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Avaliação da qualidade de vida, da dor nas costas, da funcionalidade e de alterações da coluna vertebral de estudantes de fisioterapia

Assessment of quality of life, back pain, functionality and changes of the spine of physical therapy students

Resumos

O objetivo deste estudo foi avaliar a qualidade de vida, dor nas costas, funcionalidade e as alterações da coluna vertebral de estudantes de fisioterapia. Participaram 42 universitários, sendo avaliada a coluna vertebral por meio do arcômetro, a dor nas costas por meio de um questionário multidimensional de dor, a qualidade de vida por meio do questionário SF-36 e funcionalidade a partir do Roland-Morris. Foi realizada estatística descritiva e teste qui-quadrado (α=0,05). Os resultados demonstraram: prevalência de alterações nas curvaturas da coluna vertebral de 38,1%; (n=16); alta prevalência de dor nas costas (69%; n=29); baixa prevalência de comprometimento da funcionalidade (3,4%; n=1); que não há associação entre as alterações nas curvaturas da coluna vertebral e funcionalidade e dor nas costas; e que os escores dos domínios do SF-36 foram maiores que 45, exceto o domínio "dor", cujo escore aproximado foi de 35. Conclui-se que quanto menor os níveis de intensidade da dor melhor o nível de qualidade de vida.

Coluna vertebral; Dor; Qualidade de vida


The objective was to evaluate the quality of life, back pain, function and the changes of the spine of physical therapy students. 42 students participated in this study. We assessed the spine through the arcometer, back pain using a multidimensional pain questionnaire, quality of life using the SF-36 and feature from the Roland-Morris. Descriptive statistics and chi-square test (α = 0.05) was performed. The results demonstrated a prevalence of changes in curvatures of the spine 38,1% (n =16), high prevalence of back pain (69%, n = 29), low prevalence of impaired functionality (3.4%, n = 1), there is no association between changes in the curvatures of the spine and back pain and functionality, and SF-36 domain scores were higher than 45, except in "pain" area (score = 35). Conclusion: the lower the levels of pain intensity level, best the quality of life.

Spine; Pain; Quality of life


ARTIGO ORIGINAL

Avaliação da qualidade de vida, da dor nas costas, da funcionalidade e de alterações da coluna vertebral de estudantes de fisioterapia

Assessment of quality of life, back pain, functionality and changes of the spine of physical therapy students

Caroline de Andrade BacchiI; Cláudia Tarragô CandottiII; Matias NollIII; Carlos Eduardo dos Santos MinossiI

IUniversidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil

IICurso de Fisioterapia e Educação Física e do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Movimento Humano da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil

IIIEscola Superior de Educação Física, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil

Endereço Endereço: Cláudia Tarragô Candotti UFRGS - Escola de Educação Física (Sala 218) Rua Felizardo 750 Bairro: Jardim Botânico Porto Alegre RS Brasil 90690-200 Telefone: (51) 3308.5861 e-mail: claudia.candotti@ufrgs.br

RESUMO

O objetivo deste estudo foi avaliar a qualidade de vida, dor nas costas, funcionalidade e as alterações da coluna vertebral de estudantes de fisioterapia. Participaram 42 universitários, sendo avaliada a coluna vertebral por meio do arcômetro, a dor nas costas por meio de um questionário multidimensional de dor, a qualidade de vida por meio do questionário SF-36 e funcionalidade a partir do Roland-Morris. Foi realizada estatística descritiva e teste qui-quadrado (α=0,05). Os resultados demonstraram: prevalência de alterações nas curvaturas da coluna vertebral de 38,1%; (n=16); alta prevalência de dor nas costas (69%; n=29); baixa prevalência de comprometimento da funcionalidade (3,4%; n=1); que não há associação entre as alterações nas curvaturas da coluna vertebral e funcionalidade e dor nas costas; e que os escores dos domínios do SF-36 foram maiores que 45, exceto o domínio "dor", cujo escore aproximado foi de 35. Conclui-se que quanto menor os níveis de intensidade da dor melhor o nível de qualidade de vida.

Palavras-chave: Coluna vertebral. Dor. Qualidade de vida.

ABSTRACT

The objective was to evaluate the quality of life, back pain, function and the changes of the spine of physical therapy students. 42 students participated in this study. We assessed the spine through the arcometer, back pain using a multidimensional pain questionnaire, quality of life using the SF-36 and feature from the Roland-Morris. Descriptive statistics and chi-square test (α = 0.05) was performed. The results demonstrated a prevalence of changes in curvatures of the spine 38,1% (n =16), high prevalence of back pain (69%, n = 29), low prevalence of impaired functionality (3.4%, n = 1), there is no association between changes in the curvatures of the spine and back pain and functionality, and SF-36 domain scores were higher than 45, except in "pain" area (score = 35). Conclusion: the lower the levels of pain intensity level, best the quality of life.

Keywords: Spine. Pain. Quality of life.

Introdução

Atualmente observa-se um incremento do número de pessoas que sofrem com problemas na coluna vertebral, como a ocorrência de dor e de alterações posturais (KENDALL et al., 2007). Tem sido relatado que estes problemas estão associados com baixa auto-estima, redução da qualidade de vida, limitação funcional (HINMAN, 2004, DIEEN et al., 2003) e, principalmente, relacionados a fatores estressores e externos na vida diária dos indivíduos, especialmente aqueles cujas atividades cotidianas exigem um longo período em posição sentada (CARNEIRO et al., 2005; CANDOTTI, NOLL e CRUZ, 2010).

Para realizar a avaliação das alterações posturais da coluna vertebral tradicionalmente são utilizados métodos de avaliação indiretos e diretos (D'OSUALDO et al., 1997). O método indireto mais utilizado entre os fisioterapeutas é a avaliação postural, que corresponde a uma análise visual qualitativa, dependente da experiência palpatória do avaliador e que não permite a quantificação em graus das alterações da coluna vertebral (TRIBASTONE, 2000; FALCÃO et al., 2007), tornando-se, então, um método de avaliação subjetivo e limitado. Portanto, muitas vezes há necessidade da utilização de métodos de avaliação diretos que permitam análises quantitativas e objetivas, seja por técnicas invasivas ou não-invasivas.

O método padrão-ouro utilizado para a avaliação das curvaturas fisiológicas da coluna vertebral e de patologias da coluna é o raio-X. No entanto, muitos autores enfatizam as desvantagens desse método: exposição do paciente à radiação ionizante, má qualidade da imagem que pode dificultar a análise do exame e ausência do equipamento no ambiente clínico dos fisioterapeutas para acompanhamento evolutivo dos pacientes (BARAÚNA et al., 2005; DOODY et al., 2000). Assim, uma alternativa considerada eficaz na avaliação das curvaturas da coluna é a utilização das chamadas técnicas não-invasivas, as quais, a partir de instrumentalização de baixa complexidade permitem avaliar de forma quantitativa as curvaturas da coluna vertebral (LEROUX, 2001; BARAÚNA et al., 2005; CASTRO e LOPES, 2003). Dentre os diversos instrumentos referidos na literatura, destacam-se o arcômetro (D'OSUALDO et al., 1997; CHAISE et al., 2011) e o flexicurva (HINMANN, 2004), por serem considerados de fácil manuseio, baixo custo e por permitirem a mensuração quantitativa em graus das curvaturas da coluna vertebral.

Empiricamente, é aceito que as dores referidas na região das costas podem ter ligação com possíveis alterações das curvaturas fisiológicas da coluna vertebral, muitas vezes provenientes de maus hábitos posturais nas atividades da vida diária, como por exemplo, a permanência por longo período em uma posição incorreta, fatores ambientais inadequados, sejam familiares, profissionais ou de estudo, nível de atividade física, estilo de vida sedentário, utilização de sapatos com saltos altos ou ainda possíveis patologias ortopédicas (KNOPLICH, 2003; CAILLIET, 2001; CANDOTTI, NOLL e CRUZ, 2010).

Considerando a existência de dor nas costas como um fator limitante da aptidão física, emocional e cognitiva de um indivíduo, e em especial de estudantes universitários, capaz de limitar e/ou modificar aspectos da qualidade de vida e da capacidade funcional, entende-se que é de fundamental importância a realização de avaliação postural para investigar a presença de alterações na coluna vertebral assim como identificar o quanto a dor nas costas dos estudantes está relacionada com estas alterações. Ainda, a investigação da capacidade funcional e da percepção da qualidade de vida (TSUKIMOTO et al., 2006; OCARINO et al., 2009) dos estudantes poderão fornecer uma ampla possibilidade de compreensão dos problemas na coluna vertebral desta população. Deste modo, justifica-se o presente estudo, o qual teve como objetivo avaliar a qualidade de vida, a dor nas costas, a funcionalidade e as alterações da coluna vertebral de estudantes de fisioterapia.

Método

Tipo de Estudo

O delineamento desta pesquisa é do tipo Estudo de Caso Institucional (GAYA, 2008), sendo utilizadas como estratégias para apresentação dos resultados abordagens descritivas e inferenciais das variáveis do estudo.

Amostra

A amostra foi constituída por 42 estudantes voluntários matriculados no curso de Bacharelado em Fisioterapia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul no ano de 2010. Os critérios de exclusão foram: 1) impossibilidade do indivíduo de permanecer na postura ortostática, 2) existência de qualquer intervenção cirúrgica prévia na coluna vertebral e 3) gravidez.

Para caracterizar a amostra foram mensuradas a massa corporal, a estatura e os perímetros da cintura e do quadril, utilizando uma balança digital (Filizola), um estadiômetro (Filizola) e uma fita métrica (Sanny), respectivamente. Foram também calculados o Índice de Massa Corporal (IMC) e a Relação Cintura Quadril (RCQ), obtida pelo quociente entre o perímetro da cintura (cm) e o perímetro do quadril (cm). Este estudo foi aprovado no Comitê de Ética e Pesquisa da UFRGS, sob número 19191.

Para este estudo foi utilizado o instrumento arcômetro e questionários para avaliação da dor nas costas, da qualidade de vida e da funcionalidade.

Instrumento avaliativo da coluna vertebral: Arcômetro

O arcômetro (D'OSUALDO et al., 1997; DIAS et al., 2008; CHAISE et al., 2011) é um instrumento constituído por: (1) uma haste principal de 50 cm de comprimento, 1 cm de largura e 1 cm de espessura; (2) duas hastes menores, perpendiculares a principal, com comprimento de 40 cm, largura e espessura de 0,5 cm de cada; (3) uma haste central, também perpendicular a principal, com comprimento de 40 cm, largura e espessura de 0,5 cm cada; (4) três conexões primárias, que permitem a movimentação das duas hastes menores e da haste central na vertical; e uma conexão secundária, permitindo a movimentação destas hastes também na horizontal (Figura 1). Cada conexão primária é constituída por duas peças, sendo uma no formato de "U" e uma peça reta para fixação da haste central. As conexões secundárias são constituídas somente de uma peça em formato de "U". Nas hastes foram acopladas escalas métricas, permitindo mensurações lineares nas direções vertical e horizontal. Na haste principal, em uma das faces de 0,25 cm foi fixada e centralizada uma escala em milímetros, de 0 a 80 cm, partindo do ponto de fixação inicial da primeira haste fixada. Na haste central, também foi fixada e centralizada uma escala milimétrica, de 0 a 50 cm (Figura 1).


Instrumento avaliativo da dor nas costas

Para avaliação da dor nas costas foi utilizado um questionário de dor proposto por Candotti e Guimarães (1998), cujo objetivo foi coletar informações sobre a existência e intensidade da dor. Para análise da existência de dor foram consideradas duas categorias: com dor e sem dor. Para a análise da intensidade da dor, a escala de 0 a 10 do questionário foi dividida em 4 categorias, segundo a seguinte classificação: de 1 à 3, dor fraca; de 4 à 6, dor moderada; de 7 à 9, dor forte; e 10, dor muito forte (CIENA et al., 2008).

Instrumento avaliativo da qualidade de vida

Para avaliação da qualidade de vida foi utilizado o questionário SF-36. Este questionário foi traduzido e validado para a língua portuguesa por Ciconelli et al em 1997, sendo constituído por 36 itens divididos em 8 domínios: capacidade funcional, aspectos físicos, dor, estado geral de saúde, vitalidade, aspectos sociais, aspectos emocionais e saúde mental. Este questionário apresenta um escore final de 0 a 100, no qual o 0 corresponde ao pior estado geral de saúde e 100 ao melhor estado de saúde (CICONELLI et al., 1997). Cada dimensão do questionário é avaliada em separado, visto que não existe um único valor que possa sintetizar a avaliação da qualidade de vida (TSUKIMOTO et al., 2006).

Instrumento avaliativo da funcionalidade

O questionário Roland-Morris foi utilizado para avaliar o desempenho funcional e foi preenchido apenas pelos estudantes que referiram dor nas costas (VIGATTO et al., 2007). A validação deste instrumento para a língua portuguesa foi realizada por Nusbaum et al (2001). O escore do questionário Roland-Morris é de zero à 24 pontos, e o ponto de corte corresponde ao escore igual ou superior à 14, caracterizando a presença de incapacidade significante decorrente da dor na região do tronco (coluna torácica e lombar) (TSUKIMOTO et al., 2006, OCARINO et al., 2009). Portanto, para análise da variável funcionalidade foram consideradas duas categorias: com limitação e sem limitação.

Procedimentos

Os procedimentos para avaliar a presença de alterações nas curvaturas da coluna vertebral no plano sagital, a dor nas costas e a qualidade de vida nos estudantes de fisioterapia foram realizados nessa ordem sequencial, no mesmo dia e local, pela mesma equipe avaliadora. Primeiramente, os estudantes foram convidados a participar do estudo, sendo realizada uma breve explicação sobre o mesmo e apresentado do TCLE. Logo após os estudantes responderam o questionário sobre a qualidade de vida e da dor nas costas. Os estudantes que referiram sentir dor nas costas preencheram também o questionário sobre funcionalidade.

Após o preenchimento dos questionários foram avaliadas as curvaturas da coluna vertebral dos estudantes. Os estudantes foram posicionados em postura ortostática, braços relaxados ao longo do corpo, pés paralelos sem calçados e com o dorso despido. O avaliador, através do método palpatório, identificou e demarcou os processos espinhosos das vértebras torácicas (T1, T12) e lombares (L1 e L5) do estudante (Figura 2a). Para mensurar as curvaturas torácica e lombar com o arcômetro, o avaliador posicionou as hastes do instrumento sobre os processos espinhosos demarcados. Nesta etapa obteve-se as medidas de FA e FB (Figura 1). Logo após, o avaliador identificou o ápice da curvatura através da haste central que corresponde à medida de f. Em seguida, realizou a leitura na escala do instrumento das medidas de h1 e h2 que correspondem à distância entre a vértebra limite superior e o ponto do ápice da curvatura, e entre, o ápice da curvatura e a vértebra limite inferior, respectivamente. A verticalidade do arcômetro durante a coleta foi garantida pelo marcador de nível acoplado na haste superior. Esse procedimento foi repetido tanto para a obtenção dos dados da curvatura torácica (Figura 2b) quanto para a curvatura lombar (Figura 2c).


Os dados provenientes do arcômetro, ou seja, valores de h1, h2, f, FA e FB (Figura 1) da curvatura torácica e lombar dos indivíduos foram inseridos nas equações 1 à 5, de modo que a partir de três relações trigonométricas foram calculados os graus das curvaturas torácica e lombar (CHAISE et al., 2011).

onde,

φ1= ângulo, em graus, correspondente ao primeiro arco gerado a partir dos valores de f1 e h1;

φ2= ângulo, em graus, correspondente ao segundo arco gerado a partir dos valores de f2 e h2;

AA = ângulo do arcômetro em graus.

Para classificação da coluna torácica foram utilizados os parâmetros propostos por Bernhartd e Bridwell (1989), onde a postura é considerada normal quando os valores angulares da curvatura torácica variam entre 20° e 60°. Quando o valor da curvatura apresentou-se maior que 60° foi classificada como hipercifose torácica e quando o valor da curvatura foi menor que 20° foi classificada como retificação torácica. Para a classificação da coluna lombar os parâmetros de referência normais variam entre 22° e 54° (PROPST-PROCTOR e BLECK, 1983). Foi classificada como hiperlordose lombar quando o valor da curvatura foi maior que 54°, e quando o valor da curvatura foi menor 22° foi classificada como retificação lombar. Ainda, para análise das alterações da coluna vertebral, realizou-se uma classificação geral das curvaturas da coluna vertebral: com alteração na coluna vertebral (presença de alteração postural na torácica, lombar ou ambas), sem alteração da coluna vertebral (ausência de alteração postural na coluna vertebral na região torácica e lombar).

Tratamento Estatístico

Para o tratamento estatístico, através de procedimentos de estatística descritiva e inferencial, foi realizado no Software SPSS 18.0. As variáveis categóricas (1) alteração das curvaturas da coluna vertebral (com e sem alteração); (2) dor (com e sem dor) e (3) funcionalidade (com limitação e sem limitação) foram descritas utilizando-se tabelas de freqüência. A variável contínua qualidade de vida foi descrita por meio de média e desvio padrão.

Para verificar a associação entre alterações da coluna vertebral e dor, e alterações da coluna vertebral e funcionalidade utilizou-se o teste qui-quadrado. O nível de significância adotado para este estudo foi de 0,05.

Resultados

Participaram deste estudo 42 estudantes, sendo 8 (19%) estudantes do sexo masculino e 34 (81%) do sexo feminino. A Tabela 1 apresenta a caracterização da amostra segundo os valores médios de idade, massa corporal, estatura, IMC e RCQ.

A Tabela 2 apresenta a prevalência de dor nas costas, de alterações da coluna vertebral como um todo e de funcionalidade.

Os resultados referentes à intensidade da dor nas costas demonstraram que 44,8% (n=13) referiram sentir dor fraca, 37,9% (n=11) dor moderada, 13,8% (n=4) dor forte, 3,4% (n=1) dor muito forte.

Os resultados do teste de associação demonstraram que a dor nas costas não está associada significativamente (p=0,618) com as alterações nas curvaturas da coluna vertebral. Do mesmo modo, verificou-se que a funcionalidade não está associada significativamente (p=0,389) com as alterações nas curvaturas da coluna vertebral.

Os resultados referentes à avaliação das curvaturas da coluna vertebral, separadamente para a região torácica e região lombar, mensuradas com o arcômetro, estão apresentadas na Tabela 3.

Os resultados referentes à avaliação qualidade de vida estão descritos na Tabela 4

Discussão

Os resultados encontrados no presente estudo demonstraram uma prevalência de alterações na coluna vertebral de 38,1% e prevalência de dor nas costas de 69%, sendo que destes estudantes com dor nas costas, apenas 3,4% apresentaram limitação funcional. Martelli e Traebert (2006) avaliaram escolares por meio do posturógrafo e fio de prumo e encontraram uma prevalência de alterações posturais de 28,2%, porém estes autores também avaliaram as alterações laterais, no plano frontal, além da avaliação no plano sagital. As duas alterações mais prevalentes foram a hiperlordose lombar (20,3%) e hipercifose torácica (11%). Estes resultados estão próximos aos resultados do presente estudo, em que a prevalência da hiperlordose lombar foi de 23,8% e de hipecifose torácica foi de 14,3%.

Destsch et al. (2007) avaliaram as alterações laterais e ântero-posteriores de jovens do sexo feminino utilizando um posturógrafo e encontraram alta prevalência de alterações posturais. Os resultados do presente estudo demostraram uma prevalência de alterações da coluna vertebral de 38,1%, sendo assim, um resultado que traz preocupação, pois a maioria também apresenta histórico de dor nas costas e isso poderia estar alterando a funcionalidade da coluna vertebral e a qualidade de vida dos universitários.

Karahan e Bayraktar (2004) avaliaram a postura corporal nas atividades diárias relacionadas ao trabalho e a existência de dor lombar de 56 enfermeiras, na Turquia. Os resultados mostraram que 87,5% das enfermeiras sofrem de dor lombar e que a maioria delas não utiliza o corpo na sua mecânica correta nas posturas laborais. Recentemente Najenson et al. (2010) demonstraram que 45,4% dos motoristas de ônibus avaliados (média de idade de 45 anos) apresentaram dor lombar no último ano, sendo que este resultado está de acordo com o presente estudo que apresentou dor nas costas em 69% dos estudantes. Siqueira et al. (2008) realizou um estudo para verificar a ocorrência de lombalgia em fisioterapeutas e os resultados mostraram alto índice de alterações musculoesqueléticas na coluna lombar, uma vez que 78,56% dos fisioterapeutas relataram a presença de dor na região da coluna vertebral. Dezan et al. (2004), utilizando fotogrametria, realizaram um estudo com objetivo de analisar as curvaturas da coluna vertebral e a ocorrência de lombalgia em atletas, do sexo masculino e com idade média de 23,7 anos. Seus resultados mostraram uma prevalência de dor lombar de 58% e os autores concluíram que a dor lombar pode estar associada com alterações da coluna vertebral (aumento no ângulo torácico e lombar) e desequilíbrios musculares. Os achados do presente estudo não corroboram com estes resultados, uma vez que não foi encontrada relação significativa entre dor e alteração das curvaturas da coluna vertebral.

O estudo de Pinto et al. (2000) teve como objetivo verificar a relação entre o ângulo da lordose lombar e desempenho da musculatura abdominal em 50 alunos de fisioterapia. O ângulo da lordose foi avaliado por radiografias enquanto que a força da musculatura abdominal foi avaliada por um esfigmomanômetro. Seus resultados demonstraram que não há correlação significativa entre estes parâmetros e que 36% dos estudantes apresentaram hiperlordose lombar, uma prevalência superior àquela encontrada no presente estudo que foi de 23,8% (Tabela 3).

Falcão et al. (2007), utilizando fotogrametria, realizaram um estudo com estudantes universitários e funcionários para verificar a correlação de alterações posturais com dores musculoesqueléticas e os resultados demonstraram a não existência dessa associação, corroborando com os resultados do presente estudo, o qual também não encontrou associação entre alterações nas curvaturas da coluna, dor nas costas e funcionalidade, uma vez que a prevalência de alterações nas curvaturas da coluna foi de 38,1% e a prevalência da funcionalidade sem comprometimento foi alta. Não obstante, a dor nas costas, que apresentou alta prevalência, não causou incapacidade funcional, porém um acompanhamento longitudinal dos universitários seria interessante, já que quase 40% apresentam alteração da coluna vertebral.

Os resultados da avaliação da percepção da qualidade de vida dos estudantes de fisioterapia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, demonstraram que a maioria dos domínios do SF-36 apresentou uma boa qualidade de vida, exceto o domínio da dor que apresentou um escore mais baixo. Esse resultado está de acordo com o resultado encontrado de alta prevalência de dor nas costas nos estudantes. O domínio da capacidade funcional apresentou um escore alto e esse resultado também foi encontrado no questionário Roland-Morris que demonstrou alta prevalência de funcionalidade sem comprometimento. Tsukimoto et al. (2006) realizaram um estudo longitudinal em que os indivíduos (média da idade de 46,8 anos) com dor lombar participaram de uma Escola Postural, sendo avaliados por questionários de qualidade de vida e funcionalidade. Seus resultados mostraram que os indivíduos melhoraram significativamente nos domínios do SF-36 para capacidade funcional, aspectos físicos, dor, estado geral de saúde, vitalidade, bem como melhoraram seus escores do questionário Roland-Morris.

Finalizando, entende-se interessante comentar que o presente estudo utilizou o instrumento arcômetro para avaliar a coluna vertebral, pois é considerada uma ferramenta alternativa, de fácil aplicabilidade, baixo custo, fácil manuseio e que permite uma avaliação quantitativa e objetiva das curvaturas da coluna vertebral (CHAISE et al., 2011). Tradicionalmente, nos estudos de prevalência, a avaliação da coluna vertebral tem sido realizada através da observação da sua forma, ou seja, pela inspeção visual, seja por fotografias ou não, sendo o instrumento posturógrafo o mais comumente utilizado. Nesse sentido, o presente estudo diferencia-se quando apresenta a possibilidade da obtenção de medidas diretas das curvaturas. Não obstante, a opção por este instrumento apresenta uma importante limitação, que é a impossibilidade de avaliar a postura dos estudantes como um todo.

Conclusão

Os resultados demonstraram prevalência de alterações nas curvaturas da coluna vertebral de 38,1% (n=16), prevalência de dor nas costas de 69%; (n=29) e prevalência de comprometimento da funcionalidade de 3,4%; (n=1).

Os resultados não demonstraram associação significativa entre dor nas costas e as alterações nas curvaturas da coluna, e entre funcionalidade e as alterações nas curvaturas da coluna. Os resultados da avaliação da qualidade de vida mostraram que os escores de todos os domínios foram maiores que 45, exceto o domínio "dor", que foi de 36,7.

Entende-se interessante reavaliar esses estudantes com intuito de verificar a evolução do quadro apresentado, no que tange as alterações da coluna vertebral, a dor nas costas, a capacidade funcional e a qualidade de vida dos mesmos.

Recebido em: 23 de outubro de 2011.

Aceito em: 01 de abril de 2013.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013

    Histórico

    • Recebido
      23 Out 2011
    • Aceito
      01 Abr 2013
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