Acessibilidade / Reportar erro

NUTRIENTES E UMIDADE DO SOLO APÓS A INCORPORAÇÃO DE BIOCARVÃO EM UM PLANTIO DE Eucalyptus benthamii

SOIL NUTRIENTS AND MOISTURE AFTER INCORPORATING BIOCHAR IN AN Eucalyptus benthamii FOREST

RESUMO

O objetivo do trabalho foi avaliar as condições nutricionais e de umidade de um solo cultivado com Eucalyptus benthamii no qual se incorporou biocarvão oriundo da pirólise rápida de uma mistura de madeiras de espécies nativas de Floresta Ombrófila Mista no preparo pré-plantio. O estudo foi desenvolvido em área experimental do Campus da Universidade Estadual do Centro-Oeste, localizada em Irati, Paraná. Foram utilizadas quatro doses de biocarvão, 0, 10, 20 e 40 Mg ha-1, com e sem adubação mineral de 340 Kg ha-1 de NPK com 14 Kg de N, 48 Kg de P2O5, 28 Kg de K2O no formulado 4-14-8, em delineamento em blocos ao acaso com quatro repetições. As mudas de Eucalyptus benthamii foram plantadas em espaçamento 3 por 2 metros e após 60 e 180 dias foram avaliados os seguintes atributos do solo: pH, carbono orgânico, teores de P, K, Ca, Mg, Al e a umidade do solo. A aplicação de 40 Mg ha-1 de biocarvão com e sem adubação de base ocasionou aumento do pH e nutrientes devido ao teor de cinzas na constituição do condicionador, e aumento da umidade do solo. A aplicação de biocarvão pode se tornar uma prática positiva com o objetivo de disponibilizar nutrientes para o desenvolvimento inicial da cultura. Entretanto, deve-se a avaliar o efeito da fertilidade, de acordo com as doses aplicadas, uma vez que a disponibilidade de nutrientes diminuiu ao longo do tempo acarretando a necessidade de adubações de cobertura, porém em quantidades menores.

Palavras-chave:
fertilidade do solo; cinzas; Eucalipto

ABSTRACT

The objective of this research was to evaluate the nutritional and moisture conditions of a soil cultivated with Eucalyptus benthamii, in which it was used biochar coming from the fast pyrolysis of a mixture of native species of Mixed Ombrophilous Forest in the preparation of the pre-planting. The study was developed in an experimental area of the State University of the Center-West located in Irati, Paraná state. Four doses of biochar, 0, 10, 20 and 40 Mg ha-1, with and without mineral fertilization of 340 Kg ha-1 of NPK with 14 Kg N, 48 Kg P2O5, 28 Kg K2O in formulation 4-14-8, in a randomized complete block design with four replicates. Eucalyptus benthamii seedlings were planted in spacing 3 x 2 meters and, after 60 and 180 days, the following soil attributes were evaluated: pH, organic carbon, P, K, Ca, Mg, Al contents and soil moisture. The application of 40 Mg ha-1 biochar with and without basic fertilization, caused an increase of pH and nutrients due to the ash content in the constitution of the conditioner, and an increase of the soil moisture. The application of biochar may become a positive practice in order to provide nutrients for the initial development of the crop. However, it is necessary to evaluate the effect of fertility according to the dose applied, since the availability of nutrients may decrease over time, leading to the need for cover fertilization, however in smaller amounts.

Keywords:
soil fertility; ash; Eucalyptus

INTRODUÇÃO

Estudos com foco no carvão de biomassa florestal incorporado nos solos estão em voga. Trabalhos envolvendo as Terras Pretas de Índio (TPI), que são solos que ocorrem na região Amazônica, caracterizados por alta fertilidade devido ao acúmulo de biocarvão formados a partir da ação pirogênica e depositados nesses solos por populações indígenas (LEHMANN; JOSEPH, 2009LEHMANN, J.; JOSEPH, S. Biochar for environmental management: an introduction. In: LEHMANN, J; JOSEPH, S. (Ed.). Biochar for Environmental Management: Science and Technology . London: Earthscan , 2009. p. 1-12.) são referências.

O carvão pirogênico é resultante da combustão parcial dos materiais, originando uma matéria orgânica estável e resistente à degradação química, térmica e fotoquímica. A estrutura química do carvão confere estabilidade e reatividade de acordo com o tempo de aplicação, e sua estrutura aromática, alifática, hidrofóbica e seus grupos funcionais ácidos, formados através da oxidação biológica lenta, resultam em acumulação e persistência do carbono no solo e retenção e disponibilidade de nutrientes (MADARI et al., 2006MADARI, B. E. et al. Carvão vegetal como condicionador do solo para arroz de terras altas (cultivar Primavera): um estudo prospectivo. Comunicado técnico Embrapa Arroz e Feijão, Santo Antônio de Goiás, v. 125, p. 6, 2006.). O termo biochar (biocarvão) foi criado para descrever a aplicação de matéria orgânica carbonizada ao solo em uma forma deliberada, para melhorar as propriedades do solo ou para armazenar carbono (LEHMANN; JOSEPH, 2009LEHMANN, J.; JOSEPH, S. Biochar for environmental management: an introduction. In: LEHMANN, J; JOSEPH, S. (Ed.). Biochar for Environmental Management: Science and Technology . London: Earthscan , 2009. p. 1-12.). Durante o processo denominado de pirólise rápida (temperatura entre 450-550°C) há a formação de biocarvão com baixa granulometria que transforma cerca da metade do carbono armazenado no tecido vegetal em uma forma estável e inativa de carbono. Este processo complementa o processo da fotossíntese, que remove o CO2 da atmosfera através de mecanismos fisiológicos das plantas, enquanto a aplicação de biocarvão no solo estoca o carbono de forma sólida, também benéfica (MAIA, 2012MAIA, C. M. B. F. Biochar: uma nova ferramenta no manejo de solos. In: SEMINÁRIO DE ATUALIZAÇÃO FLORESTAL, 2.; SEMANA DE ESTUDOS FLORESTAIS, 11., 2012, Irati. Anais... Irati: Universidade Estadual do Centro-Oeste, 2012.).

Assim como ocorreu nas TPI, a aplicação de diferentes tipos de biocarvão tem sido relatada em diversas tipologias de solos e culturas agrícolas com resultados promissores com relação à melhoria na fertilidade do solo, aos aspectos físicos e com ganhos de produtividade. A presença do biocarvão pode contribuir para mudanças significativas nas propriedades físicas e químicas do solo, alterando características tais como: textura, estrutura, porosidade, diâmetro dos poros, distribuição granulométrica, densidade, pH do solo, disponibilidade de nutrientes, aumento do teor de matéria orgânica e redução da concentração de metais pesados (GLASER; LEHMANN; ZECH, 2002GLASER, B.; LEHMANN, J.; ZECH, W. Ameliorating physical and chemical properties of highly weathered soils in the tropics with charcoal - a review. Biology and Fertility of Soils, Berlin, v. 35, n. 4, p. 219-230, 2002.; LEHMANN; RONDON, 2006LEHMANN, J.; RONDON, M. Bio-Char soil management on highly weathered soils in the humid tropics. In: UPHOFF, N. et al. (Ed.). Biological approaches to sustainable soil systems. Florida: CRC Press, 2006. p. 517-530.; MEDEIROS JUNIOR, 2007MEDEIROS-JUNIOR, J. C. Uso do fino do carvão vegetal e da adubação potássica na produção de berinjela (Solanum melongena L.) em Latossolo amarelo antrópico da Amazônia Central. 2007. 72 f. Dissertação (Mestrado em Biologia Tropical e Recursos Naturais) - Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2007.; HOSSAIN et al., 2010HOSSAIN, M. K. et al. Agronomic properties of wastewater sludge biochar and bioavailability of metals in production of cherry tomato (Lycopersicon esculentum). Chemosphere, Oxford, v. 78, n. 9, p. 1167-1171, 2010.; PETTER, 2010PETTER, F.A. Biomassa carbonizada como condicionador de solo: aspectos agronômicos do seu uso em solos de Cerrado. 130 f. Tese (Doutorado em Ciências Agrárias) - Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2010.; SOHI, 2010SOHI, S. P. et al. A review of biochar and its use and function in soil. Advances in Agronomy, Burlington, v. 105, p. 47-82, 2010. ; SMIDER; SINGH, 2014SMIDER, B.; SINGH, B. Agronomic performance of a high ash biochar in two contrasting soils. Agriculture, Ecosystems & Environment - Journal, Amsterdam, v. 191, p. 99-107, 2014.; OJEDA et al., 2015OJEDA, G. et al. Are soil-water functions affected by biochar application? Geoderma, Amsterdam, v. 249, p. 1-11, 2015.; PUGA et al., 2015PUGA, A. P. et al. Biochar application to a contaminated soil reduces the availability and plant uptake of zinc, lead and cadmium. Journal of Environmental Management, New York, v. 159, p. 86-93, 2015.). Em culturas florestais, estudos relacionados à incorporação de biocarvão em solos ainda são incipientes, com poucos resultados em relação à produtividade e ao manejo da adubação e do solo. Assim, este estudo teve como objetivo avaliar a disponibilidade de nutrientes, acidez e a umidade do solo devido à aplicação de diferentes doses de biocarvão no pré-plantio em reflorestamento com Eucalyptus benthamii.

MATERIAL E MÉTODOS

O experimento foi conduzido no município de Irati no Paraná (25°27’ S; 50°37’ W e altitude de 890 metros), durante o ano de 2010. O clima da região, segundo a classificação de Köppen, é classificado como Cfb. O solo utilizado classifica-se como Cambissolo Háplico Ta Distrófico típico (EMBRAPA, 2006EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Sistema brasileiro de classificação de solos. 2. ed. Rio de Janeiro: EMBRAPA, 2006. 306 p.) de textura muito argilosa com 647 g dm-3 de argila. A pluviosidade média nos meses de realização do ensaio no município de Irati é apresentada na Tabela 1.

Tabela 1
Precipitações pluviométricas mensais, em milímetros, núcleo regional de Irati-PR (SECRETARIA DO ESTADO E DO ABASTECIMENTO DO PARANÁ, 2011SECRETARIA DO ESTADO E DO ABASTECIMENTO DO PARANÁ. Precipitações mensais nos últimos 12 meses (nov. 2009 - nov. 2010). Curitiba: SEAB, 2011. Disponível em: <http://www.seab.pr.gov.br> . Acesso em: 01 fev. 2010.
http://www.seab.pr.gov.br...
).
Table 1
Monthly rainfall in millimeters, regional nucleus of Irati, Paraná state (SECRETARIA DO ESTADO E DO ABASTECIMENTO DO PARANÁ, 2011SECRETARIA DO ESTADO E DO ABASTECIMENTO DO PARANÁ. Precipitações mensais nos últimos 12 meses (nov. 2009 - nov. 2010). Curitiba: SEAB, 2011. Disponível em: <http://www.seab.pr.gov.br> . Acesso em: 01 fev. 2010.
http://www.seab.pr.gov.br...
).

Para a realização do ensaio procedeu-se o preparo do solo em que inicialmente aplicou-se 2,5 Mg ha-1 de calcário dolomítico (29% de CaO e 20% de MgO) a lanço, com posterior incorporação com grade leve nos 20 cm superficiais do solo. Aguardou-se um mês e procedeu-se a aplicação a lanço e em área total do biocarvão com incorporação com gradagem leve. O biocarvão é proveniente de um depósito com volume expressivo, a céu aberto, de uma área de assentamento de famílias de pequenos agricultores pelo INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), na cidade de Inácio Martins, Paraná, denominado Assentamento José Dias. A ocupação da área pelos assentados ocorreu em 1988 e a partir de 1998 iniciou-se a produção de carvão utilizando as espécies de canela (Ocotea sp), bracatinga (Mimosa scrabella Hoehne) e resíduos de imbuia (Ocotea porosa (Nees & C. Mart.) Barroso), cortados com o objetivo de abertura de área para a exploração agrícola. Os tratamentos foram constituídos de três diferentes doses de biocarvão aplicados no solo sem adubação de base e das mesmas doses com a adubação de base (Tabela 2).

Tabela 2
Descrição dos tratamentos utilizados para a realização do ensaio, com as doses de biocarvão incorporadas na camada de 20 cm do solo e adubação aplicada em coveta na lateral das mudas plantadas.
Table 2
Description of treatments used for the assay, with doses of biochar incorporated in the layer of 20 cm of the soil and fertilizer applied in a hole beside the planted seedlings.

A adubação de base consistiu-se de 340 Kg ha-1 de NPK com 14 Kg de N, 48 Kg de P2O5, 28 Kg de K2O no formulado 4-14-8, aplicados em covetas laterais. Após o preparo do solo procedeu-se o plantio das mudas de Eucalyptus benthamii, utilizando-se um espaçamento 3 por 2 metros, realizado no mês de março de 2010. Utilizou-se o delineamento em blocos casualizados com 4 blocos. A área útil das parcelas experimentais foi de 288 m2, com um total de 48 plantas por parcela. As características do biocarvão utilizado no ensaio foram pH em H2O de 4,9; 79% de granulometria inferior a 2 mm; 5% de umidade; 26% de teor de voláteis e de cinzas e 48% de carbono fixo (EMBRAPA, 1997EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Manual de métodos de análise de solos. Rio de Janeiro, 1997. 212 p.; Norma da ASTM D-1762-84 adaptada por OLIVEIRA et al., 1982OLIVEIRA, J. B. Estudos preliminares de normatização de testes de controle de qualidade do carvão vegetal. In: PENEDO, W. R. Carvão Vegetal. Belo Horizonte: CETEC, 1982. p. 7-38. (Publicação Técnica CETEC, v. 6).).

Aos 60 e 180 dias após o plantio foram coletadas amostras de solo com o auxílio de um trado holandês em cinco pontos dentro de cada parcela na profundidade 0-20 cm. Estas amostras foram misturadas para compor uma amostra composta representando o solo da parcela. Após, levou-se o material para laboratório de Solos Florestais da Universidade Estadual do Centro-Oeste e, posteriormente, secaram-se as amostras em estufa a ± 60°C, seguindo o destorroamento e peneiramento em peneira com malha 2 mm de abertura. Assim, alíquotas dessas amostras foram retiradas para a realização de análises químicas em que se avaliaram: pH e acidez potencial, por potenciometria determinada na suspensão do solo após agitação e decantação; matéria orgânica pelo método de Walkley-Black; P por espectrofotômetro ultravioleta visível; K por fotômetro de chama, e Ca, Mg e Al por titulometria. Em relação às análises físicas do solo, avaliou-se a umidade do solo por coletas de amostras indeformadas com o auxílio de anel de Kopecky na profundidade 0-10 cm e determinação dos valores de umidade do solo (Ug) seguindo a metodologia da Embrapa (1997)EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Manual de métodos de análise de solos. Rio de Janeiro, 1997. 212 p.. A análise de variância foi realizada com o auxílio do software ASSISTAT® versão 7.6 beta (SILVA; AZEVEDO, 2002SILVA, F. A. S.; AZEVEDO, C. A. V. Versão do programa computacional Assistat para o sistema operacional Windows. Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v. 4, n. 1, p. 71-78, 2002.), usando-se o teste de Tukey para comparação de médias quando pertinentes.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Resultados dos tratamentos nos teores de nutrientes, acidez e umidade do solo

Foram observadas diferenças em relação à testemunha para os nutrientes, acidez e umidade do solo após a aplicação do biocarvão, sendo que ocorreram variações em relação ao atributo avaliado e o tempo, dado em dias, após a aplicação do tratamento (Tabela 3).

Tabela 3
Valores médios para pH, acidez potencial (H+Al), carbono (C), fósforo (P), potássio (K) cálcio (Ca), magnésio (Mg), alumínio (Al), e percentual de umidade do solo (Ug) para os tratamentos aos 60 e 180 dias após a incorporação do biocarvão em plantio de Eucalyptus benthamii, em Irati-PR.
Table 3
Mean values for pH, potential acidity (H+Al), carbon (C), phosphorus (P), potassium (K) calcium (Ca), magnesium (Mg), aluminum (Al) and soil moisture (Ug) of the treatments at 60 and 180 days after the incorporation of biochar in a forest of Eucalyptus benthamii in Irati, Paraná state.

Os parâmetros acidez potencial, carbono e magnésio não diferiram do tratamento controle na avaliação aos 60 dias após o plantio. Com relação aos parâmetros pH, potássio, alumínio e umidade do solo nessa avaliação apenas o tratamento 40 Mg ha-1 de carvão e adubo diferiu da testemunha. Na avaliação realizada aos 180 dias após o plantio, o tratamento 40 Mg ha-1 de carvão e adubo diferiu da testemunha para os parâmetros pH, acidez potencial, fósforo, cálcio, magnésio, alumínio e umidade do solo. Para os demais parâmetros nessa avaliação não houve diferença significativa.

Efeitos da aplicação dos tratamentos na acidez, nutrientes e umidade do solo

O aumento dos níveis de bases trocáveis no solo pode elevar o pH do solo pela substituição de íons de H e Al no complexo de troca do solo (MIYAZAWA; PAVAN; FRANCHINI, 2000MIYAZAWA, M.; PAVAN, M. A.; FRANCHINI, J. C. Neutralização da acidez do perfil do solo por resíduos vegetais. Informações Agronômicas Potafos, Piracicaba, n. 92, p. 8, 2000.). As maiores doses de biocarvão aplicado aumentaram a quantidade de bases possivelmente pela presença de cinzas na constituição do biocarvão incorporado. Essas cinzas ficam alocadas nos microporos existentes no biocarvão e os cátions trocáveis são adsorvidos por forças eletrostáticas apresentando-se como sais solúveis e consequentemente ficando rapidamente disponíveis para as plantas (SANCHEZ; VILLACHICA; BANDY, 1983SANCHEZ, P. A.; VILLACHICA, J. H.; BANDY, D. E. Soil fertility dynamics after clearing a tropical rainforest in Peru. Soil Science Society of America Journal, Madison, v. 47, p. 1171-1178, 1983.; GLASER; LEHMANN; ZECH, 2002GLASER, B.; LEHMANN, J.; ZECH, W. Ameliorating physical and chemical properties of highly weathered soils in the tropics with charcoal - a review. Biology and Fertility of Soils, Berlin, v. 35, n. 4, p. 219-230, 2002.). A absorção dos nutrientes pelas plantas, as perdas de íons por lixiviação, a adsorção dos cátions trocáveis no complexo de trocas e, ou a complexação pela matéria orgânica pode ter influenciado a oscilação do pH quando o nível das bases trocáveis ora aumenta ou diminui no solo de acordo com o tempo após incorporação. Outro aspecto que pode influenciar a elevação do pH do solo é a decomposição da matéria orgânica quando há aumento nas bases trocáveis no solo (COSTA et al., 2009COSTA, J. A. et al. Geoquímica das Terras Pretas Amazônicas. In: TEIXEIRA, W. G. et al. (Ed.). As terras pretas de índio da Amazônia: sua caracterização e uso deste conhecimento na criação de novas áreas . 1. ed. Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental , 2009. p. 162 -172.; CUNHA et al., 2009CUNHA, T. J. F. et al. Soil organic matter and fertility of anthropogenic dark earths (Terra Preta de Indio) in the Brazilian amazon basin. Revista Brasileira de Ciência do Solo, Viçosa, MG, v. 33, p. 85-93, 2009.), como observado no tratamento 40 Mg ha-1 e adubação. Ainda, a alta reatividade que o biocarvão possui ocasionada pela dissociação dos grupos funcionais presentes nas periferias de suas estruturas podem adsorver íons H+ do solo elevando o pH (MADARI et al., 2006MADARI, B. E. et al. Carvão vegetal como condicionador do solo para arroz de terras altas (cultivar Primavera): um estudo prospectivo. Comunicado técnico Embrapa Arroz e Feijão, Santo Antônio de Goiás, v. 125, p. 6, 2006.).

Embora as mudanças no pH do solo apresentadas sejam sutis, Troeh e Thompson (2007TROEH, F. R.; THOMPSON, L. M. Solos e fertilidade do solo. São Paulo: Andrei, 2007. 718 p.) sugerem que em pH ácidos, variações entre 4 e 4,5 podem favorecer a taxa de mineralização da matéria orgânica, reduzir a precipitação do fósforo com Al e Fe e diminuir perdas de Ca e Mg, e K por lixiviação, acarretando um benefício para áreas de implantação florestal onde o pH do solo é, normalmente, mais ácido.

A redução significativa da acidez potencial (H+Al) com a aplicação do biocarvão ocorreu com o tratamento 40 Mg ha-1 e adubação. O aumento do pH pode formar espécies de Al insolúveis e, consequentemente reduz o conteúdo de H+Al no solo, além do aumento das bases trocáveis, as quais promovem uma competição pelos sítios de troca, diminuindo o conteúdo de H+Al (VAN RAIJ et al., 1997VAN RAIJ, B. et al. Recomendações de adubação e calagem para o estado de São Paulo. Boletim Técnico IAC, Campinas, n. 100, 285 p. 1997.). Como foi mostrado, o aumento na quantidade de bases trocáveis foi proporcional à quantidade de biocarvão que foi adicionada, pelas maiores quantidades de biocarvão adicionado ao solo conter maior quantidade de cinzas, que disponibilizam cátions para a solução do solo e estes entram em equilíbrio rápido com a superfície de adsorção dos coloides por forças eletrostáticas (GLASER; LEHMANN; ZECH, 2002GLASER, B.; LEHMANN, J.; ZECH, W. Ameliorating physical and chemical properties of highly weathered soils in the tropics with charcoal - a review. Biology and Fertility of Soils, Berlin, v. 35, n. 4, p. 219-230, 2002.).

O P total e o disponível se destacam como elementos diagnósticos mais importantes das TPI (PESSOA JUNIOR, 2012PESSOA-JUNIOR, E. S. F. et al. Terra Preta de Índio na Região Amazônica. Scientia Amazonia, Manaus, v. 1, n.1, p. 1-8, 2012.) e elevados teores de P2O5 são encontrados em solos de TPI (SOMBROEK, 1966SOMBROEK, W. G. Amazon soils: A reconnaissance of the soils of the Brazilian Amazon region. Wageningen: Centre for Agricultural Publication and Documentation, 1966. 292 p.). Os altos teores de fósforo significativos nos tratamentos devem-se ao fato de que o nutriente realiza ligação orgânica com a matéria orgânica, ficando disponível, o que não ocorre com ligações inorgânicas (argilominerais) nas quais, no solo, o nutriente fica indisponível (MADARI et al., 2006MADARI, B. E. et al. Carvão vegetal como condicionador do solo para arroz de terras altas (cultivar Primavera): um estudo prospectivo. Comunicado técnico Embrapa Arroz e Feijão, Santo Antônio de Goiás, v. 125, p. 6, 2006.). Além disso, a adição de metais alcalinos, tanto como sais solúveis quanto estes associados aos sítios de troca, em solos com biocarvão, podem ocasionar um efeito significativo na solubilidade do P, especialmente em solos ácidos nos quais as mudanças sutis no pH podem resultar em substancial redução da precipitação do P com Al+3 e Fe+3 (DELUCA; MACKENZIE; GUNDALE, 2009DELUCA, T. H.; MACKENZIE, M. D.; GUNDALE, M. J. Biochar effects on soil nutrient transformation. In: LEHMANN, J.; JOSEPH, S. (Ed.). Biochar for Environmental Management: Science and Technology. London: Earthscan, 2009. p. 251-270.).

A cinza presente no biocarvão é predominantemente constituída por óxidos (MgO, CaO, K2O) e devido às reações de dissociação os nutrientes são disponibilizados prontamente para as plantas (SANCHEZ; VILLACHICA; BANDY, 1983SANCHEZ, P. A.; VILLACHICA, J. H.; BANDY, D. E. Soil fertility dynamics after clearing a tropical rainforest in Peru. Soil Science Society of America Journal, Madison, v. 47, p. 1171-1178, 1983.). Esse fato justifica o aumento no teor de K no solo aos 60 dias com a aplicação de maiores doses de biocarvão e estes dados corroboram o estudo de Oguntunde et al. (2004OGUNTUNDE, P. G. et al. Effects of charcoal production on maize yield, chemical properties and texture of soil. Biology and Fertility of Soils , Berlin, v. 39, p. 295-299, 2004.). Em geral, grande parte das cinzas de biocarvão é rica em potássio na sua constituição dependendo, principalmente de qual parte do material vegetal foi carbonizado (STEINER; TEIXEIRA; ZECH, 2004STEINER, C.; TEIXEIRA, W. G.; ZECH, W. Slash and char: an alternative to slash and burn practiced in the Amazon basin. In: GLASER, B. B.; WOODS, W. I. (Ed.). Amazonian dark earths: explorations in space and time. Berlin: Springer Verlag, 2004. p. 183-194.). A elevação nos teores das bases trocáveis deve estar relacionada com a constituição do material incorporado, uma vez que, esses valores foram quase sempre superiores à testemunha (K aos 60 dias; Ca e Mg aos 180 dias). Segundo Pessoa Junior et al. (2012)PESSOA-JUNIOR, E. S. F. et al. Terra Preta de Índio na Região Amazônica. Scientia Amazonia, Manaus, v. 1, n.1, p. 1-8, 2012., na maioria das TPI, os teores de Ca são mais elevados que Mg, K e Na, pela sua maior disponibilidade advinda dos materiais introduzidos nas áreas de descarte e por sua maior afinidade com as superfícies de troca do solo. Nesse caso, pode ocorrer o fenômeno de complexação da matéria orgânica carbonizada, com íons de cálcio revestindo as partículas do solo. Esse processo pode contribuir para o aumento do nutriente em materiais carbonizados (SOMBROEK, 1966SOMBROEK, W. G. Amazon soils: A reconnaissance of the soils of the Brazilian Amazon region. Wageningen: Centre for Agricultural Publication and Documentation, 1966. 292 p.).

Para todos os tratamentos, foi observado que os teores de Mg no solo estavam acima de 2 cmolc/dm3. O aumento no teor do nutriente pode estar relacionado com o material de origem dos solos como também com a calagem realizada durante a fase de implantação do experimento. Normalmente, em TPIs, a quantidade de Mg é menor que 1/5 da quantidade de Ca (SOMBROEK, 1966SOMBROEK, W. G. Amazon soils: A reconnaissance of the soils of the Brazilian Amazon region. Wageningen: Centre for Agricultural Publication and Documentation, 1966. 292 p.). A liberação dos íons Mg ocorreu de forma mais lenta que K e Ca como observado na Tabela 3, visto que o tratamento 40 Mg ha-1 foi superior à testemunha no último período avaliado para o Mg. Mesmo com diferença estatística nos períodos avaliados para o Ca e Mg, a relação Ca/Mg foi semelhante em todos os tratamentos, evidenciando relação abaixo de 2/1. Esse fato é associado à calagem com calcário dolomítico que elevou o teor de magnésio no solo causando um desbalanço na relação Ca/Mg.

Alguns mecanismos são relatados para a retenção de nutrientes através do biocarvão, porém, há influência do tipo de biocarvão e da temperatura de pirólise submetida (OJEDA et al., 2015OJEDA, G. et al. Are soil-water functions affected by biochar application? Geoderma, Amsterdam, v. 249, p. 1-11, 2015.). O carvão pirogênico pode apresentar uma maior densidade de carga negativa por unidade de área superficial e consequentemente uma maior densidade de carga, devido às características químicas desejáveis do biocarvão (LIANG et al., 2006LIANG, B. et al. Black carbon increases cations exchange capacity in soils. Soil Science Society of America Journal, Madison, v. 70, p. 1719-1730, 2006.). A retenção de nutrientes nas partículas dos materiais carbonizados também se deve ao fato de que os mesmos são presos através de forças físicas nos poros finos do biocarvão (GLASER; LEHMANN; ZECH, 2002GLASER, B.; LEHMANN, J.; ZECH, W. Ameliorating physical and chemical properties of highly weathered soils in the tropics with charcoal - a review. Biology and Fertility of Soils, Berlin, v. 35, n. 4, p. 219-230, 2002.). Em suma, nenhum desses fatores atua de forma isolada pois, há um grande número de reações que podem ocorrer em nível de solução do solo e matéria orgânica e, portanto, todos os processos para a retenção de nutrientes podem acontecer ao mesmo tempo. Na Austrália, foi realizado um estudo com vistas à produção de milho (Zea mays) sob influência de diferentes doses de biocarvão de resíduos da produção de tomates verdes obtidos por pirólise lenta (>550°C), em dois tipos de solos, um arenoso pouco desenvolvido semelhante aos Neossolos quartzarênicos, e outro muito argiloso rico em óxidos e hidróxidos de Fe e Al com alta CTC onde, os autores atribuíram ao alto teor de cinzas a maior disponibilidade de N, P, K, S, Ca e Mg do que a maioria dos outros biocarvões convencionais. Os resultados, entretanto, mostraram queda na produção de massa seca nos solos jovens arenosos, fato atribuído ao excesso de sais solúveis na solução no solo como também a concentração de hidroxilas, devido à alta alcalinidade do biocarvão que, por sua vez, causou fitotoxidez nas plantas, contrapondo com os resultados nos solos argilosos com pH ácido, em que a capacidade trocável do solo reduziu as concentrações de sais solúveis na solução do solo proporcionando efeitos positivos diretos e indiretos na produção de milho (SMIDER; SINGH, 2014SMIDER, B.; SINGH, B. Agronomic performance of a high ash biochar in two contrasting soils. Agriculture, Ecosystems & Environment - Journal, Amsterdam, v. 191, p. 99-107, 2014.).

Os valores de Al diminuíram com o aumento da quantidade de biocarvão incorporado, o que pode ser justificado pela precipitação do alumínio que é favorecida com a elevação do pH formando Al(OH)3, diminuindo sua atividade na solução do solo e consequentemente a sua toxidez (ERNANI, 2008ERNANI, P. R. Química do solo e disponibilidade de nutrientes. Lages: O autor, 2008. 230 p.). Esses dados estão de acordo com a discussão sobre a elevação dos níveis de bases trocáveis no solo através dos conteúdos maiores de biocarvão. Além deste fato, ainda pode ocorrer, em determinados tipos de biocarvão, a capacidade de redução de concentrações de metais pesados em solos contaminados. Puga et al. (2015PUGA, A. P. et al. Biochar application to a contaminated soil reduces the availability and plant uptake of zinc, lead and cadmium. Journal of Environmental Management, New York, v. 159, p. 86-93, 2015.) avaliando o potencial do biocarvão de palha de cana-de-açúcar no desenvolvimento de Canavalia ensiformis e Mucuna aterrima em solos contaminados, verificaram que houve menor absorção de metais pesados pelas culturais bem como incremento na fitomassa e disponibilidade significativa de P, entretanto, esse efeito mitigador deve ser melhor avaliado uma vez que os metais pesados podem acumular-se nos tecidos das plantas.

A matéria orgânica do solo pode governar a geração de cargas elétricas negativas sob dependência do pH, todavia, essas cargas não foram expressivas devido à baixa quantidade de material orgânico nos solos, cerca de 4% em relação à massa mineral, água e espaços porosos. O aumento do pH e o número de bases adicionadas nos tratamentos com as maiores doses não foram suficientes para elevar a CTC em relação à testemunha e adubação, porque ocorreu também diminuição da acidez potencial e precipitação do Al3+ na forma de óxidos pouco solúveis.

O teor de carbono orgânico do solo nos tratamentos com biocarvão deveria ter sido superior ao da testemunha, fato que não foi observado nesse estudo. O biocarvão adicionado apresentava cerca de 48% de carbono fixo. Assim, os teores de carbono deveriam aumentar cerca de 5, 10 e 20 g/dm3 com a adição de 10, 20 e 40 Mg ha-1 de biocarvão, respectivamente. Porém, o maior aumento observado foi de 1,8 g/dm3 em relação à testemunha (Tabela 3). Madari et al. (2006MADARI, B. E. et al. Carvão vegetal como condicionador do solo para arroz de terras altas (cultivar Primavera): um estudo prospectivo. Comunicado técnico Embrapa Arroz e Feijão, Santo Antônio de Goiás, v. 125, p. 6, 2006.) relataram que o método para a quantificação de matéria orgânica do solo baseado na oxidação por dicromato de potássio (Walkley-Black) apenas quantifica a matéria orgânica oxidável do solo e, como o biocarvão é muito estável, este método não o quantifica devido à difícil digestão com ácido sulfúrico concentrado (STEINER; TEIXEIRA; ZECH, 2004STEINER, C.; TEIXEIRA, W. G.; ZECH, W. Slash and char: an alternative to slash and burn practiced in the Amazon basin. In: GLASER, B. B.; WOODS, W. I. (Ed.). Amazonian dark earths: explorations in space and time. Berlin: Springer Verlag, 2004. p. 183-194.).

O biocarvão possui uma estrutura muito porosa que pode ter a função de retenção da água do solo, funcionando como “esponja”, aumentando a disponibilidade de água potencial para as plantas. Muitos trabalhos mostram que a disponibilidade de água para as plantas depende basicamente da textura, estrutura e teor de matéria orgânica do solo. Desta forma, a matéria orgânica incorporada no solo na forma de biocarvão pode ter atuado de forma positiva com a fração mineral melhorando as propriedades físico-hídricas, formando agregados, reduzindo a coesão e a plasticidade além de contribuir para o arejamento e friabilidade do solo acumulando mais água no solo (PICCOLO; PIETRAMELLARA; MBAGWU, 1997PICCOLO, A.; PIETRAMELLARA, G.; MBAGWU, J. S. C. Use of humic substances as soil conditioners to increase aggregate stability. Geoderma, Amsterdam, v. 75, p. 267-277, 1997.; BENITES et al., 2009BENITES, V. M. et al. Utilização de carvão e subprodutos da carbonização vegetal na agricultura: aprendendo com as Terras Pretas de Índio. In: TEIXEIRA, W. G. et al. (Ed.). As terras pretas de índio da Amazônia: sua caracterização e uso deste conhecimento na criação de novas áreas. 1. ed. Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental, 2009. p. 285-296.; COSTA et al., 2009COSTA, J. A. et al. Geoquímica das Terras Pretas Amazônicas. In: TEIXEIRA, W. G. et al. (Ed.). As terras pretas de índio da Amazônia: sua caracterização e uso deste conhecimento na criação de novas áreas . 1. ed. Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental , 2009. p. 162 -172.).

O aumento da umidade do solo pode estar relacionado com a textura dos solos (OJEDA et al., 2015OJEDA, G. et al. Are soil-water functions affected by biochar application? Geoderma, Amsterdam, v. 249, p. 1-11, 2015.). A elevação da umidade em solos muito argilosos propõe um efeito combinando entre o biocarvão e a parte mineral do solo. Esses resultados contrapõem os resultados encontrados por Sohi et al. (2010SOHI, S. P. et al. A review of biochar and its use and function in soil. Advances in Agronomy, Burlington, v. 105, p. 47-82, 2010. ) que afirmam que o tamanho dos poros do biocarvão é relativamente fixo, enquanto que a do solo mineral é determinada principalmente pela textura, assim pode-se esperar que os acréscimos da umidade a partir do biocarvão são maiores em solos arenosos, tem um efeito neutro em solos de textura média, e diminui a umidade disponível no solo argiloso. Tryon (1948TRYON, E. H. Effects of charcoal on certain physical, chemical, and biological properties of forest soils. Ecological Monographs, Ithaca, New York, v. 18, n. 1, p. 81-115, 1948.), citado por Glaser, Lehmann e Zech (2002GLASER, B.; LEHMANN, J.; ZECH, W. Ameliorating physical and chemical properties of highly weathered soils in the tropics with charcoal - a review. Biology and Fertility of Soils, Berlin, v. 35, n. 4, p. 219-230, 2002.) encontrou 18% de acréscimos na retenção da umidade do solo em relação a quantidade de biocarvão em solos arenosos, entretanto não houve variação da umidade em solos argilosos e siltosos devido à hidrofobicidade do biocarvão.

O biocarvão é um material naturalmente hidrofóbico e isto propicia pouca ou nenhuma absorção de água, entretanto, essa característica pode ter sido modificada, devido às condições que o biocarvão sofreu antes da incorporação, ou seja, exposição ao tempo, precipitações e temperatura. Neste trabalho, a aplicação de 40 Mg ha-1 ocasionou maior capacidade de retenção de água num solo de textura muito argilosa. Em solos de textura média a argilosa, que possuem naturalmente quantidade maior de microporos para a retenção de quantidades maiores de água, o biocarvão pode interferir neste atributo, elevando ainda mais o teor água no solo. Além disso, outro aspecto que interfere na disponibilidade de água no solo é o regime de chuvas e foi observado um déficit hídrico no período das coletas de solo, com menos de 100 e 70 mm.mês-1 (Tabela 1) aos 60 e 180 dias, respectivamente, considerado normal para a época do ano e tornando importante a influência do biocarvão no aumento da umidade do solo. Ojeda et al. (2015OJEDA, G. et al. Are soil-water functions affected by biochar application? Geoderma, Amsterdam, v. 249, p. 1-11, 2015.) relataram que o fluxo de água é bastante afetado pelo tipo do biocarvão, concluindo que a mistura de biocarvão com lodo de esgoto favoreceu a maior liberação de nutrientes, principalmente Ca e S, além da umidade do solo. Os autores ainda ressaltaram que os efeitos da aplicação de biocarvão devem ser monitorados em solos instáveis, uma vez que pode ocorrer a maior liberação de nutrientes no contato solo-água provocando alterações nos ecossistemas aquáticos por processos de eutrofização (excesso de N e P em corpos hídricos).

CONCLUSÕES

A aplicação de 40 Mg ha-1 de biocarvão com e sem adubação de base elevou os teores de bases trocáveis (K, Ca e Mg) e P no solo devido à maior presença de cinzas na constituição do biocarvão, e com isso houve o aumento do pH do solo e a redução do Al e da acidez potencial aos 60 e 180 dias após a incorporação do biocarvão.

A aplicação de 40 Mg ha-1 de biocarvão elevou o teor de água no solo em relação à testemunha nos períodos avaliados independentemente do regime de chuvas, indicando que, em solos argilosos, a aplicação do biocarvão contribui para retenção de água.

Embora a aplicação de 40 Mg ha-1 de biocarvão tenha sido superior à testemunha nos períodos analisados, a dose intermediária de 20 Mg ha-1 foi similar na disponibilidade de cátions básicos e redução do pH e acidez solo, principalmente aos 180 dias após a incorporação. Portanto, a aplicação de biocarvão pode se tornar uma prática positiva com o objetivo de disponibilizar nutrientes para o desenvolvimento inicial da cultura. Contudo, deve-se a avaliar o efeito da fertilidade de acordo com as doses aplicadas a longo prazo, uma vez que, a disponibilidade de nutrientes diminuiu devido à absorção das plantas e neste caso ocasiona a necessidade de adubações de cobertura, porém em quantidades menores que o necessário para a cultura, com a aplicação do biocarvão.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela concessão de bolsa de pós-graduação ao primeiro autor.

REFERÊNCIAS

  • BENITES, V. M. et al. Utilização de carvão e subprodutos da carbonização vegetal na agricultura: aprendendo com as Terras Pretas de Índio. In: TEIXEIRA, W. G. et al. (Ed.). As terras pretas de índio da Amazônia: sua caracterização e uso deste conhecimento na criação de novas áreas. 1. ed. Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental, 2009. p. 285-296.
  • COSTA, J. A. et al. Geoquímica das Terras Pretas Amazônicas. In: TEIXEIRA, W. G. et al. (Ed.). As terras pretas de índio da Amazônia: sua caracterização e uso deste conhecimento na criação de novas áreas . 1. ed. Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental , 2009. p. 162 -172.
  • CUNHA, T. J. F. et al. Soil organic matter and fertility of anthropogenic dark earths (Terra Preta de Indio) in the Brazilian amazon basin. Revista Brasileira de Ciência do Solo, Viçosa, MG, v. 33, p. 85-93, 2009.
  • DELUCA, T. H.; MACKENZIE, M. D.; GUNDALE, M. J. Biochar effects on soil nutrient transformation. In: LEHMANN, J.; JOSEPH, S. (Ed.). Biochar for Environmental Management: Science and Technology. London: Earthscan, 2009. p. 251-270.
  • EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Manual de métodos de análise de solos. Rio de Janeiro, 1997. 212 p.
  • EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Sistema brasileiro de classificação de solos. 2. ed. Rio de Janeiro: EMBRAPA, 2006. 306 p.
  • ERNANI, P. R. Química do solo e disponibilidade de nutrientes. Lages: O autor, 2008. 230 p.
  • GLASER, B.; LEHMANN, J.; ZECH, W. Ameliorating physical and chemical properties of highly weathered soils in the tropics with charcoal - a review. Biology and Fertility of Soils, Berlin, v. 35, n. 4, p. 219-230, 2002.
  • HOSSAIN, M. K. et al. Agronomic properties of wastewater sludge biochar and bioavailability of metals in production of cherry tomato (Lycopersicon esculentum). Chemosphere, Oxford, v. 78, n. 9, p. 1167-1171, 2010.
  • LEHMANN, J.; JOSEPH, S. Biochar for environmental management: an introduction. In: LEHMANN, J; JOSEPH, S. (Ed.). Biochar for Environmental Management: Science and Technology . London: Earthscan , 2009. p. 1-12.
  • LEHMANN, J.; RONDON, M. Bio-Char soil management on highly weathered soils in the humid tropics. In: UPHOFF, N. et al. (Ed.). Biological approaches to sustainable soil systems. Florida: CRC Press, 2006. p. 517-530.
  • LIANG, B. et al. Black carbon increases cations exchange capacity in soils. Soil Science Society of America Journal, Madison, v. 70, p. 1719-1730, 2006.
  • MADARI, B. E. et al. Carvão vegetal como condicionador do solo para arroz de terras altas (cultivar Primavera): um estudo prospectivo. Comunicado técnico Embrapa Arroz e Feijão, Santo Antônio de Goiás, v. 125, p. 6, 2006.
  • MAIA, C. M. B. F. Biochar: uma nova ferramenta no manejo de solos. In: SEMINÁRIO DE ATUALIZAÇÃO FLORESTAL, 2.; SEMANA DE ESTUDOS FLORESTAIS, 11., 2012, Irati. Anais... Irati: Universidade Estadual do Centro-Oeste, 2012.
  • MEDEIROS-JUNIOR, J. C. Uso do fino do carvão vegetal e da adubação potássica na produção de berinjela (Solanum melongena L.) em Latossolo amarelo antrópico da Amazônia Central. 2007. 72 f. Dissertação (Mestrado em Biologia Tropical e Recursos Naturais) - Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2007.
  • MIYAZAWA, M.; PAVAN, M. A.; FRANCHINI, J. C. Neutralização da acidez do perfil do solo por resíduos vegetais. Informações Agronômicas Potafos, Piracicaba, n. 92, p. 8, 2000.
  • OGUNTUNDE, P. G. et al. Effects of charcoal production on maize yield, chemical properties and texture of soil. Biology and Fertility of Soils , Berlin, v. 39, p. 295-299, 2004.
  • OJEDA, G. et al. Are soil-water functions affected by biochar application? Geoderma, Amsterdam, v. 249, p. 1-11, 2015.
  • OLIVEIRA, J. B. Estudos preliminares de normatização de testes de controle de qualidade do carvão vegetal. In: PENEDO, W. R. Carvão Vegetal. Belo Horizonte: CETEC, 1982. p. 7-38. (Publicação Técnica CETEC, v. 6).
  • PESSOA-JUNIOR, E. S. F. et al. Terra Preta de Índio na Região Amazônica. Scientia Amazonia, Manaus, v. 1, n.1, p. 1-8, 2012.
  • PETTER, F.A. Biomassa carbonizada como condicionador de solo: aspectos agronômicos do seu uso em solos de Cerrado. 130 f. Tese (Doutorado em Ciências Agrárias) - Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2010.
  • PICCOLO, A.; PIETRAMELLARA, G.; MBAGWU, J. S. C. Use of humic substances as soil conditioners to increase aggregate stability. Geoderma, Amsterdam, v. 75, p. 267-277, 1997.
  • PUGA, A. P. et al. Biochar application to a contaminated soil reduces the availability and plant uptake of zinc, lead and cadmium. Journal of Environmental Management, New York, v. 159, p. 86-93, 2015.
  • SANCHEZ, P. A.; VILLACHICA, J. H.; BANDY, D. E. Soil fertility dynamics after clearing a tropical rainforest in Peru. Soil Science Society of America Journal, Madison, v. 47, p. 1171-1178, 1983.
  • SECRETARIA DO ESTADO E DO ABASTECIMENTO DO PARANÁ. Precipitações mensais nos últimos 12 meses (nov. 2009 - nov. 2010). Curitiba: SEAB, 2011. Disponível em: <http://www.seab.pr.gov.br> Acesso em: 01 fev. 2010.
    » http://www.seab.pr.gov.br
  • SILVA, F. A. S.; AZEVEDO, C. A. V. Versão do programa computacional Assistat para o sistema operacional Windows. Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v. 4, n. 1, p. 71-78, 2002.
  • SMIDER, B.; SINGH, B. Agronomic performance of a high ash biochar in two contrasting soils. Agriculture, Ecosystems & Environment - Journal, Amsterdam, v. 191, p. 99-107, 2014.
  • SOHI, S. P. et al. A review of biochar and its use and function in soil. Advances in Agronomy, Burlington, v. 105, p. 47-82, 2010.
  • SOMBROEK, W. G. Amazon soils: A reconnaissance of the soils of the Brazilian Amazon region. Wageningen: Centre for Agricultural Publication and Documentation, 1966. 292 p.
  • STEINER, C.; TEIXEIRA, W. G.; ZECH, W. Slash and char: an alternative to slash and burn practiced in the Amazon basin. In: GLASER, B. B.; WOODS, W. I. (Ed.). Amazonian dark earths: explorations in space and time. Berlin: Springer Verlag, 2004. p. 183-194.
  • TROEH, F. R.; THOMPSON, L. M. Solos e fertilidade do solo. São Paulo: Andrei, 2007. 718 p.
  • TRYON, E. H. Effects of charcoal on certain physical, chemical, and biological properties of forest soils. Ecological Monographs, Ithaca, New York, v. 18, n. 1, p. 81-115, 1948.
  • VAN RAIJ, B. et al. Recomendações de adubação e calagem para o estado de São Paulo. Boletim Técnico IAC, Campinas, n. 100, 285 p. 1997.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    08 Out 2013
  • Aceito
    12 Set 2017
Universidade Federal de Santa Maria Av. Roraima, 1.000, 97105-900 Santa Maria RS Brasil, Tel. : (55 55)3220-8444 r.37, Fax: (55 55)3220-8444 r.22 - Santa Maria - RS - Brazil
E-mail: cienciaflorestal@ufsm.br