTICA, 1, 1999, São Paulo Anais... São Paulo: Horto Florestal, 1999. p. 24-33. .). Segundo dados do IBGE (2012)IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Estados@. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/estadosat/temas.php?sigla=pr&tema=lavourapermanente2010>. Acesso em: 23 de mar. 2012.
http://www.ibge.gov.br/estadosat/temas.p...
referentes à safra 2010, o Brasil produziu 425.641.000 kg de folhas em 70.301 ha, contabilizando uma renda aos produtores de R$159.839.000, demonstrando a importância da cultura para a geração de renda e emprego.

Embora a cultura da erva-mate represente valores significativos em termos de área cultivada e recursos financeiros gerados, os povoamentos de erva-mate e a produção de mudas vêm sofrendo sérios prejuízos em função da baixa produção e da mortalidade de mudas devido à podridão-de-raízes (causada por Fusarium spp., Rhizoctonia sp. e Pythium sp.). Nos povoamentos da espécie, a doença causa mortalidade de plantas, na maioria das vezes, localizadas em reboleiras. A doença manifesta-se, inicialmente, com amarelecimento e queda excessiva de folhas, evoluindo para morte de alguns galhos até a seca total e morte da planta. Quando aparecem os primeiros sintomas, o sistema radicular apresenta necroses localizadas que logo evoluem para todas as raízes. Nas mudas, a morte acontece alguns dias depois de aparecerem os sintomas, atacando as plântulas na sementeira, ou mudas já nas embalagens (POLETTO et al., 2006POLETTO, I. et al. Zoneamento e identificação de Fusarium spp causador de podridão-de-raízes em plantios de erva-mate (Ilex paraguariensis A. St.-Hil.) na região do Vale do Taquarí-RS. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 16, n. 1, p. 1-10, 2006.; POLETTO et al., 2007POLETTO, I. et al. Primeira ocorrência de Pythium sp e Rhizoctonia sp. causando podridão-de-raízes em ervais no Rio Grande do Sul. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 17, n. 1, p. 65-71, 2007.).

No caso desta doença, a adoção de medidas de controle é bastante limitada devido à falta de informações relacionadas aos aspectos epidemiológicos. Segundo Maffia e Mizubuti (2005)MAFFIA, L A . MIZUBUTI, E S. G. . Epidemiologia de doenças radiculares. In: MICHEREFF, S. J.; ABDRADE, D. E. G. T.; MENEZES, M. (Ed) Ecologia e manejo de patógenos radiculares em solos tropicais. Recife: UFRPE, 2005. p. 209-246., os estudos epidemiológicos são essenciais para o manejo racional e a redução de perdas causadas por doenças de patógenos do sistema radicular. O entendimento do comportamento do patógeno, fontes de inóculo, meios de disseminação e dos fatores do ambiente que interferem no patossistema tornam-se fundamentais para o sucesso das medidas adotadas.

Em função do exposto acima, este trabalho teve por objetivo analisar e descrever os principais aspectos epidemiológicos relacionados à podridão-de-raízes da erva-mate.

MATERIAL E MÉTODOS

A região em estudo localiza-se, aproximadamente, entre as latitudes 28º49' e 29º03' S e longitudes 51º55' e 52º20' W, conhecida por região alta do Vale do Taquari - RS e municípios próximos, compreendida por Arvorezinha, Ilópolis, Anta Gorda, Fontoura Xavier, Itapuca, São José do Erval e Doutor Ricardo, apresentando altitudes que variam de 200 a 800 m. O relevo é ondulado a montanhoso (BRASIL, 1973BRASIL. Ministério da Agricultura. Divisão de Pesquisas Pedológicas. Levantamento de reconhecimento dos solos do estado do Rio Grande do Sul. Recife: MA/DPP-AS/DRNR, 1973. 431 p.) predominando os Neossolos Litólicos e Chernossolos Argilúvicos e, onde o relevo é mais suave, predominam Argissolos Vermelhos e Nitossolos Vermelhos (STRECK et al., 2002STRECK, E. V. et al. Solos do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: EMATER/RS; UFRGS, 2002. 126 p.). O clima, segundo a classificação climática de Köppen, é Cfa, subtropical. A precipitação média anual é de 1800 mm, sendo bem distribuída ao longo do ano (MORENO, 1961MORENO, J A . Clima do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Secretaria da Agricultura, 1961. 41p.).

Inicialmente, com a ajuda dos técnicos da Associação Rio-Grandense de Empreendimentos de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER-RS), foram contatadas propriedades rurais e viveiros produtores de erva-mate interessados em fornecer material para estudo. Em alguns locais selecionados, os ervais estavam sadios, os demais locais apresentavam ervais com sintomas da doença. Em cada local foram coletadas informações a respeito das principais técnicas de cultivo utilizadas.

Durante um ciclo de produção de mudas no viveiro (2009 - 2010) procederam-se as coletas de sementes, plântulas, mudas e substrato que foram analisadas no Laboratório de Fitopatologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Cada amostra coletada foi identificada, com as iniciais do nome do proprietário e do tipo de amostra. As amostras CG, IP, NS, AP, SB, AR e AC foram coletadas em Anta Gorda, SB, AF, LR e ND em Ilópolis e JD, MG, DC e AM em Arvorezinha.

Foram coletadas sementes recém-lavadas (despolpadas), sementes no final do processo de estratificação, sementes em sementeiras e sementes em semeadura direta, aproximadamente 20 dias após a semeadura (há duas técnicas de semeadura para produção de mudas de erva-mate: a tradicional, com semeadura em sementeiras e, a semeadura direta, em que as sementes são colocadas diretamente nos recipientes, nos quais as mudas permanecem até estarem prontas para plantio a campo). As amostras coletadas foram armazenadas em sacos plásticos, devidamente vedadas, identificadas e mantidas em geladeira (±4ºC) por no máximo dois dias. Para a análise, inicialmente, as sementes foram lavadas em água corrente para retirar o excesso de substrato. Em seguida, foram lavadas novamente, primeiramente com uma solução de álcool a 70% por 1 min e depois em uma solução de hipoclorito a 3% por mais 1 min (TANAKA, 1987TANAKA, M. A. S. Técnicas auxiliares em laboratório de patologia de sementes . In: SOAVE, J.; WETZEL, M M V. da S. . (Ed.). Patologia de sementes. São Paulo: Fundação Cargill, 1987. 480 p.). Depois da desinfestação, cem sementes de cada amostra foram colocadas em câmara úmida em caixas gerbox contendo papel-filtro umedecido, e incubadas a 24°C, com fotoperíodo de 12 h por sete dias. Após esse período, as sementes foram observadas em microscópio estereoscópico e, também, com confecção de lâminas para observação em microscópio óptico. Com base na bibliografia especializada (BARNETT; HUNTER, 1999BARNETT, H. L.; HUNTER, B B. Ilustrated genera of imperfect fungi. 4th ed. St. Paul: American Phytopathological Society, 1999. 218 p.; LUZ et al., 2001LUZ, E. D. M. N. et al. Doenças causadas por Phytophthora no Brasil. Campinas: Livraria e Editora Rural, 2001. 754 p.) foram determinados os gêneros fúngicos presentes em cada semente e a sua incidência.

Também foram coletadas plântulas em sementeiras e diretamente nas embalagens em que houve semeadura direta. Estas foram devidamente embaladas e mantidas em geladeira (±4ºC) até sua análise. Para isso, as plântulas foram lavadas em água corrente para remoção de restos de substrato presente junto às raízes. Em seguida, a parte aérea foi retirada e o restante, contendo a parte radicular e a região do colo, foi lavado novamente, primeiramente com uma solução de álcool a 70% por 1 min e, depois, em uma solução de hipoclorito a 3% por mais um minuto (TANAKA, 1987TANAKA, M. A. S. Técnicas auxiliares em laboratório de patologia de sementes . In: SOAVE, J.; WETZEL, M M V. da S. . (Ed.). Patologia de sementes. São Paulo: Fundação Cargill, 1987. 480 p.), depois, transferido para placas de Petri contendo meio de cultura BDA (batata-dextrose-ágar) suplementado com 4,0 mg de estreptomicina (concentração de 70%) por 100 mL de meio. Em cada placa foram colocadas dez plântulas e, cada amostra foi composta por três placas, totalizando trinta plântulas. As placas foram mantidas em câmara de crescimento por seis dias a 24ºC, com fotoperíodo de 12 h e, após esse período, foram quantificados e identificados os fungos presentes, em nível de gênero, pelas observações das placas diretamente no microscópio estereoscópico e com confecção de lâminas para observação em microscópio óptico, com base na bibliografia especializada.

Para as amostras de mudas nos recipientes (os recipientes utilizados na produção de mudas de erva-mate são sacos plásticos pretos com tamanhos que variam de 10 x 7 cm a 18 x 12 cm, altura e largura, respectivamente), prontas para a comercialização, o processo de coleta e análise teve o mesmo procedimento das plântulas em sementeira, exceto sua incubação, que ocorreu em caixas gerbox contendo papel-filtro umedecido, por sete dias.

Amostras do substrato utilizado nos viveiros foram coletadas para determinação da comunidade fúngica, utilizando a seguinte metodologia: 10 g de solo de cada amostra foram diluídos em 90 mL de água destilada e esterilizada, juntamente com duas gotas do emulsificante Tween 80, agitado por 2 min e, partindo dessa suspensão, foram feitas diluições sequenciais de 10-2, 10-3 e 10-4. Em cada diluição, foi retirada uma alíquota de suspensão e inoculada em três placas de Petri (0,5 mL placa-1) contendo meio BDA, suplementado com 4,0 mg de estreptomicina (concentração de 70%) por 100 mL de meio. As placas inoculadas foram mantidas em câmara de crescimento por seis dias a 24ºC, com fotoperíodo de 12 h e, após esse período, os fungos presentes foram quantificados e identificados, em nível de gênero, pelas observações das placas diretamente no microscópio estereoscópico e com confecção de lâminas para observação em microscópio óptico, com base na bibliografia especializada. O número de unidades formadoras de colônia (UFCs) de cada gênero fúngico presente foi determinado através das equações citadas por Carter (1993): FD = Di x Ds x Q, em que: FD = Fator de diluição, Di = Diluição inicial, Ds = Diluição subsequente, Q = Quantidade colocada na placa. E, UFCs = (1/FD) x n, em que: UFCs = Unidades formadoras de colônias, n = Número de colônias contadas na placa.

Além dessas amostras, foram coletadas flores e frutos de erva-mate em ervais onde os viveiristas geralmente coletam frutos para obtenção das sementes. Em cada erval foram coletadas flores, em cerca de vinte plantas, de forma arbitrária. Da mesma forma, foram coletados frutos, no estágio fenológico em que começavam a apresentar coloração vermelha. Cem flores e cem frutos de cada erval amostrado foram colocados em câmara úmida em caixas gerbox contendo papel-filtro umedecido, incubados a 24°C com fotoperíodo de 12 h por sete dias. Uma amostra de frutos foi despolpada e as sementes lavadas, primeiramente com uma solução de álcool a 70% por 1 min e, depois, em uma solução de hipoclorito a 3% por mais um minuto (TANAKA, 1987TANAKA, M. A. S. Técnicas auxiliares em laboratório de patologia de sementes . In: SOAVE, J.; WETZEL, M M V. da S. . (Ed.). Patologia de sementes. São Paulo: Fundação Cargill, 1987. 480 p.) para desinfestação e, em seguida, incubadas nas condições citadas anteriormente. Para estas amostras foram quantificados e identificados os fungos presentes, em nível de gênero.

As colônias dos gêneros Fusarium crescidas nas placas com diluição de substrato, sobre as flores, os frutos e as sementes, foram isoladas e purificadas de acordo com a metodologia descrita por Fernandes (1993) e, em seguida, armazenadas em tubos de vidro por quatro meses contendo meio de cultura BDA devidamente identificados, para estudos posteriores.

Para os testes de patogenicidade, foram cultivadas mudas de erva-mate em embalagens maiores (18 x 22 cm) para que pudessem permanecer por mais tempo em ambiente de viveiro. Quando as mudas estavam com cerca de 40 cm de altura (maio de 2010) foram inoculadas com os isolados de Fusarium.

Para a produção do inóculo de Fusarium, porções das colônias armazenadas em tubos de ensaio foram retiradas e transferidas para frascos de vidro contendo 30g de arroz (sem casca, tipo parboilizado) previamente umedecido e autoclavado (30 min a 121°C a 1 atm). Depois de inoculados, os frascos permaneceram na câmara de incubação a 24°C com fotoperíodo de 12 h por 20 dias. Após esse período, os grãos de arroz contendo o fungo crescido, foram agitados com um bastão de vidro e, em seguida, inoculados na profundidade de dois centímetros, no substrato dos recipientes das mudas. Cada frasco contendo 30 g de arroz foi inoculado em quatro mudas. Quatro mudas permaneceram separadas sem inoculação, como testemunhas.

Duas semanas após a inoculação começaram as avaliações semanais observando-se, visualmente, o aparecimento de sintomas da doença. Ao final da avaliação (três meses após a inoculação), as mudas foram arrancadas e suas raízes foram lavadas em água corrente para a retirada do substrato e analisadas em microscópio estereoscópico. Em seguida, porções das raízes e do caule foram colocadas em câmara úmida para verificação do crescimento dos patógenos a partir dos tecidos internos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A porcentagem de flores de erva-mate contaminadas por Fusarium e Rhizoctonia, coletadas em ervais sadios e sintomáticos encontra-se na Figura 1A. Observa-se que a contaminação por Fusarium foi superior a 80% em todos os ervais, independentemente de serem sadios ou doentes. Há também, uma pequena contaminação, em torno de 15%, por Rhizoctonia.

Figura 1.
Porcentagem de flores (A) e frutos (B) contaminados por Fusarium e Rhizoctonia. As indicações CG, SB, JD, IP, NS, AP e SB referem-se aos ervais amostrados e, as letras após o hífen, referem-se à condição do erval: sadio (S) ou doente (D).

As flores acabam sendo a porta de entrada dos patógenos em muitos patossistemas. Um exemplo disso é caso do patossistema Botrytis cinerea - kiwi, nos Estados Unidos e na Nova Zelândia. Conídios do patógeno, produzidos sobre frutos podres e folhas senescentes, durante o inverno e primavera, chegam até as flores, disseminados pelo vento e insetos polinizadores. O patógeno se desenvolve e acaba contaminando o fruto, provocando seu apodrecimento pré e pós-colheita (MICHAILIDES; ELMER, 2000MICHAILIDES, T. J.; ELMER, P A G. Botrytis gray mold of kiwifruit caused by Botrytis cinerea in the United States and New Zealand. Plant Disease, v. 84, n. 3, p. 208-223, 2000.).

Outro exemplo é a mal-formação-da-manga (Mangifera indica L.), causada por Fusarium sacchari. A doença caracteriza-se pela infecção do patógeno nas inflorescências, transformando-as em uma massa compacta de flores estéreis. Os prejuízos, nesse caso, são em função da total ou parcial supressão das flores, impedindo a produção de frutos (ANJOS; CHARCHAR, 2007ANJOS, J. de R. N. dos; CHARCHAR, M J d'ÁVILA . Patogenicidade de isolados de Fusarium sacchari de Mangueira do Cerrado do Brasil Central. Planaltina: Embrapa Cerrados, 2007. 14 p (Documentos, 180). .).

A podridão-basal-dos-citros (PFC) também conhecida por estrelinha, causada por Colletotrichum acutatum é uma das principais doenças dos citros e afeta flores e frutos recém-formados. As flores atacadas pelo fungo apresentam lesões necróticas e caem. Quando o ataque é nos frutos recém-formados, eles ficam amarelados e caem rapidamente. Já os discos basais, cálices e pedúnculo ficam aderidos aos ramos por mais 18 meses, formando estruturas que parecem "estrelinhas" (AZEVEDO et al., 2008AZEVEDO, F A. de. et al. Controle químico de Colletotrichum acutatum em Laranja-doce-barão. Laranja, v. 29, n. 1-2, p. 23-34, 2008.). Nesses órgãos, o fungo sobrevive na forma de apressórios e, possivelmente, na forma de hifas subcuticulares e intercelulares. Essas hifas e os apressórios podem germinar em resposta a estímulos produzidos por nutrientes que são lavados das flores, produzindo muitos conídios que podem iniciar novas infecções (FEICHTENBERGER, 2005FEICHTENBERGER, E. et al. Doenças dos Citros . In: KIMATI, H. et al. (Ed.) Manual de Fitopatologia: Doenças de plantas cultivadas. 4. ed. São Paulo: Agronômica Ceres, 1995. p. 239-269.).

Os frutos de erva-mate (Figura 1B) apresentaram uma variação de 19 a 90% na porcentagem de contaminação por Fusarium e uma pequena contaminação (<10%) por Rhizoctonia, nos diferentes ervais. Apenas dois ervais NS-S (26%) e AP-S (19%) apresentaram uma menor porcentagem de contaminação por Fusarium. Nos demais, a contaminação foi acima de 80%, não havendo distinção entre ervais sadios e doentes quanto à presença dos patógenos.

Em flores e frutos, além de Fusarium e Rhizoctonia, foi constatada a presença de esporos dos gêneros Colletotrichum, Verticillium, Botrytis, Penicillium, Alternaria, Cladosporium, Paecilomyces, Periconia, Phoma, Chaetomium, Oidiodendron, Trichoderma, Dictyosporium, Rhizopus, Epicoccum, Mucor, Bipolaris, Gonatobotrys, Arthrobotrys e Aspergillus. Destes, somente Colletotrichum é patógeno da erva-mate, agente causal da pinta-preta e antracnose, responsáveis por sérios prejuízos em viveiros e ervais (GRIGOLETTI JUNIOR et al., 1996GRIGOLETTI JUNIOR, A.; AUER, C. G.; MASCHIO, L M A. Doenças em erva-mate (Ilex paraguariensis A St.-Hill) na região sul do Brasil. Boletim de Pesquisa Florestal, v. 32/33, p. 43-51, 1996.; GOMES et al., 2001GOMES, N. S B. et al. Patogenicidade de Colletotrichum acutatum em folhas destacadas de erva-mate. Boletim de Pesquisas Florestais, n. 43, p. 151-154, 2001.).

Colletotrichum é um importante patógeno de flores e frutos em algumas espécies de plantas. Em cultivos de oliveira (Olea europaea L.), por exemplo, o patógeno causa graves infecções nas suas flores, causando perdas em decorrência da queda das mesmas e, em seguida, a partir das flores que permanecem, passa a contaminar os frutos, causando prejuízos em função da antracnose (MORAL et al., 2009MORAL, J.; OLIVEIRA, R. de; TRAPEDO, A. Elucidation of the disease cycle of Olive Anthracnose caused by Colletotrichum acutatum. Phytopathology, v. 5, n. 5, p. 548-556, 2009.). Para a cultura do café (Coffea arabica L.) em todo o mundo, Colletotrichum frequentemente está associado a flores e frutos, causando perdas de 50 a até 80% na produção, em decorrência da queda prematura de flores e frutos (FERREIRA et al., 2005FERREIRA, J. B. F.; ABREU, M. S. de; PEREIRA, I S. Incidência de Colletotrichum spp em frutos de Coffea arabica L. em diferentes estádios fisiológicos e tecidos do fruto maduro. Ciência e Agrotecnologia, v. 29, n. 4, p. 880-885, 2005.). Em frutos de pitangueira (Eugenia uniflora L.) coletados em Santa Maria - RS, Ávila et al. (2009)ÁVILA, A. L. de. et al. Maturação fisiológica e coleta de sementes de Eugenia uniflora L (Pitanga) . Ciência Florestal, Santa Maria, v. 19, n. 1, p. 61-68, 2009. encontraram Cladosporium, Alternaria, Pestalotia, Fusarium e Penicillium associados aos frutos. Os autores ressaltam a importância do conhecimento dos fungos associados aos frutos, pois estes podem ser transmitidos para as sementes ocasionando problemas no armazenamento e posterior germinação.

As sementes despolpadas em laboratório (Figura 2A), mesmo desinfetadas com hipoclorito e álcool, apresentaram contaminação por Fusarium, variando de 2 a 12%, indicando que estes estão colonizando os tecidos internos, dificultando, assim, a adoção de métodos de tratamento das sementes. Somente o erval SB1-D apresentou contaminação com Rhizoctonia, porém, apenas em 1% das sementes.

Figura 2.
Porcentagem de contaminação por Fusarium e Rhizoctonia em sementes despolpadas em laboratório (A) e despolpadas pelos viveiristas (B), coletadas antes da estratificação. As indicações CG, IP, NS, AP, JD, AR, DC, AC, AF, ND, CG e SB referem-se aos ervais amostrados e, as letras após o hífen, referem-se à condição do erval: sadio (S) ou doente (D).

A porcentagem de contaminação de sementes de erva-mate, despolpadas pelos viveiristas, são apresentados na Figura 2B. No viveiro AC observa-se que 100% das sementes estavam contaminadas por Rhizoctonia e apenas 22% por Fusarium. Já os demais viveiros apresentaram uma alta contaminação por Fusarium, todos acima de 86%.

Há uma porcentagem de contaminação bem maior nas sementes despolpadas pelos viveiristas, se comparada com as despolpadas em laboratório. Além da desinfestação com hipoclorito e álcool, que pode ter diminuído a quantidade de inóculo nas sementes despolpadas em laboratório, o método de despolpamento utilizado pelos viveiristas pode proporcionar essa maior contaminação. Silva et al. (2011)SILVA, L. G. da. et al. Efeito do tratamento químico na sanidade de sementes de espécies florestais. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 21, n. 3, p. 473-478, 2011. também observaram que o tratamento com hipoclorito diminuiu significativamente a incidência de patógenos em diversas espécies florestais, no entanto, não eliminou-as totalmente.

Segundo relato dos viveiristas, o método de despolpamento comumente utilizado consiste em: primeiramente, colocar os frutos sobre uma lona plástica por três a cinco dias, na sombra, para amolecerem. Após esse período, os frutos são moídos e as sementes são lavadas em água corrente. Em seguida, as sementes são colocadas à sombra, para secar, por cerca de 10 dias. Nesse processo, não há a preocupação em retirar toda a casca e a polpa dos frutos, pois há um gasto grande de água neste processo. Analisando o método utilizado pelos viveiristas pode-se inferir que os restos de polpa e casca que permanecem aderidos às sementes podem constituir a fonte do inóculo de patógenos e, inclusive, de nutrientes para seu desenvolvimento, já que, como demonstrado na Figura 1B, os frutos apresentaram alta porcentagem de contaminação.

Além disso, a presença de diferentes gêneros fúngicos associados às sementes despolpadas pelos viveiristas é bem maior do que as despolpadas no laboratório. Foram encontrados os seguintes gêneros: Verticillium, Penicillium, Paecilomyces, Phoma, Trichoderma, Alternaria, Cladosporium, Epicoccum, Mucor, Dactylella, Oidiodendron e Rhizopus. Isso indica que as sementes não são lavadas corretamente, ou que são expostas à contaminação por estes fungos.

A contaminação de sementes por fungos é um problema para a maioria das espécies florestais como também observado por Rego et al. (2009)REGO, S. S. et al. Fungos associados a frutos e sementes de imbuia (Ocotea porosa Ness L. Barroso) .Summa Phytopathologica, v. 34, n. 4, p. 378, 2008. em frutos e sementes de Capororoca (Myrsine ferruginea Spreng.) no estado do Paraná. Eles encontraram 11 gêneros fúngicos, sendo nove potencialmente patogênicos. Seneme et al. (2012)SENEME, A. M. et al. Germinação, qualidade sanitária e armazenamento de sementes de canafístula (Peltophorum dubium). Revista Árvore, Viçosa, v. 36, n.1, p. 01-06, 2012. encontraram oito gêneros fúngicos em sementes de canafístula (Peltophorum dubium).

Benetti et al. (2009)BENETTI, S C. et al. Levantamento de fungos em sementes de Cedro e avaliação da patogenicidade de Fusarium sp e Pestalotia sp. Pesquisa Florestal Brasileira, Colombo, n. 58, p. 81-85, 2009. realizaram um levantamento de fungos associados a sementes de cedro (Cedrela fissilis Vell.) coletadas em diversos locais do estado do Paraná. Os gêneros Penicillium, Chaetomium, Aspergillus, Pestalotia, Rhizopus, Fusarium, Phomopsis, Colletotrichum, Macrophomina, Trichothecium, Epicoccum e Cladosporium foram encontrados e houve redução da germinação de sementes inoculadas com alguns isolados de Fusarium e Pestalotia.

Martinelli-Seneme et al. (2006)MARTINELLI-SENEME, A. et al. Germinação e sanidade de sementes de Bauhinia variegata. Revista Árvore, Viçosa, v. 30, n. 5, p. 710-724, 2006. detectaram os gêneros Trichothecium, Aspergillus, Cladosporium, Colletotrichum, Fusarium, Penicillium e Rhizopus em sementes de Bauhinia variegata, mas estes não exerceram efeito na germinação e vigor das sementes.

A presença de Trichoderma em frutos e sementes é interessante, pois esse fungo é um importante antagonista de Fusarium e Rhizoctonia. Segundo Martins-Corder e Melo (1998)MARTINS-CORDER, M. P.; MELO, I S. Antagonismo in vitro de Trichoderma spp a Verticillium dahliae KLEB. Scientia Agrícola, v. 55, p. 1-7, 1998. e Melo (1998)MELO, I. S. de Agentes microbianos de controle de fungos fitopatogênicos . In: MELO, I. S. de; AZEVEDO, J L de. . (Ed.) Controle Biológico. Jaguariúna: EMBRAPA, 1998. p. 17-67., este fungo tem como característica a produção abundante de conídios em conidióforos que emergem diretamente das hifas. É um fungo de solos orgânicos, vivendo saprofiticamente ou parasitando outros fungos. É um antagonista eficaz no controle de inúmeros fungos fitopatogênicos. Trichoderma pode atuar, via de regra, por meio dos seguintes mecanismos: parasitismo, antibiose, competição e indução de resistência.

No processo de estratificação, as sementes de erva-mate são colocadas, geralmente, em uma caixa de madeira por três a quatro meses e mantidas úmidas. Estas podem ser misturadas à areia ou em camadas intercaladas de areia e sementes. Neste processo, a concentração de sementes, em ambiente úmido, favorece o desenvolvimento e a transmissão de patógenos. A porcentagem de contaminação das sementes coletadas durante esse processo encontra-se na Figura 3A. Com exceção dos viveiros ND e DC, os demais apresentaram 100% de contaminação das sementes por Fusarium ou Rhizoctonia, isolada ou conjuntamente infestando as sementes.

Figura 3.
Porcentagem de contaminação por Fusarium e Rhizoctonia em sementes coletadas durante o período de estratificação (A), sementeira - SS e em semeadura direta - SPD (B). As indicações SP, AR, AF, MG, AC, LR, ND, DC e AM referem-se aos viveiros amostrados.

A contaminação por Rhizoctonia ficou bem mais evidente nas sementes em processo de estratificação, quando comparadas às sementes coletadas antes desse processo (Figura 3A). Torna-se claro, assim, que a concentração das sementes durante a estratificação faz com que o inóculo, presente em algumas sementes, passe para as adjacentes, contaminando-as.

Hoefnagels e Linderman (1999)HOEFNAGELS, M. H.; LINDERMAN, R G. Biological suppression of seedborne Fusarium spp during cold stratification of Douglas-fir seeds. Plant Disease, v. 83, n. 9, p. 845-852, 1999. analisaram três lotes de sementes de Pseudotsuga menziesii coletadas em diversas regiões dos Estados Unidos e constataram nove espécies de Fusarium associadas, além de outros fungos. Eles também demonstraram que o processo de estratificação das sementes desta espécie é responsável pelo significativo aumento na porcentagem de sementes contaminadas por Fusarium, de 10% a 15% antes da estratificação, para quase 100% ao final e que a presença desse patógeno, internamente às sementes, é de difícil erradicação.

Barrows-Broaddus e Dwinell (1985)BARROWS-BROADDUS, J.; DWINELL, L D. Branch Dieback and Cone and seed infection caused by Fusarium moniliforme Sheld var. subgutinans in a Loblolly-pine seed orchard in South Carolina. Phytopathology, v. 75, n. 10, p. 1104-1108, 1985. relatam que Fusarium moniliforme Sheld. var. subglutinans Wollenw. e Reick., agente causal do cancro-do-pinus (Pinus spp.), foi observado variando de 0% até 98% nas sementes da espécie, dependendo do lote.

Nas sementes coletadas na sementeira ou nas embalagens da semeadura direta (Figura 3B), novamente foi observado um alto percentual de contaminação por Fusarium e Rhizoctonia. Fusarium foi constatado, variando de 45% a 84% das sementes, dependendo do viveiro, enquanto Rhizoctonia estava presente entre 23% a 76% e, na maioria das vezes, os dois patógenos foram observados na mesma semente.

Os demais fungos encontrados nas sementes em estratificação (Figura 3A) e nas semeadas (Figura 3B) praticamente foram os mesmos e pertencem aos gêneros Verticillium, Botrytis, Penicillium, Paecilomyces, Phoma, Chaetomium, Trichoderma, Dictyosporium, Aspergillus, Curvularia, Rhinocladiella, Doratomyces, Circinotrichum, Amerosporium, Gliocephalis, Asteromyces, Nigrospora, Trichothecium, Arthrobotrys e Rhizopus. A abundância de fungos encontrados nas sementes deve-se ao contato das mesmas com o substrato, naturalmente rico em microrganismos.

Segundo Carneiro (1995)CARNEIRO, J G de A . Produção e controle de qualidade de mudas florestais. Curitiba: UFPR/FUPEF, 1995. 451 p., mudas originadas de sementes de baixa qualidade sanitária e fisiológica, ficam predispostas aos danos provocados pelas doenças. Sementes de pouco vigor, mal-beneficiadas, velhas ou em más condições de armazenamento, apresentam lenta emergência à superfície do substrato, favorecendo, consequentemente, o surgimento de doenças, como o tombamento de mudas. Da mesma forma, Piveta et al. (2010)PIVETA, G. et al. Superação de dormência na qualidade de sementes e mudas: influência na produção de Senna multijuga (L C. Rich.) Irwin & Barneby. Acta Amazônica, v. 40, n. 2, p. 281-288, 2010. relatam que a qualidade sanitária é um dos mais importantes aspectos na produção de mudas, pois os microrganismos podem causar anormalidades e lesões nas plântulas, bem como deterioração de sementes.

Pode-se observar que a maioria dos viveiros apresenta 100% das plântulas, coletadas em sementeira e em semeadura direta nas embalagens, contaminadas por Fusarium (Figura 4). Em relação à Rhizoctonia, a contaminação foi menor, em média 27%. A maioria das plântulas apresentava regiões enegrecidas ou necróticas no sistema radicular. Os demais fungos observados nas plântulas foram Penicillium, Rhizopus, Aspergillus Verticillium e Trichothecium, todos relatados como decompositores de matéria orgânica. O fungo Trichoderma é conhecido como controlador biológico de patógenos, principalmente, Fusarium e Rhizoctonia (MELO, 1998MELO, I. S. de Agentes microbianos de controle de fungos fitopatogênicos . In: MELO, I. S. de; AZEVEDO, J L de. . (Ed.) Controle Biológico. Jaguariúna: EMBRAPA, 1998. p. 17-67.) e sua presença nas plântulas de erva-mate poderia ter tal efeito. Porém, este fungo foi encontrado em somente quatro dos viveiros analisados e nestes, em uma média de apenas 3% das plântulas (Figura 4).

Figura 4.
Porcentagem de contaminação por Fusarium, Rhizoctonia e Trichoderma em plântulas sob semeadura direta - MPD e em sementeira MS. As indicações ND, DC, MG, AM, AC, SP e AR referem-se aos viveiros amostrados.

Graham e Linderman (1983)GRAHAM, J. H.; LINDERMAN, R J. Pathogenic seedborne Fusarium oxysporum from Douglas-fir. Plant Disease, v. 67, p. 323-325, 1983. descrevem que a doença "damping-off" de pré e pós-emergência em Pseudotsuga menziensii (Mirb.) Franco e Pinus lambertiana Dougl., nos Estados Unidos, está frequentemente associada ao Fusarium oxysporum oriundo do solo, ar ou água de irrigação, porém, eles comprovaram que as frequentes perdas por "damping-off" de mudas em viveiros foram provocadas por infecções de F. oxysporum transmitido por sementes e que, todos os isolados testados apresentaram alta severidade de "damping-off" de pré e pós-emergência e podridão-de-raízes das mudas.

Cerca de 40 a 60% das mudas no estágio final do ciclo de viveiro, apresentaram sintomas da doença no sistema radicular (regiões necróticas ou enegrecidas) (Figura 5A). Observa-se (Figura 5B) que em praticamente todos os viveiros há 100% de contaminação por Fusarium e Rhizoctonia no sistema radicular, mesmo não apresentando sintomas na parte aérea. Assim, mudas contaminadas por patógenos são transplantadas para o campo, podendo contaminar áreas livres de patógenos.

Figura 5.
Porcentagem de mudas que apresentaram sintomas da podridão-de-raízes (A); e mudas que apresentaram contaminação por Fusarium e Rhizoctonia ao final do ciclo de viveiro (B). As indicações AC, SP, AR, AM, ND, DC, AF, SP e MG referem-se aos viveiros amostrados.

Constatou-se que há uma variação na quantidade de Fusarium de 1,0 até 10,3 UFCs mg-1 de substrato coletado antes de ser utilizado para produção de mudas, dependendo do viveiro (Figura 6A). No viveiro AM há uma população considerável de Fusarium (10,3 UFCs mg-1). A população de Rhizoctonia variou de 0 até 2,3 UFCs mg-1. Isso poderá refletir em perdas na germinação de sementes e/ou mortalidade de mudas com a utilização deste substrato. Trichoderma está presente em todos os viveiros, porém, com uma população baixa (0,3 a 2,7 UFCs mg-1).

Figura 6.
Número de UFCs mg-1 de Fusarium, Rhizoctonia e Trichoderma no substrato coletado antes do plantio das mudas (C) e nas embalagens ao final do ciclo de viveiro (D). As indicações AC, SP, AR, AM, ND, DC, AF, SP, e MG referem-se aos viveiros amostrados.

Observa-se (Figura 6B) que há uma variação, em cada viveiro, no número de UFC mg-1 de substrato das populações de Fusarium, Rhizoctonia e Trichoderma presentes no substrato coletado nos recipientes das mudas ao final do ciclo de viveiro. O substrato do viveiro SP apresentou a maior população de Fusarium (4,3 UFCs mg-1), mas este esteve presente em todos os locais coletados. Rhizoctonia foi constatada em SP, AF e MG com uma população variando de 0,3 a 1,0 UFCs mg-1. Trichoderma foi observado em todos os locais, com uma população variando de 0,3 a 2,0 UFCs mg-1.

Analisando a Figura 6 A e B conjuntamente, observa-se que a população de Fusarium, em geral, foi maior no substrato antes de ser utilizado para a produção de mudas, comparado com o examinado ao final do ciclo de viveiro. Essa tendência foi observada para os demais fungos também. Uma explicação para isso poderia ser o fato que ao final do ciclo de viveiro, o substrato tenha perdido uma determinada quantidade de nutrientes em função da absorção pela muda ou pela lixiviação com a água de irrigação e, também, há a possibilidade que o Trichoderma tenha atuado como antagonista.

Os resultados mostrados acima evidenciam que as técnicas de obtenção de sementes, e manejo e cultivo dos viveiros, favorecem o desenvolvimento de patógenos transmitidos por sementes e substrato, chegando a 100% de contaminação por Fusarium e Rhizoctonia, refletindo em perdas por mortalidade de mudas e, também, na qualidade final das mudas.

Para Cram e Fraedrich (2009)CRAM, M. M.; FRAEDRICH, S W. Seed diseases and seedborne pathogens of North America. Tree Planters's Notes, v. 53, n. 2, p. 35-44, 2009., doenças em sementes de espécies florestais, relacionadas a patógenos transmitidos pelas sementes, são causadas principalmente por fungos, e numerosas espécies podem estar associadas, mas muitas são saprófitas e não afetam o desempenho e a sanidade de sementes. Perdas relacionadas a esses patógenos incluem redução na germinação, aumento do "damping-off" e mortalidade de mudas mais velhas. O efeito desses patógenos na produção de sementes e mudas implica em perdas que variam de insignificantes até grandes falhas em sementeiras ou nos recipientes. Quantificar as perdas causadas por patógenos de sementes é, geralmente, uma tarefa difícil, pois podem ser de outras causas, como "damping-off" causado por fungos de solo. O conhecimento da biologia dos patógenos de sementes e as práticas para seu manejo e controle podem auxiliar nos pomares de sementes e na produção de mudas reduzindo as perdas no viveiro.

Foram coletadas, purificadas e armazenadas 81 colônias de Fusarium sp. e 5 colônias de Rhizoctonia sp. isoladas de flores, frutos, sementes e substrato. Em função do grande número de isolados, o que demandaria muitas mudas para inoculação e realização dos testes de patogenicidade, esses foram agrupados em função da semelhança morfológica. Assim, com este agrupamento, foram selecionados 15 isolados de Fusarium sp. e uma colônia de Rhizoctonia sp. para inoculação nas mudas de erva-mate.

Ao final da avaliação observou-se que as mudas não apresentaram sintomas na parte aérea. Aquelas inoculadas com os isolados I5, I6 e I7 de Fusarium também não apresentaram sintomas no sistema radicular, embora, após sete dias em câmara úmida, tenha crescido Fusarium sp. a partir dos tecidos internos, mostrando que estes não são patogênicos à erva-mate ou, por algum motivo, não puderam expressar sua patogenicidade. As mudas inoculadas com o isolado I11 não apresentaram sintomas e nem desenvolvimento de Fusarium sp. As inoculadas com os demais isolados (I1, I2, I3, I4, I8, I9, I10, I12, I13, I14 e I15) apresentaram manchas necróticas no sistema radicular, escurecimento das pontas das raízes e desenvolvimento de Fusarium sp. a partir dos tecidos internos do caule e das raízes, mostrando que estes são patogênicos.

As mudas inoculadas com Rhizoctonia sp. (I16) apresentaram escurecimento das pontas das raízes e desenvolvimento de micélio a partir dos tecidos internos. As não inoculadas (I0 - testemunha) não apresentaram qualquer sintoma e nem desenvolvimento de nenhum dos dois gêneros de patógenos.

CONCLUSÕES

A contaminação das flores e o substrato pode ser uma porta de entrada dos patógenos no patossistema erva-mate - Fusarium e erva-mate - Rhizoctonia.

O método de obtenção das sementes de erva-mate proporciona um significativo aumento da contaminação por patógenos.

Fusarium spp. e Rhizoctonia sp. são os principais patógenos contaminantes de sementes de erva-mate.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2015

Histórico

  • Recebido
    07 Ago 2012
  • Aceito
    22 Jul 2013
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