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ESTRESSE SALINO E HÍDRICO NA GERMINAÇÃO E CRESCIMENTO INICIAL DE PLÂNTULAS DE Toona ciliata M. ROEM. var. australis

SALINE AND WATER STRESS ON GERMINATION AND EARLY SEEDLING GROWTH OF Toona ciliata M. ROEM. var. australis

RESUMO

A espécie florestal Toona ciliata var. australis possui madeira de alto valor econômico para móveis e seus plantios não são afetados pela Hypsipyla grandella, praga que ataca plantios de monocultura de espécies nativas semelhantes à Toona ciliata. Possui uma estreita relação com a água disponível, ocorrendo geralmente em florestas úmidas no seu ambiente natural. Em plantios comerciais, esse é um dos fatores que mais limita seu estabelecimento e crescimento inicial. Nas últimas décadas, sua área de plantio no Brasil foi ampliada, entretanto, é escasso o conhecimento sobre o efeito de ambientes adversos na germinação e crescimento inicial de plântulas. O objetivo deste trabalho foi avaliar os efeitos do estresse salino e hídrico na germinação e crescimento inicial de plântulas de Toona ciliata, utilizando-se soluções contendo, ou NaCl, ou PEG 6000, nos potenciais osmóticos: -0,1; -0,2; -0,3; -0,4; -0,5; -0,6; -0,9; -1,2 e -1,5 MPa, mais a testemunha, com água esterilizada. As sementes foram submetidas ao teste de germinação sobre papel-germitest umedecido com a solução correspondente, e incubadas a 25 ± 2°C e fotoperíodo de 16 h por 21 dias. O delineamento experimental foi o inteiramente casualizado, arranjado em esquema fatorial 2 × 10 (agentes osmóticos × potenciais osmóticos), com quatro repetições de 50 sementes cada. Conforme a redução do potencial osmótico observou-se menor germinação, número de plântulas normais, massa fresca, comprimento de plântula e maior número de sementes duras, sendo mais severo em PEG 6000. Portanto, houve mais sementes germinadas sob o efeito do NaCl do que do PEG 6000. Entretanto, apesar da germinação alta em NaCl, o número de plântulas anormais também foi maior que em PEG 6000. Concluise que a germinação e o crescimento inicial de plântulas de Toona ciliata são afetados tanto pelo estresse salino como hídrico, sendo as plântulas mais sensíveis ao estresse hídrico, e com maior probabilidade de desenvolver plântulas anormais sob estresse salino.

Palavras-chave:
cedro-australiano; PEG 6000; NaCl

ABSTRACT

The Toona ciliata var. australis is a tree species which yields a very high-quality timber for furniture and is unaffected by Hypsipyla grandella, a pest that attacks monoculture plantations of native species similar to Toona ciliata. It has a close relationship with water availability, occurring mainly in humid forest in its natural habitat. In commercial plantations this is an important limitation to the establishment and initial growing of Toona ciliata. In the last decades, the use of Toona ciliata in commercial plantations has increased in Brazil, however, there is little knowledge about the effect of adverse environments on seed germination and early seedling growth. This study aimed to evaluate the effects of water and saline stress on germination and early seedlings growth of Toona ciliata. Osmotic solutions were prepared with, or NaCl, or PEG 6000, in the following osmotic potentials: -0.1; -0.2; -0.3; -0.4; -0.5; -0.6; -0.9; -1.2 and -1.5 MPa. For the control treatment, it was only used sterile water. The seeds were submitted to the germination test in which the germitest paper was moistened with the relative osmotic solution. The incubation was realized in a germination chamber at 25 ± 2 °C with 16 h light of photoperiod. The experimental design was completely randomized, arranged in a factorial design 2 × 10 (osmotic agent × osmotic potential and control), with four repetitions of 50 seeds each. With the reduction on the osmotic potential was observed lower germination, number of normal seedlings, fresh weight, seedling length and higher number of hard seeds, being the effect of PEG 6000 more severe. The germination and number of abnormal seedlings was higher under NaCl effect than PEG 6000. It can be concluded that germination and early seedling growth of Toona ciliata are affected by both saline and water stress, being more sensitive under water stress and with higher probability of developing abnormal seedlings under saline stress.

Keywords:
Australian red cedar; PEG 6000; NaCl

INTRODUÇÃO

A espécie florestal Toona ciliata M. Roem. var. australis tem sido explorada desde 1790 durante a colonização da Austrália por possuir madeira de alta qualidade e resistência a pragas. Pertence à família Meliaceae, reconhecida mundialmente pelas suas espécies de alto valor econômico (BYGRAVE; BYGRAVE, 2005BYGRAVE, F. L.; BYGRAVE, P. L. Growing Australian red cedar and other Meliaceae species in plantation. Canberra: RIRDC, 2005. 60 p.).

No Brasil é conhecida como cedro-australiano e sua madeira possui características similares à espécie nativa Cedrela odorata (MANGIALAVORI, 2003MANGIALAVORI, A. et al. Dasometria en plantaciones comerciales de toona (Toona ciliate var. australis) em la Província de Salta. In: DÉCIMAS JORNADAS TÉCNICAS FORESTALES Y AMBIENTALES, 2003. Eldorado. Anais... Eldorado: Facultad de Ciências Forestales, 2003.), sendo destinada para diversos fins, como móveis, construção civil, barcos, pisos e lâminas decorativas (BUFALINO et al., 2012BUFALINO, L. et al. Particleboards made from Australian red cedar: processing variables and evaluation of mixed-species. Journal of Tropical Forest Science, Kuala Lumpur, v. 24, n. 2, p. 162-172, 2012.). Diferentemente da Cedrela odorata, a Toona ciliata não é atacada pela Hypsipyla grandella (broca-do-mogno), praga que ataca plantios de monocultura provocando a bifurcação do fuste, destruindo totalmente a forma da árvore para produção de madeira. Por essa razão, Toona ciliata tem sido plantada no lugar dessa espécie (WEST, 2014WEST, P. W. Growing plantation forests. 2nd ed. [s. l.]: Springer International Publishing, 2014. 329 p.).

Em seu ambiente natural ocorre na floresta tropical e subtropical úmida, distribuindo-se ao longo da costa de rios, com bom desenvolvimento em solos ricos aluviais ou vulcânicos (BYGRAVE; BYGRAVE, 2005BYGRAVE, F. L.; BYGRAVE, P. L. Growing Australian red cedar and other Meliaceae species in plantation. Canberra: RIRDC, 2005. 60 p.; BOLAND et al., 2006BOLAND, D. J. et al. Forest trees of Australia. 5th ed. Victoria: CSIRO Publishing, 2006. 769 p.). Possui estreita relação com a disponibilidade de água, sendo esse um dos fatores que mais limita o estabelecimento e desenvolvimento inicial de Toona ciliata (DORDEL et al., 2011DORDEL, J. et al. Effects of nurse-tree crop species and density on nutrient and water availability to underplanted Toona ciliata in northeastern Argentina. Canadian Journal of Forest Research, Ottawa, v. 41, p. 1754-1768, 2011.; DORDEL; SEELY; SIMARD, 2011DORDEL, J.; SEELY, B.; SIMARD, S. W. Relationships between simulated water stress and mortality and growth rates in underplanted Toona ciliata Roem. in subtropical Argentinean plantations. Ecological Modelling, Amsterdam, v. 222, n. 17, p. 3226-3235, 2011.). Por essa razão, seu plantio deve ser consorciado com outras espécies que forneçam proteção contra seca e geada (WEST, 2014WEST, P. W. Growing plantation forests. 2nd ed. [s. l.]: Springer International Publishing, 2014. 329 p.).

Mesmo estando em ambiente úmido, as sementes podem não embeber devido ao potencial osmótico da solução, o qual é reduzido, quanto maior for a concentração de sais ou de outros agentes osmóticos. A redução do potencial osmótico diminui a disponibilidade de água para a semente, afetando a velocidade e a porcentagem de germinação, podendo em casos mais extremos cessá-la completamente ou ainda induzir dormência secundária (BEWLEY et al., 2013BEWLEY, J. D. et al. Seeds: physiology of development, germination and dormancy. 3rd ed. New York: Springer, 2013. 392 p.). Além disso, a alta concentração de sais pode rapidamente provocar injúrias em plântulas de espécies sensíveis (BEGUM; SELVARAJU; VENUDEVAN, 2013BEGUM, M. A. J.; SELVARAJU, P.; VENUDEVAN, B. Saline stress on seed germination. Scientific Research and Essays, [s.l.], v. 8, n. 30, p. 1420-1423, 2013.).

Devido à dificuldade em padronizar condições de solo, diversos agentes osmóticos têm sido utilizados para simular o efeito do estresse salino e hídrico. Os agentes osmóticos NaCl, glicerol, sucrose e o manitol provocam tanto o estresse hídrico como salino, pois possuem baixo peso molecular e, em razão disso, podem entrar e se acumular na célula provocando efeito tóxico. O polietilenoglicol (PEG) é um composto inerte muito utilizado para simular apenas o estresse hídrico, pois não provoca efeitos tóxicos devido ao seu alto peso molecular (KAYA et al., 2006KAYA, M. D. et al. Seed treatments to overcome salt and drought stress during germination in sunflower (Helianthus annuus L.). European Journal of Agronomy, Amsterdam, v. 24, n. 4, p. 291-295, 2006.; ELIAS et al., 2012ELIAS, S. G. et al. Seed testing: principles and practices. East Lansing: Michigan State University Press, 2012. 354 p.; CAVALLARO et al., 2016CAVALLARO, V. et al. Evaluation of variability to drought and saline stress through the germination of different ecotypes of carob (Ceratonia siliqua L.) using a hydrotime model. Ecological Engineering, Oxford, v. 95, p. 557-566, 2016.).

Tendo em vista a escassez de estudos sobre o comportamento das sementes de Toona ciliata sob alguns aspectos relacionados às suas tolerâncias/intolerâncias a fatores ambientais adversos, objetivou-se avaliar o efeito do estresse salino e hídrico na germinação e no crescimento inicial das plântulas dessa espécie, bem como definir os limites máximos de tolerância.

MATERIAL E MÉTODOS

Local de condução dos experimentos e procedências das sementes

O experimento foi conduzido no Laboratório do Departamento de Horticultura e Silvicultura pertencente à Faculdade de Agronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre - RS.

As sementes de Toona ciliata utilizadas no experimento foram adquiridas de empresas credenciadas no Registro Nacional de Sementes e Mudas (RENASEM). Cada lote foi caracterizado por sua procedência (diferentes estados), sendo: Lote 1 - São Paulo (SP), Lote 2 - Santa Catarina (SC) e Lote 3 - Bahia (BA). Todos apresentavam data de coleta do ano de 2014. O armazenamento das sementes foi realizado em câmara fria a 5°C e umidade relativa abaixo de 35%.

Tratamentos de estresse hídrico e salino

Para simular o efeito de estresse hídrico e salino foram utilizadas soluções contendo NaCl ou PEG 6000, nos potenciais osmóticos: -0,1, -0,2, -0,3, -0,4, -0,5, -0,6, -0,9, -1,2 e -1,5 MPa, além da testemunha.

A quantidade de massa necessária de PEG 6000 para atingir cada potencial osmótico foi calculada utilizando-se a equação de Michel e Kaufmann (1973MICHEL, B. E.; KAUFMANN, M. R. The osmotic potential of polyethylene glycol 6000. Plant Physiology, Lancaster, v. 51, n. 6, p. 914-916, 1973.):

ψ = - 1,18 x 10 - 2 C - 1,18 x 10 - 4 C 2 + 2,67 x 10 - 4 C T + ( 8,39 x 10 - 7 ) C 2 T

Em que: ψ = potencial osmótico (bar); C = concentração do PEG 6000, expresso em g.kg-1 de H2O ou g.L-1 de água destilada; e T = temperatura em graus Celsius. Para o presente trabalho foi considerada a temperatura de 25°C. O resultado é expresso em bar e pode ser transformado em MPa dividindo-o por 10.

Para a quantidade de NaCl foi utilizada a equação de Van’t Hoff, citada por Betoni, Scalon e Mussury (2011BETONI, R.; SCALON, S. P. Q.; MUSSURY, R. M. Salinidade e temperatura na germinação e vigor de sementes de mutambo (Guazuma ulmifolia Lam.) (Sterculiaceae). Revista Árvore, Viçosa, MG, v. 35, n. 3, p. 605-616, 2011.):

ψ - - i R T C

Em que: ψ = potencial osmótico (atm.); i = coeficiente isotônico de NaCl (1,8); R = constante geral dos gases perfeitos (0,082 atm.1 mol-1.K-1); T = temperatura (K); C = concentração (mol.L-1).

O PEG 6000 e o NaCl foram pesados em balança analítica e dissolvidos em 100 mL de água esterilizada. As soluções foram acondicionadas em béqueres cobertos com filme plástico PVC e armazenadas em geladeira. Como testemunha, foi utilizada água destilada.

Foram contadas proporções iguais de sementes para cada lote e depois misturadas para proporcionar homogeneidade das variações entre os lotes. Posteriormente, as sementes receberam tratamento de desinfestação constituído de três etapas em sequência: imersão em álcool 70%, por 30 segundos; imersão em NaClO a 1%, por 60 segundos, e lavagem em água destilada esterilizada por 60 segundos.

Avaliações de germinação

As sementes foram distribuídas em caixas do tipo gerbox previamente lavadas com hipoclorito 1% e álcool 96°GL, forradas com uma folha de papel-germitest, que foram previamente autoclavadas por 20 minutos à pressão de 1,2 atm. Com o auxílio de uma micropipeta foram transferidos 7 mL da solução correspondente para cada gerbox, volume correspondente ao produto da massa seca do papel-germitest por 2,5 (BRASIL, 2009BRASIL. Ministério da agricultura e Reforma Agrária. Secretaria Nacional de Defesa Agropecuária. Regras para análise de sementes. Brasília: SNDA, 2009. 399 p.).

As caixas foram transferidas para câmaras de incubação do tipo B.O.D. (Biochemical Oxygen Demand), com temperatura de 25 ± 2°C e fotoperíodo de 16 h, sob lâmpadas fluorescentes brancas, tipo “extra luz do dia”, de 20 W.

A umidade do papel-germitest foi monitorada durante toda a condução do experimento, e, quando necessário, transferiu-se 1 mL da solução correspondente para cada gerbox.

Após 10 dias de incubação, realizou-se a primeira contagem de germinação, caracterizando o vigor inicial das sementes. Foram consideradas sementes germinadas aquelas dotadas de, no mínimo, 2 mm de protrusão radicular.

O experimento foi encerrado após 21 dias de incubação, sendo contabilizadas as plântulas normais, anormais, sementes duras e mortas, conforme descrições de estruturas disponíveis em Brasil (2009BRASIL. Ministério da agricultura e Reforma Agrária. Secretaria Nacional de Defesa Agropecuária. Regras para análise de sementes. Brasília: SNDA, 2009. 399 p.).

Avaliações de plântulas

Após 21 dias de incubação, com as plântulas normais de cada repetição do teste de germinação, foram avaliadas as variáveis: comprimento de raiz e plântula (cm.plântula-1), obtido com o auxílio de uma régua graduada, e a massa fresca (mg.plântula-1) pesada em balança analítica de 0,0001 g de precisão (BRASIL, 2009BRASIL. Ministério da agricultura e Reforma Agrária. Secretaria Nacional de Defesa Agropecuária. Regras para análise de sementes. Brasília: SNDA, 2009. 399 p.).

Procedimento estatístico

O delineamento adotado foi o inteiramente casualizado, arranjado em esquema fatorial 2 × 10 (agentes osmóticos × potenciais osmóticos e testemunha), totalizando 20 tratamentos com quatro repetições de 50 sementes. Os dados foram submetidos à análise de variância e regressão polinomial, testando-se os modelos linear e quadrático. Adotou-se o modelo que apresentou diferença significativa pelo teste F (p < 0,05) e maior coeficiente de determinação. Os dados em porcentagem foram transformados em arco seno (%/100)1/2 para aplicação da análise estatística. As análises estatísticas foram realizadas com auxílio do software SAS v9.3 (Statistical Analysis System).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A primeira contagem de germinação (PCG) foi influenciada significativamente pelos agentes e potencias osmóticos testados, os quais inibiram a germinação conforme a redução do potencial (Figura 1 - A). O efeito do PEG 6000 foi descrito por modelo quadrático, inibindo totalmente a germinação de Toona ciliata em -0,5 MPa. Já para NaCl, a inibição total da germinação ocorreu a partir de -1,2 MPa. Na testemunha (0 MPa) foram observados 48% de sementes germinadas.

Sementes que germinam mais rapidamente têm maior probabilidade de sobreviver a campo. Dessa forma, a variável PCG pode ser usada como um índice de vigor (ELIAS et al., 2012ELIAS, S. G. et al. Seed testing: principles and practices. East Lansing: Michigan State University Press, 2012. 354 p.). Nos resultados encontrados foi possível constatar que a utilização de PEG 6000 diminuiu consideravelmente o vigor da semente em comparação ao NaCl, sugerindo que a espécie seja mais sensível ao estresse hídrico que ao salino.

Esse mesmo comportamento também foi observado na germinação de Schizolobium amazonicum por Braga et al. (2008BRAGA, L. F. et al. Germinação de sementes de pinho-cuiabano sob deficiência hídrica com diferentes agentes osmóticos. Scientia Forestalis, Piracicaba, v. 36, n. 78, p. 157-163, 2008.) e em Erythrina falcata por Pelegrini et al. (2013PELEGRINI, L. L. et al. Efeito do estresse hídrico simulado com NaCl, manitol e PEG (6000) na germinação de sementes de Erythrina falcata Benth. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 23, n. 2, p. 511-519, 2013.). Entretanto, Martins, Pereira e Lopes (2014MARTINS, C. C.; PEREIRA, M. R. R.; LOPES, M. T. G. Germinação de sementes de eucalipto sob estresse hídrico e salino. Bioscience Journal, Uberlândia, v. 30, n. 1, p. 318-329, 2014.) não observaram diferença entre a ação dos agentes osmóticos (NaCl e PEG 6000) na germinação de Eucalyptus camaldulensis, Eucalyptus citriodora e Eucalyptus urophylla, indicando uma possível variaçãodo efeito dos agentes de acordo com espécie em questão.

A maior redução da germinação no PEG 6000, em comparação ao NaCl, pode ser explicada pela natureza química desse composto e sua interação com a parede celular. As moléculas do polímero PEG 6000 são grandes em comparação às do NaCl e por isso não passam facilmente pela parede celular, reduzindo drasticamente a absorção de água pela semente (DODD; DONAVAN, 1999DODD, G. L.; DONOVAN, L. A. Water potential and ionic effects on germination and seedling growth of two cold desert shrubs. American Journal of Botany, St. Louis, v. 86, n. 8, p. 1146-1153, 1999.; ELIAS et al., 2012ELIAS, S. G. et al. Seed testing: principles and practices. East Lansing: Michigan State University Press, 2012. 354 p.; CAVALLARO et al., 2016CAVALLARO, V. et al. Evaluation of variability to drought and saline stress through the germination of different ecotypes of carob (Ceratonia siliqua L.) using a hydrotime model. Ecological Engineering, Oxford, v. 95, p. 557-566, 2016.). Com isso, a embebição da semente ocorre de forma lenta devido à pressão osmótica, retardando a ativação do metabolismo e, consequentemente, a germinação (CAVALLARO et al., 2016).

De acordo com Cavallaro et al. (2016CAVALLARO, V. et al. Evaluation of variability to drought and saline stress through the germination of different ecotypes of carob (Ceratonia siliqua L.) using a hydrotime model. Ecological Engineering, Oxford, v. 95, p. 557-566, 2016.), a embebição de água pela semente é geralmente maior em soluções isotônicas de NaCl do que em PEG. Isso ocorre porque em NaCl os íons podem penetrar a parede celular tornando o potencial osmótico da semente menor que o do substrato, auxiliando na absorção de água e no início do processo germinativo (DODD; DONAVAN, 1999DODD, G. L.; DONOVAN, L. A. Water potential and ionic effects on germination and seedling growth of two cold desert shrubs. American Journal of Botany, St. Louis, v. 86, n. 8, p. 1146-1153, 1999.).

Figura 1
Variáveis de germinação de sementes de Toona ciliata var. australis submetidas a condições de estresse hídrico e estresse salino. Primeira contagem de germinação (A), plântulas normais (B), plântulas anormais (C), sementes duras (D), sementes mortas (E)
Figure 1
Germination variables of Toona ciliata var. australis seeds under water stress and saline stress. First count (A), normal seedlings (B), abnormal seedlings (C), hard seeds (D), dead seeds (E)

Com relação às plântulas normais (Figura 1 - B), verificou-se comportamento quadrático para NaCl e PEG 6000, reduzindo proporcionalmente à medida que o potencial osmótico tornou-se mais negativo. Não houve plântulas normais nos potenciais -0,9 MPa e -0,4 MPa para NaCl e PEG 6000, respectivamente, indicando novamente maior sensibilidade da espécie ao estresse hídrico que ao salino.

Para a porcentagem de plântulas anormais, também houve influência dos agentes e potenciais osmóticos. A presença de NaCl provocou um aumento de plântulas anormais até o potencial osmótico -0,4 MPa, no qual, por meio do modelo matemático, estimou-se 18,7%. Já na presença de PEG, o número de plântulas anormais diminuiu conforme a redução do potencial osmótico. (Figura 1 - C)

Portanto, apesar das sementes apresentarem maior potencial de germinar em NaCl, o posterior crescimento das plântulas foi consideravelmente afetado. Esses dados corroboram o descrito por Dodd e Donavan (1999DODD, G. L.; DONOVAN, L. A. Water potential and ionic effects on germination and seedling growth of two cold desert shrubs. American Journal of Botany, St. Louis, v. 86, n. 8, p. 1146-1153, 1999.), no qual sementes em estresse salino podem germinar mais que em estresse hídrico, mesmo havendo efeito negativo dos íons. Os íons Na+ e Cl- podem ter penetrado a parede celular e provocado a redução do potencial osmótico da semente, retomando o processo de absorção de água e promovendo a germinação. Porém, o acúmulo desses íons causa o intumescimento do protoplasma, afetando a atividade enzimática e causando alterações quantitativas e qualitativas no metabolismo. Consequentemente, ocorre a redução na produção de energia, formação de distúrbios na assimilação do nitrogênio, alterações no padrão de aminoácidos e no metabolismo das proteínas (FREIRE, 2000FREIRE, A. L. O. Fixação do nitrogênio, crescimento e nutrição mineral de leucena sob condições de salinidade. 2000. 92 f. Tese (Doutorado) - Universidade Estadual Paulista, Jaboticabal, 2000.).

O PEG 6000 é considerado um composto inerte incapaz de penetrar a parede celular, portanto, não provoca o efeito dos íons como o NaCl (DODD; DONAVAN, 1999DODD, G. L.; DONOVAN, L. A. Water potential and ionic effects on germination and seedling growth of two cold desert shrubs. American Journal of Botany, St. Louis, v. 86, n. 8, p. 1146-1153, 1999.). A redução de plântulas anormais com PEG ocorreu juntamente com a redução de plântulas normais, tendo uma proporção de normais/anormais semelhante ao longo dos potenciais osmóticos.

Com relação à porcentagem de sementes duras, a redução do potencial osmótico de NaCl e PEG 6000 provocou o aumento dessa variável (Figura 1 - D), sendo representado pelo modelo linear para ambos os agentes osmóticos. A maior porcentagem de sementes duras foi observada na presença de PEG 6000, atingindo até 92,5%, na concentração de -1,5 MPa, quando a germinação foi nula. Para o NaCl, o máximo observado foi de 55%, na concentração de -1,2 MPa, enquanto na testemunha, a porcentagem de sementes duras foi de 4%. Esses dados corroboram o fato do PEG ser incapaz de penetrar a parede celular, provocando um estresse hídrico mais próximo do ideal.

Para a porcentagem de sementes mortas, os dados demonstraram interação entre os agentes e os potenciais osmóticos, em que, apenas para PEG 6000, o modelo quadrático foi significativo e, para NaCl, nenhum dos modelos foi significativo (Figura 1 - E). Apesar disso, em comparação ao PEG 6000, foi possível identificar um pequeno aumento de sementes mortas no NaCl, a partir de -0,9 MPa. No tratamentotestemunha foram observados 41,5% de sementes mortas. A alta porcentagem de sementes mortas, mesmo na testemunha, foi associada, especialmente à presença de fungos deterioradores de sementes encontrados nos lotes de sementes (dados não avaliados). De acordo com Bewley et al. (2013BEWLEY, J. D. et al. Seeds: physiology of development, germination and dormancy. 3rd ed. New York: Springer, 2013. 392 p.), durante o processo de hidratação das sementes são liberados solutos como açúcares, ácidos orgânicos, aminoácidos e vários íons, compostos que estimulam o desenvolvimento de patógenos, que posteriormente podem ocasionar a deterioração das sementes.

Com relação à massa fresca, comprimento radicular e comprimento de plântula, a redução do potencial osmótico de ambos os agentes osmóticos provocou a redução das variáveis mensuradas (Figura 2). Entretanto, a presença de PEG provocou uma redução mais drástica para essas variáveis, quando comparada ao NaCl, sendo que no potencial osmótico -0,4 MPa, já não foi possível realizar a avaliação das variáveis, pois não havia plântulas normais disponíveis. Para o NaCl, a ausência total de germinação (plântulas normais) ocorreu no potencial osmótico -0,9 MPa.

A massa fresca das plântulas apresentou incremento no potencial -0,1 MPa para ambos os agentes, sendo representada pelo modelo linear para o NaCl e quadrático para o PEG 6000 (Figura 2 - A). Para PEG houve um aumento de 0,0055 g.plântula-1, e para NaCl observou-se um aumento ainda maior, sendo de 0,0312 g.plântula-1.

O comprimento radicular (Figura 2 - B) foi menor, conforme a redução do potencial osmótico de ambos os agentes. Porém, assim como foi observado para massa fresca, houve um incremento no comprimento radicular das plântulas, no potencial -0,1 MPa, para ambos os agentes. Em comparação à testemunha, houve incremento de 1,2 cm.plântula-1 sob estresse hídrico e salino a -0,1 MPa.

Para o comprimento de plântula (Figura 2 - C), ambos os agentes osmóticos são representados pelo modelo quadrático, em que a redução do potencial resultou em plântulas menores. De maneira análoga como na massa fresca e comprimento radicular, no potencial -0,1 MPa observaram-se plântulas com maior comprimento.

Figura 2
Massa fresca (A), comprimento radicular (B) e comprimento de plântulas (C) de Toona ciliata var. australis submetidas a condições de estresse hídrico com PEG 6000 e estresse salino com NaCl
Figure 2
Fresh weight, root length and seedling length of Toona ciliata var. australis under water stress by PEG 6000 and saline stress by NaCl. Fresh weight (A), root length (B), seedling length (C)

O maior desenvolvimento das plântulas no potencial -0,1 MPa pode ser explicado pelo rápido ajustamento osmótico das células, permitindo a recuperação do turgor celular e a habilidade de administrar a elasticidade da parede celular (HSIAO; XU, 2000HSIAO, T. C.; XU, L. K. Sensitivity of growth of roots versus leaves to water stress: biophysical analysis and relation to water transport. Journal of Experimental Botany, Oxford, v. 51, n. 350, p. 1595-1616. 2000.). Além disso, de acordo com Taiz e Zeiger (2010TAIZ, L.; ZEIGER, E. Plant physiology. 3th ed. Sunderland: Sinauer, 2010. 782 p.), quando o deficit hídrico ocorre de forma suficientemente lenta para permitir alterações nos processos de desenvolvimento, promove diversos efeitos no crescimento, sendo um deles a limitação da expansão foliar. Essa limitação reduz o consumo de carbono e energia e, consequentemente, uma grande proporção dos assimilados da planta podem ser distribuídos para favorecer o desenvolvimento do sistema radicular.

O mesmo foi encontrado por Zhu et al. (2006ZHU, J. et al. Effects of drought stresses induced by polyethylene glycol on germination of Pinus sylvestris var. mongolica seeds from natural and plantation forests on sandy land. Journal of Forest Research, Tokyo, v. 11, n. 5, p. 319-328, 2006.), pesquisando o efeito do estresse hídrico com PEG 6000 em sementes de Pinus sylvestris var. mongolica, observaram que, no potencial -0,20 MPa, o agente osmótico ao invés de inibir, promoveu o desenvolvimento da plântula.

CONCLUSÕES

O crescimento inicial de plântulas e a germinação de Toona ciliata var. australis é mais sensível ao estresse hídrico do que ao salino, sendo sua germinação totalmente inibida nos potenciais osmóticos -0,5 MPa e -1,2 MPa para PEG 6000 e NaCl, respectivamente.

Sementes de Toona ciliata var. australis apresentam maior probabilidade de desenvolver plântulas anormais sob estresse salino.

O potencial osmótico de -0,1 MPa promove o crescimento de plântulas normais, independentemente do agente osmótico.

REFERÊNCIAS

  • BEGUM, M. A. J.; SELVARAJU, P.; VENUDEVAN, B. Saline stress on seed germination. Scientific Research and Essays, [s.l.], v. 8, n. 30, p. 1420-1423, 2013.
  • BETONI, R.; SCALON, S. P. Q.; MUSSURY, R. M. Salinidade e temperatura na germinação e vigor de sementes de mutambo (Guazuma ulmifolia Lam.) (Sterculiaceae). Revista Árvore, Viçosa, MG, v. 35, n. 3, p. 605-616, 2011.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2018

Histórico

  • Recebido
    06 Dez 2015
  • Aceito
    30 Set 2016
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