Acessibilidade / Reportar erro

Resposta imuno-endócrina associada à partida de futsal

Immune-endocrine responses to a futsal match

Resumos

O objetivo do estudo foi analisar o efeito de uma partida simulada de futsal sobre as concentrações salivares de cortisol (Cs) e imunoglobulina A (SIgA) em jogadores de elite. Amostras de saliva foram coletadas antes e após a partida e analisadas, posteriormente, pelo método de ELISA. A carga interna de treinamento foi avaliada através do método da Percepção Subjetiva de Esforço da sessão. Através da análise do tamanho do efeito (TE), foi constatado aumento grande (TE=1,07) do Cs e diminuição grande (TE=-1,36) da SIgA do momento pré para o pós-partida. Foi observada correlação significante (r=0,66) entre a carga interna de treinamento e a resposta do Cs. Os resultados do presente estudo indicam que uma partida simulada de futsal pode modular a resposta imuno-endócrina. A adoção de estratégias para monitorar as respostas imuno-endócrinas, em associação a utilização de instrumentos psicométricos, pode auxiliar o planejamento e o ajuste das cargas de treinamento.

Cortisol; Imunoglobulina A; Carga de treinamento; Saliva


The aim of this study was to analyze the effect of a simulated futsal match on salivary cortisol (sC) and immunoglobulin A (SIgA) concentrations in 10 male elite players. Saliva sampling was conducted before and after the futsal match, and, subsequently, the samples were analyzed by ELISA. The internal training load was evaluated by means of session rating of perceived exertion method. The effect size (ES) analysis showed a large increase (ES=1.07) for Cs and a large decrease (ES=-1.36) for SIgA from pre to post-match. There was a significant correlation (r=0.66) between internal training load and Cs response. The results of the present study indicate that a simulated match can modulate immune-endocrine response. The adoption of strategies to monitor salivary responses (Cs and SIgA) associated with psychometric tools could help the planning and the adjustment of training loads.

Cortisol; Immunoglobulin A; Training load; Saliva


ARTIGO ORIGINAL

Resposta imuno-endócrina associada à partida de futsal

Immune-endocrine responses to a futsal match

Ademir Felipe Schultz de ArrudaI; Camila Gobo de FreitasI; Nivaldo Ribeiro de MouraI; Marcelo Saldanha AokiII; Alexandre MoreiraI

IEscola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo, SP, Brasil

IIEscola de Artes Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo, SP, Brasil

Endereço Endereço: USP EEFE - Departamento de Esporte Alexandre Moreira Av. Prof. Mello Moraes, 65 Cidade Universitária São Paulo SP Brasil 05508-030 Telefone: (11) 3091-8789 Fax: (11) 3813-5091 e-mail: alemoreira@usp.br

RESUMO

O objetivo do estudo foi analisar o efeito de uma partida simulada de futsal sobre as concentrações salivares de cortisol (Cs) e imunoglobulina A (SIgA) em jogadores de elite. Amostras de saliva foram coletadas antes e após a partida e analisadas, posteriormente, pelo método de ELISA. A carga interna de treinamento foi avaliada através do método da Percepção Subjetiva de Esforço da sessão. Através da análise do tamanho do efeito (TE), foi constatado aumento grande (TE=1,07) do Cs e diminuição grande (TE=-1,36) da SIgA do momento pré para o pós-partida. Foi observada correlação significante (r=0,66) entre a carga interna de treinamento e a resposta do Cs. Os resultados do presente estudo indicam que uma partida simulada de futsal pode modular a resposta imuno-endócrina. A adoção de estratégias para monitorar as respostas imuno-endócrinas, em associação a utilização de instrumentos psicométricos, pode auxiliar o planejamento e o ajuste das cargas de treinamento.

Palavras-chave: Cortisol. Imunoglobulina A. Carga de treinamento. Saliva.

ABSTRACT

The aim of this study was to analyze the effect of a simulated futsal match on salivary cortisol (sC) and immunoglobulin A (SIgA) concentrations in 10 male elite players. Saliva sampling was conducted before and after the futsal match, and, subsequently, the samples were analyzed by ELISA. The internal training load was evaluated by means of session rating of perceived exertion method. The effect size (ES) analysis showed a large increase (ES=1.07) for Cs and a large decrease (ES=-1.36) for SIgA from pre to post-match. There was a significant correlation (r=0.66) between internal training load and Cs response. The results of the present study indicate that a simulated match can modulate immune-endocrine response. The adoption of strategies to monitor salivary responses (Cs and SIgA) associated with psychometric tools could help the planning and the adjustment of training loads.

Keywords: Cortisol. Immunoglobulin A. Training load. Saliva.

Introdução

A partida de futsal é composta por dois períodos de 20 minutos, com um intervalo de 10 minutos. O cronômetro é parado sempre que o jogo é interrompido, gerando um aumento de 75 a 80% no tempo total da partida (BARBERO-ALVAREZ et al., 2008). Adicionalmente, as substituições são ilimitadas, possibilitando a manutenção do elevado nível de intensidade durante toda a partida (ÁLVAREZ et al., 2002).

Esta significativa demanda do jogo foi demonstrada em estudos recentes. Castagna et al. (2009) observaram que jogadores profissionais de futsal realizam ações de alta intensidade, notadamente aquelas que implicam em valores de 75% do consumo máximo de oxigênio e 90% da frequência cardíaca durante 46 a 52% do tempo total de jogo. Em outra investigação realizada com jogadores profissionais, Barbero-Alvarez et al. (2008) demonstraram que a porcentagem da distância total percorrida em alta e máxima velocidade durante uma partida oficial é maior do que a verificada em outras modalidades esportivas coletivas, como por exemplo, o basquetebol, handebol e futebol de campo.

A elevada magnitude de carga competitiva impõe ao jogador significativo nível de estresse (BROOKS; FAHEY; BALDWIN, 2005). O organismo responde a esse estresse fisiológico com uma reação homeostática, que, por sua vez, resulta em alterações metabólicas e fisiológicas transitórias (COYLE, 2000), cuja magnitude parece ser decorrente e dependente da combinação entre demanda física e emocional (GATTI; DE PALO, 2011; MOREIRA et al., 2009). O conhecimento dessas respostas metabólicas e fisiológicas para uma modalidade esportiva é essencial para o incremento da efetividade do processo de treinamento (REILLY; MORRIS; WHYTE, 2009).

Nesse sentido, diferentes marcadores têm sido utilizados para investigar essas respostas agudas em modalidades esportivas coletivas. Dentre eles, o cortisol tem sido objeto de estudo em diversas investigações. Por exemplo, Elloumi et al. (2003) observaram que a resposta do cortisol salivar (Cs) em jogadores de rúgbi após uma partida competitiva é 2,5 vezes maior do que o valor encontrado no dia de descanso. Em investigação realizada com jogadoras de futebol de campo, verificou-se aumento no Cs em situação de competição, entretanto, em resposta a uma sessão de treinamento, não houve aumento na concentração desse hormônio (HANEISHI et al., 2007).

Apesar da importância do conhecimento referente à resposta hormonal associada aos momentos de treinamento e competição, poucos estudos investigaram parâmetros endócrinos em jogadores de futsal. Entretanto, recentemente, a resposta do principal marcador da imunidade da mucosa oral, a imunoglobulina salivar A (SIgA), foi investigada em jogadores profissionais de futsal durante duas partidas simuladas (MOREIRA et al., 2011). Os resultados mostraram diminuição das respostas relacionadas à SIgA, tanto para a concentração absoluta (SIgAabs), quanto para a taxa de secreção de SIgA (SIgAtaxa). Essa redução está associada ao aumento do risco para infecções do trato respiratório superior (ITRS) (GLEESON et al. 2011).

Diante da necessidade do maior entendimento das respostas fisiológicas associadas ao futsal, o presente estudo buscou analisar o efeito de uma partida simulada sobre a resposta imuno-endócrina (Cs e SIgA) em jogadores de futsal. Foi hipotetizado que haveria aumento na concentração de Cs e decréscimo da SIgA em resposta a elevada demanda física/fisiológica da partida de futsal.

Metodologia

Sujeitos

A amostra foi composta por 10 atletas de futsal (média e DP: idade, 19±1 anos, massa corporal, 73±7 kg e estatura, 180±4 cm), integrantes da equipe campeã paulista e brasileira da categoria sub-20 no período da investigação. Os atletas participavam do Campeonato Paulista durante a realização do presente estudo. A equipe realizava em média 10 sessões de treinamento semanais, de 80 a 120 minutos cada, incluindo as partidas oficiais. Todos os participantes foram informados dos riscos envolvidos no estudo e assinaram um termo de consentimento aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da EEFE USP (2008/21).

Delineamento Experimental

A presente investigação avaliou as respostas do Cs e SIgA, após uma simulação de partida, realizada durante uma sessão de treinamento. Os 10 atletas participaram integralmente da simulação, com cinco jogadores em cada equipe. Diferentemente do jogo oficial, nenhuma substituição foi realizada, porém, todas as demais regras oficiais foram mantidas. A sessão teve duração de 80 minutos, sendo 15 minutos de treinamento técnico/tático, utilizado como aquecimento, seguido de uma simulação de três tempos de 20 minutos, com dois minutos de intervalo entre eles. O intervalo foi utilizado para recuperação e hidratação ad libitum. Os atletas participantes realizavam habitualmente sessões de simulação, como a utilizada no presente estudo, como forma de treinamento específico.

Os indivíduos forneceram amostras de saliva imediatamente antes (15h45min) da sessão de treinamento e aproximadamente cinco a 10 minutos após o encerramento desta e indicaram a PSE da sessão, utilizando-se da escala CR-10, 30 minutos após o término da sessão (NAKAMURA; MOREIRA; AOKI, 2010). O preenchimento foi feito de forma individualizada, sem contanto entre os jogadores. Todos os participantes estavam amplamente familiarizados com o instrumento, por utilizarem rotineiramente a escala para controle da intensidade do treinamento.

Procedimentos de coleta e análise das amostas de saliva

Os atletas foram instruídos a não consumir alimentos ou cafeína por pelo menos duas horas antes do início da sessão de treinamento. A saliva foi coletada, sem estimulação, em tubos pré-pesados e esterilizados. Imediatamente após as coletas, os tubos foram armazenados em gelo seco e transportados para o laboratório, aonde foram estocados a -80º C até a análise. As análises do Cs e da SIgA foram realizadas com utilização de kits comerciais específicos (ELISA, SIgA EIA kit e Salivary Cortisol EIA, ALPCO Diagnostics, Salem, MA, USA), seguindo instruções dos fabricantes. A análise foi realizada utilizando-se o método de ELISA (enzime linked imunosorbant assay) de acordo com os procedimentos adotados por Moreira et al. (2009) e Moreira et al. (2011). O fluxo salivar (FS) foi determinado a partir do cálculo do volume de saliva para cada amostra, subtraindo o peso do tubo pré-coleta do peso pós-coleta, realizado em uma balança de precisão (0,001g) – assumiu-se que 1mL = 1g e FS = volume (mL) / tempo (min) conforme procedimento realizado por Koch et al. (2007) e Moreira et al. (2011). O coeficiente de variação intra-análise foi de 4% e 6% para Cs e SIgA, respectivamente.

Carga interna de treinamento

Para a determinação da carga interna de treinamento foi utilizado o método da PSE da sessão. Assim, a carga interna de treinamento foi quantificada através do cálculo do produto da duração da sessão, em minutos, pela pontuação na escala CR-10, registrada 30 minutos após o término da sessão. A carga interna de treinamento foi apresentada em unidades arbitrárias (UA). Esse método foi proposto por Foster (1998) e mais recentemente revisado e discutido por Nakamura, Moreira e Aoki (2010).

Análise Estatística

Os dados foram apresentados como média, desvio padrão (DP) e percentual de alteração. Inicialmente foi realizado o teste de normalidade de Shapiro-Wilk. Todos os dados contemplaram os pressupostos de distribuição normal (p > 0,05). Em seguida, o percentual de alteração foi analisado para cada variável dependente (SIgA, Cs e fluxo salivar) como proposto por Batterham e Hopkins (2006) . Para avaliar a magnitude das alterações pré e pós-simulação, utilizou-se do tamanho do efeito (TE), sendo considerado < 0,2 = trivial, entre 0,2 e 0,5 = pequeno, entre 0,5 e 0,8 = moderado e > 0,8 = grande, como proposto por Cohen (1988).

Para analisar a correlação entre as variáveis, foi utilizado o coeficiente de correlação de Pearson. Foi considerado entre 0 e 0,1 = trivial, entre 0,1 e 0,3 = pequena, entre 0,3 e 0,5 = moderada, entre 0,5 e 0,7 = grande, entre 0,7 e 0,9 = muito grande e entre 0,9 e 1 = quase perfeito (HOPKINS, 2002)

Resultados

A carga interna de treinamento apresentou média ± DP de 400 ± 37,71 UA. Oito atletas apontaram a sessão como "difícil" (escore 5), um atleta apontou como "um pouco difícil" (escore 4) e um atleta classificou a sessão entre "difícil" e "muito difícil" (escore 6).

Os resultados referentes ao Cs e a SIgA são apresentados em forma de média e DP para os momentos pré e pós-simulação na tabela 1. O percentual de alteração individual, para SIgA e Cs, pode ser observado nas figuras 1 e 2, respectivamente. A concentração de Cs aumentou consideravelmente do momento pré para o momento pós (TE = 1,07). Além disso, foi encontrada correlação significante (r = 0,66) entre o percentual de alteração do Cs e a carga interna de treinamento. A concentração de SIgAabs apresentou queda substancial no momento pós-partida em comparação com o momento pré-partida (TE = -1,36). O fluxo salivar não foi afetado pela partida de futsal (TE = 0,43).



Discussão

O objetivo do presente estudo foi investigar a resposta imuno-endócrina associada à partida de futsal. Os principais resultados foram: 1) a classificação da intensidade da partida, como "difícil" ou "muito difícil" por 9 dos 10 atletas analisados; 2) o aumento na concentração de Cs e a diminuição na concentração de SIgA em resposta à partida e 3) a correlação significante entre a carga interna e o aumento da concentração de Cs.

Os valores de PSE da sessão indicam que a simulação foi realizada com intensidade elevada, compatível com a intensidade do jogo de futsal reportada anteriormente. Castagna et al. (2009), por exemplo, demonstraram que jogadores de futsal alcançam valores médios de 75% do consumo máximo de oxigênio e 90% da frequência cardíaca máxima durante as partidas. O aumento substancial da concentração de Cs do momento pré para o momento pós-simulação corrobora estes resultados e indica que a demanda física/fisiológica da simulação foi elevada.

Interessantemente, o incremento da concentração de Cs decorrente da partida simulada diverge dos resultados apresentados em estudos anteriores com outras modalidades coletivas, os quais também utilizaram simulações de jogo oficial ou sessões de treinamento para analisar a resposta do cortisol. Moreira et al. (2009) investigaram jogadores profissionais de futebol de campo em uma partida simulada com duração de 70 minutos (dois períodos de 35 minutos), realizada durante a temporada competitiva. Embora os autores tenham reportado incremento individual no nível de Cs, não foi constatada variação estatisticamente significante (p = 0,06) desse parâmetro quando comparados os momentos pré e pós-simulação. Esse comportamento do Cs também foi observado em jogadoras de futebol após uma sessão de treinamento (HANEISHI et al., 2007). A sessão de treinamento não foi capaz de gerar estresse suficiente para resultar em aumento do Cs, que passou de 17,7 para 22,4 nmol·L-1 do momento pré para o momento pós-treinamento. Por outro lado, foi reportado incremento para este mesmo grupo em resposta a uma partida oficial, com a média da concentração de Cs passando de 18,0 (pré-jogo) para 53,1 nmol·L-1 no momento pós-jogo.

Os resultados desses dois estudos sugerem a importância do fator psicológico como um agente estressor adicional, que por sua vez, levaria a um incremento do estresse imposto ao organismo dos atletas. Entretanto, no presente estudo foi detectado aumento da resposta do Cs para uma simulação de partida de futsal, o que reforça a hipótese inicial de que esse esporte impõe uma demanda fisiológica ampliada, quando comparado a outras modalidades esportivas coletivas (BARBERO-ALVAREZ et al., 2008). Esse maior estresse fisiológico imposto ao organismo poderia explicar a elevada magnitude de resposta do Cs mesmo na ausência do componente real de competição. A hipótese de que o futsal apresenta elevada demanda fisiológica é reforçada pela magnitude de carga interna de treinamento (400 UA). Além disso, é importante ressaltar que a carga interna apresentou correlação positiva com o percentual de variação do Cs (r = 0,66).

Além do aumento do Cs, a partida simulada induziu uma diminuição do nível de SIgA. A queda da concentração de SIgA tem sido associada ao aumento do risco de infecções do trato respiratório superior (ITRS) (BISHOP; GLEESON, 2009; GLEESON et al., 2011). Neville, Gleeson e Folland (2008), em investigação durante 50 semanas em atletas participantes da America's Cup Yacht Racing, mostraram redução significante da SIgA durante as três semanas que precederam episódios de ITRS e retorno ao valor da linha de base duas semanas após os episódios.

Os resultados do presente estudo (queda da SIgA) reforçam os achados reportados por Moreira et al. (2011), com jogadores profissionais de futsal. No estudo de Moreira et al. (2011), foi detectada queda significante (p < 0,05) na concentração de SIgA (175 vs 99 µg·mL-1 , pré e pós-simulação, respectivamente), após partidas simuladas com duração de 40 minutos (4 períodos de 10 minutos). Em conjunto, os resultados do presente estudo e os apresentados por Moreira et al (2011), indicam que a partida simulada de futsal poderia aumentar o risco para ITRS.

Recentemente, Gleeson et al. (2011) mostraram que o baixo nível de SIgA estava relacionado ao número de semanas com episódios de ITRS em atletas de diferentes modalidades esportivas e distintos níveis de qualificação. Diante dessas evidências, seria plausível assumir que a redução repetida da SIgA, decorrente da sequência de sessões de treinamento e competição no futsal, poderia aumentar o risco de ITRS e comprometer o processo de treinamento ou mesmo a participação efetiva na competição. Essa observação deveria ser levada em consideração por técnicos e preparadores físicos, no tocante a organização e monitoramento das cargas de treinamento, a fim de minimizar o risco de ITRS e otimizar o processo de preparação.

Apesar da concordância entre os resultados do presente estudo e a investigação prévia de Moreira et al. (2011) no que concerne as respostas de SIgA às partidas simuladas de futsal, resultados distintos foram apresentados em investigações com jogadores de outras modalidades esportivas coletivas. Moreira et al. (2009) reportaram não haver variação no nível de SIgA quando comparado ao valor pré e pós-simulação de partida de futebol de campo, com duração de 70 minutos. Do mesmo modo, Koch et al. (2007) não identificaram queda no nível de SIgA em jogadores de rúgbi submetidos a uma partida oficial de 80 minutos do momento pré para o pós-jogo (311,4 vs. 355,8 µg·mL-1, respectivamente; p = 0,18). Essas diferentes respostas reforçam a necessidade de mais investigações com modalidades esportivas coletivas. É possível especular que a maior intensidade do jogo de futsal, em comparação com as outras modalidades coletivas investigadas, seja um dos fatores de explicação para as diferenças nas respostas agudas de SIgA.

Apesar da queda de SIgA e da elevação da concentração de Cs, não foi verificada correlação significante entre as respostas desses marcadores. Esses resultados corroboram estudos anteriores, reforçando que mecanismos distintos modulam as alterações do Cs e da SIgA. Apesar da conhecida propriedade imunomodulatória do cortisol, tem sido demonstrado que as alterações da SIgA não são mediadas, necessariamente, por esse hormônio esteroide (LI; GLEESON, 2004; MOREIRA et al., 2010; SARI-SARRAF, REILLY; DORAN, 2006).

Alterações no estado hídrico poderiam impactar nos resultados dos marcadores analisados no presente estudo. Entretanto, a ingestão ad libitum de água durante a partida simulada parece ter sido suficiente para manter o nível de hidratação dos jogadores e, consequentemente, não afetar os resultados apresentados. Walsh et al. (2004) demonstraram que a ingestão de fluidos durante um exercício prolongado pode prevenir a diminuição da taxa de fluxo salivar. Além disso, Walsh et al. (2004) revelaram que a variação do fluxo salivar poderia ser utilizada como um bom marcador de estado hídrico.

Embora o presente estudo forneça fortes evidências da alta demanda física-fisiológica imposta aos atletas por uma partida simulada de futsal, algumas limitações devem ser consideradas. Em função de se investigar somente uma equipe participando da partida simulada, o tamanho da amostra foi reduzido. Mais estudos com jogadores de futsal em situação de simulação e competição poderiam ampliar este conhecimento, e reforçando ou refutando os resultados aqui apresentados. Além disso, a estratégia de simulação poderia afetar os resultados. É possível se especular que a manipulação do tempo de jogo, o maior ou menor número de períodos de jogo, o aumento ou a redução nos intervalos, por exemplo, poderiam induzir diferentes respostas. Portanto, apesar dos resultados aqui apresentados serem bastante consistentes, esses achados devem ser interpretados com cautela, pois poderiam representar a demanda inerente à estratégia especifica de simulação adotada. Outras estratégias poderiam ser avaliadas em futuros estudos para o avanço do conhecimento sobre as respostas fisiológicas associadas ao futsal.

Em conclusão, os resultados do estudo permitem afirmar que uma partida simulada de futsal, inerente à estratégia de organização aqui proposta, é capaz de gerar elevado nível de estresse, demonstrado pela magnitude elevada da carga interna, pelo aumento da concentração de Cs e pela diminuição do nível de SIgA. A redução da SIgA indica diminuição da imunidade da mucosa oral, o que, por sua vez, poderia maximizar o risco de ITRS após partidas simuladas. No cotidiano do treinamento, técnicos, preparadores físicos e fisiologistas poderiam adotar estratégias para monitorar as respostas imuno-endócrinas, em associação a utilização de instrumentos psicométricos (escalas e questionários), com intuito de auxiliar o planejamento e o ajuste das cargas de treinamento.

Agradecimentos: aos atletas que participaram da presente investigação pela enorme colaboração e disposição durante a investigação, assim como aos membros da comissão técnica. Gostaríamos também de agradecer à FAPESP pelo auxílio financeiro (processo 2008/10404-3, auxílio à pesquisa, projeto de pesquisa regular).

Recebido em: 5 de dezembro de 2011.

Aceito em: 13 de maio de 2013.

  • ÁLVAREZ, J. C.; GIMENEZ, L.; CORONA, P; MANONELLES, P. Necesidades cardiovasculares y metabolicas del futbol-sala: analisis de la competicion. Apunts - Educación Física e Deportes, Barcelona, v.67, p.45-53, 2002. Disponível em: http://articulos-apunts.edittec.com/67/es/067_045-051ES.pdf Acesso em: 20 jun. 2011.
  • BARBERO-ALVAREZ, J. C; SOTO, V. M.; BARBERO-ALVAREZ, V.; GRANDA-VERA, J. Match analysis and heart rate of futsal players during competition. Journal of Sports Sciences, London, v.26, n.1, p.63-73, 2008. Disponível em: http://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/02640410701287289?url_ver=Z39.88-2003&rfr_id=ori:rid:crossref.org&rfr_dat=cr_pub%3dpubmed Acesso em: 20 jun. 2011.
  • BATTERHAM, A. M.; HOPKINS, W. G. Making meaningful inferences about magnitudes. International Journal of Sports Physiology and Performance, Champaign, v.1, n.1, p.50-57, 2006. Disponível em: http://www.sportsci.org/jour/05/ambwgh.htm Acesso em: 20 jun. 2011.
  • BISHOP, N. C.; GLEESON, M. Acute and chronic effects of exercise on markers of mucosal immunity. Frontiers in Bioscience: a Journal and Virtual Library, Tampa, v.14, n.1, p. 4444-4456, 2009. doi: http://dx.doi.org/10.2741/3540
  • BORG, G.A. Psychophysical bases of perceived exertion. Medicine and Science in Sports and Exercise, Hagerstown, v.14, n.5, p.377-381, 1982. doi: http://dx.doi.org/10.1249/00005768-198205000-00012
  • BROOKS, G. A.; FAHEY, T. D.; BALDWIN, K. M. Exercise physiology: human bioenergetics and its applications. 4. ed. New York: McGraw-Hill, 2005.
  • CASTAGNA, C.; D'OTTAVIO, S.; VERA, J. G.; BARBERO ÁLVAREZ, J. C. Match demands of professional Futsal: A case study. Journal of Science and Medicine in Sport, Belconnen, v.12, n.4, p.490-494, 2009. doi: http://dx.doi.org/10.1016/j.jsams.2008.02.001
  • COHEN, J. Statistical power analysis for the behavioral sciences. 2. ed. Hillsdale: Erlbaum, 1988.
  • COYLE, E. F. Physical activity as a metabolic stressor. American Journal of Clinical Nutrition, New York, v.72, n.2 Suppl, p.512S-520S, 2000. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/10919953 Acesso em: 20 jun. 2011.
  • ELLOUMI, M.; MASO, F.; MICHAUX, O.; ROBERT, A.; LAC, G. Behaviour of saliva cortisol [C], testosterone [T] and the T/C ratio during a rugby match and during the post-competition recovery days. European Journal of Applied Physiology, Heidelberg, v.90, n.1-2, p. 23-28, 2003. doi: http://dx.doi.org/101007/s00421-003-0868-5
  • FOSTER, C. Monitoring training in athletes with reference to overtraining syndrome. Medicine and Science in Sports and Exercise, Hagerstown, v.30, n.7, p.1164-1168, 1998. doi: http://dx.doi.org/10.1097/00005768-1998007000-00023
  • FOSTER, C.; FLORHAUG, J.A.; FRANKLIN, J.; GOTTSCHALL, L.; HROVATIN, L.A.; PARKER, S.; DOLESHAL, P.; DODGE, C. A new approach to monitoring exercise training. Journal of Strength and Conditioning Research, Champaign, v.15, n.1, p.109-115, 2001. doi: http://dx.doi.org/10.1519/00124278-200102000-00019
  • GATTI, R.; DE PALO, E. F. An update: salivary hormones and physical exercise. Scandinavian Journal of Medicine and Science in Sports, Copenhagen, v.21, n.2, p.157-169, 2011. doi: http://dx.doi.org/10.1111/j.1600-0838.2010.01252.x
  • GLEESON, M.; BISHOP, N.; OLIVEIRA, M.; MCCAULY, T.; TAULER, P.; MUHAMAD, A. S. Respiratory infection risk in athletes: association with antigen-stimulated IL-10 production and salivary IgA secretion. Scandinavian Journal of Medicine and Science in Sports, Copenhagen, v.22, n.3, p.410-417, 2011. doi: http://dx.doi.org/10.1111/j.1600.0838.2010.01272.x
  • HANEISHI, K.; FRY, A. C.; MOORE, C. A.; SCHILLING, B. K.; LI, Y.; FRY, M. D. Cortisol and stress responses during a game and practice in female collegiate soccer players. Journal of Strength and Conditioning Research, Champaign, v.21, n.2, p.583588, 2007. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/17530979 Acesso em: 20 jun. 2011.
  • HOPKINS, W. G. A New View of Statistics, 2002. Disponível em: http://sportsci.org/resource/stats/effectmag.html Acesso em: 20 nov. 2011.
  • KOCH, A. J.; WHERRY, A. D.; PETERSEN, M. C.; JOHNSON, J. C.; STUART, M. K.; SEXTON, W. L. Salivary immunoglobulin A response to a collegiate rugby game. Journal of Strength and Conditioning Research, Champaign, v.21, n.1, p.86-90, 2007. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Salivary+immunoglobulin+A+response+to+a+collegiate+rugby+game Acesso em: 20 jun 2011.
  • LI, T. L.; GLEESON, M. The effect of single and repeated bouts of prolonged cycling on leukocyte redistribution, neutrophil degranulation, IL-6, and plasma stress hormone responses. International Journal of Sport Nutrition and Exercise Metabolism, Champaign, v.14, n.5, p.501-516, 2004.
  • MOREIRA, A.; ARSATI, F.; DE OLIVEIRA LIMA ARSATI, Y. B.; DA SILVA, D.A.; DE ARAUJO,V. C. Salivary cortisol in top-level professional soccer players. European Journal of Applied Physiology, Heidelberg, v.106, n.1, p.25-30, 2009. doi: http://dx.doi.org/10.1007/s00421-009-0984-y
  • MOREIRA, A.; ARSATI, F.; LIMA-ARSATI, Y. B. O.; FRANCHINI, E.; DE ARAÚJO, V. C. Effect of a kickboxing match on salivary cortisol and immunoglobulin A. Perceptual and Motor Skills, Missoula, v.111, n.1, p.158-166, 2010. doi: http://dx.doi.org/10.2466/05.06.16.25.PMS.111.4.158-166
  • MOREIRA, A.; ARSATI, F.; DE OLIVEIRA LIMA-ARSATI, Y. B.; DE FREITAS, C. G.; DE ARAÚJO, V. C. Salivary immunoglobulin A responses in professional top-level futsal players. Journal of Strength and Conditioning Research, Champaign, v.25, n.7, p.1932-1936, 2011. doi: http://dx.doi.org/10.1519/JSC.0b013e3181e7fbc0
  • NAKAMURA, F. Y.; MOREIRA, A.; AOKI, M. S. Monitoramento da carga de treinamento: a percepção subjetiva do esforço da sessão é um método confiável? Revista da Educação Física/UEM, Maringá, v.21, n.1, p.1-11, 2010. Disponível em: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/RevEducFis/article/view/6713 Acesso em: 20 jun. 2011.
  • NEVILLE, V.; GLEESON, M.; FOLLAND, J. P. Salivary IgA as a Risk Factor for Upper Respiratory Infections in Elite Professional Athletes. Medicine and Science in Sports and Exercise, Hagerstown, v.40, n.7, p.1228-1236, 2008. doi: http://dx.doi.org/10.1249/MSS.0b013e31816be9c3
  • REILLY, T.; MORRIS, T.; WHYTE, G. The specificity of training prescription and physiological assessment: a review. Journal of Sports Science, London, v.27, n.6, p.575-589, 2009. doi: http://dx.doi.org/10.1080/02640410902729741
  • SARI-SARRAF, V.; REILLY, T.; DORAN, D. A. Salivary IgA response to intermittent and continuous exercise. International Journal of Sports Medicine, Stuttgart, v.27, n.11, p.849-855, 2006. doi: http://dx.doi.org/10.1055/s-2006-923777
  • WALSH, N. P.; LAING, S. J.; OLIVER, S. J.; MONTAGUE, J. C.; WALTERS, R.; BILZON, J. L. Saliva parameters as potential indices of hydration status during acute dehydration. Medicine and Science in Sports Exercise, Hagerstown, v.36, n.9, p.1535-1542, 2004. doi: http://dx.doi.org/10.1249/01.MSS.0000139797.26760.06
  • Endereço:

    USP EEFE - Departamento de Esporte
    Alexandre Moreira
    Av. Prof. Mello Moraes, 65 Cidade Universitária
    São Paulo SP Brasil
    05508-030
    Telefone: (11) 3091-8789
    Fax: (11) 3813-5091
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013

    Histórico

    • Recebido
      05 Dez 2011
    • Aceito
      13 Maio 2013
    Universidade Estadual Paulista Universidade Estadual Paulista, Av. 24-A, 1515, 13506-900 Rio Claro, SP/Brasil, Tel.: (55 19) 3526-4330 - Rio Claro - SP - Brazil
    E-mail: motriz.rc@unesp.br