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Atributos químicos do solo em plantios florestais em substituição à vegetação nativa em campos de altitude

Soil chemical properties in forestry plantations replacing native vegetation in high-altitude grasslands

Resumo

Os plantios de espécies florestais exóticas vêm aumentando em áreas cobertas por vegetação nativa na região nordeste do Rio Grande do Sul, o que pode alterar as dinâmicas dos nutrientes no solo. Dessa maneira, o objetivo deste estudo foi avaliar os efeitos da mudança de uso da terra sobre pH e teores de carbono orgânico total (COT), Al3+, Ca2+, Mg2+ e K+ em Cambissolo Húmico, em plantios realizados em área de campo nativo. As áreas analisadas foram pinus plantado em 1963 (P) e eucalipto em 1991 (E), comparativamente a áreas adjacentes remanescentes: de campo nativo em regeneração natural a partir de 1990 (RN), mata nativa (MN) e campo nativo (CN). As amostras de solo foram coletadas nas profundidades de 0-5, 5-10 e 10-20 cm, em oito pontos para cada área avaliada, com cálculo de médias e intervalos de confiança (95%). Em geral, CN e MN apresentaram os maiores valores de COT. O plantio “P” apresentou em relação ao CN menores teores de COT, Ca e K na camada 0-10 cm, enquanto o plantio “E” apresentou menores teores de COT em relação ao CN, indicando efeitos negativos da floresta plantada em relação à vegetação natural campestre quanto à ciclagem de carbono e nutrientes. A área RN apresentou valores desses atributos similares aos do CN e MN. Avaliações em longo prazo são importantes para verificar influências do cultivo florestal sobre atributos do solo e identificar a sustentabilidade das formas de uso do solo.

Palavras-chave:
Mata de araucária; Fertilidade do solo; Floresta nativa; Matéria orgânica do solo

Abstract

The planted forests using exotic trees are increasing areas and have replaced native vegetation in the southern Brazilian highlands, which can change the dynamics of soil nutrients. The objective was to evaluate the effects of the land use change on pH and total soil organic carbon (COT), Al3+, Ca2+, Mg2+ e K+ contents on a Humic Dystrudept under plantations established in native grassland area. The land uses evaluated were pinus established in 1963 (P) and eucalyptus planted in 1991 (E), comparatively to adjacent areas of native grassland (NP), natural regeneration since 1990 (NR), and native forest (NF). Soil samples were collected at 0-5, 5-10 and 10-20 cm depth, in eight replicates for each land use to calculate means and confidence intervals (95%). In general, NP and NF showed the highest values of TOC. “P” stand compared to NP had lower TOC, Ca and K in the 0-10 cm layer, indicating negative effects of forest plantations in comparison with natural grassland in relation to carbon and nutrient cycling. NR area showed similar values of those properties in relation to NP and NF areas. Long-term evaluations are important to verify influences of forest plantations on soil properties and identify the sustainability of these land use forms.

Keywords:
Araucaria forest; Soil fertility; Native forest; Soil organic matter

Introdução

A intervenção antrópica em ecossistemas naturais para plantios de monoculturas florestais exóticas pode ocasionar degradação do solo e invasão biológica em diversos ecossistemas naturais. As condições geradas nessa floresta podem afetar o equilíbrio do carbono e nutrientes no solo e influenciar a resiliência desses ambientes (SIMBERLOFF et al., 2010SIMBERLOFF, D. et al. Spread and impact of introduced conifers in South America: lessons from other southern hemisphere regions. Austral Ecology, Adelaide, n. 35, p. 489-504, 2010.). Esses efeitos negativos podem variar em função do tipo de solo, clima, vegetação, manejo e tempo de substituição dessas áreas, implicando em impacto maior nos ecossistemas nativos mais frágeis e/ou de maior relevância ecológica, conforme verificado em ambientes naturais do Sul do Brasil (WIESMEIER et al., 2009WIESMEIER, M. M. et al. Depletion of soil organic carbon and nitrogen under Pinus taeda plantations in Southern Brazilian grasslands (Campos). European Journal of Soil Science, Oxford, v. 60, n. 3, p. 347-359, 2009.; DICK et al., 2011DICK, D. P. et al. Pinus afforestation in South Brazilian highlands: soil chemical attributes and organic matter composition. Scientia Agricola, Piracicaba, v. 68, n. 2, p. 175-181, 2011.; TOMASI; INDA; DICK, 2012TOMASI, C. A.; INDA, A. V.; DICK, D. P. Substâncias húmicas em Latossolo subtropical de altitude sob usos e manejos distintos. Ciência Rural, Santa Maria, v. 42, n. 12, p. 2180-2184, 2012.).

Na região nordeste do Rio Grande do Sul, mais precisamente nos Campos de Cima da Serra, a vegetação nativa é formada por áreas de campo associadas à floresta de araucária, que desempenham importante função ecológica na ciclagem de nutrientes e armazenamento de carbono do solo (POTES et al., 2010POTES, M. L. et al. Matéria orgânica em Neossolos de altitude: influência da queima da pastagem e do tipo de vegetação na sua composição e teor. Revista Brasileira de Ciência do Solo, Viçosa, MG., v. 34, n. 1, p. 23-32, 2010.; 2012POTES, M. L. et al. Soil organic matter in fire-affected pastures and in an Araucaria forest in South-Brazilian Leptosols. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 47, n. 5, p. 707-715, 2012.; SANTANA et al., 2013SANTANA, G. S. et al. Chemical composition and stocks of soil organic matter in a south Brazilian oxisol under pasture. Journal of the Brazilian Chemical Society, São Paulo, v. 24, n. 5, p. 821-829, 2013.; GROPPO et al., 2015GROPPO, J. D. et al. Changes in soil carbon, nitrogen and phosphorus due to land-use changes in Brazil. Biogeosciences Discussions, [s.l.], v. 12, n. 3, p. 2533-2571, 2015.). Essa vegetação constitui um dos ecossistemas mais ameaçados do país (CARLUCCI et al., 2011CARLUCCI, M.B. et al. Conservação da Floresta com Araucária no extremo Sul do Brasil. Natureza & Conservação, Rio de Janeiro, v. 9, n. 1, p. 111-114, 2011.) e continua sendo alterada e fortemente reduzida nas últimas décadas, especialmente pela crescente expansão das florestas plantadas com espécies exóticas, como pinus e eucalipto (OVERBECK et al., 2007OVERBECK, G. E. et al. Brazil's neglected biome: the south Brazilian Campos. Perspectives in Plant Ecology, Evolution and Systematics, Jena, v.9, p. 101-116, 2007.; CUNHA et al., 2011CUNHA, M. C. L. et al. Quantificação da dinâmica dos remanescentes florestais no município de Jaquirana, RS, em imagens de satélite. Revista Árvore, Viçosa, MG, v. 35, n. 4, p. 867-873, 2011.), requerendo maior atenção e estudos para avaliar, quantificar e monitorar os impactos causados ao solo e ao meio ambiente como um todo, especialmente em avaliações de longa duração.

Alguns trabalhos com avaliação de componentes do solo em florestas plantadas com espécies exóticas revelam capacidade de manter o armazenamento de C em níveis próximos ou maiores ao de áreas naturais (MAFRA et al., 2008MAFRA, A. L. et al. Carbono orgânico e atributos químicos do solo em áreas florestais. Revista Árvore, Viçosa, MG, v. 32, n. 2, p. 217-224, 2008.; SANTANA et al., 2015SANTANA, G. S. et al. The impact of exotic forest plantations on the chemical composition of soil organic matter in Southern Brazil as assessed by Py-GC/MS and lipid extracts study. Geoderma Regional, [s. l.], v. 4, p. 11-19, 2015.). Por outro lado, há situações que o plantio dessas florestas pode diminuir o teor de carbono orgânico do solo, como foi observado nos trabalhos de Wiesmeier et al. (2009WIESMEIER, M. M. et al. Depletion of soil organic carbon and nitrogen under Pinus taeda plantations in Southern Brazilian grasslands (Campos). European Journal of Soil Science, Oxford, v. 60, n. 3, p. 347-359, 2009.), Dick et al. (2011DICK, D. P. et al. Pinus afforestation in South Brazilian highlands: soil chemical attributes and organic matter composition. Scientia Agricola, Piracicaba, v. 68, n. 2, p. 175-181, 2011.), Tomasi et al. (2012TOMASI, C.A. et al. Atributos químicos e área superficial específica em Latossolo subtropical de altitude sob usos e manejos distintos. Ciência Rural, Santa Maria, v. 42, n. 12, p. 2172-2179, 2012.) e Denardin et al. (2014DENARDIN, R. B. N. et al. Estoque de carbono no solo sob diferentes formações florestais, Chapecó - SC. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 24, n. 1, p. 59-69, 2014.).

Estudos dessa natureza apresentam algumas limitações, em especial devido ao longo tempo necessário para acompanhamento das alterações no solo. Sendo assim, muitas vezes torna-se difícil encontrar áreas que tenham histórico detalhado da sua evolução, e em condições uniformes que permitam a comparação com as condições naturais antecedentes aos plantios florestais. Assim, foram identificadas áreas com plantações florestais de longa duração, localizadas na Floresta Nacional, em São Francisco de Paula, RS, sendo esta uma unidade de estudo e pesquisa com plantios comerciais desde a década de 1960, cujos estudos têm sido desenvolvidos para avaliar os aspectos técnicos e produtivos da implantação de espécies florestais como pinus e eucalipto (TONINI et al., 2002TONINI, H. et al. Comparação gráfica entre curvas de índice de sítio para Pinus elliottii e Pinus taeda desenvolvidas no Sul do Brasil. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 12, n. 1, p. 143-152, 2002.; BACKES; PRATES; VIOLA, 2005BACKES, A.; PRATES, F. L.; VIOLA, M. G. Produção de serapilheira em Floresta Ombrófila Mista, em São Francisco de Paula, Rio Grande do Sul, Brasil. Acta Botanica Brasilica, São Paulo, v. 19, n. 1, p. 155-160, 2005.). Dessa forma, o objetivo deste estudo foi avaliar teores do carbono orgânico e nutrientes no solo em plantios de eucalipto e pinus em ciclo de longa duração, comparativamente a áreas de campo em regeneração, mata e campo nativos remanescentes, como indicativos produtivos e ambientais da mudança na vegetação sobre o solo, na região dos Campos de Cima da Serra, no Rio Grande do Sul.

Material e método

O estudo foi desenvolvido na Floresta Nacional, em São Francisco de Paula - RS, localizada entre as coordenadas 29º24’ e 29º27’S e 50º22’ e 50º25’W. O clima da região é do tipo mesotérmico úmido “Cfb”, segundo Köppen (ALVARES et al., 2013ALVARES, C. A. et al. Köppen’s climate classification map for Brazil. Meteorologische Zeitschrif, Stuttgart, v. 22, n. 6, p. 711-728, 2013.). A temperatura média anual é de 14,5 °C e a precipitação média anual é de 2252 mm. O solo é caracterizado como Cambissolo Húmico Alumínico, textura franco argilosa, derivado de rochas efusivas ácidas da Formação Serra Geral (STRECK et al., 2008STRECK, E. V. et al. Solos do Rio Grande do Sul. 2. ed. Porto Alegre: EMATER; UFRGS, 2008. 222 p.). A cobertura vegetal natural na região é formada por vegetação campestre e pela Floresta Ombrófila Mista em galeria (BEHLING; BAUERMAN; NEVES, 2001BEHLING, H.; BAUERMAN, S. G.; NEVES, P. C. P. Holocene environmental changes in São Francisco de Paula region, southern Brazil. Journal of South American Earth Sciences, Columbia, v. 14, n. 6, p. 631-639, 2001.).

Os sistemas de uso da terra avaliados abrangeram plantios florestais com histórico detalhado de implantação e com inventários de produção em ciclo de longa duração, incluindo pinus (Pinus taeda) plantado em 1963 (P) e eucalipto (Eucalyptus saligna), plantado em 1991 (E), conforme programa de manejo florestal da Floresta Nacional de estudo (INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE, 2013INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE. Programa de manejo florestal da Floresta Nacional de São Francisco de Paula-RS. São Francisco de Paula, 2013, 67 p.). Comparativamente foram avaliadas uma área de campo nativo em regeneração natural a partir de 1990 (RN), uma área de campo nativo utilizada na pecuária bovina extensiva tradicional (CN) e uma mata nativa (MN) (Tabela 1).

Tabela 1
Histórico de uso do solo nas áreas avaliadas na Floresta Nacional de São Francisco de Paula
Table 1
Land use characteristics in the evaluated areas of São Francisco de Paula National

As áreas analisadas foram previamente avaliadas quanto à uniformidade nas condições edáficas e de relevo, com base na profundidade efetiva, cor e textura do solo em tradagens, de forma a minimizar variações naturais e permitir comparação entre elas. As áreas são vizinhas e localizam-se em um raio máximo de 400 metros entre si.

O solo foi coletado em julho de 2012, em amostras deformadas nas camadas de 0-5, 5-10 e 10-20 cm com trado holandês, em dois transectos, com quatro pontos de coleta equidistantes de 15 m, totalizando oito amostras por profundidade, em cada uso do solo, com oito sub-amostras cada uma, para formar uma amostra composta.

As avaliações realizadas foram do teor de carbono orgânico total e da composição química do solo. O carbono orgânico total foi analisado pelo método de combustão úmida, com oxidação com dicromato de potássio, ácido sulfúrico, e determinação por titulação. Os atributos químicos do solo analisados foram pH em água, pH em CaCl2, alumínio, cálcio, magnésio e potássio, determinados segundo metodologias de Tedesco et al. (1995TEDESCO, M. J. et al. Análise de solo, plantas e outros materiais. 2.ed. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1995. 174p.).

A estatística utilizada para comparar as áreas foi representada pelo cálculo das médias e dos intervalos de confiança (95%), conforme Pimentel-Gomes e Garcia (2002)PIMENTEL-GOMES, F.; GARCIA, C. R. Estatística aplicada a experimentos agronômicos e florestais: exposição com exemplos e orientações para uso de aplicativos. Piracicaba: FEALQ. 2002. 309 p., sendo comparadas as variáveis em cada camada individualmente, sendo a semelhança identificada pela sobreposição dos intervalos de confiança (PAYTON; MILLER; RAUN, 2000PAYTON, M. E.; MILLER, A. E.; RAUN, W. R. Testing statistical hypotheses using standard error bars and confidence intervals. Communications in Soil Science and Plant Analysis, Missouri, v. 31, n.5/6, p. 547-551, 2000.).

Resultados e discussão

Carbono orgânico total

Os solos sob CN, RN e MN apresentaram os maiores teores de COT, variando de 62,1 a 70,5 g kg-1na camada superficial, e de 44,1 a 64,1 g kg-1 em subsuperfície (Figura 1).

Figura 1
Teores de carbono orgânico total em diferentes tipos de uso do solo, em São Francisco de Paula - RS. As barras indicam o intervalo de confiança (95%)
Figure 1
Total soil organic carbon in different land uses in São Francisco de Paula - RS state. Error bars represent the confidence intervals of the means (95%)

Na área RN foram verificados teores de COT intermediários entre MN e CN, diferindo do CN apenas na última camada. Os plantios florestais apresentaram menor teor de COT nas três camadas, quando comparados ao CN.

Os altos teores de COT observados nas áreas naturais avaliadas são indicativos da alta capacidade de acúmulo de carbono em solos de vegetação nativa na região dos Campos de Cima da Serra, relacionada ao aporte total de materiais orgânicos no solo e às condições de solo e clima dessa região, caracterizada por valores elevados de precipitação e baixa temperatura (BECKER; BURIOL; STRECK, 2012BECKER, E. L. S.; BURIOL, G. A.; STRECK, N. A. Clima e Intemperismo na Formação dos Solos do Rio Grande do Sul, Brasil. Revista Brasileira de Geografia Física, Recife, v. 5, n. 1, p. 33-46, 2012.). Com o aumento da umidade no solo e redução de temperatura ocorre diminuição da taxa de decomposição dos materiais orgânicos pelos microrganismos, favorecendo o acúmulo de matéria orgânica. Além disso, os teores altos de Al trocável dos solos da região conferem proteção química ao C devido à complexação da matéria orgânica com o Al (SILVA; DICK; INDA JUNIOR, 2008SILVA, L. B.; DICK, D. P.; INDA JUNIOR, A. V. Solos subtropicais de altitude: atributos químicos, teor de matéria orgânica e resistência à oxidação química. Ciência Rural, Santa Maria, v. 38, n. 4, p. 1167-1171, 2008.).

Nas áreas de plantios florestais os teores de COT foram menores, especialmente quando comparadas ao CN. Resultados semelhantes foram encontrados por Silva et al. (2009SILVA, L. G. et al. Physical, chemical and biological attributes of a cerrado Oxisol under different forest species. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 44, n. 6, p. 613-620, 2009.), em Latossolo Vermelho-Amarelo de cerrado em plantios de eucalipto (Eucalyptus grandis) e pinus (Pinus tecunumanii). Nos Campos de Cima da Serra, outros estudos sobre o efeito de plantios de pinus no C do solo têm relatado comportamento semelhante, como foi observado por Wiesmeier et al. (2009WIESMEIER, M. M. et al. Depletion of soil organic carbon and nitrogen under Pinus taeda plantations in Southern Brazilian grasslands (Campos). European Journal of Soil Science, Oxford, v. 60, n. 3, p. 347-359, 2009.), Dick et al. (2011DICK, D. P. et al. Pinus afforestation in South Brazilian highlands: soil chemical attributes and organic matter composition. Scientia Agricola, Piracicaba, v. 68, n. 2, p. 175-181, 2011.) e Tomasi, Inda e Dick (2012TOMASI, C. A.; INDA, A. V.; DICK, D. P. Substâncias húmicas em Latossolo subtropical de altitude sob usos e manejos distintos. Ciência Rural, Santa Maria, v. 42, n. 12, p. 2180-2184, 2012.), com redução no teor de carbono orgânico no solo nesse plantio em comparação com os solos das áreas nativas. Destaca-se que podem ocorrer variações nos teores de carbono orgânicos nessas áreas advindas das práticas adotadas, como tipo de preparo do solo, manejo dos resíduos, utilização da queima, número de rotações, entre outros fatores.

Alguns estudos relatam variações no teor de C do solo em plantações florestais de acordo com o manejo dado a essas florestas, como a influência da queima, relatada por Brun (2008BRUN, E. J. Matéria orgânica do solo em plantios de Pinus taeda e Pinus elliottii em duas regiões do Rio Grande do Sul. 2008. Tese (Doutorado em Engenharia Florestal) - Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2008.), que resultou em maiores teores de C total em área com pinus onde a biomassa foi queimada, em relação à área original de floresta nativa. Nesse caso, os danos provocados pela queima foram contrabalanceados pelo maior aporte de serapilheira. Já em área de pinus em que a biomassa foi enleirada houve menor teor de C no solo em comparação com a área de floresta nativa, pois o enleiramento da camada de resíduos fez com que o carbono ficasse concentrado nas leiras, e não nos locais de plantio. Em outro estudo conduzido por Abrão et al. (2015ABRÃO, S. F. et al. Alterações químicas de um Cambissolo Húmico causadas por florestamento com Pinus taeda em área de campo natural. Floresta, Curitiba, v. 45, n. 3, p. 455-464, 2015.), a substituição do campo natural por pinus diminuiu os teores de C e N na camada mais superficial do solo no primeiro cultivo. Porém, na segunda rotação, as áreas apresentaram valores semelhantes nessa camada, indicando que o tempo de cultivo afeta os atributos químicos do solo.

Além disso, as mudanças nos teores de COT em plantios de pinus podem ser relacionadas à alteração na produção de serapilheira e variações na sua composição qualitativa, além de mudanças no ambiente local. Os organismos do solo são responsáveis pela ciclagem do C e têm sua atividade influenciada por diversos fatores no solo tais como: umidade, temperatura, estrutura, disponibilidade de nutrientes e textura, e da vegetação, como relação C/N e quantidade de resíduos orgânicos, dentre outros (CARVALHO; MOREIRA; CARDOSO, 2012CARVALHO, F. de; MOREIRA, F. M.S.; CARDOSO, E. J. B. N. Chemical and biochemical properties of Araucaria angustifolia (Bert.) Ktze. forest soils in the state of São Paulo. Revista Brasileira de Ciência do Solo, Viçosa, MG, v. 36, n. 4, p. 1189-1202, 2012.). Paz et al. (2015PAZ, C. P. et al. Changes in macrofungal communities following forest conversion into plantations in Southern Brazil. Biotropica, [s. l.], v. 47, n. 5, p. 616-625, 2015.) estudaram os macrofungos na Floresta Nacional de São Francisco de Paula e concluíram que a conversão da floresta nativa em plantações de pinus e eucalipto reduziu o número de espécies de macrofungos de decomposição, provavelmente devido a mudanças na disponibilidade e qualidade do substrato e que, além disso, as florestas nativas podem ser vulneráveis à invasão por espécies ectomicorrízicas exóticas, juntamente com seus hospedeiros exóticos. A avaliação desses fatores pode auxiliar o entendimento das diferenças dos teores de COT entre áreas nativas e plantadas.

A transformação do campo nativo em plantio de pinus implica em mudança de ambiente mais aberto para condição mais sombreada sob as árvores, formando um microclima no sub-bosque, devido à menor velocidade do vento e radiação solar, que diminuem a evaporação da água do solo, com consequente aumento na umidade e diminuição na amplitude térmica do solo. Além disso, alguns autores citam que a serapilheira do pinus se caracteriza pelo baixo teor de nutrientes e lenta decomposição, em função da alta relação C/N e compostos fenólicos e ligninas encontrados nas acículas, o que reduz o desenvolvimento de microrganismos, diminuindo assim a incorporação de C no solo (CARVALHO et al., 2008CARVALHO, A. M. X. de et al. Atividade microbiana de solo e serapilheira em áreas povoadas com Pinus elliottii e Terminalia ivorensis. Revista Brasileira de Ciência de Solo, Viçosa, MG, v. 32, nesp, p. 2709-2716, 2008.; SARTOR et al., 2009SARTOR, L. R. et al. Alelopatia de acículas de Pinus taeda na germinação e no desenvolvimento de plântulas de Avena strigosa. Ciência Rural, Santa Maria, v. 39, n. 6, p. 1653-1659, 2009. ; ALMEIDA et al., 2012ALMEIDA, H. C. et al. Distribution of chemical compartments of soil organic matter and C stocks of a cambisol from south Brazil as affected by Pinus afforestation. Química Nova, São Paulo, v. 35, n. 7, p. 1329-1335, 2012.). Já outros estudos destacam a produção de serapilheira pelo pinus e sua importância sobre a ciclagem de nutrientes no solo (VIERA; SCHUMACHER, 2010VIERA, M.; SCHUMACHER, M. V. Teores e aporte de nutrientes na serapilheira de Pinus taeda L., e sua relação com a temperatura do ar e pluviosidade. Revista Árvore, Viçosa, MG, v. 34, n. 1, p. 85-94, 2010.; PIOVESAN et al., 2012PIOVESAN, G. et al. Deposição de serapilheira em povoamento de Pinus. Pesquisa Agropecuária Tropical, Goiânia, v. 42, n. 2, p. 206-211, 2012.), o que pode contribuir para a melhoria das condições químicas do solo (SILVA et al., 2016SILVA, A. M. et al. Características químicas de um Latossolo Vermelho em recuperação sob plantio de Pinus spp. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 26, n. 4, p. 1049-1060, 2016.).

De forma semelhante à floresta de pinus, no eucalipto também há redução da luminosidade no sub-bosque e formação de microclima mais úmido e com menor variação térmica (ANDRADE et al., 2001ANDRADE, C. M. S. de et al. Fatores limitantes ao crescimento do capim-Tanzânia em um sistema agrossilvipastoril com eucalipto, na região dos Cerrados de Minas Gerais. Revista Brasileira de Zootecnia, Viçosa, MG v. 30, n. 4, p. 1178-1185, 2001.). Destaca-se também, que a serapilheira do eucalipto apresenta baixa decomposição, em função do alto teor de lignina e alta relação C/N (VIERA; SCHUMACHER; CALDEIRA, 2013VIERA, M.; SCHUMACHER, M. V.; CALDEIRA, M. V. W. Dinâmica de decomposição e nutrientes em plantio de Eucalyptus urophylla x Eucalyptus globulus no sul do Brasil. Floresta e Ambiente, Seropédica, v. 20, n. 3, p. 351-360, 2013.), havendo acúmulo desta conforme aumenta a idade do plantio (VIERA et al., 2014VIERA, M. et al. Deposição de serapilheira e nutrientes em plantio de Eucalyptus urophylla × E. globulus. Floresta e Ambiente, Seropédica, v. 21, n. 3, p. 327-338, 2014.). Várias espécies de eucaliptos produzem substâncias alelopáticas, capazes de interferir na atividade microbiana do solo (MOURA et al., 1996MOURA, V. T. L. et al. Nodulação e crescimento de leguminosas cultivadas em solos coletados sob eucaliptal e sob mata atlântica: relação com os efeitos alelopáticos do Eucalyptus. Revista Brasileira de Ciência do Solo, Viçosa, MG, v.20, n. 3, p. 399-405, 1996.; SOUTO et al., 2001SOUTO, X. C. et al. Allelopathic effects of tree species on some soil microbial populations and herbaceous plants. Biologia Plantarum, Prague, v. 44, n. 2, p. 269-27, 2001.). Assim, a menor decomposição da serapilheira ocasiona redução no aporte de C orgânico, o que pode justificar o menor teor de COT do plantio “E” em relação ao CN. Por outro lado, o acúmulo de serapilheira na área de eucalipto com mais de 20 anos após a implantação representa uma reserva de material orgânico, que poderia ser gradativamente incorporado à matéria orgânica do solo, à medida que ocorresse novo ciclo de cultivo ou fosse mudado o uso da terra nesse local.

A semelhança nos valores de COT das áreas RN, MN e CN sugere que a substituição gradual da vegetação de campo para mata nativa, que ocorreu após abandono da área de campo nativo mantém o acúmulo de C orgânico no solo. Em estudo realizado em Guarapuava, Paraná, Bini et al. (2013BINI, D. et al. Effects of land use on soil organic carbon and microbial processes associated with soil health in southern Brazil. European Journal of Soil Biology, Oxford, v. 55, p. 117-123, 2013.) encontraram para a floresta secundária com 13 anos, desenvolvida em área anteriormente cultivada com pinus por 40 anos e abandonada após queima acidental, teor de C orgânico similar ao solo da floresta nativa. Essa recuperação pode ser atribuída aos resíduos orgânicos diversificados produzidos pelas espécies nativas, além da proteção do solo contra a erosão, que permitem equilíbrio na atividade microbiana e acúmulo de C orgânico no solo.

Valores de pH em água e em CaCl2

Os valores de pH em água nos sistemas de usos do solo variaram de 3,78 a 4,50, ao passo que em CaCl2 variaram de 3,63 a 3,96, indicando elevada acidez nas três profundidades avaliadas (Tabela 2).

Tabela 2
Valores de pH em água e pH em CaCl2 e respectivos intervalos de confiança (95%), em diferentes tipos de uso do solo, em Cambissolo Húmico, em São Francisco de Paula - RS
Table 2
Mean water and CaCl2 pH values and confidence intervals (95%) in different land uses on a Humic Dystrudept, in São Francisco de Paula - RS state

Os baixos valores de pH observados são típicos de solos de altitude do Sul do Brasil e estão associados ao intemperismo do solo, além da ocorrência de quantidade considerável de ácidos orgânicos, que se acumulam no solo devido à decomposição e mineralização lenta dos resíduos vegetais nesse ambiente (SILVA; DICK; INDA JUNIOR, 2008SILVA, L. B.; DICK, D. P.; INDA JUNIOR, A. V. Solos subtropicais de altitude: atributos químicos, teor de matéria orgânica e resistência à oxidação química. Ciência Rural, Santa Maria, v. 38, n. 4, p. 1167-1171, 2008..). Pode haver relação inversa entre o teor de C e o pH, uma vez que parte da acidez do solo pode estar relacionada aos ácidos orgânicos liberados pelos microrganismos na decomposição da matéria orgânica, e contribuem para o estabelecimento da atividade de prótons na solução do solo (BALDOTTO; BALDOTTO, 2014BALDOTTO, M. A.; BALDOTTO, L. E. B. Ácidos húmicos. Revista Ceres, Viçosa, MG, v. 61, supl., p. 856-881, 2014.). Além disso, não foi aplicado corretivo de acidez do solo nas áreas avaliadas. Skorupa et al. (2012SKORUPA, A.L.A. et al. Propriedades de solos sob vegetação nativa em Minas Gerais: distribuição por fitofisionomia, hidrografia e variabilidade espacial. Revista Brasileira de Ciência do Solo, Viçosa, MG, v. 36, n. 1, p. 11-22, 2012.) evidenciaram em fragmento de Floresta Ombrófila, em Minas Gerais, baixo pH do solo e altos teores de H+Al em solos de altitude, com alta precipitação pluvial, o que pode favorecer o acúmulo de matéria orgânica e a consequente acidificação do solo. Valores baixos de pH foram reportados por Potes et al. (2010POTES, M. L. et al. Matéria orgânica em Neossolos de altitude: influência da queima da pastagem e do tipo de vegetação na sua composição e teor. Revista Brasileira de Ciência do Solo, Viçosa, MG., v. 34, n. 1, p. 23-32, 2010.), em estudo realizado em solo sob campo e mata nativos na região dos Campos de Cima da Serra, no Rio Grande do Sul.

Teores de Al e nutrientes

Os valores de Al encontrados foram considerados altos (Tabela 3), o que pode ser explicado devido aos baixos valores de pH, facilitando a solubilização do Al trocável no solo. Além disso, o alto teor de Al encontrado nos solos dessa região foi relacionado por Tomasi et al. (2012TOMASI, C. A.; INDA, A. V.; DICK, D. P. Substâncias húmicas em Latossolo subtropical de altitude sob usos e manejos distintos. Ciência Rural, Santa Maria, v. 42, n. 12, p. 2180-2184, 2012.) à composição mineralógica, caulinítica e oxídica destes. As áreas CN e MN tiveram conteúdos de Al relativamente baixos na superfície e aumentaram em profundidade, evidenciando que além da matéria orgânica, a mineralogia interfere nos teores de alumínio trocável.

Tabela 3
Teores de Ca, Mg, Al e K (cmolc dm-3) e respectivos intervalos de confiança (95%), em sistemas de um Cambissolo Húmico, em São Francisco de Paula - RS
Table 3
Mean Ca, Mg, Al and K contents (cmolc dm-3) and confidence intervals (95%) in different land uses on a Humic Dystrudept, in São Francisco de Paula - RS state

A composição química do solo, em termos de alumínio trocável e teor de nutrientes, é importante indicador da sua qualidade e permite avaliar a influência da mudança de vegetação sobre o solo. Destaca-se também, que os solos da região Campos de Cima da Serra são na maioria fortemente ácidos, com altos teores de alumínio e pobres em nutrientes (SILVA; DICK; INDA JUNIOR, 2008SILVA, L. B.; DICK, D. P.; INDA JUNIOR, A. V. Solos subtropicais de altitude: atributos químicos, teor de matéria orgânica e resistência à oxidação química. Ciência Rural, Santa Maria, v. 38, n. 4, p. 1167-1171, 2008.).

O solo sob eucalipto apresentou teores de Ca inferiores ao CN, sem diferença em relação aos teores de Mg e K (Tabela 3). Essa diferença pode ser explicada pela absorção de Ca pelo eucalipto e alocação na parte aérea da planta (SANTANA et al., 2008SANTANA, R. C. et al. Alocação de nutrientes em plantios de eucalipto no Brasil. Revista Brasileira de Ciência do Solo, Viçosa, MG, v. 32, nesp., p. 2723-2733, 2008.). Em outro estudo avaliando espécies florestais, Silva et al. (2009SILVA, L. G. et al. Physical, chemical and biological attributes of a cerrado Oxisol under different forest species. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 44, n. 6, p. 613-620, 2009.) relataram em plantio de eucalipto aumento no teor de K do solo, enquanto os teores de Ca e Mg e saturação por bases não diferiram em relação ao cerrado nativo, porém foram superiores aos dos plantios de pinus. Destaca-se que essas espécies foram adubadas na sua implantação, o que difere da condição deste estudo (Tabela 1).

Os maiores teores de nutrientes no solo foram de Ca, seguidos de Mg e K, o que é comumente observado em solos florestais nessa região (VIERA; SCHUMACHER, 2010VIERA, M.; SCHUMACHER, M. V. Teores e aporte de nutrientes na serapilheira de Pinus taeda L., e sua relação com a temperatura do ar e pluviosidade. Revista Árvore, Viçosa, MG, v. 34, n. 1, p. 85-94, 2010.). No geral, considerando a disponibilidade de nutrientes no solo para as plantas, os valores de K foram médios nas áreas avaliadas, especialmente na primeira camada, o que pode ser justificado pelo material de origem a partir de rochas efusivas da Formação Serra Geral. No entanto, a substituição do campo pelo plantio “P” indicou redução, especialmente nos teores de K (Tabela 3), o que pode ser justificado pela elevada capacidade de absorção desse elemento pelo pinus (MAFRA et al., 2008MAFRA, A. L. et al. Carbono orgânico e atributos químicos do solo em áreas florestais. Revista Árvore, Viçosa, MG, v. 32, n. 2, p. 217-224, 2008.; TOMASI et al., 2012TOMASI, C. A.; INDA, A. V.; DICK, D. P. Substâncias húmicas em Latossolo subtropical de altitude sob usos e manejos distintos. Ciência Rural, Santa Maria, v. 42, n. 12, p. 2180-2184, 2012.), e pelos baixos teores de K e também de Mg que a serapilheira do pinus apresenta, e consequentemente baixo retorno destes nutrientes ao solo (VIERA; SCHUMACHER, 2010VIERA, M.; SCHUMACHER, M. V. Teores e aporte de nutrientes na serapilheira de Pinus taeda L., e sua relação com a temperatura do ar e pluviosidade. Revista Árvore, Viçosa, MG, v. 34, n. 1, p. 85-94, 2010.; BATISTA et al., 2015BATISTA, A. H. et al. Liming and fertilisation in Pinus taeda plantations with severe nutrient deficiency in savanna soils. Acta Scientiarum. Agronomy, Maringá, v. 37, n. 1, p. 117-125, 2015.). Batista et al (2015BATISTA, A. H. et al. Liming and fertilisation in Pinus taeda plantations with severe nutrient deficiency in savanna soils. Acta Scientiarum. Agronomy, Maringá, v. 37, n. 1, p. 117-125, 2015.) avaliaram o efeito da adubação e calagem aplicadas sobre a serapilheira do pinus, em solos com alta acidez e baixos teores de bases trocáveis, e revelaram que a adubação é uma possibilidade de corrigir limitações nutricionais, uma vez que incrementou os teores de K no solo, serapilheira e acículas. No entanto, mais estudos são necessários para avaliar a eficiência da calagem e adubação em reverter a deficiência nutricional e melhorar o crescimento dessa espécie.

Resultados semelhantes foram encontrados por Almeida et al. (2012ALMEIDA, H. C. et al. Distribution of chemical compartments of soil organic matter and C stocks of a cambisol from south Brazil as affected by Pinus afforestation. Química Nova, São Paulo, v. 35, n. 7, p. 1329-1335, 2012.), que relataram empobrecimento do solo em termos de nutrientes, devido à introdução do pinus em área de campo nativo no Planalto Catarinense, sendo que na pastagem o pH, os teores de Ca e Mg trocáveis foram maiores e Al foi reduzido em relação ao pinus de 10 e 14 anos. Nos Campos de Cima da Serra, Dick et al. (2011DICK, D. P. et al. Pinus afforestation in South Brazilian highlands: soil chemical attributes and organic matter composition. Scientia Agricola, Piracicaba, v. 68, n. 2, p. 175-181, 2011.) encontraram teores de Ca e Mg trocáveis consideravelmente menores em todas as amostras de pinus de 8 e 30 anos, em relação ao campo nativo. No cerrado, Silva et al. (2009SILVA, L. G. et al. Physical, chemical and biological attributes of a cerrado Oxisol under different forest species. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 44, n. 6, p. 613-620, 2009.) encontraram para áreas sob pinus, previamente adubadas, reduções no pH e nos teores de K, Ca e Mg e aumento médio de 40% na saturação por Al (m%), em comparação com o cerrado nativo. Fatores como a liberação de ácidos orgânicos das acículas durante a decomposição, maior absorção de cátions que ânions e redução da matéria orgânica foram apontados como possíveis causas dessas variações nos atributos químicos do solo.

A variação de resultados encontrados na literatura quanto aos efeitos do eucalipto e pinus sobre a dinâmica dos nutrientes no solo pode ter relação com as diferenças de clima, solo, espécies plantadas, uso da adubação (não empregada no plantio de eucalipto avaliado), ecossistema nativo usado como referência e manejo das áreas reflorestadas, que tornam imprópria a generalização dos efeitos gerados por esses plantios no solo. No caso da área de pinus amostrada, salienta-se que foi implantada há cerca de 49 anos, o que representa um período maior de crescimento em relação ao ciclo normal das florestas comerciais plantadas com essa espécie na região sul do Brasil.

As diferenças encontradas entre os teores de nutrientes das diferentes áreas podem ser explicadas pelo comportamento diferenciado entre espécies vegetais, quanto à absorção de nutrientes a partir do solo, deposição e qualidade de resíduos na superfície e velocidade de decomposição da serapilheira e liberação dos nutrientes, que alteram a ciclagem e os teores desses elementos no solo (VIERA; SCHUMACHER, 2010VIERA, M.; SCHUMACHER, M. V. Teores e aporte de nutrientes na serapilheira de Pinus taeda L., e sua relação com a temperatura do ar e pluviosidade. Revista Árvore, Viçosa, MG, v. 34, n. 1, p. 85-94, 2010.).

Em relação às áreas nativas avaliadas, a MN apresentou teores semelhantes de nutrientes em relação ao CN, possivelmente em função da alta diversidade vegetal desse ecossistema e relativamente baixo grau de resistência à decomposição da sua serapilheira, que possibilita maior retorno dos nutrientes ao solo (OSAKI; PÉLLICO NETTO, 2013OSAKI, F.; PÉLLICO NETTO, S. Flutuação da população de fungos sob Floresta Ombrófila Mista e em povoamento de Pinus taeda. Floresta, Curitiba, v. 42, n. 4, p. 795-808, 2013.). Além disso, as florestas de araucária constituem sistemas florísticos e estruturais heterogêneos e complexos, capazes de desenvolver estratégias que ampliam suas variáveis funcionais, possibilitando alcançar, dessa maneira, boa eficiência na ciclagem de nutrientes (BACKES; PRATES; VIOLA, 2005BACKES, A.; PRATES, F. L.; VIOLA, M. G. Produção de serapilheira em Floresta Ombrófila Mista, em São Francisco de Paula, Rio Grande do Sul, Brasil. Acta Botanica Brasilica, São Paulo, v. 19, n. 1, p. 155-160, 2005.). Schumacher et al. (2004 SCHUMACHER, M. V. et al. Produção de serapilheira em uma floresta de Araucaria angustifolia (Bertol.) Kuntze no município de Pinhal Grande-RS. Revista Árvore, Viçosa, MG, v.28, n.1, p. 29-37, 2004.), em floresta de araucária em Pinhal Grande-RS, relataram que as acículas foram as principais responsáveis pela devolução de nutrientes ao solo, tendo o Ca a maior devolução, seguido pelo N, K, Mg e P.

Em relação aos teores de nutrientes da área RN, estes foram similares aos do CN e MN, exceto em relação aos de K, o que sugere que a mudança de vegetação nessa área produziu resíduos com menor qualidade e menor facilidade de decomposição em relação aos resíduos das áreas CN e MN. Diferenças nutricionais entre solos de sistemas em regeneração e nativos podem ocorrer em função de diferenças nos padrões de biomassa microbiana e atividades enzimáticas, como relatadas por Kuwano et al. (2014KUWANO, B. H. et al. Soil quality indicators in a Rhodic Kandiudult under different uses in northern Parana, Brazil. Revista Brasileira de Ciência do Solo, Viçosa, MG v. 38, n. 1, p. 50-59, 2014.), em solo de floresta em regeneração secundária por mais de 20 anos no norte do Paraná, em que estes atributos ainda não estavam ao mesmo nível que a vegetação nativa tomada como referência.

Conclusões

A mata nativa e a regeneração natural apresentaram atributos químicos do solo semelhantes ao campo nativo, o que sugere dinâmica equivalente dessas formas de vegetação para carbono e nutrientes no solo.

O cultivo de pinus de longa duração reduziu os teores de carbono e de nutrientes no solo em comparação ao campo nativo, com destaque para redução no teor de K. Já o eucalipto reduziu os teores de Ca e Mg em relação ao campo nativo, o que possivelmente esteja relacionado à velocidade de decomposição dos resíduos orgânicos e variações na absorção de nutrientes pelas espécies cultivadas, visto não ter sido feita adubação na ocasião da sua implantação.

Os plantios florestais podem modificar os atributos químicos do solo, e esses estudos de longa duração podem fornecer informações importantes para práticas de manejo como adubação e correção desses solos ácidos e pobres em nutrientes.

Agradecimentos

À Floresta Nacional de São Francisco de Paula, em especial ao Analista Ambiental Artur José Soligo pela possibilidade de realização do trabalho e pelas informações de histórico das áreas. Autorização junto ao Instituto Chico Mendes n. 35029-1.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2020

Histórico

  • Recebido
    23 Jul 2015
  • Aceito
    12 Jun 2019
  • Publicado
    04 Jun 2020
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