Produção e aplicação de filtro de baixo custo com carvão ativado a partir do resíduo de caroço de açaí nativo

Production and application of low cost filter with activated charcoal from native açaí kit waste

RESUMO

Esta pesquisa teve como objetivo produzir carvão ativado (CA) a partir do caroço do açaí da espécie nativa Euterpe precatoria, bem como realizar análises físicas do CA e verificar a sua capacidade de filtragem. Para isso, foram realizados três diferentes tipos de CA, sendo dois feitos em laboratório com a variação de temperatura e tempo de exposição e outro tipo de CA realizado em campo (área rural). O CA produzido, tanto em laboratório, como em campo, teve significativa redução de massa aparente e a microscopia eletrônica comprovou ser de boa qualidade. O filtro com o carvão de caroço de açaí mostrou-se eficaz na remoção parcial de coliformes e com um aumento significativo do pH, elevou os níveis de alcalinidade e condutividade, reduziu a dureza e melhorou a turbidez, e provou ser uma ótima ferramenta que, somada com o processo de cloração, pode levar água tratada a comunidades isoladas que não tem acesso a água tratada, tendo características de baixo custo e reaproveitamento de resíduos.

Palavras-chave
Adsorção; Filtro; Amazônia

ABSTRACT

This research aimed to produce activated carbon (AC) from the seed of açaí of the native species Euterpe precatoria, as well as to perform physical analysis of the AC and verify its filtering capacity. For this, three different types of AC were carried out, two of which were carried out in the laboratory with the variation of temperature and exposure time and another type of AC carried out in the field (rural area). The AC produced, both in the laboratory and in the field, had a significant reduction in apparent mass and electron microscopy proved to be of good quality. The filter with açaí stone charcoal proved to be effective in partially removing coliforms and with a significant increase in pH, it raised alkalinity and conductivity levels, reduced hardness and improved turbidity, and proved to be a great tool that, added to the chlorination process, it can take treated water to isolated communities that do not have access to treated water, having characteristics of low cost and reuse of waste.

Keywords
Adsorption; Filter; Amazônia

1 INTRODUÇÃO

O açaizeiro (Euterpe precatoria), de origem nativa da América Central e do Sul, é considerado como a palmeira mais produtiva da região amazônica. Destaca-se por ter frutos consumidos como um alimento básico nessa região do Brasil. Nos últimos anos, o fruto do açaí ganhou a atenção internacional como um alimento funcional, devido aos seus diversos benefícios nutricionais e terapêuticos (MENEZES; TORRES; SRUR, 2008; BERNAUD; FUNCHAL, 2011; BONOMO; SILVA; BOASQUIVIS; PAIVA; GUERRA; MARTINS; TORRES; PAULA; CANESCHI; JACOLOT; GROSSIN; TESSIER; BOULANGER; SILVA; PEDROSA; OLIVEIRA, 2014).

Em sua utilização, o açaí possui extrema versatilidade. Em seu uso primário, o consumo alimentício da polpa possibilita uma fonte nutricional, acarretada por uma via de fonte econômica regional aos produtores. Para sua utilização secundária, o caroço, enquanto resíduo, também pode corresponder a uma série de implicações. Nessa ordem, destacam-se também as produções de alimentos e bebidas, a partir do processamento do caroço, bem como sua utilização, na forma de partículas para a construção civil (BARBOSA; REBELO; MARTORANO; GIACON, 2019).

A fabricação de carvão ativado (CA) também é uma perspectiva para os resíduos do açaí. O CA é uma forma de carbono puro de grande porosidade, caracterizado pela extensa superfície em função da granulometria, bem como sua afinidade com a água, permitindo, como produto dessa interação, a filtragem das impurezas presentes nela. Tais atributos dão relevância a esse material, quando se deseja analisar fatores inerentes ao tratamento da água (FISCHER; LIMA; FELSNER; QUINÁIA, 2019).

Um filtro de carvão tem como principal característica remover contaminantes e as impurezas, utilizando como método a absorção química. O poro do elemento filtrante de carvão tem capacidade normalmente de remover partículas que variam de 0,5 a 50 micra (SOUSA, 2019).

Além disso, a função social de um filtro pode ir além de suas fronteiras, servindo como alternativa de utilização para tratamento a baixo custo, às comunidades isoladas, como ribeirinhos (SILVA; SOUSA; MEDEIROS; RIZZATTI, 2018).

A produção de CA do caroço de açaí pode auxiliar na resolução de algumas problemáticas, as quais se relacionam com a correta destinação de resíduos vegetais e seus potenciais intrínsecos à utilização; bem como com a qualidade de tratamento de água, a processos de baixo custo ou impacto ambiental. A esse sinal, verifica-se potencial conforme a produção de outras tipificações de carvão ativado ou materiais adsortivos, com origem em resíduos vegetais, como o caroço do pêssego e do babaçu (SILVA; SANTOS; SILVA FILHO; CARVALHO; NUNES, 2019; HEYLMANN; LOPES; AFONSO; DEMARCO; JÚNIOR, T. R. C.; QUADRO; ANDREAZZA, 2021). Ainda, essa utilização de um material gerado a partir de uma fruta nativa da região, cuja produção pode movimentar o comércio, gerando emprego e renda local, permitindo ainda a mitigação de impactos ambientais, segundo sua constituição na cadeia produtiva como subproduto de reaproveitamento. Logo, se relacionando como um forte indicador de sustentabilidade (BARBOSA; REBELO; MARTORANO; GIACON, 2019).

Diante disso, o objetivo deste trabalho foi produzir o CA a partir do caroço do açaí de espécies nativas (E. precatoria), bem como caracterizar suas propriedades físicas e de filtragem.

2 MATERIAL E MÉTODOS

2.1 Coleta e preparação das amostras

As sementes foram coletadas em um estabelecimento comercial que processa e vende a polpa do açaí no centro da cidade de Rio Branco – Acre. Lá foram adquiridos dois sacos de 60 litros de caroços. Em seguida, o material foi lavado em água corrente até que se retirassem as impurezas. Após a lavagem, foram separados em dois lotes, um foi para o laboratório da Universidade Federal do Acre (UFAC), para secar em estufa, outro foi para o campo para secagem natural ao sol.

2.2 Produção do carvão ativado em laboratório

No laboratório, os estudos foram desenvolvidos utilizando os métodos estipulados por Sousa (2019) com variação apenas da temperatura de secagem, que foi de 105 ºC, o tempo de espera entre cada processo foi de 24 h. Uma solução ativante foi preparada com a dissolução de NaOH em água na proporção de 80 g de NaOH/L de água. Nesta pesquisa, foram usadas 960 g de NaOH dissolvidas em 12 L de água. Após secagem em estufa, as amostras foram mergulhadas na solução alcalina de soda cáustica, por 24 horas. Posteriormente, os caroços foram retirados do recipiente de repouso e deixados em peneira para retirar o excesso de solução.

Para efeito de comparação, foram retirados 1000,27 g de caroço de açaí que foram previamente mergulhadas na solução ativante de NaOH por 24 horas, e também 1000,40 g de caroço in natura, ambas amostras foram secas em estufa a 105 ºC por 24 horas (item A, Figura 1). Para carbonização do CA, a amostra de caroços de açaí foi calcinada em um forno modelo Linn Elektro Therm.

O forno possui uma taxa de aquecimento de 10°C/min e patamar de queima de 2 horas para cada temperatura, com resfriamento natural no forno, conforme as temperaturas de 350 e 400°C, que foram definidas, de acordo com os resultados obtidos previamente.

Figura 1
Fluxograma de etapas desenvolvidas para a produção de carvão ativado em laboratório e em propriedade rural

Depois da secagem, as amostras de caroço de açaí foram introduzidas em uma mufla de temperatura controlada e carbonizadas a uma temperatura de aproximadamente 400 ºC por 2 horas, na ausência de oxigênio para evitar a queima total do CA (item B1, Figura 1).

Após o processo de carbonização (pirólise), o material foi pesado. Em ambas amostras houve uma considerável perda de massa. O CA pesou 121,07 g, já o material que não sofreu ativação química pesou 61,45 g. Depois de triturado, o carvão ativado foi acondicionado em um recipiente cilíndrico, do tipo “vela de filtro” para posterior uso nos testes de filtragem da água.

2.3 Produção do carvão ativado na propriedade rural – campo

Diferentemente do que foi realizado em laboratório, no campo, as sementes quimicamente alteradas com o ativante NaOH secaram de forma natural, ao sol, e após foram introduzidas em um equipamento construído de forma rústica assemelhando- se a um torrador de café.

O teste no campo foi realizado com as seguintes condições: secagem ao sol, queima utilizando galhos e troncos secos, podendo assim ser comparado com o material feito em laboratório, sendo feito com um tambor de 200 litros, com um tubo galvanizado em seu eixo, e acrescentado duas chapas em seu interior com função de misturador. Em seguida, houve carbonização.

O equipamento era movimentado em torno do próprio eixo, causando uma carbonização uniforme do material. Esse processo durou cerca de 1h30min, até que o processo de pirólise fosse concluído. O carvão ativado foi retirado do tambor, resfriado e levado ao laboratório para realizar os testes (itens B2 e C, Figura 1).

2.4 Teste de filtro de areia com carvão ativado de açaí

Depois de triturado, o carvão ativado foi acondicionado em uma vela de garrafa pet de 2 litros para posterior uso nos testes da qualidade da água (itens D e E, Figura 1). O filtro foi fabricado com o intuito de produzir um material de baixo custo, o reaproveito da garrafa pet. O processo de fabricação utilizou duas garrafas pets que foram coladas com cola instantânea. As camadas utilizadas são mostradas na Tabela 1.

Tabela 1
Camadas do filtro de areia e carvão ativado de caroço de açaí com a especificação da espessura, faixa de granulometria e peso

Material	Espessura	Faixa granulométrica	Peso
Areia	3cm	5-20mm	481,66g
Areia	3 cm	0,5-5 mm	484,32 g
Areia	3 cm	0,075-0,5 mm	458,47 g
carvão ativado	5 cm	5-20 mm	104,55 g
carvão ativado	5 cm	0,5-5 mm	92,62 g

• Fonte: Autores (2021). Em que: Especificação de camadas de filtro utilizadas, bem como material, espessura, faixa de granulometria e peso.

2.5 Caracterização das matérias-primas

Foram pesadas 4 amostras de carvão com granulometria 2-5 mm separados em provetas de 1000 ml para cada amostra, conforme mostra a Tabela 2.

Tabela 2
Amostras e caracterização do carvão ativado de caroços de açaí, local e temperatura de análise

Amostra	Material	Local	Temperatura
CAL-01	carvão ativado	laboratório	350ºC
CAC-02	carvão ativado	campo	desconhecida
CAL-03	carvão ativado	laboratório	400ºC
CA-CO	carvão ativado	comercial	-

• Fonte: Autores (2021). Em que: CAL-01: Carvão ativado em laboratório, amostra 01; CAC-02: Carvão ativado em campo, amostra 02; CAL-03: Carvão ativado em laboratório, amostra 03; CA-CO: Carvão ativado comercial, amostra 04; Para as 04 amostras, demonstra-se as condições de análise realizadas, material utilizado, local e temperatura referida.

Posteriormente foram coletadas amostras e enviadas ao Instituto Federal de Alagoas (IFAl – Campus Maceió) para realização da microscopia eletrônica de varredura (MEV), de acordo com a metodologia de Castro (2002).

2.6 Coleta e origem da água

Para o teste da eficiência dos filtros, foram coletadas amostras de pontos distintos e isolados, em uma comunidade na zona rural de Rio Branco, onde foram feitos testes de: coliformes, dureza, turbidez, pH, alcalinidade e condutividade, com o objetivo de detectar alguma alteração após a passagem deste fluido pelo filtro, constatando, assim, sua eficiência ou não. Após os procedimentos de coleta, as garrafas contendo as amostras foram acondicionadas em caixas de isopor e lacradas com fita e foram transportadas imediatamente ao laboratório de análises da Unidade de Tratamento de Alimentos – UTAL localizada na UFAC, os testes foram realizados de acordo com o Manual de Análise de Água da Fundação Nacional da Saúde – FUNASA.

3 RESULTADOS

3.1 Análises de densidade e MEV

As análises realizadas para peso saturado, peso seco em estufa e de massa específica das amostras CAL-01, CAC-02 e CAL-03 estão apresentadas na tabela 3. Esses resultados mostraram que as amostras de CA ativado de caroços de açaí tiveram maior peso saturado quando comparado ao CA comercial (CA-CO). Por outro lado, o peso seco em estufa das amostras testadas foi menor em relação ao CA-CO, enquanto a massa específica foi semelhante entre as amostras de CA de caroços de açaí e CA-CO.

Tabela 3
Densidade das amostras de carvão ativado de caroços de açaí

Amostra	Peso saturado (g)	Peso Seco em estufa (g)	Massa Específica (g/ml)
CAL-01	203,00	66,67	0,67
CAC-02	244,59	84,00	0,84
CAL-03	276,53	62,41	0,62
CA-CO	163,51	92,85	0,92

• Fonte: Autores (2021). Em que: Para as 04 amostras, obteve-se o peso saturado, em contraparte ao peso seco em estufa, que permitiu determinar a massa específica.

Os resultados obtidos da microscopia (MEV) estão presentes nas Figuras 2, 3 e 4. A partir das imagens percebe-se que o carvão foi realmente ativado com a presença de mesoporos, microporos primários e microporos secundários presentes na superfície identificada. Esses resultados foram observados principalmente para as amostras CAL-01 (Figura 2) e CAC-02 (Figura 3). Já a amostra CAL-03 possui aspecto foliado devido a superfície ser constituída predominantemente por macroporos.

Figura 2
Microscopia eletrônica de varredura aplicada para o filtro 1 – CA de caroço de açaí a 350ºC, amostra CAL-01

Figura 3
Microscopia eletrônica de varredura aplicada para o filtro 2 – CA de caroço de açaí em campo, amostra CAC-02

Figura 4
Microscopia eletrônica de varredura aplicada para o filtro 3 – CA de caroço de açaí em laboratório a 400 ºC, amostra CAL-03

3.2 Análises físico-químicas e microbiológicas das amostras

Foram feitos testes, após a passagem da água, dos protótipos de 3 filtros, como demonstrado na Tabela 4. Observou-se que o pH da água filtrada das amostras CAL-01, CAC-02 e CAL-03 aumentou em relação a água não filtrada, bem como ocorreu relação similar para a turbidez. Na dureza, as amostras CAL-01, CAC-02 e CAL-03 tiveram valor nulo em relação à amostra sem filtração. A alcalinidade e condutividade das amostras CAL-01, CAC-02 e CAL-03 elevaram-se bastante em relação à amostra sem filtração.

Tabela 4
Análise físico-química e microbiológica da água sem filtração e com filtração (uso de filtros feitos a partir de carvão ativado de caroço de açaí)

Parâmetros	Amostra sem filtração	CAL-01	CAC-02	CAL-03
Análise Fisico-química
pH	6,33	8	8,67	8
Turbidez	4,94	7,15	6,03	3,02
Dureza	32	0	0	0
Alcalinidade	38,7	101,661	95,8518	103,5974
Condutividade	167,8	282	240	273
Análise Microbiológica
Coliformes totais	presença	presença	presença	presença
Coliformes fecais	presença	0	0	0

• Fonte: Autores (2021)

3.3 Análise de custo de fabricação

A determinação do custo unitário de fabricação do filtro, modelado em garrafa PET, com camadas de CA de açaí com resíduo do caroço, areia, feltro, algodão e estrutura com cola, é demonstrado na Tabela 5.

Tabela 5
Composição do custo de fabricação do filtro de CA com resíduo de caroço de açaí

ITEM	DESCRIÇÃO	UNIDADE	COEFICIENTE	V. UNITÁRIO	V. TOTAL
1	FILTRO COM CARVÃO ATIVADO DE CAROÇO DE AÇAÍ, COM GARRAFA PET E CAMADAS DE AREIA E FELTRO	UND	1,00		40,20
1.1	Resíduo de caroço de açaí	Kg	0,00314	0,00	0,00
1.2	Areia	M³	0,002826	68	0,19
1.3	Garrafa pet	Und	2,00	2,26	4,52
1.4	Algodão	Kg	0,000942	47,80	0,05
1.5	Feltro	M	0,00785	26,99	0,21
1.6	Cola	Kg	0,0157	339,80	5,33
1.7	Reagente soda cáustica	Kg	1,00	29,90	29.90

• Fonte: Autores (2021)

A pesquisa exposta acima se deu com base no mercado local. Alguns custos, como a verificação do valor da garrafa PET pode ser relativizado a partir da utilização de garrafas reutilizadas. Em relação ao filtro, os quantitativos são obtidos a partir de um filtro com 30 cm de altura, diâmetro de 10 cm, camadas de CA com 2 camadas de 5 cm, areia com 3 camadas de 3 cm, algodão em 1 camada com 3 cm na ponta, feltro com camadas intercaladas entre as demais e cola para acabamento estruturante.

4 DISCUSSÃO

4.1 Análises de MEV

A partir das imagens obtidas observou-se que o carvão foi realmente ativado com a presença de mesoporos, microporos primários e microporos secundários. É por meio desses poros que o carvão ativado realiza o processo de adsorção, tais poros tão pequenos não se formam somente com um processo de pirólise sem a presença de algum componente químico ativante, neste caso o hidróxido de sódio (NaOH). Similar ao encontrado por Barbosa, Rebelo, Martorano e Giacon (2019), que expõem em suas análises, a presença de microporos, em superfície irregular, característico das partículas resultantes do caroço de açaí. Depreende-se, portanto, a eficiência do processo.

Conforme os resultados, pode-se observar que com a ativação ocorreu um aumento significativo do diâmetro dos poros e o surgimento de novos poros, o que é adequado para o processo de adsorção. Essa característica é paralelamente encontrada por Heylmann, Lopes, Afonso, Demarco, Cadaval Júnior, Quadro e Andreazza (2021) ao executar o CA baseado no caroço do pêssego. Assim, nota-se que tanto para o processo, como para a característica adsortiva, foram encontrados resultados coerentes, uma vez que se tratam de materiais distintos, com tratamentos similares.

4.2 Análises físico-químicas e microbiológicas das amostras

O valor de pH é também um resultado importante para a composição dos chamados índices de qualidade de águas (IQA). A Portaria n.º 2.914, de 12 de dezembro de 2011 do Ministério da Saúde recomenda que o pH da água seja mantido na faixa de 6,0 a 9,5. Percebe-se que a água da amostra sem filtragem apresentou adequado pH com valor de 6,33. Vale lembrar que a mesma portaria diz que água sem o processo de filtração é desaconselhável, uma vez que podem existir inúmeros contaminantes, podendo tornar o consumo dessa água um tanto quanto inviável.

A água da amostra filtrada 1 (CAL-01), em filtro com carvão ativado a 350ºC, exibiu valor de pH 8,00, que chama a atenção, pois elevou o pH tornando-a mais alcalina e se aproximando do seu valor máximo que é de 9 dentro dos valores limites exigidos pela legislação. Em sequência, o filtro com carvão ativado produzido em campo, amostra filtrada 2 (CAC-02), apresentou o melhor desempenho, uma vez que elevou o pH para 8,67, que se encontra dentro da faixa estabelecida. Já a amostra filtrada 3 (CAL-03), que passou pelo filtro com carvão ativado a 400ºC, assim como a amostra filtrada 1 apresentou um pH = 8 mostrando que, neste quesito, todos os valores estão dentro dos padrões estabelecidos.

Dos dados obtidos, percebe-se que nas amostras filtradas 1 e 2 ocorreu um aumento na turbidez com valores de 7,15 e 6,03 respectivamente, ou seja, estão fora dos padrões estabelecidos por norma, que é de no máximo 5,0 UT. Por ser um elemento poroso e frágil, supõe-se que essa elevação na turbidez seja devido às partículas do próprio carvão, comprometendo, assim, o resultado da amostra. Já a amostra filtrada 3 teve o resultado positivo, pois o valor que anteriormente era de 4,94 UT diminuiu para 3,02 UT, comprovando uma maior resistência do carvão produzido, liberando menos partículas na água.

A dureza da água é a propriedade relacionada com a concentração de íons de determinados minerais dissolvidos nesta substância. Esse fenômeno se deve à presença de determinados cátions na água, principalmente os cátions de cálcio e magnésio. Os dados de dureza da água são expressos como mg/L em CaCO3. (SOUSA, 2019).

A Portaria n.º 2.914, de 12 de dezembro de 2011, limita a dureza em 500 mg/L CaCO3 como padrão de potabilidade. Diante disso, houve uma redução de 100% na dureza para todas as amostras filtradas, que diminuiu de 32 para 0, sendo a amostra que apresentou dureza 32, a amostra que não foi filtrada. Apresentaram, assim, a classificação do tipo “mole”, em conformidade com o padrão de potabilidade exigido pela Lei.

Segundo o padrão de potabilidade estabelecido pela legislação da Portaria n.º 2.914, de 12 de dezembro de 2011 do Ministério da Saúde, não há valor mínimo ou máximo permitido para a alcalinidade da água, pois não representa risco potencial à saúde pública. Entretanto, a alcalinidade constitui-se em um parâmetro importante no controle de determinados processos unitários utilizados em estações de tratamento de águas para abastecimento (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2004). A partir da comparação das amostras, notou-se que todas apresentaram um aumento na alcalinidade: 1.ª – de 38,7 mg/L, para 101,66 mg/L; 2.ª – para 95,8518 mg/L e 3.ª – para 103,5974 mg/L.

A partir da medida de condutividade elétrica podemos estimar a salinidade da água, definida como a quantidade total de sais dissolvidos na água. Os sais se dissolvem dando origem a íons de carga oposta e, portanto, contribuem para a condutividade elétrica da solução. Sabe-se que a condutividade está diretamente relacionada com o pH da água (SOUSA, 2019).

A diferença de condutividade elétrica e de salinidade é pronunciada entre água doce e água salgada, podendo sê-la mesmo entre dois corpos de água doce de uma região, mas que possuam nascentes diferentes e com fluxos de água de natureza diferente. Portanto, não há um padrão para o que seriam valores de condutividade e salinidade para uma água saudável ou mesmo para um determinado tipo de água, em especial para fontes de água doce, que têm uma forte dependência com a geologia do local (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2011). Ao invés disso, de maneira geral foram estabelecidos valores padrão para a quantidade de sólidos dissolvidos totais para determinar se a água é saudável ou não. Mesmo com essa falta de padrões, alguns valores base podem ser estabelecidos para a condutividade elétrica de acordo com a sua natureza. Percebeu-se um aumento na condutividade das 3 amostras, entretanto tais valores ainda continuam dentro dos padrões aceitáveis de potabilidade

A análise microbiológica revelou que após a filtragem houve presença de coliformes totais em todas as amostras e ausência de coliformes fecais. Entretanto, a Portaria 2914/2011 do Ministério da Saúde, em seu artigo 34, diz que o processo de cloração é obrigatório em toda a extensão do sistema de distribuição. Esse processo citado pela portaria proporciona a eliminação dos coliformes restantes na água, tornando-a própria para consumo humano. Ainda, o processo de clarificação é o principal responsável pela remoção dos coliformes totais e Escherichia coli da água bruta, com remoções superiores a 99% (LACERDA; RADER; LOPES, 2018). Sendo, portanto, indicado como tratamento complementar ao aqui proposto.

4.3 Análise de custo para fabricação

Na intercorrência da fabricação do filtro, existe a necessidade do baixo custo, como parâmetro viabilizador de utilização por parte da população ribeirinha. O baixo custo obtido, estimado em torno de R$ 40,20 por unidade, por utilizar majoritariamente materiais de descarte e de baixo custo, reflete-se e assemelha-se ao obtido pela utilização com outros métodos de tratamento de água propostos para populações ribeirinhas (SILVA; SOUSA; MEDEIROS; RIZZATTI, 2018).

5 CONCLUSÕES

A produção de carvão ativado a partir do caroço de açaí alcançou o desempenho esperado quando gerado o filtro montado com areia, carvão e garrafa pet de baixo custo, dessa forma confirma-se a hipótese anteriormente formulada. Percebeu-se que elevou de fato as propriedades da água, com sua capacidade de adsorção, causando o aumento do pH, da alcalinidade, da condutividade e ausência de coliformes fecais, fatores positivos para o tratamento de água potável para consumo humano. Entretanto, ocorreu um aumento na turbidez em duas das amostras (CAL-01 e CAC-02), e a presença de coliformes totais se manteve, após a filtragem. Ressalta-se que os testes foram feitos utilizando apenas o carvão ativado produzido e areia, sem utilização de nenhum outro processo de filtragem.

Em uma perspectiva futura, adaptações com melhorias da aplicação do método, como a simplificação ou redução das camadas, com aumento na propriedade adsortiva do carvão, pode potencializar a ação de filtração de agentes microbiológicos. Dessa maneira, o filtro de carvão ativado ajudará a população local, sobretudo a população ribeirinha e comunidades isoladas no tratamento de água.

AGRADECIMENTOS

À UFAC, por ceder os laboratórios do campus Rio Branco, para realização de ensaios e análises inerentes à pesquisa; bem como a Marcelo Ramon da Silva Nunes do Instituto Federal do Acre-UFAC por fazer as imagens do MEV e enriquecer ainda mais este trabalho.

Como citar este artigo

• Silva, M. S.; Viana, T. H. C.; Gouveia, C. L.; Peters, L. P. Produção e aplicação de filtro de baixo custo com carvão ativado a partir do resíduo de caroço de açaí nativo. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 33, n. 2, e71315, p. 1-18, 2023. DOI 10.5902/1980509871315. https://doi.org/10.5902/1980509871315.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  07 Ago 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  11 Ago 2022
• Revisado
  23 Fev 2023
• Aceito
  28 Jun 2023